Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A MATERIA VEICULADA PELO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, DO DIA 13 DE JUNHO ULTIMO, SOBRE O INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL - IEDI, INTITULADA 'IEDI COMPLETA 10 ANOS COM SENTIMENTO DE FRUSTRAÇÃO'.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA. POLITICA PARTIDARIA.:
  • COMENTARIOS A MATERIA VEICULADA PELO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, DO DIA 13 DE JUNHO ULTIMO, SOBRE O INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL - IEDI, INTITULADA 'IEDI COMPLETA 10 ANOS COM SENTIMENTO DE FRUSTRAÇÃO'.
Aparteantes
Edison Lobão, Ernandes Amorim, Lauro Campos, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 29/06/1999 - Página 17280
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • DEBATE, NECESSIDADE, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS, MANUTENÇÃO, ESTABILIDADE, MOEDA.
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, IMPRENSA, EUGENIO STAUB, INDUSTRIAL, PRESIDENTE, ENTIDADE, ESTUDO, DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL, CRITICA, POLITICA INDUSTRIAL, GOVERNO.
  • EXPECTATIVA, ORADOR, ATENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLITICA SOCIAL, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • CRITICA, POLITICA PARTIDARIA, LOBBY, NOMEAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, PREJUIZO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - V. Exª está sugerindo que ao invés de ter benevolência com uns, tenha benevolência com vários.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Com todos.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, há um debate instalado no País sobre a retomada do crescimento, do desenvolvimento econômico. Cumprida boa parte da agenda que visava a estabilizar a economia e corrigir o processo inflacionário, há uma expectativa de que o País volte a crescer. E voltando a crescer o País, há a esperança de mais emprego, de aumento da atividade econômica e, conseqüentemente, de um cenário de mais felicidade, de mais progresso social do povo brasileiro. No meio dessa discussão, muitos têm se posicionado ora para defender abertamente a retomada do desenvolvimento, ora para vinculá-lo a uma política financeira que tem por objetivo manter baixas taxas de inflação, portanto, preservando o valor da moeda e, conseqüentemente, o equilíbrio da nossa economia.

Nesses dias, em função da comemoração dos dez anos do Iedi - Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial -, falando em nome desse Instituto, o industrial Eugênio Staub, seu Presidente, declarou-se frustrado com os índices que o País tem alcançado ao longo desses dez anos de fundação do Iedi.

A Folha de S.Paulo de domingo, 13 de junho, trazia uma matéria sob o título “O Iedi completa 10 anos com sentimento de frustração”. Em alguns tópicos de uma entrevista concedida pelo Presidente do Instituto, Sr. Eugênio Staub, pode-se ler o seguinte: “Fundado em 15 de maio de 1989 por 30 empresários industriais, o Iedi conta hoje com um conselho composto por 45 membros”.

Sobre a função do Iedi, dizia o Sr. Eugênio Staub “que é continuar, democraticamente, a cutucar o Governo e a influenciar os políticos, porque uma revolução não está na nossa agenda. Queremos contribuir para o País encontrar o seu caminho”.

E fala sobre a sua relação com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Diz ele: ”O Presidente Fernando Henrique Cardoso nos trata sempre com muito carinho, mas isso não quer dizer que implemente nossas sugestões. Eram 14 propostas fundamentais. De acordo com um balanço que fizemos recentemente, 30% delas estão em implantação. A principal, a mudança da política cambial, foi implantada, embora de forma atrapalhada.” E por aí segue.

O que o IEDI esperava para a economia brasileira, ou espera, porque o seu documento de constituição continha 21 itens que deveriam estar presentes no Brasil de 2010? Quais eram esses itens?

1) O País é uma democracia pluralista, com Partidos Políticos fortes e de ideais bem definidos;

2) Tem em torno de 200 milhões de habitantes e uma taxa moderada de crescimento populacional;

3) Inserido no mundo desenvolvido, está entre as cinco maiores economias do mundo, com renda per capita superior a US$5 mil;

4) Existem grupos privados nacionais eficientes e fortes, inclusive multinacionais brasileiras;

5) A fome e a miséria foram erradicadas como conseqüência da boa distribuição de renda;

6) O regime econômico é baseado na livre iniciativa, com liberdade cambial e de fluxos de capitais;

7) O corporativismo e os cartórios foram eliminados e não existe mais a socialização dos prejuízos;

8) O sistema produtivo é participativo. Existe ambiente de ampla negociação nas relações entre capital e trabalho.

9) O Governo é forte, de tamanho reduzido, eficiente e sua ação voltada para os interesses coletivos;

10) Na área econômica, o Governo exerce funções normativas e reguladoras de forma democrática, transparente e não casuística;

11) A justiça é soberana, eficiente, eficaz e ética;

12) A sociedade dá grande importância aos valores éticos, à família, ao indivíduo, ao trabalho e à criatividade, ao respeito pelas crianças, idosos e minorias;

13) A qualidade de vida alcançou níveis comparados aos de outros países desenvolvidos, destacando-se níveis elevados nas áreas da saúde, habitação, saneamento básico, alimentação, equilíbrio ecológico e segurança;

14) A educação é de acesso a todos. O ensino privado convive com o ensino público;

15) A infra-estrutura de comunicação, de transporte, de distribuição de energia é moderna e eficiente;

16) A indústria é competitiva, interna e internacionalmente, fabricando produtos de qualidade com elevada produtividade;

17) O país é um importante produtor e exportador de alimentos. A agricultura apresenta elevada produtividade;

18) O país tem alta capacitação tecnológica, é importante criador de tecnologia e não impõe barreiras às suas importações;

19) Há razoável equilíbrio regional provocado pela descentralização industrial e urbana;

20) A moeda é estável e forte;

21) O País está em contínua evolução econômica, social e política, e reina confiança na sociedade.

Diante dessa visão que o IEDI tinha do Brasil no ano 2010 - e esse documento que acabei de ler foi escrito em 1989 -, verifica-se uma evidente e muito grande distância entre o Brasil de hoje, o Brasil real, e o Brasil ideal, pintado para o ano de 2010...

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Agora entendi, é o Brasil pintado, desculpe-me.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - O que nós desejamos mostrar com isso , Senador Ernandes Amorim - e o fazemos aqui nesse documento que solicitamos à assessoria do Senado -, é uma comparação entre o Brasil na década de 90 e o Brasil da década de 80, por muitos chamada de década perdida. Eu diria que ela pode até ter sido perdida do ponto de vista econômico, mas foi importantíssima do ponto de vista político, porque marcou a reconciliação dos brasileiros com o processo de redemocratização e com a promulgação da nova Constituição. Assim, se ela foi perdida do ponto de vista econômico, foi da maior importância do ponto de vista político.

Alguns desses dados mostram que o País evoluiu bastante ao longo desses anos, razão pela qual a forma como foi apresentada a manifestação do IEDI e a resposta do Presidente Fernando Henrique Cardoso pode - parece-me - levar à conclusão de que ambas as partes estão com a razão. O IEDI anuncia, aponta e registra a sua insatisfação com esse cenário que havia sido tratado e o Presidente desqualifica aqueles que desejam o retorno de processos na economia absolutamente incompatíveis com a sociedade livre, globalizada, de grandes relações internacionais, que pensamos deva ser o Brasil de hoje.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Concedo o aparte do Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL-MA) - Meu caro companheiro, penso que essa prospectiva do IEDI ainda está modesta em relação a um documento semelhante elaborado pela ONU, também no final da década de 80, em que previa que, no ano 2010, o Brasil seria a terceira maior economia do mundo, depois dos Estados Unidos e da China. O documento que V. Exª acaba de ler estabelece uma perspectiva de quinta economia. Na verdade essa parece ser a solução ideal, o cenário ideal para o Brasil e para a sociedade brasileira. Uma sociedade com esses indicadores só teria que se regozijar por tudo quanto já tivesse alcançado no que diz respeito ao desenvolvimento da economia e ao bem-estar do povo. Ainda ontem examinava um documento, segundo o qual na China existem, hoje, cerca de 24 mil joint-ventures com os Estados Unidos e apenas um com o Brasil. Veja que diferença extraordinária. Precisamos ser um pouco mais ousados, precisamos avançar mais. O documento é importante como balizador, como uma lanterna na popa, como diria Roberto Campos, mas é preciso que cada qual de nós faça também sua parte e acredite neste País, como eu acredito e como certamente V. Exª acredita.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Senador Edison Lobão, V. Exª, com isso, frisa a necessidade de o País se articular melhor - talvez no cenário internacional - e ser mais ousado, com atitudes que permitam o crescimento de nossa economia nesse contexto em que vivemos. O que houve entre o lançamento desse documento do IEDI, em 1989, e os dias de hoje, foi um fato novo e importante: a globalização. E vamos verificar que estamos presos em uma espécie de armadilha. Por quê? Fizemos a estabilidade da economia e vivemos em um regime sem inflação. Esse é o maior capital do Presidente Fernando Henrique. As vitórias que Sua Excelência teve na primeira e segunda eleições estão, sem dúvida, repousadas nesse clima de segurança, de estabilidade econômica, porque antes vivíamos aos sobressaltos, com os preços disparando todos os dias, e a economia sendo corroída pelo processo inflacionário.

As pesquisas de opinião, recentemente publicadas pela imprensa, mostraram que já existe uma espécie de descolamento entre a imagem do Presidente e o Plano Real. Quer dizer, a taxa de aceitação do Plano Real é muito superior à aprovação do Governo, ou da figura do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Isso apenas confirma o que outros já disseram antes: o Plano Real é importante, a população o apoiou e está satisfeita, mas duas coisas têm de ser ditas: primeiro, o Presidente não tem mais o direito autoral do Plano Real, o Plano Real caiu no domínio público; segundo, não nos resta essa estabilidade, porque ela também veio acompanhada de efeitos indesejáveis: o desemprego, a falta de crescimento econômico, os problemas que os empresários sofrem, a competitividade, a abertura das nossas barreiras comerciais e, portanto, o grande aumento da importação. Há, pois, a necessidade de engenho para conciliar essa estabilidade com algum crescimento.

Dados recentes mostram o grande aumento da pobreza na Argentina em função de todas essas medidas na economia, nos dois governos do Presidente Menem. Mas, por outro lado, no meio de todas essas dificuldades, o governo argentino determinou aos bancos privados, mediante acertos nessas questões de compulsório e recolhimento ao Banco Central, que refinanciassem todas as empresas que devessem até US$200 mil. Sem dúvida nenhuma, trata-se de uma medida que busca revitalizar a economia, porque empresas que devem até US$200 mil são pequenas e médias.

Creio que o Presidente Fernando Henrique legitimará seu segundo mandato com políticas sociais, e não há política social melhor e mais necessária que aquela que propicie emprego. O Governo deve lançar-se nesse novo campo.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Lúcio Alcântara, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Se ouso interrompê-lo, é para concordar em gênero, número e grau com as suas observações. Não há dúvida alguma de que o Plano Real já atingiu a maturidade no seio da sociedade brasileira. Toda a sociedade brasileira aplaude o Plano Real. Todavia, temos de admitir que ele teve aspectos negativos que precisam ser corrigidos. Até determinado momento, tudo foi bem; mas, agora, os dados mostram o número estarrecedor de dez milhões de desempregados no nosso País. Para solucionar esse problema, V. Exª tem razão, é preciso haver a retomada para o desenvolvimento. Daí a nossa pregação, desde que chegamos ao Senado, de que essa retomada do crescimento seja feita a partir do interior. É importante salientar isso, porque estamos concentrando muitos recursos na região Sudeste do Brasil. Estão reunidos, no Rio de Janeiro, toda a América Latina e alguns países europeus para discutir a economia, e a maior discussão que devemos fazer refere-se às barreiras que os países europeus e os países mais desenvolvidos colocam com relação aos produtos agrícolas do Brasil. A agricultura, âncora do Real, vem sendo amplamente sacrificada. Se o Governo der incentivos à agricultura - e está na hora de adotarmos mecanismos de defesa da empresa nacional -, sem dúvida, estou com aqueles que ainda têm a mais viva esperança no nosso País. Cumprimento V. Exª pelo oportuno pronunciamento.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Esse encontro de cúpula, com Presidentes, Chefes de Estado e Governo, no Rio de Janeiro, é de certa maneira alvissareiro, à medida que estamos abrindo uma pequena brecha naquela defesa monolítica, intransigente, que a União Européia fazia dos seus produtos e principalmente dos produtos agrícolas, como que nos tirando qualquer chance de competir e exportar para aqueles países.

Duvido que esse sistema de internacionalização da economia, de globalização, a palavra mais utilizada, gere condições ou estabeleça premissas, possibilidades de países ascenderem no ranking geral de desenvolvimento. Se fizermos uma rápida rememoração, será muito difícil apontar, nos últimos anos, um país que tenha rompido a barreira do subdesenvolvimento para se integrar aos países do Primeiro Mundo.

O Presidente Menem enviará um expediente a um organismo internacional ou à ONU, dizendo que a Argentina se considera país de Primeiro Mundo, abrindo mão de recursos que normalmente as instituições multilaterais e internacionais destinam aos países em desenvolvimento, por intermédio do PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, e outros. Será a primeira vez que um país vai passar de um mundo para outro mediante um ofício do Presidente da República.

Sr. Presidente, afinal essa globalização vem para cristalizar situações assimétricas dessas economias ou representa realmente uma nova esperança para esses países? Nesse momento, estamos sentindo a dificuldade em conciliar o desenvolvimento com a estabilidade da moeda. Esse é o nosso grande desafio. Sem isso, não seremos nunca um País com um povo próspero e feliz, um País que realize o seu grande destino, ainda que as taxas de inflação sejam muito baixas.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Antes de expor meu ponto de vista, declaro a minha admiração por V. Exª, por seu comportamento, pela sua capacidade de trabalho e por seu discernimento. Hoje, infelizmente, a minha vida não permite concordar com alguns pontos que expõe. Em 1954, fui professor de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais - dedicação exclusiva, tempo integral. Naquela ocasião, era moda essas discussões de hoje. A inflação era indispensável - aquele sopro inflacionário a que Keynes se referia e que Raul Prebisch e seus discípulos, na América Latina, consideravam essencial para o desenvolvimento. Alguns diziam que, sem inflação, não havia desenvolvimento; outros optavam pela estabilidade, pelo equilíbrio orçamentário e, portanto, achavam que a inflação perturbava essa estabilidade. Em 1958, fiz um curso sobre desenvolvimento econômico na Itália e fui aluno de vários eminentes mestres, como Claudio Napoleoni, Rosenstein Rodan e outros, cujas teorias desenvolvimentistas eram um pouco diferentes umas das outras. Mas, por exemplo, Rosenstein Rodan, chefe do planejamento da Inglaterra para as colônias, criou a teoria do big push, que sugeria que, sem grandes quantidades maciças de investimento público, não se poderia conseguir o desenvolvimento e que somente investimentos públicos em pequenas doses não resolveria o problema. E apontava diversos exemplos, no Chile, no Brasil, etc, de coisas que não tinham dado certo porque o Governo não tinha acertado no calibre dos seus investimentos, dos seus gastos, ocasionadores, obviamente, de desequilíbrio orçamentário. Ainda nos anos 50, depois de estudar bastante, comecei a discordar de alguns aspectos desse desenvolvimentismo e colocava no quadro para meus alunos uma frase não de um economista, mas de um sociólogo do conhecimento: “Todo conceito”, dizia Karl Mannheim, “representa uma espécie de tabu diante da pluralidade de sentidos e, por isso, unifica e simplifica a vida em proveito da ação”. O desenvolvimento econômico é um tabu, tal como o pleno emprego, que é colocado para unificar e simplificar a vida em proveito da ação. As pessoas se engajam no desenvolvimento econômico, os trabalhadores, os capitalistas e os comerciantes, sem perceberem que ele significa enriquecimento para uns e empobrecimento para outros.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - E qual é a alternativa?

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - O desenvolvimento econômico significa, dentro da nossa sociedade, em nosso contexto, obviamente, o aumento da dívida pública, do déficit orçamentário, que ficam escondidos, não são mostrados para não atrapalhar a hipnose que esses conceitos têm de causar na sociedade. Na minha tese de concurso para catedrático, nobre Senador, toco nesses assuntos, e meu modesto posicionamento é o de que, na realidade, não é tabu; a palavra “Polinésia”, sagrada e profana, amada e odiada, não é essa dualidade que está presente nesses nossos conceitos de pleno emprego, de desenvolvimento, etc. Não, a nossa dualidade é capitalista. Não é “Polinésia”; é capitalista mesmo. Quer dizer, confundimo-nos e dizemos, por exemplo, que todas as sociedades devem tentar atingir o pleno emprego. O pleno emprego da mão-de-obra, maravilha! O significado aparente é maravilhoso. No entanto, o próprio Keynes fala de maneira um pouco escondida -- não pode ser muito claro -- que o pleno emprego só é alcançável com salário próximo de zero: “Zero or negative wage, we will ensure full employment continuously”. Salário zero ou negativo assegura o pleno emprego. Então, se a meta de uns é o pleno emprego, o destino de outros é salário zero ou negativo. O que vimos acontecer no Brasil foi outra coisa, ao contrário do otimismo, por exemplo, de Roberto Campos, que, quando tomou posse como Senador, disse que, no ano 2000, o Brasil seria tão grande, que dominaria, como os Estados Unidos faziam naquela ocasião, os países da América Latina e que escutaríamos do Paraguai, do Uruguai, etc. aquela mesma repulsa: “Brazilians, go home”. E nos encontramos, hoje, em nível semelhante ao dos nossos vizinhos. Muito obrigado, Senador.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Obrigado pelo aparte, Senador Lauro Campos. O discurso de V. Exª é enriquecedor, porque é fundamentado na teoria econômica. No entanto, em uma entrevista publicada ontem ou anteontem na Folha de S.Paulo, o Deputado Delfim Netto deixa os economistas muito mal, porque diz que toda previsão é chute -- eu chuto, tu chutas, ele chuta, nós chutamos -- e serve depois para demonstrar que o erro acabou por expor uma situação melhor do que aquela que tinha sido prevista.

Ainda gostaria de chamar a atenção de V. Exª -- já vou concluir, Sr. Presidente -- para o problema do desenvolvimentismo e de dizer que o difícil é justamente conciliar esse equilíbrio econômico, sem os males do déficit público, do endividamento, com o crescimento econômico.

Para uma sociedade como a nossa, que incorpora, anualmente, milhões de pessoas ao mercado de trabalho, é preciso criar oportunidade de trabalho.

Ouvia dizer muito que era necessário deixar o bolo crescer para dividi-lo depois. Hoje, não há bolo, e o número de pessoas que precisam da divisão aumentou muito. Então, é fundamental que esse ajuste se dê de modo a conferir uma face humana à política econômica do País. Esse é o nosso grande dilema.

Como os dados estão mostrando que o Presidente Fernando Henrique enfrenta dificuldades, por não estar conseguindo liderar um programa de crescimento e de desenvolvimento, penso que Sua Excelência terá que fazer tudo para que o seu segundo governo seja marcado por isso, sob pena de ficarmos “patinando” nessa política financeira de estabilidade, enquanto a situação do País se agrava pelo desemprego, pelo desequilíbrio das empresas, enfim, por todos esses elementos perturbadores a que estamos assistindo.

Por último, deveríamos libertar o Presidente Fernando Henrique Cardoso, para que compusesse o seu governo da maneira que julgasse conveniente. Estou dando, aqui, a minha opinião pessoal. Os Partidos políticos -- inclusive, o meu -- deveriam ter a grandeza de liberar o Presidente para fazer um novo Ministério; para escolher pessoas dentro dos partidos, mas exercitar plenamente o poder que lhe é dado pela própria Constituição, uma vez que os desentendimentos, a falta de sincronia nas ações dos partidos políticos terminam por comprometer a própria ação do Governo.

Ora, nós que pertencemos a partidos políticos que apóiam o Governo e temos, conseqüentemente, de ser os mais interessados -- tanto quanto todos os brasileiros, é verdade -- em seu êxito, devemos ter a compreensão para, neste momento, liberar o Presidente da República, a fim de que promova uma reorganização do Governo conforme considerar necessário.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Senador Lúcio Alcântara, V. Exª me permite um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Sr. Presidente Geraldo Melo, já esgotei o tempo e não quero abusar da generosidade de V. Exª. Ainda não sou um Pedro Simon, mas chego lá.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Senador Lúcio Alcântara, V. Exª já esgotou em oito minutos o seu tempo, mas, para equilibrar a benevolência da Mesa, sugiro que ouça o aparte do nobre Colega.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Ouço V. Exª, Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Senador Lúcio Alcântara, temos observado o movimento dos Partidos junto ao Governo Federal. Mandei elaborar um discurso -- que seria lido hoje, e o será possivelmente amanhã -- sobre a necessidade de os Partidos e parlamentares devolverem os cargos que ocupam ao Presidente da República, a fim de que Sua Excelência tenha as condições necessárias para realizar uma reforma e governar o País com autonomia. Na verdade, o que se vê é uma minoria dividindo o poder com o Presidente e, de resto, o Brasil prejudicado. Por isso, o conselho que gostaria de estender, neste momento, a quem ocupa cargos no governo é o de que os devolvam ao Presidente da República; assim, Sua Excelência se sentirá à vontade para realizar essa reforma. Muito obrigado.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Muito obrigado, Senador Ernandes Amorim. V. Exª vem apenas ao encontro da minha proposta. Creio que o Presidente deve libertar-se, com a compreensão e até com o apoio dos Partidos políticos de sua base, a fim de que reorganize o Governo com vistas a emprestar maior vigor, maior sintonia com a população e com o povo brasileiro na realização do seu destino e na reversão das condições absolutamente inaceitáveis em que ainda vive boa parte do povo brasileiro.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/06/1999 - Página 17280