Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO, HOJE, DOS 134 ANOS DE NASCIMENTO DO MARECHAL CANDIDO MARIANO DA SILVA RONDON.

Autor
Jonas Pinheiro (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Jonas Pinheiro da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • TRANSCURSO, HOJE, DOS 134 ANOS DE NASCIMENTO DO MARECHAL CANDIDO MARIANO DA SILVA RONDON.
Aparteantes
Amir Lando, Mozarildo Cavalcanti, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/1999 - Página 9938
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, CANDIDO MARIANO DA SILVA RONDON, MARECHAL, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, POLITICA INDIGENISTA, TELECOMUNICAÇÃO, INTEGRAÇÃO, BRASIL.

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, comemoraremos, no próximo dia 5 de maio, 134 anos de nascimento de uma das maiores figuras da história brasileira: o Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.  

Exatamente no dia 5 de maio de 1865 nascia o menino Cândido Mariano da Silva, na localidade de Mimoso, no atual município de Santo Antônio do Leverger, onde também tive orgulho de nascer e ser dele conterrâneo.  

Esse notável brasileiro sempre orgulhou-se de possuir em suas veias sangue dos índios Terena, Bororos e Guanás, já que era neto desses índios por parte das avós materna e paterna.  

Da baia do Chacororé, no distante Município de Santo Antônio de Leverger, no então isolado Estado de Mato Grosso, o jovem Cândido Mariano, após ter aprendido as primeiras letras de um veterano da Guerra do Paraguai, foi residir em Cuiabá. Lá freqüentou o Liceu cuiabano, concluindo o seu curso com 16 anos de idade.  

Cônscio de sua vocação, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde freqüentou a Escola Militar, no período de 1881 a 1890, diplomando-se, posteriormente, Bacharel em Matemática, Ciências Físicas e Nacionais pela Escola Superior de Guerra do Brasil.  

Em 1913, Rondon realizou com Theodore Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos de 1901 a 1909, uma importante expedição científica na Região Amazônica. Esse conhecimento levou a que o ex-Presidente dos Estados Unidos Theodore Roosevelt afirmasse: "O Coronel Rondon não é apenas um oficial e um cavalheiro, no sentido honrosamente verdadeiro para os melhores oficiais do exército em qualquer bom serviço militar. É também um explorador particularmente intrépido e competente, homem dotado de espírito científico, naturalista de campo, intelectual e filósofo". Theodore Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos de 1901 a 1909, realizou com Rondon, em 1913, uma importante expedição científica na Região Amazônica.  

Ao que afirmou Roosevelt sobre a personalidade de Rondon poderíamos ainda acrescentar: antropólogo, etnólogo, sociólogo, geógrafo, sertanista, indianista, estadista, pesquisador, humanista e matemático, assim como todas as qualidades de nossos índios — bondade, solidariedade, respeito pela natureza, respeito pelo ser humano.  

Quando os portugueses chegaram ao Brasil, havia aqui aproximadamente cinco milhões de índios. Hoje existem menos de 200 mil: o Brasil dizimou, aproximadamente, um milhão de índios por século, ao longo dos nossos 500 anos de história. Podemos afirmar que o patriotismo, a personalidade e a força moral de Rondon evitaram que o índio brasileiro fosse completamente exterminado.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o mundo de hoje, dominado por meios de comunicação que glorificam e idolatram falsos valores, não consegue compreender o exemplo, o valor e a grandeza moral de homens como Martin Luther King, Marechal Rondon, José de Anchieta, Ghandi, Tiradentes, Duque de Caxias, Rui Barbosa e Santos Dumont.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - V. Exª me permite um aparte, eminente Senador Jonas Pinheiro?  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Ouço V. Exª com muito prazer, prezado Senador Tião Viana.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - Senador Jonas Pinheiro, agradeço a oportunidade do aparte. Desejo dividir com V. Exª minha admiração pelo Marechal Rondon, uma pessoa que possui uma trajetória definida na vida e na memória do nosso País, que atingiu o coração do Brasil nas suas viagens pelo interior e que demonstrou um profundo sentimento de solidariedade para com as populações isoladas da Amazônia brasileira. Imagino o que significou para o Marechal Rondon e para o povo brasileiro a criação desse movimento de investigação, de acompanhamento da realidade brasileira, de proteção às comunidades abandonadas. Rondon esteve permanentemente em comunicação com as pessoas dos grandes centros urbanos e as que viviam isoladas. As ações de saúde e de educação implementadas pela presença, estimulação e inspiração do Marechal Rondon são uma marca de profundo respeito e amor pelo Brasil, algo que está faltando a algumas autoridades contemporâneas do nosso País. A homenagem que V. Exª faz ao Marechal Rondon é mais do que justa, mais do que verdadeira.  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Muito obrigado, Senador Tião Viana. Incorporo, com muito prazer, o aparte de V. Exª nesse humilde e modesto pronunciamento – humilde e modesto como era o nosso saudoso Marechal Rondon.  

O que somos e temos como Nação soberana e independente – um grande território, um só povo, uma só língua – devemos a nossos antepassados e, principalmente, a homens extraordinários como o Marechal Rondon, exemplo de patriotismo, sabedoria, inteligência, abnegação, coragem, liderança, amor ao próximo e simplicidade.  

A integração do Brasil se completa com os trabalhos realizados por Rondon na área de comunicação, na Comissão Construtora de Linhas Telegráficas, responsável pela ligação entre pontos muito distantes, considerando-se as dificuldades da época, como Franca a Uberaba, Goiás a Cuiabá.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as gerações de hoje não têm condições de avaliar corretamente o trabalho gigantesco realizado pelo Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon em benefício do Brasil, pois um trabalho iniciado em fins do século XIV é inimaginável por quem desfruta dos confortos da civilização moderna.  

O Brasil da época de Rondon – especialmente, o Brasil redescoberto por Rondon – era um país sem estradas, sem comunicações, sem grandes recursos médicos, com os perigos e as doenças da selva, o que comprova a têmpera forte e o espírito decidido do nosso grande desbravador, um homem sem medo.  

Rondon foi um dos raríssimos brancos a receber a maior homenagem póstuma indígena: o Quarup, comemoração religiosa dos índios do Alto Xingu, que representa a passagem do espírito do morto para a aldeia celeste ou o retorno à vida em outra dimensão.  

A homenagem do Quarup a Rondon não é uma mera conseqüência de ele ter sangue terena e bororo, por parte da avó materna, e dos índios guanás, por parte da avó paterna, mas decorrência do respeito e dos fortes laços de amizade com os povos indígenas, que tanto amou, defendeu, protegeu e preservou.  

O Serviço de Proteção ao Índio (SPI) – criado por Rondon, em 1910, e depois transformado na Fundação Nacional do Índio (Funai) –, é uma demonstração da sua preocupação com aquilo que hoje chamamos de direitos humanos: acima de tudo, a proteção dos mais fracos da sociedade.  

A diferença essencial é que hoje assistimos a muitas palavras e a poucos atos em termos de direitos humanos: no mundo inteiro, entre países chamados desenvolvidos e não-desenvolvidos, a cada instante são praticados graves atentados aos direitos humanos.  

Rondon foi também um pioneiro mundial no campo dos direitos humanos, não meramente com palavras vazias ou retórica a ser negada na prática. Rondon foi exemplo para o mundo desenvolvido e foi reconhecido por entidades internacionais por seu trabalho, que deveria ser imitado em matéria de política indigenista.  

O lema de Rondon – "Morrer, se preciso for. Matar, nunca!" – ultrapassa em muito a própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada quase maio século após o início dos trabalhos de Rondon.  

Sr. Presidente, Srªs Senadores e Srs. Senadores, 2.270 km de linhas telegráficas estendidas em regiões até então desconhecidas e inóspitas;; 50.000 km de trilhas; o estabelecimento de mais de 200 coordenadas geográficas; o registro, em mapa, de 12 rios desconhecidos e descobertas no campo da Botânica são grandes realizações de Rondon.  

A obra de Rondon, no entanto, ultrapassa todas essas realizações materiais, sociais e culturais, que contribuíram para nosso desenvolvimento como Nação soberana e independente. A obra maior de Rondon se situa num universo mais amplo e insuperável: seu maior legado é no campo ético e moral, um legado que, efetivamente, supera o tempo e as gerações, como o símbolo do homem que supera os limites estreitos do egoísmo e das fraquezas humanas.  

No Brasil de hoje, vemos tantos exemplos de falta de dignidade, de falta de respeito pela vida humana, de falta de respeito ao patrimônio cultural, econômico e moral de nossa gente. E o desaparecimento de Rondon tornou nosso Brasil mais pobre e vulnerável no campo ético e moral, pois a falta de ética na condução dos assuntos públicos vem tornando nosso País um exemplo de falta de fraternidade, de dignidade e de respeito ao ser humano.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o saudoso Senador e antropólogo Darcy Ribeiro, discípulo e continuador do trabalho de Rondon junto aos índios, assim se expressa sobre os últimos dias de Rondon: "Em sua última viagem a Mato Grosso, Rondon fez uma visita ao velho Cadete, chefe dos índios Bororo.  

Foi um encontro singular de amigos que se conheciam há mais de sessenta anos, desde quando Rondon, no princípio de sua carreira militar e indigenista, chamou ao nosso convívio os Bororo de Garças. Os dois velhos tomaram-se as mãos e, meio abraçados, falaram longamente na língua daqueles índios. A certa altura, Rondon voltou-se para alguém que o acompanhava e comentou: "Sabe o que ele está dizendo? Aconselha-me a vir morrer aqui, porque, diz ele, estando velho, não durarei muito e só os Bororo saberiam fazer o meu enterro". Continua Darcy Ribeiro: "acompanhei os funerais de Rondon no Rio, sei das homenagens que lhe foram prestadas em todo o País e como a notícia de seu falecimento repercutiu nas aldeias indígenas. O Brasil o perdeu consciente de que perdia a personalidade mais enérgica e mais generosa que nosso povo jamais produziu."  

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL-RR) - V. Exª me concede um aparte?  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Com muito prazer ouço o aparte do Senador Mozarildo Cavalcante.  

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL-RR) - Senador Jonas Pinheiro, quero cumprimentá-lo pelo brilhante pronunciamento em homenagem ao Marechal Rondon que, sem dúvida, é um exemplo de defensor e protetor dos índios deste País. Não tenho dúvida que o Serviço de Proteção ao Índio, por ele criado, foi um exemplo a ser seguido pela Funai. Ao contrário do SPI, a Funai tem desservido os índios. Temos ouvido recentemente inúmeras notícias: uma, do

Jornal Nacional, dá conta que mais da metade da população Ianomâmi está acometida de malária, sem falar na oncocercose; outra, do SBT, noticiou que tribos indígenas no Maranhão estão plantando e comercializando maconha, uma demonstração cabal do descaso a que a Funai relegou os índios brasileiros. Portanto, é tão oportuna a homenagem que V. Exª faz ao Marechal Rondon que serviria mesmo como chamamento à razão para que a Funai pudesse dar uma nova realidade a seus trabalhos ou, como já propus nesta Casa, que esta fundação seja transformada numa nova Secretaria Nacional de Assunto Indígenas do Ministério da Justiça. Muito obrigado pela oportunidade do aparte.  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Agradeço, nobre Senador Mozarildo Cavalcanti, e incorporo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.  

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, não temos dúvida de que sem o trabalho obstinado de uma personalidade forte e marcante como o Marechal Rondon, o índio não mais existiria no Brasil. "Morrer, se preciso for. Matar, nunca", o lema que norteou permanentemente o trabalho de Rondon em seus contatos como nossos irmãos indígenas.  

Todos nós que temos compromissos públicos com o bem-estar do povo brasileiro precisamos, numa homenagem efetiva à memória de Rondon, continuar sua luta em defesa do Brasil, da nossa cultura, dos nosso índios, do nosso patrimônio e, principalmente, em defesa da ética em todos os campos da vida nacional.  

Apesar dos falsos ídolos fabricados pelos meios de comunicação que, aparentemente, ofuscam ou relegam a segundo plano aqueles que realmente merecem o respeito da nação, homens da estatura moral de Rondon permanecerão ao longo dos séculos.  

O povo brasileiro, bom e afável em sua origem, como o nosso índio, saberá fazer a escolha certa entre o joio e o trigo, entre o bem e o mal, entre o falso e o verdadeiro.  

No futuro, muito coisa desaparecerá; mas não a bondade, o amor ao próximo, o patriotismo, a coragem e os valores morais de homens como o Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.  

O Sr. Amir Lando (PMDB-RO) - Senador Jonas Pinheiro, V. Exª permite um aparte?  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Com muito prazer, eminente Senador representante do Estado de Rondônia, unidade da Federação cujo nome se origina do nome Rondon.  

O Sr. Amir Lando (PMDB-RO) - Nobre Senador, V. Exª traça hoje um perfil dessa grande figura brasileira que foi o Marechal Cândido Rondon. Senador Jonas Pinheiro, temos de render o nosso reconhecimento a esses heróis que construíram grande parte do Brasil. Eu tive ainda a chance de ler algumas correspondência do Marechal Cândido Rondon - poderia tê-las trazido à colação hoje - a figuras de Rondônia, como foi o ex-governador Aloisio Webber. Essas cartas estão prenhes de nacionalismo, de amor à terra, de amor ao Brasil. Já quando os anos se avantajavam, ele mantinha a mesma chama de ideal de um jovem que queria sempre ver crescer e engrandecer o Brasil. Os seus projetos, as idéias expressas nesses mais de 20 documentos é uma lição de brasilidade, uma lição que temos de reverenciar. Um povo que não cultua seus heróis e seu passado é um povo destinado a perder sua própria história. Quem perde sua história perde sua razão e a própria existência. Por isso, quando V. Exª homenageia essa grande figura que deu o nome ao meu Estado de Rondônia, nada mais justo, neste singelo aparte, do que parabenizar V. Exª por ter trazido à memória deste Senado a grandeza de um homem que, mais que Rondônia, abraçou, com seu ideal, com sua vontade, a Amazônia inteira. Muito obrigado pelo aparte.  

O SR. JONAS PINHEIRO (PFL-MT) - Muito obrigado, Senador Amir Lando.  

Devo reconhecer que o Marechal Cândido Rondon, que nasceu em Mimoso, filho de D. Claudina, tem seu nome até hoje reverenciado naquela terra. A imagem do Pantanal Mato-Grossense, bem pertinho da Baía de Chacororé, depois de amanhã, dia 05, estará em festa.  

Esteve em Mimoso, há poucos dias, o Ministro do Esporte e Turismo, Rafael Greca, para reverenciar Marechal Cândido Rondon. A Câmara Municipal de Santo Antônio do Leverger reúne, todos os anos, do dia 05 de maio, naquela localidade, e, portanto, depois de amanhã, mais uma vez o Município de Santo Antônio do Leverger, por intermédio de sua Prefeita, seu Vice-Prefeito e Vereadores, estarão prestando uma justa homenagem a esse grande homem brasileiro.  

Que os brasileiros e o Brasil, Sr. Presidente, não esqueçam as lições do Marechal Rondon, o qual, mais do que ninguém, mereceria ter recebido o Prêmio Nobel da Paz, como exemplo de honra e trabalho para o mundo, que necessita cada vez mais de ética e espírito público.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/1999 - Página 9938