Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS AO RELATORIO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE DETECTOU A REDUÇÃO DE RECURSOS DESTINADOS AO SETOR DE PREVENÇÃO DE DOENÇAS, DO MINISTERIO DA SAUDE, CONTRARIANDO OS ARGUMENTOS UTILIZADOS QUANDO DA APROVAÇÃO DA CPMF.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • COMENTARIOS AO RELATORIO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE DETECTOU A REDUÇÃO DE RECURSOS DESTINADOS AO SETOR DE PREVENÇÃO DE DOENÇAS, DO MINISTERIO DA SAUDE, CONTRARIANDO OS ARGUMENTOS UTILIZADOS QUANDO DA APROVAÇÃO DA CPMF.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/1998 - Página 10715
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, RELATORIO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), DEMONSTRAÇÃO, REDUÇÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, GOVERNO, SETOR, MEDICINA PREVENTIVA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), COMPROVAÇÃO, FALTA, UTILIZAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), AREA, SAUDE, BRASIL.
  • CRITICA, POLITICA, SAUDE, GOVERNO, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, MEDICINA PREVENTIVA, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, PRONUNCIAMENTO, ORADOR, NECESSIDADE, ACOMPANHAMENTO, APLICAÇÃO, RECURSOS, AREA, SAUDE, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, GOVERNO, UTILIZAÇÃO, VERBA, ALTERNATIVA, SETOR, SOCIEDADE.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero, antes de começar o meu pronunciamento, agradecer ao Senador Gilvam Borges, que me permitiu esta permuta.

Quero chamar a atenção hoje para um comentário que reputo importante pelo fato de ter sido publicado pelos jornais e não ter sido alvo de comentário nesta Casa. Refiro-me ao empenho do Governo para a criação da CPMF, sob a alegação de que necessitava de mais recursos para investir na área da saúde. No entanto, isso não se verificou na prática. O que testemunhamos foi justamente o contrário, e isso não sou apenas eu quem afirma. Tive a oportunidade de ler dados do relatório do Tribunal de Contas da União que revelam que o Governo cortou R$38 milhões que deveriam ser aplicados na prevenção de doenças.

Ora, isso é muito sério. Talvez, por estar mal informado, o Governo acredite que seja melhor a medicina curativa do que a preventiva. Essa explicação - a mais razoável para justificar tamanha discrepância - traz-me à lembrança o momento do retorno da CPMF. Dizia-se, para justificar esse retorno, que seriam ampliados os atendimentos ambulatoriais, seria aumentado o número de leitos, seria melhorada a qualidade da prestação de serviços e até o salário dos servidores nessa área seria melhorado. Concordo plenamente com a necessidade de tais alterações, mas é preciso que mais atenção se dê a algumas doenças seculares que ainda atormentam o País. Se tivermos aqui uma política de prevenção na área de saúde, não precisaremos gastar tanto com a ampliação, seja de atendimento ambulatorial, seja do número de leitos ou da rede hospitalar.

Quero aqui me referir a uma dessas doenças, a osteoporose, que é conhecida desde a Antigüidade. Fraturas ósseas por perda de massa óssea são relatadas principalmente entre idosos, que fraturavam seus ossos ao se esforçarem minimamente. Sempre tivemos idosos, mas por que não há uma preocupação nesta área?

Existem registros das civilizações inca e asteca sobre velhos que, ao se sentarem de maneira abrupta em assentos de pedra, fraturavam a bacia. Eu trouxe esse exemplo para mostrar que essa doença é milenar. A osteoporose é uma realidade e precisa ser tratada. No entanto, ela não está sendo colocada como uma das prioridades por este Governo, assim como não temos visto ser dada prioridade para a terceira idade.

Sabemos que a expectativa de vida está aumentando e existe uma estimativa para o Brasil, com relação ao ano 2000, de uma população de idosos em torno de 21 milhões de pessoas, o que provavelmente acentuará a necessidade da prevenção da osteoporose. Desses, cerca de 4 milhões terão osteoporose, caso não sejam desencadeadas medidas de prevenção que minimizem esses números.

Até o próprio relatório do TCU sobre as contas do Presidente, aprovado com ressalvas no dia 16 de junho, faz um alerta quanto à necessidade de “redobrar os esforços” para melhorar as ações preventivas na área de saúde. Durante o julgamento das contas, o Ministro Iram Saraiva fez a seguinte afirmação: “Há uma inversão da lógica do sistema, que privilegia a cura da doença em detrimento da prevenção e da promoção da saúde da população”. Não fui eu quem disse isso. Foi o Ministro Iram Saraiva quem fez essa afirmação durante o julgamento das contas do Presidente da República.

O relatório apresenta algumas conclusões: o programa de combate à tuberculose recebeu apenas 19% dos recursos previstos; o combate à hanseníase não recebeu sequer um centavo da Fundação Nacional de Saúde; dos créditos destinados a combater o mal de Chagas, apenas 44% foram gastos. Esses cortes somaram 38,78% do total que deveria ter sido aplicado em ações de prevenção de doenças.

Para se ter uma idéia de quão grande é o descaso com a saúde preventiva no Brasil, chamo a atenção para o fato de que a Organização Mundial de Saúde - OMS se viu obrigada a advertir o Governo brasileiro sobre o problema. No ano de 1997, em que não foram utilizados todos os recursos conveniados para o combate à hanseníase (popularmente conhecida como lepra), o Brasil estava em segundo lugar em números de casos da doença no mundo, só perdendo para a Índia. Havia aproximadamente 100 mil pessoas infectadas em todo o País, que, em sua maioria, não tinham conhecimento da contaminação pelo bacilo de Hansen.

Ora, estamos apresentando uma situação que é óbvia, é evidente, mas não estamos conseguindo sensibilizar as autoridades para o problema. Algumas pessoas que têm acompanhado os nossos debates nesta Casa até me disseram que tenho feito alguns discursos repetitivos na área da saúde, da segurança e da discriminação. Eu respondi que isso acontece porque não conseguimos ainda sensibilizar um número maior de representantes do povo - na Câmara, no Senado e entre os nossos Ministros -, para que fizessem eco a esse grande apelo, a fim de conseguirmos mais recursos para tratamentos preventivos, principalmente na área da saúde.

Há uma insensibilidade muito grande no meio político em relação a esses temas, poucos são aqueles que os levantam - talvez por não serem considerados preferenciais ou prioritários, talvez porque não haja mesmo essa prioridade; talvez porque não haja mesmo esses recursos. Se assim fosse, não teria importância estar daqui falando sobre algo que não encontra respaldo por parte das autoridades competentes.

No entanto, quero continuar repetindo esses pronunciamentos, porque não se trata apenas de denúncias vazias, temos dados concretos: foram retirados R$38 milhões dos recursos destinados a tratamentos preventivos de saúde. Não adianta apenas ficarmos aqui querendo tomar outras medidas, deixando que sucateiem a saúde, com o Governo injetando recursos, modernizando o sistema e, depois, privatizando a preço de banana. É isso que estamos observando, além da falta de sentimento humano em relação a situações tão graves.

Há, também, outro dado sobre a saúde que vem causando preocupação. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a AIDS está mudando o alvo. Anteriormente, os viciados em drogas e os homossexuais eram os mais atingidos; agora, o perfil é outro e temos que estar atentos a isso, já que as populações pobres rurais e urbanas, os heterossexuais e as mulheres é que se tornaram os principais alvos.

O rápido avanço da doença entre a população mais desfavorecida é justificada pela falta de informação, além da escassez de recursos para se protegerem - e, aqui, lembramos o insignificante número de preservativos consumidos por essa classe menos favorecida. Também temos tabus que precisam ser quebrados. Não podemos ficar presos ao sentimento religioso ou à falta de postura moral ou ética; a realidade é que as pessoas estão morrendo dessa doença, que precisa ser tratada de maneira diferente de como a estamos tratando, deixando que este assunto venha à baila.

O aumento do número de casos nas áreas rurais deve-se principalmente aos movimentos migratórios. Então, é preciso inserir esta questão da prevenção, principalmente em se tratando da questão da AIDS, no debate dos movimentos migratórios.

Por último, a falta de atenção em relação a essa doença pode significar uma despesa para o Brasil da ordem de US$700 milhões por ano, que seriam gastos com o tratamento dos doentes, quando se poderia economizar fazendo-se a prevenção.

Portanto, se o Governo continuar demonstrando descaso com a prevenção de doenças, em breve estaremos diante de várias endemias que necessitarão de muito mais recursos para o seu tratamento. Também é possível que o Presidente Fernando Henrique Cardoso lance mão de um novo tributo com a mesma justificativa da CPMF, já que não discutimos uma reforma financeira, tributária e administrativa que tenha como ponto principal o atendimento à população.

Portanto, deixo aqui mais uma vez o meu apelo, esperando que os meus Pares, no Senado Federal, façam coro não apenas ao meu pronunciamento, mas à necessidade de acompanharmos os recursos na área de saúde, que são reduzidos para que outras políticas que não dizem respeito à vida e à prevenção sejam priorizadas.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/1998 - Página 10715