Discurso no Senado Federal

FALTA DE RECURSOS PARA A IMPLANTAÇÃO DE PROGRAMAS DE ASSENTAMENTO DA REFORMA AGRARIA NO ESTADO DO MATO GROSSO.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • FALTA DE RECURSOS PARA A IMPLANTAÇÃO DE PROGRAMAS DE ASSENTAMENTO DA REFORMA AGRARIA NO ESTADO DO MATO GROSSO.
Aparteantes
Jonas Pinheiro, Odacir Soares.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1998 - Página 17609
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, INSUFICIENCIA, RECURSOS, DESTINAÇÃO, GOVERNO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, ASSENTAMENTO RURAL, RESULTADO, REFORMA AGRARIA, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou usar a palavra brevemente, para, mais uma vez, falar de uma questão grave, que atravessa Mato Grosso, o nosso Estado, e diversos Estados brasileiros, onde vêm sendo implantados programas de reforma agrária.  

O Governo, de fato, vem procurando cumprir a sua meta de assentamento das famílias. No entanto, têm faltado recursos para obras de infra-estrutura como também para o custeio. Agora, neste final de ano - já estamos em dezembro -, a maioria dos assentados do Brasil todo clama pelos recursos para o custeio; a maior parte não recebeu e nem sabe se receberá.  

Acho que talvez o Governo tenha que rever essa questão das metas, diminuir sua meta com relação à reforma agrária, para que sejam evitadas as dificuldades que ocorrem hoje em Mato Grosso e, praticamente, em todo o Brasil onde há assentamento de reforma agrária.  

Hoje, pela manhã, recebi vários líderes de assentados, de sindicatos e da Federação dos Trabalhadores da Agricultura de Mato Grosso. Todos os apelos foram no mesmo sentido: é necessário viabilizar urgentemente recursos para que os assentados possam trabalhar, plantar e tocar suas lavouras.  

Nesta breve passagem pela tribuna, Sr. Presidente, gostaria de comunicar que já tratei deste assunto com o Ministro da Reforma Agrária, homem idealista, sério, que vem fazendo um grande trabalho frente ao Ministério da Reforma Agrária. Já falei também com o Presidente do Incra a respeito desse assunto.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - V. Exª me permite um aparte, Senador Carlos Bezerra?  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Pois não, nobre Senador.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - V. Exª está levantando essa questão, que é muito importante. Inclusive, recentemente o Governo Federal baixou uma medida provisória tratando dos recursos, dos acessórios, dos juros aplicados pelo Banco da Amazônia, pelos bancos oficiais, em relação aos fundos constitucionais; e, também em relação à securitização da dívida dos produtores rurais em geral. Essa medida provisória terminou beneficiando os grandes produtores rurais e prejudicando os pequenos produtores rurais. Quer dizer, na realidade, a Medida Provisória foi baixada com o objetivo de beneficiar os pequenos, que estão hoje inadimplentes em decorrência de o preço do produto ser inferior ao preço do dinheiro, e, na realidade, terminou beneficiando os maiores e prejudicando os menores. Inclusive, estou fazendo um apelo ao Presidente da República para que, agora, na reedição da Medida Provisória, possa corrigir essa distorção. Hoje a inadimplência tem levado a que os recursos dos fundos não sejam tomados pelos produtores rurais. Então, se chegar no Banco da Amazônia, hoje, há dinheiro do Fundo Constitucional do Norte à disposição dos agricultores, e não há agricultor para tomar esse dinheiro, porque estão inadimplentes. Então, é uma distorção que precisa ser corrigida urgentemente. Outro aspecto é esse que V. Exª levantou: a questão do financiamento dos assentados. Quer dizer, hoje o Governo cobra juros muito mais baixos para aqueles que invadem terras e que são depois assentados, do que para os produtores rurais. É outra distorção também que precisa ser corrigida.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Exatamente, nobre Senador. Inclusive, com relação aos Fundos Constitucionais, acho que eles deveriam ser usados basicamente para os pequenos. Basicamente para o pequeno produtor rural, para a microempresa, para a média empresa - de média empresa para microempresa -, e em condições razoáveis. Porque, nas condições em que se emprestava até há pouco tempo, não havia condição alguma de reversibilidade. Quem tomasse esse dinheiro estava fadado ao fracasso, a se tornar devedor insolvente. Porque a modalidade, os juros cobrados, a correção cobrada, inviabilizava qualquer projeto. Lá no Mato Grosso costumam dizer que, até uma indústria de maconha não se pagaria com um empréstimo dessa natureza, que dizem ser um negócio altamente lucrativo. E é essa política que se aplica ao médio e ao pequeno produtor rural. Sabemos que sobretudo o pequeno é responsável pela produção da maioria dos alimentos que o brasileiro consome. Setenta por cento da alimentação que o povo brasileiro consome, hoje, vem do pequeno produtor, da pequena propriedade. Então, é fundamental fortificar esse setor, ampliando o número de pequenas propriedades e tendo uma política agrícola compatível com esse setor, dando um financiamento compatível para que ele possa pagar e tenha condições de, amanhã, poder honrar o seu compromisso. O que estamos assistindo é a uma verdadeira angústia, porque são homens que nunca foram ao banco, nunca tomaram dinheiro emprestado, não sabem das condições e, o que é grave, não têm orientação técnica e, agora, estou ouvindo falar que querem transformar o Incra numa agência e passar todas as atividades para os Estados e Municípios. Os Estados não estão ligando para a reforma agrária, não dão orientação alguma para os pequenos, para os assentados. Eles recebem o financiamento e fazem daquele dinheiro o que bem entenderem, porque não há uma orientação técnica para isso. A Embrapa que está aí, que tem tecnologia, poderia estar subsidiando e ajudando nesses projetos, mas ela está paralisada.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - Permite-me V. Exª outro aparte?  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Pois não.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - O Governo Federal, também, está querendo ser mais esperto do que todo mundo. Quando o Governo fala em transformar o Incra numa agência e transferir as atividades da reforma agrária para os Estados e Municípios, ele não está vislumbrando a transferência de dinheiro: ele quer transferir apenas a incumbência, a responsabilidade de fazer a reforma agrária, mas o dinheiro ele não quer mandar. Esse é outro fato que deve ser observado. Não se trata apenas de transformar o Incra em uma agência, nem de transferir a sua competência para Estados e Municípios. Trata-se fundamentalmente da transferência de recursos, porque não se faz reforma agrária sem recursos. É preciso comprar terra, fazer assentamentos, realizar topografia, fazer todo esse trabalho decorrente dos projetos de colonização.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Nobre Senador, em um Estado, isso pode funcionar bem, mas, na maioria dos Estados, isso não vai funcionar, porque alguns Governadores e Prefeitos não têm compromisso com a reforma agrária, com a área social. No meu Estado, por exemplo, pela segunda vez, tenta-se...  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - Penso que isso não vai funcionar bem em lugar algum.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Exatamente. Também há a questão do recurso. No meu Estado, pela segunda vez, tenta-se extinguir a Empaer, a Empresa de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural. Ora, como pode haver um governo que tenta extinguir uma empresa de extensão rural?  

O Brasil errou ao extinguir a Embrater, foi um erro grave. Um Governo de Estado que extingue uma empresa de extensão rural não tem responsabilidade, porque esse é um setor fundamental para que haja o incremento da agricultura e, principalmente, para que seja dado apoio aos médios e pequenos produtores.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - Senador Carlos Bezerra, diga-se de passagem que, lamentavelmente - talvez, eu possa falar pela nossa região, pelo Centro-Oeste -, pouquíssimas empresas de extensão rural não estão falidas na nossa região hoje. Os salários estão atrasados, e há obrigações sociais e fundos de garantia não recolhidos. A extensão aparece sem nenhuma importância dentro do contexto agrícola dos nossos Estados e da nossa região. V. Exª aborda, com muita propriedade, a questão da extensão rural, que está vinculada à assistência técnica.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Exatamente. Sem isso, nada funciona.  

O Sr. Jonas Pinheiro (PFL-MT) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Jonas Pinheiro (PFL-MT) - Senador Carlos Bezerra, gostaria de alertar a Casa para o fato de que a medida provisória que trata dos fundos constitucionais representou um avanço, porque, há um ano e dois meses, estamos lutando para que haja a reorganização desses fundos. Essa medida provisória está aí para ser analisada. Portanto, peço a atenção da Casa e de todo o Congresso Nacional para essa matéria, para que as Bancadas interessadas nessa medida provisória - tanto as do Norte, como as do Nordeste e do Centro-Oeste - trabalhem para melhorar essa medida provisória, a partir daquilo que queremos para os fundos constitucionais. Portanto, essa medida provisória vai ser reeditada, e, na sua reedição, vamos ter que implantar a Comissão Mista que vai tratar dessa matéria, para que se discuta, em profundidade, o problema sério dos fundos constitucionais. A princípio, fui indicado pelo meu Partido, o PFL, para presidir essa Comissão Mista. Portanto, faço esse apelo na qualidade de Presidente da referida Comissão, a fim de que possamos nos entender a respeito dos fundos constitucionais. Já estive no Banco do Brasil, que é o agente financeiro do Fundo Constitucional do Centro-Oeste. Na última segunda-feira desta semana, estive no Basa, em Belém, tratando deste assunto. Estamos convocando também o BNB, bem como todos os Estados interessados nesses fundos constitucionais, para estudarmos o assunto e elaborarmos uma boa lei que venha atender àquilo que nós, Constituintes de 88, pensamos para os fundos constitucionais. Por outro lado, registro aqui, com muita tristeza, a situação do trabalho da extensão rural no Brasil. Sou egresso do Sistema de Extensão Rural do Brasil. Sou funcionário do sistema desde 1961, e é com muita tristeza que participamos dessa discussão quando os nossos fundos constitucionais estão minguados e precisando do apoio desta Casa. Muito obrigado.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Agradeço o aparte do Senador Jonas Pinheiro, que é um estudioso dessa matéria.  

O Sr. Odacir Soares

(PTB-RO) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Ouço novamente o Senador Odacir Soares.  

O Sr. Odacir Soares (PTB-RO) - Quero apenas reportar-me às palavras do Senador Jonas Pinheiro e às de V. Exª, que vem abordando essa questão. Fico tranqüilo em saber que a Presidência dessa Comissão Mista já coube ao PFL, particularmente ao Senador Jonas Pinheiro, que é um estudioso da matéria. Quero apenas dar uma contribuição. Conversar com o Banco da Amazônia, com o Banco do Brasil e com o Banco do Nordeste não resolve nada, porque esses bancos, na realidade, assumem o risco de aplicar esses recursos do Orçamento Fiscal da União. Gostaria de dar uma sugestão, a partir da sugestão dada pelo Senador Carlos Bezerra: que os recursos desses fundos tomados pelas micros, pequenas e médias empresas agroindustriais não fossem remunerados, porque se trata de recursos oriundos do Orçamento Fiscal da União. Concebemos esses fundos na Constituição de 1988 exatamente para promover o desenvolvimento da pequena indústria, do pequeno agricultor e da pequena propriedade rural, e não para transformar os fundos em fonte de renda. Na realidade, o Banco da Amazônia vem sendo sacrificado por ser o agente financeiro desses fundos no Centro-Oeste. O Banco do Nordeste também é sacrificado, na medida em que, havendo inadimplência, ela é debitada do resultado líquido do banco naquele exercício. O Banco da Amazônia, em 1997 ou em 1996, teve, pela primeira vez em sua história recente, um lucro líquido de aproximadamente R$45 milhões. A inadimplência da Região Centro-Oeste foi de R$70 milhões. Na realidade, o Banco apresentou um prejuízo de R$30 milhões como decorrência da inadimplência, que, por sua vez, decorre dos altos juros cobrados do setor. Essa é uma observação que eu gostaria de trazer à discussão desse problema, em relação à Comissão Mista que já está constituída.  

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT) - Não é o banco que define a aplicação do recurso, mas sim o Governo Federal, a Secretaria de Desenvolvimento Regional, juntamente com o Ministério da Fazenda. O assunto deve ser resolvido aqui. O banco é um mero aplicador, um cumpridor das regras aqui estabelecidas.  

Por último, Sr. Presidente, quero dizer que o Brasil é um país complicado. Avançamos, passaram-se décadas, mas não mudamos a prática política. Nesta semana, fui surpreendido com uma notícia na televisão sobre a invasão da agência do Incra em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Foi um protesto contra a transformação do Incra em agência. Que absurdo! Eu não sabia disso. Eu não sabia que estavam agilizando essa iniciativa administrativa no Incra e que o Movimento dos Trabalhadores era contrário; eles invadiram a sede do Incra no Rio Grande do Sul. Tomei conhecimento do fato por intermédio da televisão, que divulgou a invasão ocorrida.  

Assim, falta a prática democrática por parte do Governo, no sentido de chamar todos os setores interessados na reforma agrária e de discutir o assunto antes de se tomar qualquer medida. Os burocratas de sempre decidem sozinhos numa sala de ar-condicionado, sem ouvir ninguém, sem ouvir as federações, os sindicatos, os setores interessados nessa matéria.  

Quero, portanto, lamentar que a prática continua sendo a mesma: autoritária e centralizadora. Não são ouvidos os segmentos interessados no assunto.  

Era o que eu gostaria de abordar, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1998 - Página 17609