Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A REFORMA ADMINISTRATIVA, ESPECIALMENTE NO QUE TANGE A ESTABILIDADE DOS SERVIDORES PUBLICOS.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA ADMINISTRATIVA.:
  • COMENTARIOS A REFORMA ADMINISTRATIVA, ESPECIALMENTE NO QUE TANGE A ESTABILIDADE DOS SERVIDORES PUBLICOS.
Aparteantes
Epitácio Cafeteira.
Publicação
Publicação no DSF de 11/02/1998 - Página 2604
Assunto
Outros > REFORMA ADMINISTRATIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, ANALISE, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFORMA ADMINISTRATIVA, ESPECIFICAÇÃO, QUEBRA, ESTABILIDADE, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, BRASIL.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, esta semana, como está amplamente noticiado, o Senado vai votar a Reforma Administrativa, sobre a qual, em um dos seus tópicos, agora mesmo, acabamos de ouvir o “discurso-desabafo” do Senador Epitacio Cafeteira.

Srª. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, é verdade que nunca se votaram tantas leis neste País. Concordo, porque acredito que, no Congresso Nacional, devam estar em tramitação, no mínimo, 400 ou 500 emendas à Constituição de 1988.

De hoje para amanhã, estaremos aqui votando a Reforma Administrativa. Não tenho dúvidas, Srs. Senadores, meus caros Colegas, da sua aprovação. Sei que esta Reforma será aprovada.

Ocupo a Tribuna para manifestar meu ponto de vista com relação a alguns tópicos referentes à Reforma Administrativa.

A meu ver, estamos cometendo alguns equívocos diante da sociedade brasileira, porque vejo alguns apregoarem, por exemplo, o fim da estabilidade do servidor público como uma grande vantagem, como uma grande iniciativa em favor do Serviço Público deste País. Penso diferente nesse tópico; penso que a estabilidade é uma garantia, uma segurança para o Serviço Público; ela evita perseguições e demissões injustificadas, deixando que o servidor público trabalhe com mais tranqüilidade.

Outros argumentam diferentemente. Entendem que a estabilidade faz com que o servidor público seja negligente no seu serviço e não cumpra efetivamente a sua missão. Contudo, quero discutir o que está na lei; não quero discutir as suposições, Srª. Presidente, Srs. Senadores; quero discutir a Reforma que vamos votar aqui, e, sob este aspecto, não penso que ela acabe com a estabilidade no Direito brasileiro, sinceramente.

Como advogado, li atentamente a proposta que estamos votando e, referentemente à estabilidade, vejo que o primeiro item é a consagração do princípio, hoje existente, de que o ingresso no Serviço Público se deve dar mediante concurso de provas e títulos. Esta regra continuará consagrada na Reforma em apreço, cujo texto afirma que a estabilidade se dará depois de três anos de “observação” do servidor público, enquanto que a Constituição de 1988 prevê um prazo de dois anos. Então, no atinente ao tempo, a nova lei apenas amplia o prazo de dois para três anos. Duvido que alguém me diga, no caso, que a estabilidade está quebrada; ela está flexibilizada, endurecida; porém, não se está acabando com a estabilidade.

É preciso também dizer que não existe estabilidade absoluta, nunca existiu no Direito brasileiro, porque o servidor público, mediante o cometimento de determinadas faltas previstas na legislação, pode ser demitido do Serviço Público através de processo administrativo que lhe assegure o direito à ampla defesa.

Ainda estou analisando o problema do prazo, que está ampliado de dois para três anos, o que, por si, não quebra a estabilidade. Podemos até ser contrários a esse dispositivo, mas nunca poderemos afirmar que a ampliação do estágio probatório quebre a estabilidade.

Srª Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero reafirmar, aqui, que tenho a minha vida pública marcada pela defesa do princípio da estabilidade. Estou apenas fazendo comentários à lei existente e, ao fazê-los, como advogado, penso que, neste tópico, conforme acabei de afirmar aqui, a estabilidade positivamente não foi quebrada.

Dispõe ainda mais a lei, em um dos seus incisos, que o funcionário que não tiver bom desempenho poderá ser demitido. Volto a fazer a indagação: isto quebra a estabilidade no Direito Público brasileiro? Para responder a esta pergunta, temos que olhar a lei que, hoje, regula esta matéria. Bom desempenho não é novidade no Direito Administrativo brasileiro. A falta do bom desempenho ali está inscrita sob a forma de negligência e desídia, caracterizadoras, na lei atual - não na que estamos votando -, da figura da falta grave, a qual, apurada mediante inquérito administrativo, resguardado o direito de ampla defesa, poderá sujeitar o funcionário à pena de perda do seu cargo.

E o que diz esta Reforma de agora? Apenas não fala em desídia, mas em falta de bom desempenho.

É interessante notar, Srª. Presidente, que, querendo quebrar a estabilidade, querendo que a Reforma seja mais ágil, remete o legislador a matéria à lei complementar. Ora, Srª. Presidente, Srs. Senadores, como afirmei na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, se dependerá de lei complementar, ficaremos diante de um “buraco negro” até que a lei complementar seja votada. E é bom que dependa de lei complementar; não entendo que isso seja ruim; não estou criticando; apenas comento a lei por entender que a sociedade brasileira precisa ficar esclarecida sobre o teor da Reforma Administrativa que estamos votando, a qual, nesse particular, dependerá de lei complementar, para cuja apreciação e votação - frise-se - exige-se quorum qualificado.

E, na Reforma constitucional que vai ser votada, já está garantido, por antecipação, que isso se dará sempre, assegurados os princípios do contraditório e da ampla defesa.

O Sr. Epitacio Cafeteira (PPB-MA) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ramez Tebet?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Ouço o aparte do nobre Senador Epitacio Cafeteira.

O Sr. Epitacio Cafeteira (PPB-MA) - Nobre Senador Ramez Tebet, V. Exª iniciou o seu pronunciamento, firmando-se no art. 41, que dispõe: art.41 - São estáveis, após dois anos de efetivo exercício, os servidores nomeados em virtude de concurso público. V. Exª se fixou no caput; V. Exª não desceu aos parágrafos, aos incisos, onde V. Exª verá que essa estabilidade de três anos não é verdadeira. V. Exª encontrará, logo adiante, no inciso III, a seguinte disposição: mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurado amplo direito de defesa. Todavia, veja V. Exª, é precária essa estabilidade que se garantiu depois de três anos. V. Exª dirá que sabe que o Governo não fará isso. Então, pergunto-lhe: qual governo? O federal, o estadual ou o municipal? O que estamos pretendendo com isso? Estamos abrindo uma porta para que, politicamente, tudo seja possível. V. Exª há de me permitir manter o que disse no meu pronunciamento. A estabilidade, que é uma cláusula pétria, vai ser destruída, embora abrindo uma janela para dizer que a lei complementar vai estabelecer como será medido, periodicamente, o desempenho. O projeto possibilita a extinção do cargo, ficando o funcionário em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço. Ora, V. Exª conhece como é este País em termos políticos. Em meu Estado, por exemplo, muitos prefeitos recém-eleitos demitiram todos os servidores. Não tinham o amparo dessa emenda e não houve necessidade de lei complementar. Se não houver alguma coisa que garanta a esses servidores retornar, posso garantir a V. Exª que estaremos condenando essas famílias, porque o chefe de família, homem ou mulher, desempregado, com toda a certeza, caminhará para o fim da sua vida, já que estará perdendo a cidadania e o respeito da família.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Senador Epitacio Cafeteira, o aparte de V. Exª me permite apenas esclarecer que não estou falando contra a estabilidade. Sou a favor da estabilidade e estou até colocando parâmetros no meu pronunciamento; parâmetros de quem está comentando a reforma e os termos em que ela está redigida. Neste ponto, discordo de V. Exª. O fato da lei exigir, depois do estágio probatório, uma avaliação periódica que garanta a ampla defesa, positivamente não pode ser encarado como quebra da estabilidade, significa, isto sim, a busca da eficiência no serviço público e a possibilidade da ampla defesa, porque ele deverá estar sujeito à prestação de contas de sua atuação.

Os prefeitos estão demitindo servidores que não estão amparados pela estabilidade, Senador Epitacio Cafeteira, pois, do contrário, não poderiam demitir. Nesse ponto reside a diferença entre o servidor amparado pela estabilidade, isto é, que fez concurso ou que foi declarado estável por lei e aquele que foi contratado sob outro regime jurídico.

Enfim, é essa a interpretação que faço para entrar no ponto crítico. Neste caso, sim, penso que a questão é complicada, pois existe um dispositivo nesta Reforma Constitucional que diz que, para se atingir a aplicação de recursos ao limite de 60% previsto na Lei Camata, pode haver demissão - até dos estáveis! A meu ver, esse é o ponto negativo do projeto, embora para se chegar a esse ponto, a lei também estabeleça critérios: primeiro, a eliminação de 20% dos cargos em comissão ou dos cargos em confiança, o que não depende de Reforma Constitucional; pode ser feita a qualquer momento. Tanto prefeito quanto governador, Presidente da República ou presidentes de instituições como o Legislativo, por exemplo, podem fazê-lo. Eliminação de cargos não está no instituto da estabilidade, bem como cuida da demissão, antes dos estáveis, daqueles que são contratados ou prestam serviços fora da estabilidade, fora do concurso público, como, por exemplo, os celetistas.

O que acontece, na prática, é que os prefeitos, os governadores não têm condições de demitir, porque os Estados estão quebrados, e, para demitir quem está pela CLT, têm que pagar uma alta indenização, daí porquê a existência desses Planos de Demissões Voluntárias que perambulam por aí. Então, nesse tópico, dou razão àqueles que afirmam que a estabilidade, do ponto de vista legal, não acontece em razão do que acabei de afirmar.

Por outro lado, como me propus a examinar o texto da Lei, como me propus a fazer comentários sobre essa Lei, permito-me afirmar sim - e aí muitos têm razão - que ela está voltada à figura do servidor público. Toda economia que se quer fazer está centrada na demissão de servidores públicos. Todos nós assistimos, por exemplo, na Comissão de Constituição e Justiça, ao depoimento culto e brilhante do Ministro Bresser Pereira, onde S. Exª afirmou que haverá uma economia de R$9 bilhões/ano, depois da aprovação e da aplicação da Reforma Administrativa. Como me propus a comentar a Lei e a fazer um exame frio de seu texto, tenho que compará-la à realidade dos fatos, àquilo que conheço da realidade brasileira. E, ao fazer essa comparação, permito-me dizer a S. Exª, o Ministro da Administração, que, pelos cálculos que formulei, à média de R$500 por mês - e é muito para os fins a que me proponho -, para haver uma economia de R$9 bilhões há necessidade de se demitir 1 milhão e 350 mil servidores públicos, atirando-os em um clima de desemprego, que cada vez aumenta mais neste País. Aí, sim, haveria tal economia! Entretanto, duvido que se demita 1 milhão e 350 mil funcionários em 27 Estados da Federação brasileira, aliás, torço mesmo para isso não acontecer. Todos nós torcemos para não acontecer.

           O que houve, Srª Presidente e Srs. Senadores, é que o Ministro se equivocou na conta. Só pode ser equívoco! Comecei minha vida como Prefeito; fui Deputado estadual; Vice-Governador e Governador por dez meses. Sou homem que representa Mato Grosso do Sul, onde aliás se fez o Plano de Demissão Voluntária, demitindo-se aqueles funcionários que espontaneamente assim optaram, independentemente de estabilidade ou do regime de trabalho. Para tanto, foi preciso contratar empréstimo com a Caixa Econômica Federal, porque os Estados não têm recursos para isso.

           Srª. Presidente, o meu discurso parece ser contraditório, mas não o é. Venho a esta tribuna apenas porque entendo que precisamos esclarecer a sociedade brasileira, pois tenho a obrigação de lhe apresentar a minha visão como Senador. Não posso negar que este Projeto possui pontos altamente positivos; ele vai impedir, por exemplo, a existência dos marajás, uma figura que não existirá mais. Como se explica a sua presença? Pelo acúmulo de vantagens permitidas em leis municipais, estaduais e federais, vantagens que, positivamente, ninguém pode compreender. Cito um exemplo:

           O Sr. Epitacio Cafeteira (PPB-MA) - Por que não aprovamos só a parte positiva, nobre Senador? Para aprovarmos a parte positiva, nós temos que aprovar também a parte negativa?

           O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Não, nobre Senador, essa é uma questão de voto; cada um vai votar do jeito que quiser, nobre Senador Epitacio Cafeteira. Como parâmetro do meu discurso, eu me propus analisar o que a Reforma Administrativa contém, porque - volto a afirmar - a sociedade brasileira ainda não está perfeitamente esclarecida sobre ela.

           O Sr. Epitacio Cafeteira (PPB-MA) - Estou de acordo com V. Exª.

           O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Estou apenas explicando o que tem a lei, porque nenhum de nós pode aceitar que haja servidores públicos nos Estados ganhando mais de R$20.000,00. E isso acontece porque a legislação facilita. Vem à minha mente, neste momento, o caso de um servidor público estadual - um Coronel da Polícia Militar - que recebe mais de R$20.000,00 por mês. Por que o seu salário atingiu essa cifra astronômica? Naturalmente, porque ele foi chefe de gabinete por dois anos e acumulou esse salário ao vencimento de coronel. Se passar a ser Secretário de Segurança Pública e permanecer por dois anos, acumulará. Se ficar mais algum tempo em outro cargo, acumulará também. Assim, ele atinge essa cifra estratosférica.

           O Sr. Epitacio Cafeteira (PPB-MA) - É por isso, então, que se vai tirar a estabilidade do funcionário?

           O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Esse projeto de Reforma Administrativa acaba com isso, e tem que acabar mesmo, porque uma situação como essa não pode continuar. Há pontos altamente positivos nele, que vamos votar aqui no Senado.

           Srª Presidente, lamentavelmente meu tempo se esgota, impedindo-me de fazer a análise que me propus quando assomei a esta tribuna, logo em seguida ao pronunciamento do Senador Epitacio Cafeteira. Vim a plenário preparado para fazer este discurso, não foi o pronunciamento do Senador Epitacio Cafeteira que me trouxe à tribuna. Pretendi apresentar a minha visão sobre essa Reforma Administrativa, que tem também um processo didático. Disse que a sociedade brasileira não está esclarecida, mas ela está se conscientizando das coisas. É preciso haver o debate com ela, e creio que, embora de maneira tímida, ele começa a acontecer. Há um processo didático na elaboração dessa matéria.

           Vamos ter ainda prazo para discussão. Quando a matéria entrar na Ordem do Dia, eu sei que a discussão estará encerrada, mas teremos tempo de voltar ao assunto durante o encaminhamento da votação.

           Portanto, não adianta chorarmos um morto que não ainda morreu. O ideal é irmos aperfeiçoando a legislação em pontos importantes para a administração pública, da maneira que for possível, porque chegou a hora de olharmos mais para os direitos dos cidadãos. Estamos muito voltados para as reformas institucionais; é necessário que tenhamos também olhos para os cidadãos, que esperam a melhoria da sua qualidade de vida.

           Srª Presidente, muito obrigado pela tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/02/1998 - Página 2604