Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O PRONUNCIAMENTO DO SENADOR PEDRO SIMON. PREOCUPAÇÃO COM A FORMA DE CRIAÇÃO DE COMISSÕES PARLAMENTARES MISTAS.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O PRONUNCIAMENTO DO SENADOR PEDRO SIMON. PREOCUPAÇÃO COM A FORMA DE CRIAÇÃO DE COMISSÕES PARLAMENTARES MISTAS.
Aparteantes
Eduardo Siqueira Campos, Heloísa Helena, Jefferson Peres, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 10/04/1999 - Página 7738
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCOS.
Indexação
  • APOIO, SENADOR, DIA, FUNCIONAMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO.
  • FRUSTRAÇÃO, ORADOR, QUALIDADE, LIDER, BLOCO PARLAMENTAR, OPOSIÇÃO, RELAÇÃO, RETIRADA, ASSINATURA, SENADOR, REQUERIMENTO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, BANCOS, DEMORA, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, SENADO.
  • CRITICA, MANIPULAÇÃO, SENADO, IMPEDIMENTO, PARTICIPAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, BANCOS, DEFESA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CONGRESSO NACIONAL.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, em primeiro lugar, louvar a proposta do Senador Pedro Simon: S. Exª propôs que a sexta-feira deixe de ser uma sexta-feira morna para ser uma sexta-feira quente, sugerindo o funcionamento das CPIs às quintas-feiras à tarde e às sextas-feiras durante todo o dia, proposta que considero extremamente correta.  

Nesta sexta-feira, quero fazer referência à questão da CPI do sistema financeiro. Todos os Srs. Senadores acompanharam nesta Casa o esforço que a Oposição fez para obter assinaturas que viabilizassem a realização de uma CPI mista do Congresso Nacional. O Deputado Aloizio Mercadante, economista competente, responsável e preocupado com os problemas sociais e econômicos deste País, fez uma série de denúncias graves atinentes ao sistema financeiro e buscou coletar junto aos seus pares assinaturas suficientes para fazer uma CPI na Câmara dos Deputados. Ao mesmo tempo, ocorria no Senado o processo de discussão de uma CPI do Poder Judiciário, proposta apresentada pelo Senador Antonio Carlos Magalhães.  

O Senador Jader Barbalho, líder do PMDB, ao assinar a CPI do Judiciário, condicionou o seu apoio à criação também de uma CPI do sistema financeiro, o que foi viabilizado em seguida na forma de uma proposta do Senado da República.  

Sr. Presidente, é sobre este episódio de criação de CPI exclusiva e CPI mista que quero me ater nesta manhã de sexta-feira morna, como costumamos chamar aqui.  

Para iniciar, gostaria de dizer que, na condição de noviça na Liderança, estou um pouco frustrada, pois, durante esta semana, foi feito todo um esforço no sentido da viabilização das 27 assinaturas para a CPI mista do Congresso Nacional. Conversou-se com cada um dos Srs. Senadores, não apenas com a Liderança, mas com os Senadores do Bloco como um todo e com os Senadores de outros partidos, como os Senadores Pedro Simon, Roberto Requião e Amir Lando, meu vizinho do Estado de Rondônia, e a opinião daqueles que, por várias razões, não concordavam com a CPI Mista do Congresso Nacional foi respeitada. No entanto, isso não resultou em nada.  

Outra coisa também me gerou uma frustração, qual seja, quando cheguei a esta Casa, apesar de não ser especialista em Regimento, descobri que aqui há uma dinâmica na tramitação dos projetos: há a tramitação dos projetos em caráter normal, que são aqueles que têm pernas, mas não andam; há a tramitação dos projetos que têm pedido de urgência, que são aqueles que têm pernas e andam, mas bem devagar; e por fim, como não se satisfazia às necessidades, criou-se o mecanismo da urgência urgentíssima, que são os projetos que têm pernas, andam, mas nem tanto, e só correm quando são empurrados.  

Observei esta situação esdrúxula: projeto normal, ou seja, aqueles projetos "Matusalém" que andam em cima de tartaruga; projeto de urgência e projeto de urgência urgentíssima.  

Portanto, pela frustração que tive com aqueles que retiraram as assinaturas da CPI Mista do Sistema Financeiro, quero propor uma dinâmica para as assinaturas. Poderíamos, por exemplo, instituir duas modalidades: a primeira seria uma linha "A", ou seja, quando o parlamentar assinasse nesta linha "A", poderia retirar sua assinatura, mudá-la; enfim, fazer o que bem entendesse com ela. Na linha "B", criaríamos a modalidade do assinado assinadíssimo. Isso porque, com esse mecanismo, quando fôssemos viabilizar as assinaturas para projetos polêmicos, já abordaríamos os colegas dizendo-lhes o seguinte: Se V. Exª assinar na linha "B" - a modalidade assinado assinadíssimo -, não adiantarão as pressões do amanhecer, da alvorada, ou seja, as pressões do Palácio da Alvorada; não adiantarão as pressões dos Líderes das Bancadas majoritárias, pois não poderá retirar sua assinatura.  

Dessa forma, evitaríamos o trabalho, o desgaste e a expectativa de ir buscar assinaturas, apresentá-las para a sociedade, dizendo que as 27 assinaturas para a criação da CPI Mista do Sistema Financeiro foram conseguidas, mas que nada disso adiantou.  

Dessa maneira, gostaria de registrar um pouco da minha frustração e dizer que, aprendendo com a cultura da Casa, quando as coisas não funcionam pelos processos normais, inventamos alguns mecanismos para evitar perda de tempo e algumas decepções.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Em primeiro lugar, gostaria de dizer que V. Exª está abordando uma realidade total. Quando V. Exª disse que não é profunda entendedora do Regimento, também eu, quando cheguei nesta Casa, há vinte anos atrás, vinha da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, onde conhecia de cor e salteado o regimento. Era considerado um craque, porque estudava e sabia o regimento.  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Confesso que estou tentando, estou-me esforçando.  

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Depois vim para esta Casa. Antes de chegar aqui, pedi ao Paulo Brossard, que era Senador à época, meu amigo, que me levasse uma cópia dos Regimentos do Senado e da Câmara e do Regimento Comum. Fui para a praia e, primeiro, li como se fosse uma literatura, uma mera leitura. Tenho uma maneira de ler, usando um lápis com a ponta vermelha e um com a ponta azul. Com a vermelha, sublinho uma, duas ou várias vezes quando entendo que é positivo; com a azul - faço o contrário dos outros, porque não sou internacional, e o que é internacional é vermelho -, quando acho que é errado, que há alguns pontos equivocados. Na segunda vez, fui lendo e fazendo essas interrogações para expressar a minha dúvida. Li pela terceira vez, fazendo as comparações. Cheguei, então, à seguinte conclusão, principalmente com relação ao Regimento do Senado: o Regimento do Senado é uma mentira só. Ele é feito para que quem esteja presidindo a Casa faça o que quiser, por isso o assessor do Presidente é uma figura muito importante e deve estar ali, ao lado. Em qualquer questão de ordem que for levantada, se o Presidente entender que deverá mandar para a Comissão Permanente, há um artigo e ele dirá: "De acordo com o artigo tal, vai para a Comissão Permanente." Se ele achar que deve submeter ao Plenário, ele invocará o artigo tal e submeterá ao Plenário. Se ele considerar que deve adiar a votação, dirá: "De acordo com o artigo tal, deve ser adiada a votação." Se ele achar que tem que ser votado, porque tem que ser votado, de acordo com o artigo tal, terá que ser votado. Se ele entende que o projeto deve ser retirado, como V. Exª diz, porque saíram assinaturas, invoca o artigo tal. É uma pena, mas o Regimento do Senado é feito para quem preside. É triste que seja assim. Não é feito de maneira séria e responsável. Dentro desse contexto, é profundamente lastimável que um Senador da República assine - não uma assinatura que, às vezes, acontece pelo carinho, pela credibilidade e pelo respeito que temos com o outro colega, principalmente com relação a alguém como V. Exª -, e depois retire a sua assinatura, pois quando se trata de uma CPI Mista, o cidadão só assina se quiser assinar, caso contrário, não assina. Mas assinar e retirar depois não fica bem. Não fica bem para esse Senador, não fica bem para quem pediu para ele retirar, não fica bem para ninguém. É um episódio muito triste esse. Sofri isso, mas graças a Deus não sofri no Senado, pois aqui não conseguiram retirar as assinaturas para a minha CPI dos corruptores, mas arrumaram um outro pretexto. Qual foi a fórmula? Conseguimos as assinaturas, mas não instalaram a CPI dos corruptores porque os Líderes do PSDB e do PFL não indicaram os membros. Vi, agora, no jornal, que vai ser instalada a CPI do Sistema Financeiro e que foi instalada a do Judiciário, mas, há três dias, quando se dizia que não iam ser indicados os membros, a manchete do nosso Jornal do Senado estampava o seguinte: Como diz o Regimento do Congresso Nacional, se em cinco dias não indicarem o membros, o Presidente pode indicá-los. Por similitude, iam indicar. No meu projeto não se lembraram desse artigo. Quando pedi a CPI dos corruptores, ele não valeu, tanto que tive que entrar com um projeto de emenda regimental dizendo: Se, em cinco dias, não forem apresentado os nomes pelos Líderes, o Presidente pode fazê-lo. Mas eles não tiveram problema nenhum, adaptaram-no ao Regimento. Agora, retirar assinaturas... Que pena! Não fica bem para a biografia dos Senadores que pediram para retirar suas assinaturas. E, cá entre nós, vamos ser muito sinceros, não fica bem para a Liderança do Governo, que sabemos que de uma maneira ou de outra deve tê-los pressionado. É profundamente lamentável que aconteça isso num Congresso que se diz sério. Reparem que instalamos, ontem, uma CPI para investigar o Judiciário e, nesse dia, no Senado da República, Senadores retiraram assinaturas de uma CPI pedida por eles. Que autoridade temos para investigar um outro Poder quando fatos dessa natureza acontecem aqui, no mesmo dia, na mesma hora e com as mesmas pessoas influenciadas?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço ao aparte de V. Exª. Com a sua experiência na vida pública e nesta Casa, com certeza, fala com conhecimento de causa no que diz respeito ao Regimento Interno. Com relação à retirada das assinaturas, apenas registro aqui a minha frustração. Claro que não é preciso citar nome de ninguém, até por uma questão de respeito aos colegas que, num determinado momento, assinaram o requerimento, mas, por uma série de pressões, retiraram as assinaturas. Entendo que a modalidade do assinado assinadíssimo, assim como há a urgência urgentíssima, com certeza nos evitaria uma certa perda de tempo.  

Sr. Presidente, o que eu queria colocar com relação a esta questão da CPI mista e do que está ocorrendo no Congresso Nacional é o fato de que, até um certo momento, eu achava que estávamos vivendo uma confusão institucional. A interferência do Legislativo no Judiciário, todos os processos que estão ocorrendo, hoje, neste País, me levava a crer nisso. E por que isso, Sr. Presidente? Porque os jornais estão colocando o tempo todo que alguns juízes poderão se recusar a depor na CPI e que alguns deles poderão vir aqui, avarados, obrigados pela própria Justiça, pelos mecanismos institucionais para depor na CPI. Então, uma situação, no mínimo, esquisita de interferência nos Poderes.

 

Além disso, vivemos agora não apenas uma confusão institucional, mas uma esquizofrenia institucional, tendo em vista que, neste momento, o próprio Poder Legislativo começa a criar uma espécie de negação da sua própria funcionalidade. Vou justificar por que, Sr. Presidente. A Constituição Federal assegura às duas Casas o direito da CPI mista. É uma prerrogativa do Congresso Nacional que, em casos de interesse do País e não se tratando de prerrogativas exclusivas do Senado, como foi o caso da CPI dos Precatórios, que se crie uma CPI mista. Mas aí alguns poderiam alegar que não foi possível a CPI mista porque não conseguimos as assinaturas para viabilizá-la, já que alguns Srs. Senadores retiraram as suas assinaturas. Eu concordaria com essa tese, Sr. Presidente. Só que, antes da nossa tentativa de instalarmos uma CPI mista no Senado, o Deputado Aloizio Mercadante já havia proposto uma CPI exclusiva na Câmara dos Deputados. Pela proposta do Deputado era possível a criação de uma CPI exclusiva. Entretanto, o que foi feito para inviabilizar a CPI mista do Deputado Aloizio Mercadante? A operação ressurreição, até porque estávamos numa época de Páscoa e a Casa, por uma decisão política, começou a ressuscitar CPIs de mil novecentos e antigamente, então, a CPI Mercadante ficou no final da fila, não podendo ser viabilizada porque só podem ser viabilizadas cinco comissões parlamentares de inquérito, segundo o Regimento da Casa. Uma manobra política que colou. E, aí, veio a CPI do Senado. Houve assinaturas para uma CPI do Senado, viabilizada, como proposta do Senador Jader Barbalho. Em seguida, os Deputados conseguiram viabilizar assinaturas para uma CPI mista na Câmara dos Deputados. Ora, se uma das Casas já havia se manifestado no sentido de uma CPI exclusiva, que não aconteceu por causa de uma manobra política; se o Senado decidiu por uma CPI exclusiva e já estava trabalhando pela sua implementação, manifestada, pela segunda vez, pelos Deputados em participar do processo de CPI, porque é da sua prerrogativa constitucional fazê-lo, seria mais do que justo e correto que o Senado oferecesse essa oportunidade, assinando para que a comissão fosse mista, já que havia o desejo manifestado, em dois momentos, pelas duas Casas. O Senado negou à Câmara dos Deputados o direito de exercer as suas prerrogativas constitucionais. O contrário não poderia ocorrer. Se porventura nós estivéssemos em um processo de CPI mista e uma das Casas se manifestasse desejando que se transformasse em CPI exclusiva, isso não seria possível. Mas o poderia ocorrer. Da forma como ocorreu, a esquizofrenia está criada, tendo em vista que o Senado decidiu tutelar a Câmara dos Deputados. O que acontece é uma tutela e os Srs. Deputados que desejam participar do processo de CPI não podem fazê-lo por uma manobra política e porque o Senado impediu. Impediu porque não cumpre a Constituição, que estabelece que, com um terço de assinaturas, pode-se instituir uma CPI mista. Os Srs. Deputados não poderão participar desse processo em virtude de uma decisão do Senado. É por isso que digo que saímos de uma fase de confusão institucional para uma esquizofrenia institucional.  

Com relação à interferência dos Poderes, acredito que no caso do Poder Legislativo não é de se estranhar que alguns não se importem em interferir no Poder Judiciário, até porque já é uma cultura recorrente que o Poder Executivo interfere nas decisões do Poder Legislativo; isso ocorre a toda hora. O que talvez alguns desejem é transferir essa tecnologia, esse mecanismo para outros poderes.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - Permite V. Exª um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concedo o aparte à nobre Senadora Heloisa Helena.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - Minha querida Líder Marina Silva, concordo inteiramente com a indignação e o pronunciamento de V. Exª, mas entendo que deveríamos fazer uma correção: na semana passada, ao protestar contra a omissão e a cumplicidade do Senado, afirmei que aqui tanto a Bancada da Oposição como a da Situação quase que fazem o mesmo discurso e quem nos assistia talvez pensasse que aqui era um grande processo enlouquecedor e que precisaríamos todos ir ao divã. E hoje V. Exª traz a questão da esquizofrenia. Devemos fazer uma correção até em respeito às pessoas que têm a sua saúde mental comprometida, devemos fazer até um exercício de não usar esses termos, porque tanto as pessoas que vão ao divã como aquelas que têm problemas mentais são por nós respeitadas. Acredito que devemos usar algum outro termo que caracterize muito bem, mesmo dentro dos limites das normas civilizadas, esse tipo de farsa, de balcão que, muitas vezes, é montado em torno de tira e bota assinatura, em torno de posição política dentro deste plenário. Como muito bem colocou o Senador Pedro Simon, não ficam só sob suspeita os Parlamentares ou a Liderança, mas a própria Comissão Parlamentar de Inquérito. Por que essa comissão mista não pôde ser criada se as denúncias para a sua formação - como V. Exª muito bem colocou - foram iniciadas dentro da Câmara, pelo Deputado Federal Aloizio Mercadante? Isso é o que precisa ser explicado. Os Senadores, as Lideranças, alguém tem que explicar por que as assinaturas foram retiradas. Se existe, como bem caracterizou V. Exª , a proteção no campo da legislação, tanto no Regimento como na Constituição, por que é que isso foi retirado? Tal atitude coloca em suspeita a própria CPI, porque se as pessoas, em função de pressão política, retiram suas assinaturas, imagine o que podem fazer sob pressão política, sob pressão dos banqueiros, do sistema financeiro, do Governo Federal ou de qualquer Senador. Imagine o que pensa a sociedade sobre o que pode acontecer, diante de pressão política, ao funcionamento da CPI! É por isso que todos nós temos que estar muito atentos aos trabalhos dessa CPI; para que esta não seja uma farsa. Pois, a partir do momento que uma simples assinatura para a constituição de uma comissão mista gera esse tipo de constrangimento não apenas para V. Exª, mas para todos os Senadores - e todos os Senadores desta Casa, independentes de serem do Bloco de Oposição, têm que se sentir, e sei que se sentem, constrangidos com esse tipo de processo - gera também para a sociedade a possibilidade de uma farsa em relação a pressões que possam acontecer. É por isso que é importante a nossa extrema vigilância em relação a essa Comissão.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PFL-TO) - Permite-me V. Exª. um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concedo a aparte ao Senador Eduardo Siqueira Campos.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PFL-TO) - Nobre Líder Marina Silva, ouvindo o pronunciamento de V. Exª, senti-me com uma extrema vontade de fazer um aparte, principalmente porque V. Exª toca em um ponto muito importante, que acaba por atingir a própria credibilidade das nossas assinaturas. Antes mesmo de ter sido procurado por V. Exª para assinar o pedido de CPI, já havia assinado a CPI proposta pelo Senador Jader Barbalho e tinha vindo à tribuna desta Casa para manifestar a minha opinião, uma convicção de que, até pelas prerrogativas que não são exclusivas mas são mais afetas ao Senado, eu entendia que essa Comissão deveria ser do Senado. Fiz isso antes de ser procurado - já sabia da intenção do ilustre Deputado Aloízio Mercadante, um homem da área, um estudioso, um parlamentar comprometido com as questões econômicas - e disse, no meu pronunciamento que, embora entendendo legítima a vontade de S. Exª, o meu entendimento era de que, até para propiciar uma maior participação dos Senadores que já aprovam o Presidente do Banco Central, que aprovam os financiamentos internacionais, que fiscalizam mais apropriadamente, segundo a Constituição, o sistema financeiro, a Comissão era mais afeta ao Senado. Esse era o entendimento modesto de minha parte. Portanto, tive o cuidado de, ao ser procurado por V. Exª, dizer que havia essa convicção pessoal e, após isso, em uma reunião do Partido da Frente Liberal, onde todos pudemos usar da palavra, tomamos uma posição também de partido de que a Comissão deveria ser do Senado. No entanto, V. Exª toca em um ponto muito importante, porque acabo de dar a minha assinatura a uma proposta feita pela nobre colega Heloisa Helena e tive o cuidado de dizer-lhe que o compromisso assumido com a assinatura seria para ver o assunto debatido. Nesse caso creio que é muito importante que quem assine tenha a responsabilidade de dar uma contribuição para que o assunto seja debatido e, no mérito, discordar. Faço sempre questão de deixar isso claro. Mas, no caso de uma CPI, é diferente. Jamais, por convicção pessoal, assinaria um pedido de CPI que não está apenas ensejando a discussão, mas que já vai, de fato, à ação. Por isso tive o cuidado de dizer a V. Exª, primeiro por convicção pessoal, que creio que essa CPI deve ser do Senado e, em segundo lugar, porque houve uma decisão do meu Partido, que pretendo seguir. Portanto, neguei a assinatura. Não quero aqui entrar no mérito de discutir quem pôs e quem retirou a assinatura. Deixo isso a cargo da consciência de cada um. Eu não o faria. Se tivesse assinado, pode ter certeza V. Exª, por nada retiraria minha assinatura. Assim, quando V. Exª diz que encaminharia à Mesa uma proposta de mudança do Regimento, considero importante, para que possamos ter esta modalidade: assinar para ver a questão discutida. Entretanto, assinar e depois retirar é uma situação que, no meu ponto de vista, é realmente complicada e até dificulta o trabalho sério de quem o está promovendo, como é o caso de V. Exª, que procurou todos os Senadores no intuito de transformar essa Comissão em mista. Era essa a consideração que gostaria de fazer. Espero que a proposta de V. Exª seja apreciada a fim de que tenhamos a possibilidade de apoiar aquilo que queremos ver discutido, enquanto que a assinatura de apoio dada num requerimento para criação de CPI, por exemplo, seja definitiva e não passível de retirada.  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço a V. Exª o aparte. Nossa prática de apoiar determinadas matérias para que elas sejam debatidas fazem parte, inclusive, de uma cultura democrática muito importante, que é o fato de podermos discordar no mérito, mas darmos oportunidade de que o debate seja instituído até para que possamos exercitar o processo de convencimento e mudança de opinião.

 

O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT-AM) - Permite-me V.Exª um aparte, nobre Senadora?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concedo o aparte ao ilustre colega de Bancada do Bloco, Senador Jefferson Péres.  

O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT-AM) - Senadora Marina Silva, não ponho em dúvida a intenção do ilustre Senador Jader Barbalho quando propôs a investigação de escândalos no sistema financeiro. Também não vou generalizar e condenar os Senadores que retiraram suas assinaturas, porque terão sido diferentes os motivos de cada um. Entretanto, Senadora, o certo é que há evidências de que essa CPI não foi criada para valer. A persistente recusa, a resistência da base governista em criar a CPI mista torna isso muito claro. Ontem, quando o Senador Eduardo Suplicy disse-me que o Bloco havia finalmente conseguido 27 assinaturas - e ele dizia isso muito alegre -, eu disse a S. Exª que as assinaturas seriam retiradas. Profetizei isso. E não sou daqueles, Senadora, que se rejubilam quando as suas profecias sombrias se realizam e dizem: "Bem que eu avisei!" Não. Fico realmente triste quando isso acontece. De forma que é lamentável. Eu já perdi a crença nessa CPI, no resultado dessa CPI. Se dependesse de mim, a Oposição nem participaria mais dela. E o certo é, para concluir, que o Senado, como disse o Senador Pedro Simon, sai apequenado desse episódio.  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço a V. Exª o aparte e o incorporo ao meu pronunciamento. E peço apenas aquiescência da Mesa para as minhas considerações finais.  

Algumas das argumentações que foram apresentadas para que a CPI fosse exclusiva do Senado, do meu ponto de vista, não procedem. Alguns argumentavam que essa CPI tinha que ter começo, meio e fim e que, se ela fosse das duas Casas, ia criar um processo de denúncias generalizado e que poderia não levar a nada. Escutei isso de alguns colegas, tanto Deputados quanto Senadores, que eram contrários a criação da CPI, como uma justificativa para a CPI não ser mista.  

Ouvi também da parte de alguns que isso poderia chegar a perda do controle, levar a uma crise... Eu não sei que tipo de controle é preciso ter? Para mim as investigações devem ter o controle da lisura, das provas que têm que ser apresentadas e da responsabilidade que cada um dos Srs. Senadores e Deputados tem à frente de um processo como este. Não vejo que se tenha que ter controle a priori da instalação de uma CPI.  

Quanto à argumentação de que pode não levar a nada, eu quero apenas lembrar que as CPIs que levaram a alguma coisa foram exatamente as CPIs mistas, das duas Casas. Quem não se lembra da CPI dos Anões do Orçamento? Por acaso, foi apenas uma Casa ou foi apenas do Senado que investigou as denúncias do Orçamento? Foi exatamente essa CPI que levou à cassação de alguns Deputados, como Ibsen Pinheiro, Genebaldo Correia, Manoel Moreira, Carlos Benevides, João Alves. Houve, inclusive, citação de nome de Senadores que estariam envolvidos, processo este que depois foi controlado.  

Mas, nesse caso, foi exatamente uma CPI mista que gerou conseqüências, levando, inclusive, a um processo de credibilidade das duas Casas pelo trabalho apresentado à sociedade. A CPI do PC Farias que levou ao impedimento do Presidente Fernando Collor de Mello também foi uma CPI mista. Então, não procede o argumento de que isso não levaria a nada, porque foi justamente nas duas CPIs em que houve a participação dos Srs. Deputados e dos Srs. Senadores que as conseqüências práticas foram mais visíveis para sociedade, inclusive com mudanças estruturais nos processos viciados que havia anteriormente.  

Por último, Srª Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, devo dizer que a luta pela CPI Mista do Sistema Financeiro, que teve o competentíssimo Deputado Aloizio Mercadante e outros Srs. Deputados que trabalharam, que se empenharam nessa CPI, com certeza, tem um prejuízo muito grande, porque a participação dos Deputados daria ao Congresso Nacional, ao Senado, à CPI do Senado uma outra dimensão do ponto de vista de somarmos força, de somarmos competência. Não que os Senadores não as tenham; têm, mas, com certeza, estaríamos somando os esforços e as informações no sentido de fazer com que essa CPI do Sistema Financeiro não ficasse no mínimo com o olhar estranho da sociedade, querendo saber por que o Senado da República impediu a Câmara dos Deputados de utilizar a sua prerrogativa constitucional para participar desse processo.  

Para concluir, Srª Presidente, sou ligada a uma cultura de participação de ONG’s, de organizações da sociedade civil. Nestas organizações, costumamos fazer algo muito interessante: há a ECO 92. Instala-se o fórum oficial da ECO 92, e aí a sociedade civil cria o fórum paralelo. Há a Conferência de Beijing, oficialmente instituída, com a participação das mulheres, das delegadas; criamos um fórum paralelo. Existem vários momentos em que a única oportunidade de os segmentos excluídos da sociedade participarem do processo é com a criação de um fórum paralelo.  

Quem está falando é a sonhadora Senadora Marina Silva. Talvez não a Líder do Bloco de Oposição, porque não discuti com o meu Bloco, mas talvez fosse de bom alvitre que a Câmara dos Deputados, os 190 Srs. Deputados instituíssem um fórum paralelo de CPI do Sistema Financeiro. Vamos funcionar como os tribunais, que julgam os maiores crimes.  

Fizemos um tribunal para julgar os criminosos de Corumbiara - não estou aqui comparando uma coisa com a outra, trata-se apenas de um exemplo - nos mesmos moldes do funcionamento de um tribunal. Talvez tivéssemos que criar um fórum de CPI paralelo e, assim, a sociedade civil, as pessoas que têm informações poderiam levar para os Deputados, por meio da CPI paralela, tudo o que precisam saber, investigar e denunciar para a sociedade.  

Como o Líder do PT, na Câmara dos Deputados, sugeriu que se coletassem assinaturas para a CPI mista, talvez o fórum paralelo nos ajudasse com as informações a viabilizar, por meio da opinião pública, a CPI Mista do Sistema Financeiro. Somente dessa forma o trabalho que iríamos fazer teria o aval e o crédito da sociedade. Por mais que façamos aqui, com os resultados corretos, adequados, sempre as pessoas irão questionar: por que o medo de que os Srs. Deputados possam também participar desse processo?  

Muito obrigada.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/1999 - Página 7738