Discurso no Senado Federal

ALERTA PARA A QUESTÃO DOS FUNDOS DE PENSÃO NO BRASIL QUE SE RECUSAM A PAGAR IMPOSTOS FEDERAIS, ESTADUAIS E MUNICIPAIS.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • ALERTA PARA A QUESTÃO DOS FUNDOS DE PENSÃO NO BRASIL QUE SE RECUSAM A PAGAR IMPOSTOS FEDERAIS, ESTADUAIS E MUNICIPAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 29/04/1998 - Página 7184
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • PROTESTO, INCOERENCIA, FUNDOS, PENSÕES, RECUSA, PAGAMENTO, IMPOSTOS, ALEGAÇÕES, ISENÇÃO FISCAL, ENTIDADE, ASSISTENCIA SOCIAL, SIMULTANEIDADE, PARTICIPAÇÃO, ECONOMIA, PAIS, SIMILARIDADE, EMPRESA, INICIATIVA PRIVADA.

           O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, todos no Brasil pagam imposto, independentemente da capacidade econômica, pois qualquer produto, vendido legalmente, recebe uma taxação, seja ela municipal, federal ou estadual. Ao comprar um pão, mesmo o comprovadamente pobre, mesmo o indigente de rua está arcando com os impostos ali contidos. Ao adquirir uma casa, financiada por cooperativa habitacional, o trabalhador de baixa renda paga imposto de transmissão de bens intervivos. A partir de uma determinada faixa salarial, não muito alta, qualquer assalariado paga imposto de renda. Os empresários do comércio, da indústria e dos serviços pagam impostos. Mesmo com as discrepâncias, alguém poderia dizer que isso é muito justo, já que a norma atinge, igualmente, a todos. Pois aí é que está o erro: alguns grupos se acham “menos iguais” que outros na hora de pagar impostos. São os fundos de previdência privada, instituições que movimentam alguns bilhões de reais ao ano. Com certeza, não é por falta de patrimônio ou de renda. Vejamos em que se escudam esses sonegadores de impostos.

           A Constituição de 1967, que deu lugar à Constituição de 1988, assegurava imunidade às entidades de assistência social. Na concepção em vigor, à época, não havia distinção entre entidades de previdência privada e entidades de assistência social. Assim, entravam na mesma categoria, para efeitos de imunidade, tanto asilos, creches, casas de misericórdia, quanto os poderosos fundos de pensão. Vê-se que a Lei Maior igualava nos benefícios tanto as humildes casas assistenciais quanto os fundos de previdência privada. As primeiras, mantidas a partir de doações da comunidade; os segundos, patrocinados por grandes empresas, privadas ou estatais. Uns voltados para o socorro imediato a pessoas que não têm abrigo ou que passam fome; outros destinados a complementar renda de aposentadoria dos já alcançados pela previdência comum. Como se vê, pouco havia de comum entre as legítimas entidades de assistência social e os fundos de pensão.

           Assim era a lei, assim se respeitava a imunidade.

           Mas veio a Constituição de 1988, fruto de amplo debate da sociedade, que procurou espelhar na lei a nova realidade do País.

           Se, em 1967, ainda não estava bem definido o sistema de seguridade público, que separasse a assistência social da previdência social, em 1988, esse sistema ficou claramente definido.

           Se, pela Carta de 1967, não havia distinção entre assistência social e previdência social, na Carta de 1988, tal distinção é cristalina. Se não, vejamos, o que dispõem os artigos específicos. No Título VIII, Da Ordem Social, no Capítulo II, Da Seguridade Social, art. 194, a Lei Magna afirma, textualmente, que “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.” Como se vê, assistência e previdência são conceitos distintos.

           Já o art. 201 do mesmo texto constitucional dispõe sobre os planos de previdência social, que deverão cobrir os eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidentes do trabalho, velhice e reclusão; inclui a previdência, ainda, ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda; se estende à proteção à maternidade, especialmente à gestante; alcança a proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário, e assim por diante. Abre a participação nos benefícios da previdência social a qualquer pessoa, mediante contribuição aos planos previdenciários. Dispõe, ainda, sobre o financiamento, formas de reajuste, normas para a obtenção da aposentadoria etc.

           No art. 203, a Constituição de 88 trata, especificamente, da assistência social a ser prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social. A assistência social tem objetivos bem delineados, que são: proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; amparo às crianças e adolescentes carentes; promoção da integração ao mercado de trabalho; habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Ou seja, assistência social é uma categoria destinada aos que não foram alcançados pelas vias normais de provimento de renda, ou seja, pelo trabalho assalariado - formal ou informal - e aos que, sem condições de trabalho, precisam do auxílio, do socorro humanitário do Estado para viverem com dignidade.

           Pois bem, Sr. Presidente, quais são os fundos de pensão no Brasil e a quem amparam? Um deles é a Previ, dos funcionários do Banco do Brasil; outra é a Centrus, dos empregados do Banco Central; há também a Funcef, do pessoal da Caixa Econômica Federal; assim como esses, de instituições estatais, há outros tantos que amparam trabalhadores de empresas privadas, como o dos funcionários das companhias de aviação, dos trabalhadores de montadoras e tantos outros...

           Como se vê, os fundos de pensão privados alcançam públicos definidos: empregados de determinada empresa, que são, portanto, pessoas que têm acesso a um meio regular de provimento de renda, que são os salários; do ponto de vista previdenciário, estão amparados pelo sistema geral que alcança todos os trabalhadores; portanto, não estão na condição de indigência ao deixarem de trabalhar, pois poder-se-ão aposentar regularmente. Ou seja, nenhum dos beneficiários dos fundos de pensão se enquadra naqueles requisitos constitucionais a que se destina a assistência social, quais sejam, desamparo, deficiência e assim por diante.

           Os fundos de pensão, Sr. Presidente, são, numa sociedade como a nossa, uma espécie de privilégio, já que os outros trabalhadores não são alcançados por nenhum sistema de previdência complementar patrocinado pelo empregador.

           Esses fundos de pensão têm demonstrado um vigor financeiro tremendo, como se pode observar pela participação ativa deles nos consórcios de privatização. Nos últimos 6 anos, estiveram presentes em todos os leilões de privatização; de 1991 até setembro deste ano, investiram 2,6 bilhões de reais em ações das estatais privatizadas. Em seu conjunto, são detentores de um patrimônio de mais de 80 bilhões de reais, estando os dois maiores - Previ e Funcef - montados em mais de 25 bilhões de reais.

           Pois bem, esses poderosos fundos de pensão se recusam a pagar impostos federais, estaduais e municipais. Vejam bem: os fundos se recusam a pagar impostos. Alegam em sua defesa a imunidade fiscal que é concedida a entidades de assistência social; quer dizer: na hora de participar da economia, agem como qualquer grupo econômico poderoso, investindo bilhões de reais no mercado; mas, na hora de pagar impostos, querem se igualar às modestas creches, asilos, orfanatos e casas de misericórdia que, às duras penas e com trabalho voluntário, prestam socorro a pessoas economicamente incapazes de se sustentarem.

           A Receita Federal não aceita e nem poderia aceitar essa situação. Por essa razão, tem acionado judicialmente esses fundos de pensão para que paguem. Dois desses fundos, mesmo tendo perdido a causa em decisões tomadas por turmas do Supremo Tribunal Federal, recusam-se a pagar e estão recorrendo. Provavelmente, no próximo mês, haverá julgamento pelo Plenário do Supremo, o que encerrará a questão para um caso específico. Mas, infelizmente, por não terem efeito vinculante as decisões do Supremo, a Receita terá que acionar um a um os fundos de pensão, o que é um despropósito, pelo tempo que pode demorar cada ação.

           Quero deixar aqui registrado o meu protesto contra essa situação, lembrando que a Comissão de Fiscalização e Controle já conta com uma subcomissão justamente para fiscalizar esse tipo de entidade, para evitar os abusos por ela cometidos e coibir o uso de dinheiro público, originado das estatais que patrocinam fundos de previdência.

           Espero que a gravidade de tal situação não escape aos olhos do Poder Público e que sejam tomadas as medidas necessárias para se restabelecer um mínimo de eqüidade quanto ao pagamento de impostos.

           Era o que eu tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/04/1998 - Página 7184