Discurso no Senado Federal

JUSTIFICATIVAS A APRESENTAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE REGULAMENTA O PARAGRAFO 4 DO ARTIGO 40 DA CONSTITUIÇÃO, DISPONDO SOBRE A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA A SERVIDORES PUBLICOS, NOS CASOS DE ATIVIDADES EXERCIDAS EXCLUSIVAMENTE SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAUDE OU A INTEGRIDADE FISICA. IMPORTANCIA DO JULGAMENTO DOS SOLDADOS QUE PARTICIPARAM DA CHACINA DE ELDORADO DOS CARAJAS, QUE TERA INICIO NA PROXIMA SEMANA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL. DIREITOS HUMANOS. JUDICIARIO.:
  • JUSTIFICATIVAS A APRESENTAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE REGULAMENTA O PARAGRAFO 4 DO ARTIGO 40 DA CONSTITUIÇÃO, DISPONDO SOBRE A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA A SERVIDORES PUBLICOS, NOS CASOS DE ATIVIDADES EXERCIDAS EXCLUSIVAMENTE SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAUDE OU A INTEGRIDADE FISICA. IMPORTANCIA DO JULGAMENTO DOS SOLDADOS QUE PARTICIPARAM DA CHACINA DE ELDORADO DOS CARAJAS, QUE TERA INICIO NA PROXIMA SEMANA.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/1999 - Página 20256
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL. DIREITOS HUMANOS. JUDICIARIO.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, APOSENTADORIA, FUNCIONARIO PUBLICO, CONDIÇÕES DE TRABALHO, INSALUBRIDADE, PERICULOSIDADE, PENOSIDADE.
  • ANUNCIO, JULGAMENTO, SOLDADO, HOMICIDIO, SEM-TERRA, CONFLITO, MUNICIPIO, ELDORADO DOS CARAJAS (PA), ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), ISENÇÃO, CULPA, GOVERNADOR, SECRETARIO DE ESTADO, SEGURANÇA PUBLICA, COMANDANTE, POLICIA MILITAR, ESTADO DO PARA (PA), CRIME, VITIMA, SEM-TERRA, REPUDIO, PRIVILEGIO, DEPOIMENTO, AUTORIDADE, TESTEMUNHA.
  • EXPECTATIVA, AMPLIAÇÃO, JULGAMENTO, CRIME, DIREITOS HUMANOS, BRASIL.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou tratar de dois assuntos. Estou apresentando, neste instante, um projeto de lei que regulamenta a aposentadoria de todos os funcionários públicos que trabalham em autarquias, sejam federais, estaduais ou municipais, sob condições insalubres, penosas ou perigosas. Entendo estar fazendo justiça ao propor uma maneira toda especial de promover a sua aposentadoria.  

Essa aposentadoria estava prevista no § 1°, do art. 40 da Constituição de 1988. Na verdade, nós estamos apresentando este projeto com muito atraso. Entretanto não existe nenhum outro projeto na Casa ou na Câmara dos Deputados que trate dessa matéria. São, portanto, onze anos de profunda injustiça que nós, Parlamentares, fizemos com todos os funcionários públicos do nosso País, que trabalham sob condições penosas, insalubres ou perigosas.  

A emenda que modificou a Previdência Social manteve essa condição no parágrafo 4º do art. 40 - anteriormente ela estava no parágrafo 1º do art. 40 -, de forma que cabe prontamente uma regulamentação por parte desta Casa, porque os funcionários públicos, de uma maneira geral, foram tão penalizados, culpados de todas as desgraças e de todas as calamidades - estão, inclusive, há cinco anos sem aumento - mas, felizmente, foi mantido esse ponto na reforma previdenciária.  

O parágrafo 4º do art. 40 determina que: "É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para concessão de aposentadorias aos abrangidos pelo regime de que trata o artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar."  

Assim, estou apresentando um projeto de lei complementar, que trata especificamente dos funcionários públicos federais, estaduais e municipais que trabalham sob essas condições.  

Quero ressaltar que os trabalhadores da iniciativa privada, no regime geral de previdência social, já têm garantido esse direito a uma aposentadoria com menor tempo de serviço - alguns, com 25 anos; outros, com 20 anos e há casos até com 15 anos. Então, se esse direito existe e está sendo respeitado no que se refere aos trabalhadores da iniciativa privada que integram o regime geral de previdência social, não há por que não o fazer também com relação aos funcionários públicos. É isso que estamos fazendo neste momento. Este Projeto tem três anexos que tratam da classificação dos agentes nocivos à saúde e, em cada um desses agentes, é determinado o tempo de aposentadoria. Ele repete, em grande parte, aquilo que já funciona no regime geral de previdência social.  

Agradecemos à assessoria da Casa e a nossa própria assessoria pela elaboração de um trabalho tão bem fundamentado e tão bem detalhado sobre a matéria. Espero que nós possamos corrigir essa lacuna que existe na legislação brasileira e fazer justiça aos funcionários públicos brasileiros que trabalham sob condições perigosas, permitindo a eles o mesmo direito dos outros trabalhadores, ou seja, uma aposentadoria com menor tempo, devido às condições em que trabalham. Espero ter o apoio dos Parlamentares no Senado Federal, na Câmara dos Deputados e a sanção do Presidente da República.  

Um outro assunto de que quero tratar, Sr. Presidente, é o julgamento que se iniciará na próxima segunda-feira - e contará, inclusive, com a presença do Ministro da Reforma Agrária e do Presidente do INCRA - dos soldados que participaram da chacina de Eldorado dos Carajás, quando, há cerca de três anos, exatamente no dia 17 de abril, houve um confronto entre policiais militares e trabalhadores rurais sem-terra, do qual resultou a morte de 19 trabalhadores.  

Em primeiro lugar, ressalto a importância desse julgamento. Creio que é um ponto positivo, apesar de tanto tempo, julgar aqueles que cometeram crime contra trabalhadores rurais. Penso que é uma ação positiva do Judiciário do meu Estado efetivar esse julgamento. Entretanto, eu gostaria que os criminosos da chacina de Corumbiara, ocorrida em Rondônia, também fossem julgados, assim como os criminosos da chacina que ocorreu no Governo de São Paulo, quando era Governador Luiz Antônio Fleury Filho. Cento e cinqüenta e seis detentos foram assassinados na invasão de um presídio, e até hoje os culpados não foram punidos por terem cometido um crime tão violento, tão bárbaro contra os direitos humanos.  

Eu gostaria que as chacinas do nosso País tivessem uma conclusão e um julgamento, como está acontecendo no Estado do Pará.  

Porém, ressalvo um erro do Judiciário. Na verdade, houve evidentemente um confronto. Deve ter havido excessos da Polícia Militar, o que resultou na morte de 19 trabalhadores rurais, mas há responsáveis maiores por esse confronto. Os responsáveis maiores são o Governador do Estado do Pará, Almir Gabriel; o Secretário de Segurança, Sette Câmara, e o próprio Comandante da Polícia Militar. Afinal de contas, foram esses senhores que deram as ordens para que a Polícia Militar do Pará tirasse, a qualquer custo e por qualquer meio, os trabalhadores que estavam obstruindo uma rodovia no Pará. A obstrução era a necessidade que esses trabalhadores tinham de transporte e de alimentação para chegarem até a capital do nosso Estado e concretizarem as suas reivindicações. Houve aí uma determinação do Governador no sentido de que esses trabalhadores fossem retirados de qualquer maneira. Isso aconteceu, e o resultado gerou a morte de 19 pais de família.  

Lamentavelmente, o Superior Tribunal de Justiça isentou de culpa o Governador do Estado, o Secretário de Segurança Pública, que ainda é o mesmo, e o próprio Comandante da Polícia Militar à época.  

Ora, considero que esses fatos acontecem porque, no Brasil, somente quem paga são os pequenos. Só há julgamento, só há cadeia, só há prisão para aqueles que realmente são pobres. Os ricos e os poderosos não chegam até a cadeia; se chegam, saem dela em muito pouco tempo.  

Lamento profundamente - e aqui quero criticar - que o julgamento esteja sendo realizado apenas para os soldados que participaram daquela chacina e daquele confronto. Entendo que é uma tremenda injustiça não estarem também no banco dos réus o Governador do Pará, o Secretário de Segurança Pública e o Comandante da Polícia Militar do Estado. Pior ainda é que o julgamento é público e, como manda a lei, em um julgamento público a população tem o direito de participar e de assistir. Os advogados de defesa e de acusação arrolaram o Governador do Estado como testemunha nesse julgamento, que, no meu entendimento, deveria estar no banco dos réus. E o que entendo como mais absurdo é que o Judiciário do meu Estado concedeu o direito ao Governador de ser ouvido na sua residência oficial. Quer dizer, o Presidente do Tribunal, os jurados, os advogados e os promotores vão ter que se deslocar até a casa do Governador do Estado para ouvi-lo, e o público não poderá assistir à participação do atual Governador.  

Em nenhum momento - não quero ser radical especificamente em relação ao Governador - creio que ele teve a intenção de que ocorressem as mortes no confronto. Mas não se pode eximir a sua responsabilidade no sentido de que, como Chefe de Estado e como um homem que deveria ter preparo para comandar, poderia prever o que aconteceria. Sabendo que os ânimos estavam exaltados e que aqueles policiais militares do Pará não têm preparo para esse tipo de enfrentamento, simplesmente mandou que retirassem os trabalhadores de qualquer maneira. Não quero culpá-lo por antecedência, mas creio que é um erro do Judiciário deixá-lo fora do julgamento.  

Condeno ainda mais agora o erro de fazer com que ele, sendo chamado como testemunha, faça com que o júri se desloque para ouvi-lo, e o julgamento seja realizado na sua casa. Isso é um privilégio que contradiz a lei e um privilégio inaceitável, no nosso ponto de vista.  

Queremos deixar a nossa manifestação, o nosso posicionamento contrário a essa concessão feita pelo Judiciário do Estado do Pará. Mas espero que o julgamento transcorra normalmente, que as culpas sejam realmente efetivadas, que os criminosos sejam punidos e que, no futuro, aconteça o que está acontecendo hoje, quando se reabriu o inquérito do caso Rio Centro. Dois militares, a mando das Forças Armadas, pretendiam explodir uma bomba naquele ato que falava em democracia, na luta pela democracia no nosso País. E a bomba explodiu no colo de um dos militares.  

Na época, as Forças Armadas concluíram o inquérito dizendo que o cidadão que estava com a bomba que explodiu no seu colo sofreu um atentado da Esquerda. Imaginem os senhores! Mas, na época, foi exatamente isso o que aconteceu.  

Passados vários anos, o inquérito está sendo reaberto, e os culpados, evidentemente, haverão de pagar por aquele crime. É o que espero, no futuro, com relação à questão do julgamento que está ocorrendo no Estado do Pará; que não apenas os PMs, que entraram naquele confronto e que terminaram assassinando 19 trabalhadores, paguem pelo crime, mas que também aqueles que o ordenaram tenham a sua parcela de responsabilidade determinada pela Justiça. É essa a nossa expectativa, senão agora, pelo menos no futuro.  

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Pausa)  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/1999 - Página 20256