Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O AUMENTO DA DIVIDA PUBLICA. ANALISE DA CHAMADA LEI VILSON KLEINUBING ORIUNDA DA CPI DOS PRECATORIOS. SUGESTÃO DE PROJETO DE RESOLUÇÃO QUE ESTABELEÇA PRECEITOS BASICOS PARA A APROVAÇÃO DE PEDIDOS DE EMPRESTIMOS E DE ROLAGEM DE DIVIDAS ESTADUAIS.

Autor
José Roberto Arruda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: José Roberto Arruda
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA.:
  • PREOCUPAÇÃO COM O AUMENTO DA DIVIDA PUBLICA. ANALISE DA CHAMADA LEI VILSON KLEINUBING ORIUNDA DA CPI DOS PRECATORIOS. SUGESTÃO DE PROJETO DE RESOLUÇÃO QUE ESTABELEÇA PRECEITOS BASICOS PARA A APROVAÇÃO DE PEDIDOS DE EMPRESTIMOS E DE ROLAGEM DE DIVIDAS ESTADUAIS.
Aparteantes
Lúcio Alcântara.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/1998 - Página 3164
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, PRIVATIZAÇÃO, REDUÇÃO, DIVIDA INTERNA.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, ESTUDO, PROJETO DE RESOLUÇÃO, ACORDO, GOVERNADOR, CONTINUAÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, AJUSTE FISCAL, REDUÇÃO, DIVIDA PUBLICA, JUSTIÇA, DIFERENÇA, TRATAMENTO, ESTADOS.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, primeiramente parabenizo a Mesa pela colocação de microfones novos, de excelente qualidade. Com eles não precisamos mais fazer um esforço vocal tão grande.

Sr. Presidente, no retorno ao trabalho parlamentar, depois de uma convocação extraordinária com resultados acima dos esperados pela crítica especializada, defrontamo-nos, nos jornais dos últimos dias, com uma análise que me parece bastante séria, fundada em números de bastante credibilidade, sobre o aumento da dívida pública brasileira. A avaliação feita nos últimos anos pelos jornais mais importantes e de maior credibilidade neste País demonstra um aumento considerável no déficit público nacional.

Ora, a economia brasileira, na visão da grande maioria dos que se detêm numa análise cuidadosa do quadro econômico, apresenta alguns índices que nos dão uma tranqüilidade crescente. Os índices de inflação continuam muito baixos. A inflação do mês de janeiro será praticamente nula, provavelmente devendo ser repetido esse desempenho em fevereiro. Crescem as reservas brasileiras em dólar, o que é um dado absolutamente importante para nos tornar menos frágeis em função de algumas turbulências que ainda podem ocorrer no Sudeste Asiático. Enfim, há números que nos dão tranqüilidade.

No entanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, este Senado Federal votou, no ano passado, a lei conhecida como Lei Vilson Kleinübing, oriunda de um projeto de lei nascido da CPI dos Precatórios. A lei propunha que os governos estaduais, ao alienarem ativos, teriam de fazê-lo com o objetivo único de diminuir a dívida pública. Essa lei está sendo questionada por alguns governadores na esfera judicial, e os números apresentados inclusive em editoriais dão conta de que o crescimento do déficit público dos Estados brasileiros é no mínimo preocupante. De um lado, temos um projeto de lei votado pelo Senado Federal com todos os sintomas de descumprimento, até pela via judicial. De outro, temos alguns governos de Estado com alienação de ativos já em fase de conclusão, cujos recursos não iriam para o abatimento da dívida pública, mas para custear obras, num ano tipicamente eleitoral.

Por esse motivo, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho a esta tribuna pedir aos Senadores, símbolo maior do federalismo -- pois representamos aqui os nossos Estados --, que façamos a seguinte reflexão: se não seria possível encontrarmos uma fórmula, em entendimento político com os Srs. Governadores de Estado, que propiciasse a continuidade do programa de privatização no Brasil, mas que levasse em consideração o desempenho de cada um dos Estados no ajuste fiscal.

Eu me explico: vamos imaginar dois Estados hipotéticos. Em um deles, o Governador, cuidadoso, passou os três primeiros anos do seu mandato fazendo um rigoroso ajuste de contas. No outro, por razões quaisquer, não foram feitos ajustes. Este aumentou despesas, não teve incremento de receitas e, portanto, teve um aumento grande do seu déficit estadual.

Com a Lei Vilson Kleinübing, estaríamos tratando os dois governadores de forma absolutamente igual, ou seja, estaríamos tratando comportamentos diferenciados na Administração Pública com o mesmo peso e a mesma medida.

Pergunto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, principalmente àqueles Senadores que integram a Comissão de Assuntos Econômicos e àqueles que se debruçaram sobre a matéria na CPI dos Precatórios e que, portanto, conhecem o mecanismo da formação do déficit público brasileiro: nós, do Senado, que mostrou à Nação que quer a solução desse problema, não poderíamos, agora, buscar uma fórmula, uma fórmula econômica, é claro, mas muito mais uma fórmula política, que levasse em consideração o desempenho da economia, das finanças públicas de cada um dos Estados na possibilidade de alienação de ativos e da aplicação desses recursos para abatimento da dívida e para investimentos?

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Com o maior prazer, Senador Lúcio Alcântara.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Esta questão tem sido objeto de muitos debates e discussões. Tenho uma opinião que, infelizmente, colide frontalmente com a de V. Exª. Penso que o Senado não pode interferir na economia interna dos Estados. Tanto é verdade que eu me bati contra a posição do Senador Vilson Kleinübing, embora compreenda a posição de S. Ex ª e a de V. Exª, a sua preocupação com o déficit etc., mas, aqui, não podemos determinar aos Estados a natureza do gasto. Pela Resolução que foi aprovada, o que se diz é que o Estado terá de gastar aquele dinheiro, obrigatoriamente, com o abatimento da dívida. V. Exª falou em Estados ajustados: o Estado do Presidente do Senado Federal, a Bahia, e o Estado do Ceará , Estados ajustados que querem aproveitar esses recursos - inclusive, a Bahia já fez isso e o Ceará vai fazer logo mais - para criar, com parte desse dinheiro originário das vendas dessas empresas, um fundo de previdência para garantir a situação dos servidores estaduais que estão se aposentando. Então, é muito difícil, do ponto de vista político e, sobretudo, do ponto de vista constitucional que o Senado possa prosseguir nessa linha. Penso que o Senado desejou ir longe demais quando quis determinar que os Estados teriam de gastar aquele dinheiro obrigatoriamente com aquela finalidade. Isso é função das Assembléias Estaduais, que poderiam ter vinculado a alienação a esse dispositivo. Inclusive, a União nem pode dar esse exemplo, porque, não obstante estar fazendo isso, não existe uma lei determinando que a alienação dos ativos da União terão de ir, necessariamente, para o abatimento da dívida. Se o Governo entender que deve fazer, sim; se não, dará outra destinação. Se eu fosse Governador do Estado e estivesse alienando algum ativo, teria uma preocupação de contabilizar, por exemplo, o resultado da venda de uma companhia de energia elétrica, que geralmente é a principal, e transferir o dinheiro do povo baiano ou cearense para fazê-lo render em outro lugar. Sabe por quê? Porque o resto está virando pó, com esses juros malucos, com a dívida subindo astronomicamente, e ninguém está falando na avaliação desse déficit. V. Exª poderá dizer -- e eu vou concordar -- que os juros precisariam subir para nos defendermos dos ataques especulativos a partir do problema da Ásia. Na verdade, isso é um pouco um mito de Sísifo, é empurrar uma pedra enorme ladeira acima e, quanto mais empurramos, mais ela volta sobre nós. É difícil, Senador José Roberto Arruda -- eu, pelo menos, não creio que seja possível --, que o Senado, sendo a Casa da Federação, chegue ao ponto de determinar aos Estados que recursos decorrentes do processo de privatização sejam obrigatoriamente aplicados com aquela finalidade. Mas esses dados do déficit nos assustam. Temos de encontrar caminhos para resolver isso. V. Exª está trazendo um problema de grande importância, porém, não esqueçamos, nessa análise, dos juros, porque eles estão realmente contribuindo para o aumento dessa dívida.

SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara. Quero registrar que o aparte de V. Exª me oferece dois argumentos importantes para a solução que desejo propor. Há duas concordâncias fundamentais do seu aparte no meu pronunciamento. Primeiro, também concordo que o Senado foi longe demais. Ainda que a proposição do Senador Vilson Kleinübing tenha nascido da análise mais séria que esta Casa já fez sobre as finanças públicas brasileiras, é muito difícil, numa Resolução, dizermos a todos os Estados brasileiros que só podem aplicar o dinheiro do ativo na.... O que acontecerá na prática? O que acontece na prática é que a Resolução Vilson Kleinübing vira letra morta; os Estados não a obedecerão. Este é o primeiro ponto.

Senador Lúcio Alcântara, o segundo ponto é o seguinte: em relação aos Estados - não tinha nomeado nenhum, mas vamos citar o Estado da Bahia, o Estado do Ceará e alguns outros Estados brasileiros que fizeram ajustes consistentes nas suas contas públicas, dando, portanto, o primeiro bom exemplo; agora, o segundo bom exemplo que estão dando é que, além de terem feito ajustes consistentes, querem aplicar o dinheiro dos ativos da melhor maneira possível, constituindo um fundo de previdência, que, ao mesmo tempo, garante os direitos previdenciários do servidor público e desonera o orçamento dos seus Estados, quer dizer, causa um duplo efeito positivo; a mesma coisa está acontecendo com o Estado de São Paulo, com o Estado de Minas Gerais e com alguns outros que apresentam este bom desempenho -, seria justo tratarmos igualmente Estados como o Ceará, a Bahia, São Paulo e Paraná e outros Estados brasileiros que não fizeram ajustes, aumentaram suas despesas e estão produzindo um déficit público que não atrapalha apenas esses Estados, mas incomoda todo o País, no momento em que nos faz uma avaliação macro extremamente negativa?

Então, essa é a sugestão.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Pois não.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Aproveito para incluir o Estado de São Paulo e outros nesse rol. A Folha de S. Paulo fez um amplo levantamento sobre o assunto. Com todo o esforço do Governador Mário Covas, que passou dois anos juntando dinheiro, lutando e equilibrando-se, a dívida cresceu 45% no seu Governo. É uma luta quase inglória.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Penso que, nesse caso, já há uma sinalização de diminuição da taxa de juros. Se ele não tivesse feito os ajustes, essa dívida seria duas ou três vezes maior.

Para que tenhamos um ano tranqüilo, para que possamos dar continuidade ao Programa de Desestatização e para que a alienação possa continuar sendo feita, tudo isso sinalizando para uma diminuição continuada do déficit público, o Senado tem de cuidar da questão. Sugiro que tenhamos um Projeto de Resolução. Não estou aqui querendo ser dono desse projeto. Estou querendo propor uma discussão com os Estados para que o façamos juntos, negociando com os Governadores e definindo, na prática, o livre investimento. Não temos como impedir. E o Senado Federal, em Resolução, estabeleceria que aprovaríamos a rolagem de dívida e os financiamentos internacionais para os Estados que seguissem os preceitos básicos dessa Resolução. Poderíamos criar uma fórmula pela qual a possibilidade de aplicação livre do resultado da alienação de ativos fosse proporcional ao ajuste fiscal feito nesse período de Governo. Assim, estaríamos tratando comportamentos desiguais de forma justa, portanto desigual. Essa é a proposição que deixo para análise dos Srs. Senadores.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE) - Lembro que os Estados -- muitos deles já assinaram seus contratos -- estão com a dívida rolada por 30 anos. A União criou um crédito de mais de R$100 bilhões para fazer essa rolagem, na qual cada Estado teve sua situação sob exame específico. Estabeleceram-se condições de tal forma que se atendessem àquelas peculiaridades. Então, sob esse aspecto, a dívida dos Estados está equacionada nesse horizonte de 30 anos. O que não podíamos esperar era essa sacudida do aumento das taxas de juros, que evidentemente criou uma realidade nova. Mas há, por exemplo, como a imprensa registra, casos como o do Rio Grande do Sul, que já tomou novo empréstimo que não podia -- autorizado por nós, inclusive. Destarte, é um assunto que V. Exª tem razão de trazer, uma vez que se trata de um Parlamentar estudioso e muito minucioso no exame dessas questões. Mas é um tema para o qual não encontramos ainda solução, até porque é difícil, em uma federação com as características do Brasil, impormos certas situações aos Estados. Por outro lado, o desequilíbrio das contas públicas ameaça o País de um modo geral, perturbando seu desenvolvimento, suas negociações externas e o dinamismo da sua economia. V. Exª faz uma sugestão que é importante ser debatida e discutida para ver se encontramos uma resposta razoável e equilibrada para essa dificuldade que estamos enfrentando.

O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF) - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara, pelo enriquecimento que V. Exª trouxe a este debate.

Deixo essa idéia para análise dos Srs. Senadores, em particular para os que compõem a Comissão de Assuntos Econômicos e aos que tiveram experiência aprofundada na comissão que analisou os precatórios. Tenho certeza que o Senado Federal não pode ficar de braços cruzados com o aumento violento da dívida pública de alguns Estados e principalmente com a sinalização que se tem hoje da alienação de alguns ativos sem o abatimento dessa dívida pública.

Penso que uma fórmula razoável seria exatamente uma resolução do Senado Federal negociada politicamente com os Estados brasileiros e suas respectivas bancadas nesta Casa, de tal maneia que a rolagem da dívida, a autorização de qualquer empréstimo internacional estivesse vinculada ao cumprimento das diretrizes básicas dessa resolução que teria como diretriz básica a idéia de que a alienação de ativos e o livre uso dos recursos oriundos dessas alienações guardassem proporcionalidade com os ajustes fiscais que os governos tivessem feito nos três primeiros anos de seus mandatos. Com aqueles Estados que não fizeram ajustes, que aumentaram violentamente suas dívidas públicas e que com isso estão atrapalhando o desempenho da economia nacional como um todo, obviamente, devemos ter muito mais cuidado no que se refere à questão da alienação de ativos.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/1998 - Página 3164