Discurso no Senado Federal

INDIGNAÇÃO ANTE A PERDA, PELO BANCO CENTRAL, DE R$ 7,5 BILHÕES NO MERCADO FUTURO.

Autor
Eduardo Siqueira Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: José Eduardo Siqueira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.:
  • INDIGNAÇÃO ANTE A PERDA, PELO BANCO CENTRAL, DE R$ 7,5 BILHÕES NO MERCADO FUTURO.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/1999 - Página 6807
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.
Indexação
  • REPUDIO, ATUAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), PERDA, RECURSOS, BOLSA DE FUTURO.
  • CRITICA, GOVERNO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, FALTA, ATENÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, SUJEIÇÃO, ESPECULAÇÃO, MERCADO INTERNACIONAL, DIVIDA EXTERNA.
  • REGISTRO, RECURSOS NATURAIS, INTERIOR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO TOCANTINS (TO), POSSIBILIDADE, SUPERIORIDADE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, CRITICA, GOVERNO, FALTA, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, INFRAESTRUTURA, OCUPAÇÃO, TERRAS, REFORMA AGRARIA.
  • DEFESA, PARALISAÇÃO, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, BRASIL, NECESSIDADE, BALANÇO, ORGANIZAÇÃO, PROJETO, PAIS.
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS, MELHORIA, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os grandes jornais deste País trazem, todos eles, a informação de que o Banco Central perdeu 7,5 bilhões no mercado futuro.  

Trago para esta tribuna a indignação do povo tocantinense e, com certeza, da população do Brasil inteiro. Apenas para que se tenha uma idéia, esses 7,5 bilhões equivalem ao custo de dois projetos da Ferrovia Norte-Sul, daquilo que está previsto para a conclusão das obras da Ferrovia Norte-Sul.  

Sr. Presidente, o Brasil não é uma ciranda financeira, um exercício de balanço em que se deva simplesmente fechar as contas - deve-se e pague-se - e tudo bem, como se este País fosse apenas uma instituição bancária, uma bolsa de valores, uma agência de financiamento ou uma peça de balanço.  

O Brasil, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é uma sociedade. São 160 milhões de brasileiros que sentem, aspiram, trabalham, amam e, assim como nós, buscam alimento, emprego e segurança, e olham, esperançosos, para o Brasil de amanhã. É com essa gente que o Brasil pode ser construído. Este é o Brasil alternativo ao Brasil do compromisso e da submissão internacional, ao Brasil do débito e do crédito, da economia virtual, do jogo das bolsas e do câmbio e das garras da agiotagem, Brasil que faz esquecer as potencialidades efetivas deste imenso País, vocacionado pela natureza a se transformar numa grande Nação.  

Os 160 milhões de brasileiros e os imensos recursos naturais de seu território, no entanto, continuam constituindo potencialidades distantes, esquecidas. O Brasil dos 6 milhões de quilômetros quadrados de território além da linha do Tratado de Tordesilhas precisa ser descoberto, e é lembrar a necessidade dessa descoberta nos 500 anos do descobrimento e integrar este Brasil, com seus recursos naturais de dimensões planetárias, ao processo de desenvolvimento nacional.  

É esse território que o Brasil desconhece, onde quase nada se investe, que não consta das principais preocupações e das prioridades governamentais; é esse território a grande reserva para a reconstrução nacional.  

São mais de 150 milhões de hectares de terras agricultáveis que ocupam apenas 20% da área nacional, respeitadas, portanto, as inúmeras áreas a serem preservadas ou utilizadas em projetos específicos, compatíveis com sua sustentabilidade. Essas áreas, em grande parte irrigáveis por queda natural, constituem patrimônio da nossa Pátria. Ali, um projeto sério, a exemplo do Projeto do Rio Formoso, localizado no Tocantins, permitiria elevar a produção brasileira de alimentos para algumas centenas de milhões de toneladas, num mundo cada vez mais necessitado de alimentos, num mundo onde também, por razões cada vez mais fundamentadas, se rejeita a manipulação genética e o agrotóxico como instrumentos de crescimento da produção agrícola e de suprimento das demandas mundiais.  

Neste Brasil desconhecido, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estão 20% dos recursos hídricos do planeta, patrimônio e instrumento precioso de desenvolvimento, que não têm sido considerados valor estratégico nem valor de espécie alguma na contabilidade financeira em que se transformou o País, voltando as costas para si mesmo. No entanto, denuncia um Relatório da ONU recentemente divulgado no Cairo, no ano 2.050, na minha velhice e na idade madura de nossos filhos, 2,5 bilhões dos habitantes da Terra, em 67 países, sofrerão da escassez de água. O Brasil simplesmente ignora essas imensas reservas que pode jogar na mesa das negociações internacionais, preferindo entregar-se indefeso à ganância internacional da especulação financeira.  

Este Brasil esquecido guarda 30% da biodiversidade do planeta só na Amazônia. Se à da Amazônia se somar a imensa biodiversidade dos cerrados do Tocantins, do Centro-Oeste e do Pantanal, verificaremos estar exatamente aí a melhor estratégia para sairmos da crise crônica em que nos encontramos. Infelizmente, na visão de boca do caixa, num processo em que se reduziu a Nação a um exercício de peça contábil, a biodiversidade não está sendo contabilizada. No entanto, seu aproveitamento poder-se-ia constituir na forma de uso sustentável das florestas, das águas, dos recursos naturais enfim, capazes de tornar o Brasil uma potência de peso global, a nossa estratégia para ingressar no processo de globalização sem sermos devorados.  

O que quer o Brasil consigo mesmo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores?  

Como há de este País entrar na globalização se não conhece a si mesmo, se vira as costas para o que tem de mais precioso nessa disputa? Se apenas entra nesse circuito com uma arma - a moeda - com a qual ele é necessariamente a parte mais fraca, e despreza seus recursos de dimensões efetivamente globais?  

E o povo brasileiro?  

Sr. Presidente, o Estado do Tocantins tem levantado sua voz exigindo o seu reconhecimento como parte do Brasil, onde se invista parcela do que se gasta na ciranda financeira da economia virtual, que nada produz, para fazer uma nova revolução nacional, a revolução da produção e da riqueza dos brasileiros.  

Para isso, é básica uma política de ocupação territorial, secundada por um novo sistema de transporte, que encurte distâncias, nos aproxime do Hemisfério Norte e seus imensos mercados, que integre as vias fluviais da Amazônia e do Prata, as ferrovias, e cito a Ferrovia Norte-Sul, grande aspiração do povo tocantinense, e o transporte rodoviário, para voltar o País para o Norte e o Nordeste e para o centro de si mesmo, sem o que não haverá efetivamente o Brasil.  

A reforma agrária, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não pode se esgotar no Movimento dos Sem-Terra, ou na desapropriação de fazendas e na distribuição de títulos, ainda que significativos, enquanto a ocupação da terra continuar de forma desordenada, ou simplesmente não acontecer, ausente o Governo no processo e no oferecimento de condições de saúde, de bem-estar e de infra-estrutura para a produção, aproveitando o potencial da população migrante.  

Assim segue o Brasil, Sr. Presidente, como se não houvesse um grande projeto de nação, com seus filhos dispersos, à procura de uma oportunidade nos grandes centros.  

A minha geração – a nossa geração, a geração do século XXI – quer um Brasil novo, de horizontes maiores, possível e viável, e não um Brasil apenas de conjunturas e circunstâncias.  

As conjunturas e as circunstâncias, Sr. Presidente, são necessárias. É por elas que sobrevivemos, e sobreviver é preciso. Mas não será por intermédio delas e por elas que construiremos uma nação, um Brasil para os brasileiros, o Brasil que os brasileiros esperam que sejamos capazes de construir.  

Quando me refiro às conjunturas e circunstâncias, faço menção às reformas em pauta, às quais tenho dado apoio, como tenho apoiado de uma maneira geral o Congresso e, em especial, a Bancada do Tocantins. Essas reformas são urgentes e necessárias para o Brasil e para a sua sobrevivência.  

Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não se constrói de sobrevivências um país. O Brasil da minha geração, para quem é necessário construir um futuro, não é o Brasil da ciranda financeira, mas quem sabe o Brasil com o qual sonhamos, o Brasil do meu Tocantins, o Brasil dessa imensidão territorial, que precisa de muito mais do que de reformas conjunturais e circunstanciais. Precisamos de um projeto de nação.  

Quero, Sr. Presidente, deixar aqui registrada a minha preocupação. Nesta Casa, ontem, anunciou-se a criação da CPI dos bancos. Espero que ela não seja matéria partidária, uma comissão de uma facção, de um grupo, que ela não seja mais um ato de denuncismo para as câmaras de televisão e para a imprensa. Que seja um trabalho sério, um trabalho ponderado, um trabalho que possa mostrar à população brasileira que nós, do Senado da República, estamos preocupados com aquilo em que se transformou a política econômica implantada neste Brasil, com os fatos graves denunciados, como esse que trago hoje à tribuna, a perda de 7,5 bilhões apenas para a estabilização da moeda ou, quem sabe, uma tentativa do Banco Central de acalmar mais uma vez o mercado. Isso inquieta, preocupa.  

E se aqui desta tribuna fôssemos começar a fazer contas do que poderíamos estar construindo com esses 7,5 bilhões? Lá no Tocantins estamos erguendo, com recursos da iniciativa privada, no total de US$1,2 bilhão, uma usina hidrelétrica, que há de dar autonomia a todo o Estado do Tocantins, estabilizar o sistema, incluindo Brasília, e, ainda assim, poderemos exportar energia. Tudo isso está custando, em investimento privado, US$1,2 bilhão. De uma só vez o Brasil perdeu 7,5 bilhões, apenas nessa mudança de câmbio.  

Sr. Presidente, não há brasileiro que possa concordar com esse fato. Não há brasileiro que não possa entender que isso está errado, mesmo sem contar, como é o meu caso, Sr. Presidente, com uma formação acadêmica na área de economia. Não a tenho, o que trago para cá é o sentimento da gente simples de Tocantins.  

Citei aqui em meu pronunciamento o Projeto do Rio Formoso, um projeto que é o maior em áreas irrigadas do País. E nós não utilizamos quase nada do nosso grande potencial. Estamos há anos a ver as obras da Ferrovia Norte-Sul paralisadas. Sabemos que, hoje, o Banco Mundial já acena com o financiamento de 60% da obra; grupos privados, desejosos de participar da exploração dos serviços da ferrovia, acenam com os 40% restantes, praticamente. Ou seja, o Governo precisaria dar apenas uma demonstração de vontade política para a construção dessa obra.  

Sr. Presidente, vejo o Brasil dividido em dois mundos diferentes. Assisti, com alegria - sei da sua importância -, a inauguração de Porto Primavera, do gasoduto que trouxe gás da Bolívia, da linha de transmissão Norte-Sul, em mais de 800 quilômetros do território tocantinense, unindo o sistema Tucuruí ao sistema Centro-Sul. Tudo isso é investimento que, sem dúvida nenhuma, dará retorno a este País e ajudará a equilibrar e a desenvolver essas novas regiões e novas fronteiras.

 

Contudo, neste mesmo País, neste mesmo Governo, acontece uma perda de 7,5 bilhões no mercado e na ciranda financeiro. Contra isso temos de levantar a nossa voz e mostrar a nossa indignação. Tenho certeza de que assim pensa o Presidente da República. Não estou falando nada diferente do que discuto em meu Partido, pelo qual fui eleito e no qual tenho recebido o incentivo e o apoio necessários; principalmente agora, com o convite que me foi feito para ser um dos Vice-Líderes do meu Partido. Essa deve ser a voz de um Congresso Nacional, de um Congresso nacionalista.  

Mesmo com a minha formação favorável ao processo de privatização, peço que não se privatize mais nada no País neste instante. Vamos parar. Vamos dar um basta. Vamos fazer um balanço. Vamos ter amor aos bens nacionais, vamos reorganizar esta Nação, vamos dirigir ao nosso povo um projeto, vamos identificar áreas, vamos acabar com a guerra fiscal entre os Estados, com a qual se dá vantagens para algumas empresas montadoras em detrimentos de outras, como se não tivéssemos, todos juntos, de redirecionar a criação de empregos, as oportunidades, de buscar o equilíbrio no crescimento das grandes cidades, de diminuir as enormes distâncias entre uma classe e outra. Estas são preocupações, Sr. Presidente, que não deixam dormir em paz qualquer um que tenha amor a este País. Muitas crianças permanecem sem acesso à certidão de nascimento - repito -, mas nós nos damos ao luxo de perder 7,5 bilhões na ciranda financeira. Temos de exigir um projeto mais amplo, que aborde o problema da infância abandonada e temos, todos juntos, de procurar uma saída para essa crise crônica. Talvez possamos fazer isso nos moldes do New Deal, que propôs um programa de investimento para o interior dos Estados Unidos principalmente, na Presidência de Roosevelt. Quem sabe não está na hora de todos darmos um basta a essa situação que, sinceramente, me parece fora de controle.  

Essa CPI será importante, não para discursos como o meu, indignado, reflexivo, preocupado, mas, como disse, para dar lugar a um trabalho técnico e sério. Haveremos de descobrir o que está errado. É cada vez maior nossa preocupação com o Banco Central, com o câmbio, com essas coisas que acontecem, Sr. Presidente, e das quais não tomamos conhecimento senão pela imprensa e por denúncias como as feitas ontem pelo Senador Jader Barbalho. Isso tudo é profundamente preocupante.  

Espero que a nossa voz, a nossa indignação e o nosso trabalho acabem vertendo este País para a sua grande vocação. Sr. Presidente, são tantos os recursos, são tantas as condições naturais que tem este País, que não nos permitem deixar o barco correr, que não permitem ignorar os prejuízos causados à população, prejuízos que jamais serão ressarcidos.  

Portanto, Sr. Presidente, quero justificar a minha posição de ontem, quando disse que entendia que a CPI dos bancos não se transformaria em uma questão partidária. Anunciei da tribuna que assinaria o requerimento. Hoje tive informações, até mesmo pela imprensa, de que essa é a posição do Presidente desta Casa, como integrante do Partido da Frente Liberal. O nosso Partido dará também condições para que esse trabalho técnico possa ser realizado, para que essas duas comissões possam ser instaladas, e para que possamos discutir com profundidade todas essas questões que nos preocupam sobremaneira.  

Portanto, Sr. Presidente, mais uma vez, trago a voz do povo do Estado do Tocantins, a quem tenho a honra de representar nesta Casa, contra o que a imprensa vem anunciando - essas perdas inexplicáveis -, para que possamos, quem sabe, encontrar uma solução.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/1999 - Página 6807