Discurso no Senado Federal

DISCORDANCIA COM O PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO SOBRE A EXTINÇÃO DA APOSENTADORIA ANTECIPADA PARA AS MULHERES.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • DISCORDANCIA COM O PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO SOBRE A EXTINÇÃO DA APOSENTADORIA ANTECIPADA PARA AS MULHERES.
Aparteantes
Emília Fernandes.
Publicação
Publicação no DSF de 15/12/1998 - Página 18664
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, MULHER, OPOSIÇÃO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXTINÇÃO, DIFERENÇA, TEMPO DE SERVIÇO, APOSENTADORIA.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senadora Benedita da Silva, não tive tempo de aparteá-la, mas leve minha saudade com V. Exª.  

Só para contrariar meu amigo, Senador Artur da Távola, direi que serei breve, mas realmente o serei. Entretanto, não poderia deixar de subir a esta tribuna para uma última manifestação na Sessão Legislativa que termina amanhã, para fazer um brevíssimo pronunciamento em homenagem às mulheres e como resposta ao Presidente da República, que há dias defendeu a extinção da aposentadoria mais cedo para as mulheres, com o argumento de que todos devem ser iguais em direitos e deveres, até porque as mulheres têm longevidade maior.  

Não posso concordar com o Presidente da República, por várias razões. Uma delas, a obediência ao princípio de justiça, segundo o qual não se deve tratar igualmente os desiguais. E as mulheres não são exatamente iguais aos homens, por força da tríplice carga que as onera: a biológica, na forma de menstruação, maternidade e menopausa; a sócio-cultural que lhes impõe a maior parte dos serviços domésticos, somados hoje à atividade fora do lar; e a emocional, que nelas é maior, porque são mais sensíveis, embora nós homens nem sequer percebamos, cegos pelo nosso machismo.  

Mas tenho outra razão, mais relevante, para conceder esse benefício às mulheres. E me socorro de Rubem Braga para dizer que sinto por elas uma comoção gratuita, uma espécie de gratidão, porque sua presença é um favor da vida.  

Muitas vezes já tentei imaginar o inimaginável: o nosso mundo sem mulheres. Penso como seria se Deus - que, aliás, não tem sexo - tivesse feito a humanidade exclusivamente masculina, a se perpetuar por meio de reprodução assexuada. Como nossa vida seria insípida, fria, cinzenta e vazia!  

A começar da fase pré-natal, durante a qual seríamos privados do "nirvana uterino", onde nos abrigamos por nove meses, a salvo das agressões externas. E prosseguiria ao nascermos, tendo que enfrentar um ambiente hostil sem o conforto do peito materno.  

Mais duro seria ao longo da infância, no penoso esforço de adaptação ao mundo, impensável sem a tutela carinhosa da mãe, cúmplice das nossas faltas, a nos proteger de tudo, até mesmo do rigor da autoridade paterna.  

E como seria no decorrer da juventude, e depois, a vida sem romance, sem as namoradas que conquistamos, sem as que tentamos conquistar, sem conseguir, e sem as muitas outras que povoaram nossos sonhos, olhadas a distância, como deusas inatingíveis, mas cobiçadas com remota esperança? Sem isso, morreríamos de tédio precocemente.  

Para não falar na indispensabilidade das esposas, ao mesmo tempo amantes e segundas mães, a nos acalentar e a nos aturar, no prosaico cotidiano, nem sempre com reconhecimento, por toda a fase adulta e na senectude, até o final.  

Mesmo, porém, os que não sintam falta de amor com elas, sentiriam com certeza a falta de ternura feminina em outras momentos da vida. Penso em como seria difícil enfrentar os primeiros anos sem a companhia de babás, de vovós ou de titias, ou de professoras, a suprir falhas ou ausências maternas. E na sensaboria dos vôos, sem as aeromoças, ou das internações hospitalares, sem as enfermeiras. Enfim, não exagero se proclamá-las indispensáveis em quase tudo.  

Por força de um condicionamento cultural, sou um cavalheiro à moda antiga. As feministas não me entendam mal. Fico muito feliz que as mulheres se tenham liberado e conquistado o seu espaço. Foi um grande avanço e nada mais justo. Mas continuo sendo a favor da discriminação positiva de outrora, quando "em mulher não se batia nem com uma flor", quando lhes cedíamos nossos lugares e evitávamos dizer palavrões na sua frente. Hoje uma caretice, mas que, para mim, continua sendo prova de consideração e respeito.  

Eis por que entendo que nunca será demasiado o bom tratamento que lhes dispensarmos. Pela graça que Deus nos concedeu de tê-las conosco, do útero ao túmulo, dando leveza e encanto à nossa vida, que com elas se torna suportável, nos piores momentos, e absolutamente deleitosa, nos melhores.  

Por tudo isso não posso concordar com o Presidente da República, quando Sua Excelência lhes nega o pequeno privilégio da aposentadoria precoce. Eu concedo isso a elas e concederia muito mais, se pudesse. Por gratidão. Por amor. Às jovens e às idosas, às belas e às menos dotadas. A todas, indistintamente.  

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Concede-me V. Exª um breve aparte?  

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Seu aparte há de ser o fecho do meu discurso, Senadora Emilia Fernandes.  

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Senador Jefferson Péres, o pronunciamento de V. Exª se reveste de um encantamento, de uma poesia e, principalmente, de uma realidade concreta e de um reconhecimento do verdadeiro papel da mulher, da mãe, da amiga, da companheira, da professora, da aluna, enfim, daquela que realmente ocupa um espaço dito igual, embora saibamos que as diferenças são profundas. Associo-me também à preocupação de V. Exª no que se refere às considerações recentemente feitas pelo Presidente da República sobre a aposentadoria da mulher. Não sei se todas as pessoas tiveram oportunidade de tomar conhecimento da manifestação feita publicamente por Sua Excelência, que, na minha avaliação - e já tive oportunidade de dizer isto neste plenário -, reveste-se daquilo que realmente pensa o Presidente. No momento em que Sua Excelência fala sobre a Previdência, pinça a questão da aposentadoria da mulher cinco anos antes como se fosse um privilégio. Realmente, acredito até que Sua Excelência não gostaria de ter dito isso, que não gostaria de ter deixado público e claro o que pensa, mas que na realidade disse e pensa. Queremos nos associar à manifestação de V. Exª, que, se por um lado tem toda essa conotação da realidade, do sentimento, daquilo que aproxima os seres humanos da figura da mulher, da mãe, por outro, vem alertar que, sem dúvida, foi manifestado pelo Presidente o que Sua Excelência pensa em fazer, no seu próximo mandato, entre tantas outras medidas que prejudicam as pessoas - as que já fez e as que deverá fazer. Particularmente em relação a esta, temos de pensar que este País tem uma dívida social para com as mulheres, que possuem uma dupla e até uma tripla jornada de trabalho, que são as maiores responsáveis pela educação, pelos cuidados das crianças, idosos e pessoas doentes da família. Além disso, estão no mercado de trabalho, na política e em tantos setores, querendo mostrar o seu valor e ocupar o seu espaço. Cumprimento V. Exª pelo pronunciamento, pela sensibilidade, pela forma como introduziu esse assunto, mas também quero dizer que devemos ter um pouco mais de cuidado no nosso dia-a-dia. Nas nossas vidas partidárias e parlamentares, muitas vezes se confundem direitos, diferenças, com privilégios e com conquistas que as pessoas têm durante sua vida. Essa é uma delas. É o mínimo que pode fazer um País, onde não se tem creches, escolas, nem políticas públicas claras de saúde, que atendam à mulher, desde a geração até sua vida idosa; que se trate as mulheres erroneamente, considerando a aposentadoria cinco anos anterior à do homem apenas como um privilégio. Cumprimento V. Exª e tenho certeza de que, dentro desse seu espírito, será um batalhador para que não se abra, neste caso, nenhuma brecha, nenhuma porta, para logo se tentar retirar também este direito, que foi uma dura conquista das mulheres para dar visibilidade ao sacrifício e à vida que realmente levamos. Obrigada.  

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM) - Obrigado Senadora Emilia Fernandes pelo seu aparte que, vindo de uma pessoa que dignifica o sexo feminino neste Senado, como V. Exª, há de ser incorporado ao meu discurso, como disse, como uma chave de ouro para o mesmo.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/12/1998 - Página 18664