Discurso no Senado Federal

PREMENCIA NA SANÇÃO DO PROJETO DE LEI QUE DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DE CIRURGIA PLASTICA REPARADORA DE MAMA PELO SUS, NOS CASOS DE MUTILAÇÃO DECORRENTE DE TRATAMENTO DE CANCER.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • PREMENCIA NA SANÇÃO DO PROJETO DE LEI QUE DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DE CIRURGIA PLASTICA REPARADORA DE MAMA PELO SUS, NOS CASOS DE MUTILAÇÃO DECORRENTE DE TRATAMENTO DE CANCER.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/1999 - Página 8783
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, CUMPRIMENTO, MARIA ELVIRA, DEPUTADO FEDERAL, AUTOR, PROJETO DE LEI, FIXAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), EXECUÇÃO, CIRURGIA, REPARAÇÃO, ORGÃO HUMANO, MULHER, VITIMA, CANCER.
  • COMENTARIO, ESTIMATIVA, PREVISÃO, OCORRENCIA, CANCER, MULHER, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, PREVENÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, URGENCIA, SANÇÃO PRESIDENCIAL, PROJETO DE LEI, DISPOSIÇÃO, CIRURGIA, REPARAÇÃO, MULHER, VITIMA, CANCER.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que gostaria de abordar é um projeto que foi, recentemente, aprovado pela Câmara e pelo Senado, que consideramos da maior importância.  

Registro que, no dia em que foi votado, não pude me manifestar por outros compromissos, mas não gostaria de deixar de também manifestar a minha posição e, inclusive, registrar os meus cumprimentos à autora desse projeto, que, sem dúvida, teve uma iniciativa muito importante, do ponto de vista social, do ponto de vista do resgate da dignidade da mulher, principalmente propondo ações concretas em relação à saúde da mulher, que é um tema de tanta importância e de tantos debates em nosso País.  

Refiro-me ao projeto de lei que dispõe sobre a obrigatoriedade da cirurgia plástica reparadora da mama pela rede de unidades integrantes do Sistema Único de Saúde nos casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer, de autoria da Deputada Maria Elvira, de Minas Gerais, a quem cumprimento, mais uma vez, pela iniciativa.  

Tivemos o cuidado de acompanhar esse projeto, tendo inclusive agilizado a sua urgência quando chegou ao Senado, onde teve uma receptividade muito grande pelas Lideranças de todos os partidos.  

O projeto prevê que as mulheres que sofrerem mutilação total ou parcial de mama decorrente de utilização de técnica de tratamento de câncer têm direito à cirurgia plástica reconstrutiva e cabe ao Sistema Único de Saúde, o SUS, por meio de sua rede de unidades públicas ou conveniadas, prestar serviço de cirurgia plástica reconstrutiva de mama, prevista no artigo anterior, utilizando-se de todos os meios e técnicas necessários. E o Poder Executivo deverá regulamentar essa lei no prazo de cento e oitenta dias.  

Diz a própria autora do projeto que a insensibilidade dos governantes com a saúde, em particular com a saúde da mulher, tem deixado seqüelas em nossa sociedade. São milhares de vítimas do descaso, da incompetência e do preconceito. Os programas de atenção à saúde da mulher, embora bem concebidos e estruturados, estão muito distantes de sua implantação efetiva na rede de serviços públicos de saúde. Estão sendo descaracterizados pela descontinuidade, fragmentação e falta de recursos.  

E ainda vai mais adiante a autora do projeto, Deputada Maria Elvira, do PMDB de Minas Gerais:  

"Só as mulheres que passaram por isso seriam capazes de dar a dimensão real de seu sofrimento. A reparação estética poderia trazer para muitas delas um importante e imprescindível suporte psicológico e um inestimável apoio à sua recomposição moral, especialmente, para a mulher pobre".  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sabemos que atualmente os dados apontam que as grandes causas de morte das mulheres são doenças cardiovasculares, câncer, acidentes e doenças ligadas à gravidez e ao parto. Entre os tipos de câncer, sabemos que entre os mais freqüentes, sem dúvida, estão o de pele, mas, principalmente, o de mama e do colo uterino e ovário.  

As estimativas são alarmantes. Os dados previstos para 1999 apontam que o Brasil terá 31.200 novos casos de câncer de mama e 7.200 mortes. A Região Centro-Oeste é líder, em termos de incidência desse tipo de câncer. Em 1999, as estimativas indicam que, de cada 100 mil mulheres da Região Centro-Oeste, 34 poderão se descobrir vítimas dessa doença. Essas projeções foram divulgadas pelo Instituto Nacional do Câncer- Inca, órgão do próprio Ministério da Saúde.  

O câncer de mama é o mais freqüente nas mulheres (1 em cada10 tem essa doença), e também é a maior causa de morte por doença nas mulheres de 20 a 49 anos, inclusive no meu Estado do Rio Grande do Sul. Ocorre, preferencialmente, após os 40 anos, embora nos últimos anos tenha aparecido em mulheres mais jovens com muito mais freqüência. Nos últimos cinco anos, triplicaram os casos de mulheres com menos de 35 anos com câncer de mama, conforme estatísticas do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, dados do Rio Grande do Sul. A prevalência dessa doença é maior no Rio Grande do Sul, inclusive já se colocando ao lado de outros Estados brasileiros, onde o tipo mais comum é o de colo uterino. O câncer de mama é muito agressivo e provoca taxas de mortalidade quase cinco vezes maior que o câncer de colo de útero.  

Sabemos também, Srªs e Srs. Senadores, que a saúde da mulher é um direito humano fundamental e, como tal, deverá promover-se claramente. A saúde da mulher, na nossa avaliação, é um determinante fundamental do desenvolvimento social e econômico, aspecto este que a Organização Mundial da Saúde constantemente coloca em destaque. A mulher, como sabemos, é a pedra fundamental da família; por conseguinte, a sua saúde é um requisito que condiciona a saúde de toda a família e, por extensão, das comunidades e da sociedade. Temos compreensão de que a mulher, se realmente fosse atendida, fossem colocados à sua disposição os exames preventivos, educacionais, esclarecedores em relação ao seu corpo, à prevenção, a um planejamento familiar construtivo, certamente teríamos muito menos casos de doenças em crianças, em pessoas idosas, enfim, na sociedade como um todo.  

Não estamos pedindo privilégio para a mulher. O que dizemos é que a eqüidade em matéria de assistência não quer dizer idêntica assistência, sobretudo levando em conta as diferenças biológicas que requerem obviamente serviços de saúde especializados. A saúde da mulher é o caminho e a destinação mais seguros de recursos para a saúde de todos, porque, a partir dali, se previne, se educa e tenho certeza de que se economizam recursos.  

Durante demasiado tempo, deu-se às mulheres uma imagem de vítima indefesa da falta de políticas públicas, de educação, de creches para seus filhos, de trabalho com salários dignos, de habitação. E, principalmente, atribuiu-se à mulher um sentimento de resignação. Mas não temos dúvida de que as mulheres mudaram, as mulheres enfrentam, as mulheres se posicionam e têm dado demonstração clara de que sabem enfrentar as enormes adversidades que afetam a sua saúde e o seu bem-estar.  

Por outro lado, é certo que as mulheres precisam ser ouvidas, exercer o poder, porque são criativas e já passaram da denúncia, do medo, da submissão à ação.  

É necessário que se considerem as mulheres protagonistas de sua própria saúde e da ação assistencial. É chegada a hora de questionar, de adotar medidas, de organizar-se cada vez mais, de exigir recursos, resultados e, acima de tudo, responsabilidades.  

É chegada a hora de os sistemas assistenciais e de saúde pública prestarem atenção à opinião das mulheres e aproveitarem as suas propostas de melhoria da saúde e, por extensão, das condições de vida melhor para os seus filhos e para toda a sociedade.  

Temos os dados apontados na Conferência Mundial dos Direitos da Mulher, que se realizou em Beijing, na China, em 1995, quando afirmou e definiu: "A situação das mulheres passa a ser considerada, em nível mundial, parâmetro para medir o grau de democracia e de vigência da justiça nos mais diferentes países". E o Brasil, Srªs e Srs. Senadores, foi signatário dessa plataforma de ação e, portanto, assumiu um compromisso público de colocar em prática aquilo que lá foi definido  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - Permite-me V. Exª um aparte?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Ouço V. Exª com prazer.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT-AL) - Senadora Emilia Fernandes, saúdo V. Exª pelo pronunciamento. O fato de V. Exª não ter tido a oportunidade de se pronunciar no dia talvez tenha sido providencial e até melhor, porque possibilita que esta Casa possa, em outros espaços de discussão, mesmo diante do plenário esvaziado, debater algo importantíssimo, que é a saúde da maioria da sociedade. Somos a maioria da população e responsáveis diretas pela outra parte da população, quer seja como mães, como esposas ou como companheiras. O tema que V. Exª aborda - e o faz de forma extremamente realista, com a apresentação de dados - é extremamente importante. A nossa saúde, a saúde das mulheres, tem que ser tratada de forma diferenciada, como V. Exª afirmou. A própria estrutura anátomo-fisiológica da mulher, a estrutura do nosso aparelho reprodutivo implica um risco maior à saúde, exigindo do Poder Público maior atenção em relação a todas as áreas. V. Exª elogia, como todos nós fizemos, o projeto da Deputada Maria Elvira, que, sem dúvida, possibilita parte do resgate do amor, da dignidade da mulher. Sabemos que isso não é uma ode à beleza, uma vez que não resgata a beleza de forma nenhuma. Sabemos que a cirurgia é terrível, gigantesca, tira toda a rede ganglionar, ficando a mulher, inclusive, impossibilitada de executar muitas das tarefas domésticas em função do edema gigantesco, do derrame pleural. Enfim, é algo muito doloroso, tanto em função da nossa auto-estima, porque temos parte do nosso corpo arrancada, tirada, mutilada, como também fisicamente. Assim sendo, o projeto é de extrema importância, mas será uma luta que teremos que travar para que os serviços de saúde atuem de forma preventiva. Sabemos o quanto é fácil, o quanto é barato, pelos números que V. Exª apresenta, prevenir o câncer do colo do útero e o câncer de mama com um simples exame, seja por um processo educativo, seja através de uma fiscalização permanente e de uma oferta contínua de serviços de saúde, desde a sua unidade básica. É inadmissível o aumento de casos dessas doenças, uma vez que se trata de um exame extremamente barato, que todo serviço, desde o chamado centro de saúde, porta de entrada do sistema, pode fazer com o máximo de eficácia e com o menor custo. Parabenizo V. Exª, que tem sido uma lutadora em relação às causas relacionadas à mulher e a toda a sociedade. Creio que foi extremamente importante que V. Exª não tenha podido falar no dia, pois trouxe a possibilidade de fazermos uma discussão permanente sobre a saúde das mulheres. E, como V. Exª muito bem disse, citando a Deputada Maria Elvira, é a maioria das mulheres pobres deste País que não têm oportunidades. Para muitas de nós, por exemplo, é mais fácil fazer uma consulta permanente com um ginecologista e buscar todos os mecanismos necessários para prevenir determinados tipos de câncer. Mas a maioria das mulheres do nosso Brasil - do meu Nordeste nem se fala! -, em razão do desmantelamento completo dos serviços de saúde, está impossibilitada de ter direito a esses exames, que são tão baratos. Portanto, essa irresponsabilidade do Governo Federal com relação à saúde da mulher é inadmissível. Gostaria, ainda, Senadora Emilia, até por uma questão de justiça, de agradecer aos Senadores Artur da Távola e Gilvam Borges pela sensibilidade demonstrada tanto na Comissão de Assuntos Sociais como no plenário. S. Exªs gostariam de ter apresentado emendas no sentido de uma causa justa, qual seja de possibilitar que as cirurgias plásticas reparadoras fossem patrocinadas não apenas quando se tratasse de câncer de mama. Isso é algo extremamente importante e denota a sensibilidade dos dois Senadores. Porém, o fato de a emenda não ter sido apresentada agora, para evitar o atraso da votação e da aprovação do projeto, sem dúvida, merece também o nosso agradecimento.

 

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte de V. Exª, que enriquece o meu pronunciamento, inclusive acrescentando a participação de Senadores que, embora trouxessem novas propostas, entenderam a necessidade da urgência do projeto e o aprovaram tal como veio da Câmara.  

Logicamente, todos - a sociedade brasileira, homens e mulheres - estamos aguardando ansiosamente a sanção do Presidente da República, que tornará lei esse projeto, para que se dê início ao processo de regulamentação pelo Ministério da Saúde, possibilitando que, 180 dias após a regulamentação, os hospitais do País já comecem a habilitar-se para prestar esse serviço.  

Essa lei, sem dúvida, vai estimular que se olhe com mais sensibilidade a mulher mais pobre. As mulheres que têm melhores condições financeiras buscam outras alternativas, na iniciativa privada, por exemplo, que podem contribuir para minimizar esse grave problema.  

Por outro lado, entendemos ser justo que o País, dando continuidade aos compromissos assumidos com os direitos da mulher, a partir da Conferência de Beijing, sancione essa lei, principalmente porque o Estado brasileiro, na nossa avaliação, tem uma dívida social muito grande com a maioria da população deste País, na qual estão incluídas especialmente as mulheres.  

Como muito bem disse a Senadora Heloisa Helena, as mulheres são a maioria da população, e são mães, mulheres, avós, tias, companheiras da outra parte da população. Sabemos que as mulheres ainda são as responsáveis primeiras pela criação dos filhos, pelo cuidado com os idosos, pela orientação da educação nas famílias. Portanto, nada mais justo que, na luta pela igualdade, num tratamento em que haja eqüidade, tenhamos as diferenças atendidas, para que realmente possamos nos desenvolver na plenitude como cidadãs, como mulheres, como participantes da luta pelo desenvolvimento de um povo com justiça e igualdade social.  

Sabemos que o ideal, sem dúvida, Senadora Heloisa Helena, seria o trabalho, a campanha e o investimento na prevenção. Se tivéssemos um povo mais educado, mais consciente dos seus direitos, mais esclarecido, e não apenas pelas escolas, mas pela família, e com condições mínimas de dignidade - se as famílias vivem sem um mínimo de dignidade, se não têm habitação, se não recebem salário mínimo, se não têm trabalho, como vamos poder exigir outra construção de valores? -, certamente teríamos um povo mais sadio, mais educado e mais participante. É lógico que o ideal seria a prevenção, mas sabemos que ela ainda não está à disposição das pessoas no nosso País.  

E quero resgatar as palavras do Relator desse projeto, Senador Tião Viana, que, reportando-se à Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que cria o Sistema Único de Saúde, afirma que ali está o apoio à proposição em análise, nos arts. 6º, alínea b, e 7º, inciso III. Ambos não normatizam, determinando regras de execução. Entretanto, dispõem sobre bases e diretrizes do atendimento e garantia à saúde integral da população.  

Na alínea a do art. 6º, inclui-se, entre os objetivos e as atribuições do SUS, a assistência terapêutica integral e, inclusive, farmacêutica.  

Ao mesmo tempo, no inciso III do art. 7º, dentre os princípios e diretrizes do Estado, está definido que deverá ser garantida a preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral.  

Portanto, Srªs e Srs. Senadores, estamos diante dos dados. A urgência articulada no Senado para acelerar a votação, que obteve apoio dos Srs. Senadores, foi muito importante. Estamos vendo os dados e, se tivéssemos mais tempo, mais dados traríamos, de outros Estados. Apenas no Hospital de Base de Brasília, por exemplo - o principal hospital público de atendimento ao câncer de mama -, 180 mulheres são operadas por ano. A maioria dos casos é exatamente de retirada do seio por câncer. E as mulheres operadas, segundo os médicos, não têm condição financeira de fazer a cirurgia plástica de reconstituição da mama. Os efeitos psicológicos, já sabemos, são mais terríveis nesses casos que propriamente os físicos. A pessoa pode até tirar o câncer, mas fica o trauma de não ter o seio, que faz parte das próprias características da mulher. Portanto, as mulheres sofrem muito com esse problema.  

As formas de prevenção, que aqui já foram ressaltadas, são importantes. Precisamos ter consciência de que a prevenção está ligada à boa alimentação, ao não consumo demasiado de álcool, aos hormônios, cuja importância todos conhecem e, principalmente, está ligada aos exames periódicos, ao auto-exame, ao exame clínico, à mamografia, que é um exame que precisa ser realizado e que nem sempre está ao alcance de todas as mulheres.  

Assim, quero ressaltar, mais uma vez, a importância desse projeto, de iniciativa da Deputada Maria Elvira e, principalmente, fazer um apelo ao Presidente da República, para que sancione imediatamente essa lei, que vem ao encontro não apenas da luta e da conquista dos direitos das mulheres, mas também da justiça, e mostra a sensibilidade que os nossos governantes devem ter com a saúde da mulher.  

Era o registro que eu gostaria de fazer, Sr. Presidente.  

Muito obrigada.  

 

eÞÓ


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/1999 - Página 8783