Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A PREOCUPANTE SITUAÇÃO DA AGRICULTURA BRASILEIRA.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A PREOCUPANTE SITUAÇÃO DA AGRICULTURA BRASILEIRA.
Aparteantes
Arlindo Porto, Blairo Maggi, Carlos Patrocínio, Maguito Vilela, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 18/08/1999 - Página 20486
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, MOVIMENTO TRABALHISTA, MARCHA, PRODUTOR RURAL, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), REPUDIO, SITUAÇÃO, DIVIDA, PREJUIZO, MOTIVO, PLANO, GOVERNO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, TRANSFERENCIA, RENDA, AGRICULTURA, MERCADO FINANCEIRO.
  • CRITICA, FALTA, DEFINIÇÃO, ESTABILIDADE, POLITICA AGRICOLA, INEFICACIA, SEGURO AGRARIO, AMEAÇA, PRODUÇÃO.
  • APOIO, REIVINDICAÇÃO, PRODUTOR, GRÃO, COMENTARIO, DOCUMENTO, CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUARIA DO BRASIL (CNA), PROPOSIÇÃO, MELHORIA, FINANCIAMENTO, PRODUÇÃO AGRICOLA, OBJETIVO, AUMENTO, SAFRA.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres colegas, em primeiro lugar agradeço a gentileza do Senador José Jorge em ceder-me a palavra. Farei algumas considerações em relação ao movimento dos produtores rurais do Brasil, dos trabalhadores da terra, que ocorre em Brasília, antevendo votação a ser realizada amanhã, na Câmara dos Deputados. Trata-se de um movimento que brotou em todos os quadrantes do Brasil. Aqui se encontram produtores de todo o País, preocupados não apenas com suas vidas, de seus familiares e de seus amigos, mas com o futuro da produção nacional. Por isso, passo a tecer alguns comentários.

Brasília amanheceu ocupada por produtores rurais, no que já se convencionou chamar de “caminhonaço”. Alguns dizem que não é só “caminhonaço”: é “tratoraço”, é “patrolaço”, pois, além de caminhões dos produtores, também estão aqui tratores e equipamentos agrícolas. Trata-se de legítima manifestação de inconformismo e inquietação dos homens do campo, diante do alto custo financeiro que lhes foi imposto desde os primórdios do Plano Collor, quando os produtos agrícolas foram reajustados em cerca de 30% e os custos financeiros em mais de 70%, verificando-se uma defasagem superior a 40%.

A realidade hoje é mais dramática, pois somam-se aos prejuízos verificados naquela época as duras perdas sofridas pelos agricultores e pela agroindústria, em virtude do alto custo do dinheiro no Brasil, considerado pelos especialistas como dos mais onerosos de todo o mundo. Com efeito, decorridos mais de quatro anos desde o lançamento do Plano Real, os agricultores sofreram duplamente: de um lado, com o câmbio sobrevalorizado, que reduziu drasticamente a competitividade de seus produtos e, de outro, pelos juros situados em patamares intoleráveis.

Com isso, suas dívidas aumentaram de forma absurda enquanto seus ganhos foram contidos por imposição do novo programa econômico. Continuou-se a assistir, ao longo de todo esse tempo, a um perverso processo de transferência de renda da agricultura para o setor financeiro, que hoje apresenta os mais formidáveis lucros de toda sua história. Os estoques da dívida do campo aumentaram numa proporção que a margem de lucro auferida com a atividade rural não tem condições de alcançar.

A agricultura, nos tempos de bonança, foi eleita a “âncora verde” do Plano Real, quando seus produtos foram mantidos a baixos preços, ajudando o Governo a combater a inflação. E por que não dizer que foi a agricultura e a agroindústria que mantiveram a alta popularidade do Presidente da República, favorecendo sua reeleição para o cargo? Pelo menos o ajudou, e bastante. Disso tenho certeza, e ninguém discorda neste País. Foi uma época áurea, em que o frango e o iogurte transformaram-se em peças da propaganda governamental.

Como se vê, apesar de todo o sacrifício imposto ao homem do campo, ele deu respostas positivas às expectativas do Governo, quando este assim o quis. Entretanto, hoje a agricultura e a agroindústria estão a exigir uma contrapartida do Governo Federal, no que tange aos seus anseios por uma solução da crise que assola o campo, ameaçando a produção agrícola deste País.

Até hoje, o Brasil talvez seja um dos poucos países do mundo, em seu atual estágio de desenvolvimento, que não conhece uma política agrícola estável e claramente definida. A lentidão e a apatia com que o Governo tem tratado os problemas estruturais da agricultura são responsáveis pela inquietação que domina o campo, eliminando a possibilidade de transformar nosso País num dos grandes produtores de grãos do mundo.

Tornou-se lugar comum dizer que a agricultura é uma atividade de alto risco. Já é praxe essa afirmação. Os exemplos são os mais eloqüentes. Agora mesmo, com o inverno mais rigoroso nos Estados da Região Sul, Santa Catarina, por exemplo, sofreu fortes geadas que destruíram praticamente todas as plantações de pêssego e ameixa no Vale do Rio do Peixe. E o pior é que a atividade agrícola em nosso País não está amparada por um sistema eficaz de seguro, como se verifica em países competidores tais como os Estados Unidos, Canadá e a União Européia.

Vale a pena lembrar que, no dia 9 de junho último, a Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da Confederação Nacional da Indústria entregou ao ex-Ministro da Agricultura e do Abastecimento Francisco Turra a proposta do setor produtivo para o Plano Safra de Verão 1999/2000. Naquela proposta, estão contidas as reivindicações mínimas das entidades representativas do produtores agrícolas, com vistas ao atendimento da meta governamental de colher no próximo ano uma safra superior a 80 milhões de toneladas de grãos. Na sua elaboração, estiveram envolvidas as federações da agricultura, a Organização das Cooperativas Brasileiras e os próprios produtores.

Por estar de acordo com essas reivindicações e apoiá-las integralmente, faço questão de enumerá-las uma a uma, para que meus Pares nesta Casa também possam juntar seu apoio e sua voz, e assim encarecermos ao Governo que se sensibilize com elas e igualmente lhes dê guarida.

São conhecidas as 13 proposições que os produtores, por intermédio da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas, apresentam ao Governo para serem discutidas. Mencionam-se os juros, os valores para que se possam plantar, que não se faça doação de recursos, mas que se coloquem à disposição dos produtores esses valores, porque eles voltam ao Governo. Além disso, há o problema da armazenagem, a questão da criação de crédito rotativo num fundo que retorne a eles, para que não haja em toda safra a grande preocupação com a obtenção de recursos no momento oportuno, nem sempre possível. Em toda safra, há intranqüilidade. É preciso, “elevar os limites de financiamento por cultura”, para garantir o mínimo de tranqüilidade. Segundo a proposta deles, quando se planta, a produção deve ser dada como garantia.

O Pronaf, propalado e aventado pelos quatro cantos do País, não atende a todos os produtores - e deve-se exigir também que as instituições financeiras o faça.

Sr. Presidente, além desses aspectos, a soja hoje é fundamental e importante à economia brasileira. Não apenas o Sul deu início à plantação desse produto. O Centro-Oeste o produz em larga escala. Todavia, não há uma garantia mínima que ofereça uma certa tranqüilidade, a exemplo do que acontece nos Estados Unidos, onde não se admite que o produto chegue ao mercado internacional abaixo do mínimo estipulado, garantido pela sociedade americana, a fim de que o produtor não quebre. Aqui, porém, não há nada disso. A nossa agricultura ainda é de Terceiro Mundo, assim como outros setores da nossa economia.

O Sr. Maguito Vilela (PMDB-GO) - Permite-me V. Ex.ª um aparte, ilustre Senador Casildo Maldaner?

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Com muito prazer, eminente Senador e ex-Governador de Goiás Maguito Vilela.

O Sr. Maguito Vilela (PMDB-GO) - Senador Casildo Maldaner, cumprimento-o pelo brilhantismo do seu pronunciamento, aproveitando o momento em que milhares de agricultores reúnem-se em Brasília. É importante observarmos que esses agricultores brasileiros querem ajudar o Brasil, aumentando a produção agrícola. Eles precisam de ter o mínimo de segurança. V. Exª disse que os agricultores vivem a dar saltos no escuro todos os anos, por falta de uma política agrícola confiável. Todos nas cidades têm seguro, o agricultor nem isso. Se ele perde sua lavoura por excesso de seca, chuva ou fogo, está tudo perdido, tudo acabado. Nem seguro os agricultores brasileiros têm. Todos os países do mundo protegem sua agricultura e seus agricultores, o Brasil não. O Brasil escraviza aqueles que produzem alimentos neste País, os homens que queimam a pele no sol, que enfrentam a chuva, as cobras, os marimbondos, os juros altos e as estradas ruins. Os agricultores enfrentam tudo, trabalham dia e noite para colocar alimento na mesa dos brasileiros e são discriminados e, às vezes, ridicularizados pela imprensa, que não conhece o trabalho nem a vida do agricultor. Eles pedem ao Governo que os deixe trabalhar, que lhes dê condições para pagar suas dívidas. Temos de entender que não se pode matar a galinha de ovos de ouro deste País. A agricultura tem sustentado este País, são as exportações da soja. Ninguém fala que os insumos, os herbicidas subiram mais de 80%. E o Governo não tem o bom senso de atender, pelo menos, parte da reivindicação dos agricultores. É lógico que, se as coisas estivessem bem, eles não estavam aqui. Aliás, o agricultor não gosta de aparecer nas cidades. Ele fica enterrado no campo, comendo poeira ou atolando na lama até de madrugada. Ele vem aqui por não suportar mais a vida que leva. O Governo voltou a importar leite em pó, para sacrificar mais ainda os pequenos e médios produtores de leite deste País e competir com os agricultores brasileiros. Precisamos dar um basta nessa situação, ouvi-los atentamente, fazer uma análise apurada das suas reivindicações e procurar atender essa gente que realmente trabalha, que derrama suor, que luta realmente para produzir neste País e que merece atenção. O Governo não deveria estar reduzindo o ICMS de carro. As cidades brasileiras já estão superlotadas. Há poluição e um trânsito que não deixa as pessoas andarem nas ruas, e o Governo ainda incentiva a fabricação de mais carros, quando deveria incentivar os agricultores a produzir alimentos para este País e gerar empregos. É no campo que são gerados empregos. Lá, o Brasil começará a retomada do desenvolvimento. Tenho certeza disso. Parabéns. Continue com essas posições corretas que V. Exª tem assumido na tribuna do Senado Federal.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Acolho com muita honra, Senador Maguito Vilela, as suas ponderações, pois representa um Estado em expansão extraordinária nesse setor. É necessário que o Governo se preocupe com os agricultores, para o seu próprio crescimento. V. Exª citou o aumento nos insumos em torno de 80%. É bom lembrar que o combustível também sofreu aumentos. O óleo diesel usado nos equipamentos agrícolas aumentou cerca de cinco vezes em pouco tempo, e não tem como repassar esse aumento.

Emociono-me com os manifestantes, que acordam aos gritos e tomam conta da região dos ministérios, dizendo “Esta Esplanada é nossa, é da produção nacional”. Isso é muito bonito. Encantei-me a noite passada ao ver o movimento, o buzinaço, tratores andando: “Vamos ocupar a Esplanada. A praça é nossa”. Esse movimento de “Acorda, Brasil. Acorda, produção nacional” quer dizer “Mexe, Brasil”. Por que vamos importar leite? Muitas vezes nos emocionamos quando vemos um movimento que faz pessoas de todos os cantos do Brasil virem à Capital Federal e dizer: “Acorda, Brasil, a produção nacional está sendo ameaçada”. Precisamos acordar, senão vamos nos acocorar diante de outros países; para comer amanhã e matar a fome dos brasileiros, teremos de buscar lá fora pagando o que querem, entregando o que temos. O que é isso? Eles estão fazendo esse grande movimento.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Felicito V. Exª pelo seu pronunciamento. Esse é um momento muito importante para o nosso País. Hoje, não são trabalhadores sem terra ou pequenos produtores, mas todos os produtores rurais do Rio Grande do Sul estão aqui. São gaúchos, paranaenses, catarinenses, produtores vindos de todo o Brasil. Não consigo entender a falta de diálogo viável entre eles e o Governo. No caso do Proer, numa sexta-feira, o Dr. Malan, o Presidente Fernando Henrique Cardoso e companhia reuniram-se e encontraram uma solução para os bancos. Ninguém sabia que os bancos estavam com problemas. Ficamos sabendo na segunda-feira, depois de o Proer ter sido apresentado por intermédio de uma medida provisória. Essa gente está gritando há muito tempo. Na quinta-feira, quando debatíamos essa matéria, fiz um apelo ao Presidente do Senado e ao Líder do meu Partido, Senador Jader Barbalho, para que pedissem ao Presidente da República uma solução para este final de semana, porque essa tese de dizer que não vão deixar aprovar o projeto na Câmara dos Deputados e que o Presidente da República vai vetar é muito séria. Encontrem uma fórmula; ninguém fez nada. E o Senhor Presidente da República apenas mandou dizer que, se o projeto for aprovado, vai ser vetado. E deixaram o ilustre Ministro da Agricultura, um homem que circula pelo meio da área econômica, conversar sozinho com os agricultores. Não vi nenhum Ministro da área financeira tentar sentar, conversar, debater, dialogar. E, agora, estão eles, na Esplanada, caminhando para lá e para cá, em véspera de não ter solução. Acredito que o projeto será aprovado; se não o for, pior, porque eu sinto. Eu estive na reunião da Farsul e não estou acostumado a ir lá. Pela primeira vez, vi a Farsul, no Rio Grande do Sul, em um palanque, na rua. E vi gente debatendo, discutindo, analisando propostas concretas. Olha, chamar, como a imprensa vem fazendo, disso ou daquilo... Penso que o Governo tem que falar claro: “Querem isso, mas não é possível; podemos dar aquilo”. Não se pode deixar de responder. Quando se trata de São Paulo, da área financeira ou empresarial, eles vêm correndo e fazem as soluções que bem entendem. Ouvi dizer que tremem de medo, porque falam em uma quantia de R$8 bilhões ou R$9 bilhões. Muito menos do que deram para o Banco Nacional! O que causa dó é a falta de preocupação do Governo com essa área. Ontem, foram os caminhoneiros: estavam lutando pelo que acreditavam ser justo. Agora, eles estão mais tranqüilos, porque o Presidente do Senado garantiu que, durante um ano, não haverá aumento de óleo nem de gasolina. Se o Presidente do Senado garantiu, duvido que o Sr. Pedro Malan mude. Fora o Sr. Fernando Henrique, já haveria a preocupação: “Será que é para valer?” Nesse caso, haveria uma interrogação. No entanto, como foi o Sr. Antonio Carlos Magalhães que disse que não haverá aumento durante um ano, percebo que os caminhoneiros estão tranqüilos. O negócio é para valer, pois quem falou foi o Sr. Antonio Carlos Magalhães. Na verdade, ontem foram os caminhoneiros, os pequenos proprietários, a agricultura familiar; hoje, são os médios e os grandes proprietários, sem falar nos sem-terra. O que este Governo quer? Qual é o seu aliado? Com quem estão entendendo-se? Quem não fala mal, a não ser os nossos ilustres homens do sistema financeiro? Sr. Fernando Henrique Cardoso, Presidente da República, chame, em seu gabinete, o Sr. Pratini de Moraes, novo Ministro da Agricultura. É um homem que está por dentro; conhece a área econômica e a da agricultura e também tem relações com a área financeira. Não é como eu, nem como V. Exª, Senador. Nós, quando éramos Ministros da Agricultura, tínhamos de bater à porta, porque a área financeira não se importava conosco. Agora, trata-se de um homem da área: o Presidente da Associação Brasileira de Exportadores. Deixar as pessoas ali, caminhando para lá e para cá, sem tomar conhecimento... A Esplanada é nossa. E daí? A Esplanada é nossa e será vossa amanhã. Eu digo: Presidente Fernando Henrique Cardoso, Dr. Malan, V. Exª estava bem, V. Exª estava firme, mas tinha a seu lado muita gente. Agora, até o Sr. Antonio Carlos começou a falar de V. Exª. Já há mais gente falando que o homem é o Presidente do Banco Central. Essa história de dizer que não recebe pobre, se recebe ou não, não sei. Mas essa gente nem pobre é; ao contrário, tem dinheiro. Penso que o movimento é muito sério. Não vamos esquecer-nos de que, na semana que vem, chegam os 100 mil do PT, os sem-terra, sei lá o quê. Sabemos como isso começa, e não sabemos como termina. Agora, o mínimo que o Presidente da República tinha que fazer era chamar suas áreas financeira e agrícola, seus líderes no Congresso e os homens da terra, para sentarem à mesa e conversarem madrugada adentro. Se Sua Excelência fez isso com a área financeira, por que não o faz com a agrícola? Muito obrigado.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Recolho suas palavras, com muita honra, Senador Pedro Simon. V. Exª, que já foi Ministro da Agricultura, conhece bem esse setor e retrata a importância do fato de estarem acampados na Esplanada pequenos, médios e até grandes proprietários. Hoje, não são os sem-terra, mas é procedente o movimento. Amanhã, virão os sem-terra também. Esses que estão acampados vieram para não serem sem-terra amanhã. Se permanecer a atual situação, amanhã ou depois, esses que estão gritando, principalmente os pequenos e os médios, passarão a ser também sem-terra, não terão condições de sobrevivência; terão que fazer movimentos outros para buscar, de novo, um pedaço de terra.

Então, a luta é em prol da produção nacional, para que ela se mantenha, não se descapitalize cada vez mais, como estamos a observar. Por isso, vamos continuar.

O Sr. Arlindo Porto (PTB-MG) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Com muita honra, ouço o eminente Senador Arlindo Porto, que também foi Ministro da Agricultura e conhece o setor. Em seguida, ouvirei os demais Senadores que estão querendo apartear.

O Sr. Arlindo Porto (PTB-MG) - Senador Casildo Maldaner, eu queria fazer um rápido comentário -- para não prejudicar o raciocínio de V. Exª --, com base no que foi manifestado pelo Senador e ex-Ministro Pedro Simon. Nós estamos assistindo a uma mobilização, distorcida, às vezes, em seu objetivo, que está fixado apenas na renegociação de débito. Se há necessidade de uma mobilização em função dos seus débitos, é necessário que se conheça, na intimidade, o que está acontecendo. Esse endividamento é fruto de anos e anos de frustração na atividade rural, que vem fazendo com que o produtor, cada vez mais, tenha que investir e, cada vez menos, tenha como resultado o fruto do seu trabalho. O mercado internacional, especialmente a abertura globalizada em que adentramos, mostra exatamente isto: a falta de competitividade do produtor brasileiro -- e, especialmente, do Brasil -- no mercado mundial. As exigências e os subsídios internacionais, o acordo da Organização Mundial do Comércio e também o acordo com o Mercosul inibiram e inibem o Brasil de ser mais agressivo no mercado internacional. O novo Ministro, Pratini de Moraes, é homem experiente na relação do mercado internacional. Esperamos que S. Exª, efetivamente, ponha em prática o seu saber, o seu conhecimento; não se coloque apenas na condição de vendedor, mas na de vendedor atrelado e compromissado com quem produz. Vejo neste movimento alguns pontos importantes, que merecem destaque: os produtores rurais, por meio de suas lideranças ou por si próprios, chamam a atenção da sociedade brasileira e do Governo. O Governo, que, na grande maioria das vezes, tem sido lento na tomada de decisões, não pode continuar insensível a esse episódio dos produtores e a outros que seguramente estarão acontecendo. O que o produtor entende -- e eu, pessoalmente -- é que a classe necessita de uma política agrícola definitiva, duradoura, com ações de curto, médio e longo prazo. Recordo-me de que, quando estava com a responsabilidade de dirigir o Ministério da Agricultura, iniciamos uma grande mobilização com líderes do setor rural, discutindo uma proposta de política agrícola. Esse debate se alongou por mais de um ano, e foi entregue ao Sr. Presidente da República uma proposta consistente, que englobava todos os segmentos econômicos, desde o processo de produção até o de transformação e de comercialização nos mercados interno e externo. A agroindústria se fez presente, contribuindo, agregando valores e gerando mais emprego e renda. No entanto, sentimos que, até agora, esse documento continua esquecido em uma das gavetas do Palácio do Planalto. Não podemos viver em um país que não tenha uma política definida, e o setor da agricultura é importantíssimo, responsável por 40% do Produto Interno Bruto, o que mais gera emprego neste País e o que mais exporta. É o setor que consegue resultados positivos em sua balança comercial. Logo, não pode permanecer indiferente. Louvo V. Exª pela iniciativa de abordar o tema na tribuna desta Casa, mas louvo principalmente os produtores, por meio de nossos Líderes, o Presidente da CNA, Dr. Antônio Ernesto Werna de Salvo, os vários Presidentes de Federações, e aqui chamo a atenção para o Presidente da Federação de Agricultura do Estado de Minas Gerais, Dr. Gilmar Viana Rodrigues, que têm se colocado como defensor ardoroso da política agrícola. E louvo V. Exª por levantar o tema, não discutindo apenas o endividamento, que foi e será debatido, mas a necessidade de ação concreta, urgente e definitiva em relação ao homem do campo, em relação à produção agrícola. Parabéns a V. Exª.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Acolho com muita honra, Senador Arlindo Porto, não apenas porque V. Exª fala por Minas Gerais mas pelo Brasil, até porque exerceu a função de gerir os negócios de agricultura do País. V. Exª diz que 40% do PIB nacional provém de agronegócios. Estão aí, na Esplanada dos Ministérios, os responsáveis pela produção nacional a demonstrar isso, representando isso no País inteiro. É necessária a atenção, como diz o Senador Pedro Simon, não apenas do Ministro da Fazenda ou do Ministro Pratini de Moraes, que entende, como também disse V. Exª, de exportação; mas é preciso sentar e discutir as questões internas da agricultura, os problemas de cada um, dos setores todos, não apenas ver o mundo da exportação, mas todas as suas nuanças. Este é o momento em que os setores do Governo devem procurar encontrar um caminho, quando a produção nacional está aqui na nossa Praça, na nossa Esplanada.

O Sr. Blairo Maggi (Sem Partido-MT) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Casildo Maldaner?

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - É com muita honra que ouço o Senador Blairo Maggi, que é ligado ao setor, entende do ramo e tem sempre uma palavra abalizada em relação a assunto.

O Sr. Blairo Maggi (Sem Partido-MT) - Cumprimento o nobre Senador pelo brilhante discurso que está proferindo e gostaria de agregar um dado para ilustrar essa discussão. Tanto se fala das dívidas dos produtores e do seu perdão, que é a palavra usada pela imprensa e que é muito pesada para os produtores. Na verdade, o que se pretende é um rebate daquilo que foi colocado indevidamente nas contas dos produtores no passado. Os planos econômicos do passado fizeram com que essas contas crescessem de tal maneira que o setor, hoje em dia, não tem condições de gerar renda para pagar o que foi captado. Caso contrário, se estivesse gerando renda para isso, tenho certeza absoluta de que os produtores não estariam aqui na porta do Palácio, mas nas lavouras produzindo, preparando-se para o próximo plantio. Quero apresentar um dado para que os Senadores e a sociedade sintam a gravidade desses fatos: nos últimos seis meses, um único banco, o Banco Itaú, na sua declaração de Imposto de Renda, apresentou um lucro maior, meu caro Senador, que todo o setor de soja do Brasil inteiro. Um único banco apresentou um lucro superior a toda a agricultura de soja do Brasil. São 15 milhões de hectares, 31 milhões de toneladas, mais de um milhão e meio de produtores envolvidos nesse setor, milhares e milhares de pessoas transportando essa soja, para gerar um lucro menor do que gera um único banco. O lucro do Bradesco, do Itaú e do Banco do Brasil, os três bancos, é maior do que todo o lucro da agricultura de arroz, de feijão, de mandioca, de milho e de trigo. Agora, vejam bem se pode uma instituição bancária... Não quero falar mal das instituições bancárias; só quero me referir ao que significa uma instituição bancária para um País que tem mil e poucas agências, enquanto são milhares e milhares de produtores produzindo e, no final, ter um lucro muito menor do que uma instituição bancária. Meu Deus do Céu, alguma coisa está errada neste Brasil! Não é possível continuar dessa forma. É como diz o Senador Pedro Simon: não estão olhando com atenção para um setor que é responsável por 40% do PIB e aí deixam os nossos companheiros agricultores correndo de um lado para o outro. Ainda ontem à noite, assisti a uma cena que foi interessante, porque conhecemos o homem do campo. Eu estava saindo do Senado para ir para o meu hotel, havia três companheiros comigo e um monte de gente que passava pela rua. Os quatro que estavam comigo disseram: “Olha, aqueles são colonos, são agricultores”. Não temos o traquejo da cidade, não adianta. Quer dizer, é um povo que só vem aqui em últimas condições. Deixo esses dados para o seu conhecimento. Depois do Senador Tião Viana, farei um pronunciamento. Tenho outras considerações importantes a relatar. Se a imprensa nacional, que tem batido tanto nos produtores, tivesse um pouquinho de paciência para entender os números e não pegar somente os números que vêm do Governo, que não são verdadeiros, e procurasse entender um pouco melhor a situação, não bateria tão pesado nos produtores. Não estou aqui defendendo caloteiros, de forma nenhuma. Creio que para quem pegou dinheiro e não produziu, que o desviou, deve ser cobrado. Se for preciso colocar alguém na cadeia, que se coloque. Não estou defendendo quem não merece. Cumprimento V. Exª pelo discurso e digo que os produtores que se encontram lá fora contam com este Plenário na aprovação da lei que, sem dúvida alguma, virá aprovada da Câmara e será aprovada aqui. Se o Presidente quiser vetar, que vete. Ela voltará e o veto será derrubado, estabelecendo-se, assim, uma grande confusão que deverá ser resolvida no cenário político. Parabéns!

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - São bem-vindas as ponderações de V. Exª, Senador Blairo Maggi. Sei que V. Exª fala não só por Mato Grosso, mas também porque conhece essa questão em todos os seus ângulos.

E, quando pondera que uma instituição financeira lucrou, este ano, mais do que toda a produção nacional de soja, que envolve 1 milhão e 500 mil pessoas, entendo que a situação fica difícil. Aliás, essa instituição financeira teve lucros em função da própria política do Governo. O Governo tem influenciado, sem dúvida alguma, para que instituições financeiras como essas obtivessem lucros em função de sua prática de uma política financeira ou econômica nesse sentido. Para aquele setor que representa 40% do PIB nacional, está aí a descapitalização e um problema sério para ser enfrentado.

O Sr. Carlos Patrocínio (PFL-TO) - V. Exª me concede um aparte, nobre Senador?

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Antes de continuar com as minhas ponderações, ouço com alegria o Senador Carlos Patrocínio, representante do Estado do Tocantins.

O Sr. Carlos Patrocínio (PFL-TO) - Nobre Senador Casildo Maldaner, serei muito breve no meu aparte, até para não empanar o brilhantismo da defesa que V. Exª faz do setor produtivo rural do nosso País. Senador Maldaner, este movimento merece toda a atenção e, mais do que isso, merece muito respeito, respeito nosso enquanto Membros do Congresso Nacional, do Sr. Pratini de Moraes, Ministro da Agricultura, do Presidente Fernando Henrique Cardoso, de toda a sociedade brasileira e, sobretudo, da imprensa, porque determinados setores da imprensa têm distorcido a situação, procurando tirar o brilho deste movimento tão nacionalista como é o Movimento dos Produtores Rurais do nosso País. Eu, como V. Exª, também me senti emocionado quando vi as carretas, os tratores, as colheitadeiras postadas ao longo da Esplanada dos Ministérios. Um movimento ordeiro, pacífico e que se justifica sob todos os aspectos. Não vou elencar os motivos que justificam este movimento, porque os Senadores que me antecederam - V. Exª, a própria Senadora Emilia Fernandes que fez um brilhante discurso - já o fizeram. Mas gostaria apenas de reiterar que este povo merece respeito. Este povo não está clamando por ajuda pessoal, não está pedindo favor. Os produtores rurais estão solicitando, estão clamando pelo Brasil. E é por meio deles que vamos nos firmar no concerto das nações como um grande país. Senador Casildo Maldaner, apenas citaria um exemplo, e o faço em nome do Estado do Tocantins, a fronteira agrícola mais promissora deste País, que implementou o Prodecer - Programa de Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados. Por esse acordo, o Japão fornece recursos a uma taxa de juro de 2,9% ao ano, o Banco do Brasil os repassa aos produtores rurais - que estão alcançando alta produtividade - a uma taxa de 29%. Ou seja, o Japão fornece os recursos para que os produtores paguem 2,9% de juros, e o Banco do Brasil cobra 29% de juros, o que já está inviabilizando o programa. Fizemos a Diretoria de Crédito Agrícola do Banco do Brasil tomar ciência do que vem ocorrendo. Recebi correspondência alegando que isso não é culpa do Banco do Brasil, mas decorre de uma decisão do Conselho Monetário Nacional. Eminente Senador, seja de quem for essa decisão, o fato é que temos que subsidiar de alguma maneira o homem do campo. E não se trata de subsídio em forma de dinheiro, mas de um crédito compatível com a atividade agropecuária e, sobretudo, a garantia de preços mínimos, que permitiria ao homem do campo plantar, obter boa produtividade e honrar os compromissos assumidos Portanto, V. Exª, que fala em nome do Senado Federal, faz um magnífico pronunciamento. Todos nós estaremos ao lado dos produtores brasileiros que nos emocionam com esse movimento pacífico, ordeiro e, acima de tudo, muito justo em prol do desenvolvimento da nossa querida Pátria.

O SR CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - As ponderações de V. Exª, Senador Carlos Patrocínio, só vêm a robustecer, ajudar a informar a preocupação que se deve ter nesse particular.

Aliás, vem ao encontro do que disse o Senador Blairo Maggi, do lucro extraordinário que algumas instituições financeira, inclusive o Banco do Brasil, vêm obtendo em função de casos como esse que V. Exª declina.

Se os recursos aqui chegam do Japão, de alguns bancos externos, a juros de 2,9%, e o Banco do Brasil cobra 29% e afirma que não é o culpado pela cobrança dessa taxa, mas o Conselho Monetário Nacional, a situação fica difícil.

São questões dessa ordem que revoltam os produtores desse setor. Quanto a isso, não há a menor dúvida. É, por isso, que todos começam a se revoltar.

Sejamos sinceros, até nas pesquisas de opinião começa a cair a popularidade do Presidente da República e da área econômica do Governo. Essa sensibilidade vem de baixo, das bases. Queiramos ou não, trata-se de um reflexo do dia-a-dia. São setores que se manifestam, e isso começa a se espraiar.

Não seriam esses resultados dirigidos? Em relação a pesquisas de opinião, ficamos um tanto duvidosos. Mas o Ibope, depois o Vox Populi e outros institutos de pesquisa ligados ao próprio sistema começam a dizer - e eu começo a me preocupar - que a popularidade do Presidente está abaixo da do ex-presidente Fernando Collor.

Quando Pedro Simon diz que sabemos como esses movimentos começam, mas que não sabemos como terminarão, isso nos deixa preocupados.

Eu não digo que o Governo tem de convidá-los para irem ao Palácio da Alvorada, mas para conversarem com os líderes e os conheçam. Não é isso. Mas deve haver atenção, deve buscar um caminho viável.

O SR. PRESIDENTE (Ademir Andrade) - Senador Casildo Maldaner, alerto-lhe de que faltam dois minutos para o encerramento do seu tempo. Há oradores inscritos com viagem marcada. Seu pronunciamento já dura 48 minutos.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Agradeço a ponderação de V. Exª. Peço perdão ao eminente Senador Tião Viana a quem havia dito que minhas considerações seriam breves e não ultrapassariam mais do que 15 ou 20 minutos. Tendo em vista a participação de todos os colegas, estendi-me. Peço a S. Exª que me entenda e me perdoe. Esta discussão interessa ao Acre, seu grande Estado, e ao Brasil. O eminente Senador José Fogaça gostaria de me apartear. Este também é o pensamento do Rio Grande do Sul nesta caminhada. Todos estão fundados neste mesmo pensamento.

Sr. Presidente, para respeitar as ponderações de V. Exª, peço que a taquigrafia transcreva meu pronunciamento porque ainda há várias considerações que dizem respeito a este tema de tamanha envergadura para o Brasil. Vamos ser sinceros: os Estados Unidos oferecem garantias mínimas, a sociedade americana paga para que o produtor americano sobreviva e não seja extinto; a Europa sustenta sua produção para que o agricultor possa continuar a viver e a produzir. Quer dizer, a sociedade européia garante o mínimo da produção, o sustento do produtor.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mantém-se a parte burocrática deste País. Na Esplanada dos Ministérios, por exemplo, para manter o setor público funcionando, há uma garantia mínima, faça sol, faça chuva, dê ou não feijão, embora, mesmo que nos últimos quatro ou cinco anos não tenha havido nenhum reajuste salarial.

Isso não se aplica à produção, setor que representa 40% do PIB brasileiro. É necessário acordarmos para esse particular, a fim de que não continuemos sempre na condição de país de Terceiro Mundo. Essa é a reivindicação dos produtores brasileiros na Praça dos Três Poderes. Dizem que “A Praça também é nossa; a Esplanada também é nossa”. Os ruralistas estão aqui para acompanhar a votação da matéria a eles relacionada, na Câmara e, posteriormente, nesta Casa. Mas, acima de tudo, querem que o Governo trave com eles uma conversa franca e transparente. Esse é o verdadeiro sentido do movimento dos ruralistas.

Peço-lhe mais uma vez perdão, Sr. Presidente, e também à eminente Senadora Marina Silva e ao Senador José Fogaça, que gostariam de apartear-me. Sei, porém, que os pensamentos de S. Ex.ªs estão na mesma linha.

Sr. Presidente, finalizando, solicito a V. Exª que meu discurso seja publicado na íntegra, para que conste nos Anais desta Casa.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/08/1999 - Página 20486