Discurso no Senado Federal

CRITICAS A POLITICA NEOLIBERAL ADOTADA PELO ATUAL GOVERNO.

Autor
Amir Lando (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Amir Francisco Lando
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CRITICAS A POLITICA NEOLIBERAL ADOTADA PELO ATUAL GOVERNO.
Publicação
Publicação no DSF de 20/08/1999 - Página 21713
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, POLITICA SOCIO ECONOMICA, GOVERNO, DESRESPEITO, CIDADANIA, NEGAÇÃO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SAUDE, EDUCAÇÃO, SANEAMENTO BASICO, HABITAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, PROVOCAÇÃO, AUMENTO, DESEMPREGO, FOME, MISERIA, EXCLUSÃO, VIOLENCIA, MAIORIA, POPULAÇÃO, PAIS.

O SR. AMIR LANDO (PMDB-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos tempos, os ideólogos do neoliberalismo defenderam a tese (especialistas em teses, como são todos) do que se convencionou chamar Estado Mínimo. Traduzindo, o tamanho do Estado deveria ser o menor possível, o bastante para prestar serviços essenciais ao convívio social harmônico, pacífico e digno. O Estado deveria se abster de atividades que, na visão desses mesmos ideólogos, não lhe diriam respeito, mais propícias, ainda na visão deles, para a iniciativa privada. Alavancar a economia seria tarefa do empresário privado. Não haveria correlação positiva entre o setor público e atividades produtivas, mesmo que elas fossem consideradas, por cabeças também privilegiadas, estratégicas para o país, enquanto nação independente.  

Foi exatamente o discurso do Estado Mínimo que moldou a venda da Companhia Vale do Rio Doce, do parque petroquímico nacional, da siderurgia, da indústria de fertilizantes, de parte do setor elétrico e todo o sistema de telecomunicações. Nem mesmo o fato dos Estados Unidos, país de onde se importa tal moldura, manter seu sistema elétrico nas mãos do Estado, ou, mais ainda, de suas forças armadas, por se tratar, para eles, de atividade das mais estratégicas, chega a demover a idéia do "estado no lugar certo", ou seja, fora de qualquer atividade produtiva e cuidando, apenas, dos requerimentos sociais de sua população.  

Pois bem, lá se foram as nossas melhores estatais, para mãos nem sempre calejadas pelo conhecimento nos respectivos setores, ou para outros Estados, que também se articulam sob o teto do capitalismo, mas que mantêm suas estatais e as encoraja e as subsidia na aquisição de empresas públicas, exatamente dos países que se imaginam emergentes.  

Mas, o Estado brasileiro, após abrir mão de tamanhos ativos, estaria, hoje, no lugar certo? As cinco, ou seis, dezenas de bilhões de dólares alcançadas nos leilões de privatizações teriam sido canalizadas para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira? Teriam gerado, aqui, as ocupações produtivas para prover o sagrado direito de cidadania ao povo brasileiro, atribuindo-lhe algo além da solidariedade?  

Ao contrário, a realidade é, cada vez mais, nua e crua e mostra que se edificou um estado preguiçoso, que se nega prestar qualquer serviço de saúde, educação, saneamento básico, habitação, comunicação e, sobremodo, segurança pública, onde se observa um indisfarçado ambiente de beligerância que elimina, diariamente, centenas de vidas humanas, número superior ao que se verifica em diversos teatros de guerra declarada. O Poder de Polícia inerente à atividade administrativa se posta ausente, desmoralizando o significado da autoridade pública.  

O desemprego fere de morte corações e mentes de milhões de brasileiros, um em cada cinco pais de família já não festejam o seu dia de pagamento. Ronda, também, a angústia de outros tantos que temem, a cada contracheque, o anexo do aviso prévio, documento tal e qual um ato institucional que lhe cassa a cidadania.  

São diversas as questões que se colocam, hoje, perante à Nação: afinal, qual o papel reservado ao Estado vigente? O que a população pode esperar da organização pública atual? Será o Estado, apenas, um organismo arrecadador de tributos? Caberia ao Estado, unicamente, gerir a dívida pública, interna e externa? O Governo é, tão somente, um gestor dos credores?  

As respostas parecem emergir de fatos e números. As filas e a dor profunda nos hospitais, a "velhice antes dos trinta", que atiça para fora do mercado de trabalho as nossas melhores experiências, "a emboscada antes dos vinte", nas esquinas e nos sinais de trânsito das avenidas, por mais que elas sejam freqüentadas, ou, ainda, "a fome, um pouco por dia" de uma população que equivale a uma Argentina, uma dezena de Uruguais, ou outros tantos Luxemburgos, Bélgicas ou Noruegas.  

E os agentes da economia mostram ter, unicamente, a missão de seguir a orientação das instituições financeiras, e a sua única função a de adotar medidas que garantam o pagamento fiel dos juros e demais acessórios do capital especulativo.  

Há quatro anos, a dívida pública líquida brasileira rondava a casa dos R$ 60 bilhões. Hoje, ultrapassa a do meio trilhão. Isso, apesar de todos os percalços da dívida social e das privatizações. Quer dizer, o hospital continua à mingua, apesar do estado ter sido empurrado para "o lugar certo". As ruas mais se parecem campos de batalha, embora os credores tenham recebido, religiosamente, o seu "quinhão". Os desempregados foram transformados em "cidadãos sem rosto", embora os bancos tenham publicado balanços com percentuais de lucro de três dígitos. Portanto, a política econômica adotada pelos mesmos ideólogos nacionais do neoliberalismo e do Estado Mínimo não tem significado a construção da cidadania, porque ela foi relegada à própria sorte, em meio ao desemprego, à fome, à miséria, à exclusão crescente e à violência aterradora.  

O Estado nem chega a ser mínimo para a grande maioria de seus cidadãos, mas é pródigo para uma pequena minoria, independente de sua nacionalidade. Mais do que isso: o Estado é vampírico para aqueles que são, exatamente, os objetos das teses neoliberalizantes. Mas, seus defensores, no poder porque foram preparados para defender essas mesmas teses com "honra ao mérito", nas melhores universidades do mundo capitalista, são, na prática, meros transferidores da renda sugada de tantos, para os verdadeiros mentores das hipóteses que se impõem ser confirmadas.  

É preciso um alto lá! No limite, o sanguessuga fere de morte. Urge impor um basta definitivo no rumo desta política que tem se mostrado desumana e cruel. Ou se muda a cara do sistema, ou se muda os seus agentes. O brasileiro não pode ser um estranho dentro de seu próprio país, um intruso indesejado, condenado a níveis de existência que apontam para a exclusão da própria vida, gestada pela falta de perspectiva e pela adversidade intransponível.  

A sociedade não suporta mais a perversidade da atual condução política, econômica e social. O projeto de nação soberana e democrática necessita ser resgatado. É urgente dar rosto a todos os cidadãos brasileiros.  

A legitimação do governo se atinge, somente, na realização de políticas públicas que propiciem a concretização da justiça social, que ofereça a todos o necessário, exatamente aquilo que, hoje, se acumula nas mãos de uns poucos à custa, sobretudo, do modelo econômico implantado no país. Não é à toa que as fronteiras da tolerância foram rompidas e a legítima defesa da vida da maioria que acumula frustrações começa a transmutá-las em inquietações e revoltas, como demonstram alguns movimentos organizados, como o MST, por exemplo, justas enquanto reação ao descaso e à inoperância dos órgãos incumbidos de operar uma reforma agrária massiva, eficiente na prática e não apenas na propaganda enganosa. O estrépito midioso, em certos momentos, engana e confunde como os fogos de artifício e empanam o eterno brilho das estrelas. Contudo, após átimos de segundo, a realidade dolorosa dos acampamentos dizem mais factualmente essa atrocidade impiedosa que a elite lenta teima em apagar. Outros exemplos poderiam ser enumerados. Basta um olhar sobre as ruas onde deságua a indignação e as estradas que desembocam no poder, para se perceber que se rompeu o silêncio e que as toneladas de papéis picados e a verdadeira solidariedade soam como legitimação de movimentos que impõem mudanças. A mesma legitimação que coloca no rodapé o poder atual.  

Ao menos para não perder os privilégios, enquanto tantos e intoleráveis, a elite tem que mudar, mesmo que ela se proponha permanecer, ainda que temporariamente, onde se encontra. Caso contrário, a insatisfação social virará tudo de cabeça para baixo, e derrubará por terra as pérolas e os brilhantes que hoje se ostentam. Quem sabe, também, os paraísos fiscais não se transformem em verdadeiros infernos.  

O que se quer, na verdade, é um governo brasileiro para os que amam a terra onde nasceram e que, antes de tudo, têm como referência a Nação pacífica, porque justa.  

Era o que eu tinha a dizer,  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/08/1999 - Página 21713