Discurso no Senado Federal

APOIO A MANIFESTAÇÃO DOS AGRICULTORES EM BRASILIA, OCORRIDO DE FORMA ORDEIRA. CONSIDERAÇÕES SOBRE A 'MARCHA DOS CEM MIL'. REPUDIO AO MOVIMENTO PELO IMPEACHMENT DO PRESIDENTE DA REPUBLICA.

Autor
Leomar Quintanilha (PPB - Partido Progressista Brasileiro/TO)
Nome completo: Leomar de Melo Quintanilha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • APOIO A MANIFESTAÇÃO DOS AGRICULTORES EM BRASILIA, OCORRIDO DE FORMA ORDEIRA. CONSIDERAÇÕES SOBRE A 'MARCHA DOS CEM MIL'. REPUDIO AO MOVIMENTO PELO IMPEACHMENT DO PRESIDENTE DA REPUBLICA.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/1999 - Página 22261
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ELOGIO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, AGRICULTOR, SOLIDARIEDADE, REIVINDICAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA, DEFINIÇÃO, POLITICA AGRICOLA.
  • REGISTRO, MARCHA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), OPOSIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, CONSOLIDAÇÃO, DEMOCRACIA, PAIS.
  • CRITICA, SETOR, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REIVINDICAÇÃO, IMPEACHMENT, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, ELOGIO, PLANO PLURIANUAL (PPA).

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos vendo hoje a Esplanada dos Ministérios tomada por pessoas originárias de diversas regiões do Brasil, em um movimento previamente anunciado e com um propósito definido, a exemplo de várias outras manifestações que temos visto acontecer na Praça dos Três Poderes.  

Ainda ontem estavam em Brasília representantes do segmento produtivo deste País, uma leva de agricultores, com um propósito também muito claro e definido, qual seja, o de buscar um encaminhamento para as questões ligadas ao setor, o equacionamento de um estoque de dívidas que vem se arrastando ao longo de muitos anos e que vem experimentando alterações brutais, incompreensíveis, decorrentes, notadamente, de sucessivos planos de estabilização da economia.  

Louvo, Sr. Presidente, a manifestação dos agricultores ocorrida na semana passada, de forma ordeira, respeitosa, de maneira firme, e lamento que o encaminhamento tenha sido equivocado, pois se alardeou a reivindicação do perdão de 40% de suas dívidas. No meu entendimento, os agricultores querem efetivamente não o perdão de nada, porque eles não devem pedir perdão por nada; a sociedade brasileira é que deve pedir clemência aos produtores. O que os agricultores estão querendo, Sr. Presidente, é que se retire do saldo devedor das suas contas com as instituições financeiras o que eles não devem. Um agricultor que comprou um trator tem armazenados três ou quatro tratores na sua dívida. Eles querem a remoção disso, querem que seja recalculada a sua dívida para que possam pensar em acertar os seus compromissos com as instituições financeiras. Eles querem, Sr. Presidente, a definição de uma política agrícola clara, que haja uma manifestação e um posicionamento do Governo Federal sobre essa atividade econômica importantíssima, de vital significado para a economia do País, para não experimentarem ataques externos de agriculturas subsidiadas, como temos visto acontecer repetidas vezes.  

Os agricultores querem a oportunidade de alavancar o desenvolvimento deste País com a aptidão que têm no amanho da terra, com o conhecimento que têm no trabalho diuturno de produzir riquezas e gerar empregos, fazendo com que este País pare efetivamente de patinar na produção de apenas 80 milhões de toneladas de grãos.  

Os agricultores têm uma reivindicação certa e segura, e louvo a sua atitude ao se retirarem da Praça dos Três Poderes para não serem identificados com um movimento ideológico, já que eles não têm esse sentimento ideológico. Estavam aqui a defender os interesses - procedentes - de uma categoria importantíssima deste País.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - V. Exª me concede um aparte?  

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO) - Ouço com muita atenção o nobre Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Caro Senador Leomar Quintanilha, quero juntar a minha voz à de V. Exª, quando defende uma solução que venha, de certa forma, contribuir para a retomada do crescimento da agricultura e da produção no nosso País. Não defendemos o perdão da dívida. Não defendemos simplesmente uma posição genérica para aquelas pessoas que estão devendo e não pagam. O que queremos, sim, é que seja buscada - e o Governo já avançou bastante na discussão dessa questão - uma fórmula e, como conseqüência, um valor pagável. Não é possível, como no exemplo que V. Exª deu, um agricultor comprar um trator, pagar dois tratores, e ter mais três tratores para pagar. Na verdade, não há produção agrícola, não há preço agrícola, não há mercado que efetivamente corresponda, na atividade econômica, a um juro, a uma multa, a uma correção monetária nesse valor. Acredito que o Governo tem um momento de dificuldade, de busca de criatividade, para recalcular as dívidas com base no preço dos produtos, com base na equivalência, com base, por exemplo, no preço dos financiamentos atuais. Acho que uma fórmula tem que ser encontrada para que quem tomou financiamento para produzir mil sacos de soja possa vender os mil sacos de soja e pagar o seu empréstimo. Na verdade, hoje, se os agricultores do Brasil quisessem pagar, não poderiam, devido aos juros, às multas, enfim, à espiral financeira, que inviabilizou o pagamento e, conseqüentemente, a atividade no campo. Quero, portanto, juntar-me a V. Exª no apelo em busca do entendimento. O Ministro da Agricultura tem demonstrado que quer o entendimento, tem discutido permanentemente essa questão. Já se avançou bastante e espero que se avance mais, a fim de que efetivamente tenhamos condição de retomar o crescimento e de atingir rapidamente as 100 milhões de toneladas. É inadmissível que um país como a Argentina produza 65 milhões de toneladas de grãos e o Brasil, com extensão territorial muito maior e com condições climáticas muito melhores, fique patinando nos 80 milhões de toneladas. Parabenizo, portanto, V. Exª e apelo aos diversos segmentos envolvidos para que não radicalizem o discurso; ao contrário, convirjam no sentido de buscar efetivamente um valor, uma condição, um caminho palatável para todos os setores. Meus parabéns!  

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO) - Eminente Senador Romero Jucá, agradeço-lhe a contribuição e a análise perfeita do momento que vive a agricultura brasileira.  

Veja V. Exª que essa preocupação que nos assalta a todos hoje, de combate à pobreza, e do incremento da agricultura, que é uma atividade distributiva de renda, geradora de riqueza e emprego, seria uma das alternativas importantes, até porque é a vocação natural da economia brasileira.  

Além desse movimento dos agricultores, precisamos contribuir para encontrar a solução que venha permitir que esses que têm aptidão e investimento no setor possam permanecer na atividade. O movimento dos agricultores, a Marcha dos Cem Mil, que hoje se realiza em Brasília, além da dos servidores públicos, que houve ontem, dão-nos uma clara e nítida noção de que a democracia no Brasil está, de fato, amadurecida, tendo-se realmente consolidado.  

É importante que possamos ouvir e que todos tenham o direito de manifestar o seu sentimento, a sua angústia, a sua indignação, a sua insatisfação com o que ocorre no País. É importante que tenhamos, de fato, essas condições, porque as críticas muitas vezes contribuem para que possamos acertar ou redimensionar nossas ações e redirecionar os rumos que a elas estamos dando.  

Ledo engano é querer imputar ao Presidente Fernando Henrique Cardoso todas as culpas pelas mazelas que a sociedade brasileira está sofrendo e enfrentando. O Presidente da República - diga-se de passagem - houve-se com muita coragem e determinação ao adotar decisões cruciais para o reordenamento das contas públicas e dos rumos do Brasil. Sua Excelência tomou decisões que historicamente foram proteladas. Diga-se de passagem, a estabilização da nossa economia, que já é uma conquista da sociedade brasileira, - gerações e gerações viveram sob o tacão da inflação, o mais perverso dos impostos, que punia de forma mais intensa o mais pobre -, deu-se efetivamente sob a condução do Presidente Fernando Henrique Cardoso, sem o qual não poderíamos pensar em dar um ordenamento na nossa economia, em ver o Brasil encontrar os trilhos do seu desenvolvimento e crescimento.  

O Sr. Eduardo Suplicy (PT - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO) - Ouço, com prazer, o nobre Senador Eduardo Suplicy.  

O Sr. Eduardo Suplicy (PT - SP) - Senador Leomar Quintanilha, é importante a disposição de V. Exª e dos diversos Senadores que aqui hoje se têm pronunciado com respeito à importância dessa manifestação que se realiza agora na Esplanada dos Ministérios, diante do Congresso Nacional. É muito importante a disposição de dezenas de milhares de pessoas que estão ainda chegando a Brasília. Mais de mil ônibus já cruzaram o Entorno de Brasília, segundo os responsáveis pela Polícia Rodoviária, e ainda continuam chegando pessoas para a extraordinária manifestação que deve constituir-se em um alerta ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. Muitos aqui estão pedindo que ele conclua antes o seu Governo. Carlos Heitor Cony expressa, de forma brilhante em seu artigo, que, muitas vezes, quando uma visita chega a uma residência e percebe que está incomodando, que as pessoas não estão se sentindo bem com a sua presença, a pessoa não tem outra alternativa senão retirar-se. Será que o Presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a uma situação tal, como a expressa pelo brilhante escritor e intelectual Carlos Heitor Cony? Será que o Presidente Fernando Henrique Cardoso vai chegar a perceber uma situação como essa? O alerta aqui está. Não apenas as pesquisas de opinião demonstram que a sua popularidade caiu extraordinariamente - e isso com oito meses de governo -, mas são as pessoas por toda a parte. Quando chego a São Paulo e a outros lugares, há este sentimento de que as coisas não andam bem no País. Então, ou o Presidente realmente começa a tomar medidas que, efetivamente, sirvam para resolver o problema do desemprego, da desigualdade, da pobreza, ou ele se coloca de maneira não subserviente àquilo que tem sido os ditames dos credores internacionais do País, ou ele ganha energias para transformar a situação presente, ou, então, mais e mais, ele vai se ver na posição ilustrada hoje por Carlos Heitor Cony: um visitante que chegou à casa - aliás, chegou até pelo instituto da reeleição, não seguindo a recomendação da Oposição de que não deveríamos ter o direito de reeleição no País. Ele teve a oportunidade de pensar, mas não seguiu as recomendações de um de seus autores prediletos, Alexis de Tocqueville, que recomendava que não deveria haver a reeleição, e insistiu. Pois bem, vou ser breve e percebo que o Senador Romero Jucá quer também pronunciar-se. Agradeço a honra de V. Exª ter-me concedido o aparte, porque está na hora de estarmos ali na manifestação. Aliás, quero convidar todos os Senadores, inclusive os de apoio à base governamental, para que, juntos, possamos ouvir os sentimentos daqueles que hoje estão manifestando o seu clamor aqui na Esplanada dos Ministérios. Agradeço a honra de ter-me concedido o aparte.

 

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Leomar Quintanilha?  

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO) - Ouço, com prazer, o nobre Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Já que o ilustre Senador Eduardo Suplicy colocou aqui o comentário do jornalista Carlos Heitor Cony, eu gostaria também de fazer um breve comentário sobre o que foi dito. Apesar de reconhecer no jornalista o brilhantismo de sempre, gostaria de registrar que entendo que, nesse aspecto, ele está redondamente enganado. Primeiro, porque o Presidente da República não é um convidado na casa de ninguém. Pelo contrário, o Presidente da República foi eleito majoritariamente, com uma quantidade de votos que definiu a eleição no primeiro turno. Depois, se existem convidados nesse processo de manifestação, são exatamente as pessoas que estão hoje aqui, em frente ao Congresso, fazendo uma manifestação democrática, sem qualquer tipo de retaliação do Governo. Aliás, no meu discurso, daqui a pouco, farei uma comparação entre o que existe, hoje, no Brasil, e o que existe, hoje, por exemplo, na Venezuela, que o Líder do PT, Luís Inácio Lula da Silva, define como modelo a ser seguido na América Latina. Na verdade, hoje, foi fechado o Congresso na Venezuela. Então, coisas completamente distintas estão ocorrendo na América do Sul, nos casos específicos do Brasil e da Venezuela. O Presidente foi eleito. O Presidente está fazendo um esforço grande. Existem dificuldades no Governo? Existem. Mas, já que o Senador Eduardo Suplicy gosta de sentido figurado e de exemplos, de certa forma, metafóricos, vou dizer a S. Exª que a Oposição está agindo, talvez, como alguém poderia agir na Turquia depois do terremoto - e o que assolou o Brasil, no início do ano, na questão internacional financeira, foi um terremoto financeiro. Seria como alguém que vai à Turquia após o terremoto, chega a uma casa, que está toda bagunçada, precisando de reparos, e fala para o morador: "Não, você não está cuidando bem da sua casa. A casa está toda rachada. Vamos tomar a sua casa, porque você não está sabendo cuidar da casa." Sem levar em conta que a Turquia sofreu um terremoto. Então, creio que essas questões e esses sentidos figurados são perigosos inclusive para o processo democrático brasileiro. Porém, pela questão do Governo, pela postura democrática do Presidente e também das Oposições, porque acho que as Oposições se equivocam algumas vezes, mas entendo sua boa intenção, a preocupação social, que também é nossa - não é paternidade das Oposições -, entendo que vamos ter uma manifestação tranqüila. Essa manifestação legítima sinaliza para o Governo alguns problemas que o Governo já conhece e contra os quais está adotando medidas. Infelizmente, entretanto, não cabe falar em impeachment, em retirada do Presidente, ou em, como quis o Jornalista Carlos Heitor Cony, dizer que o convidado deve retirar-se. Por favor, Senador Suplicy, sem dúvida nenhuma, a comparação do jornalista foi de extremo mau gosto e, mais do que isso, não consentânea com a realidade que o Brasil está vivendo.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Mas precisa ser lido, até para ...  

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - A Presidência adverte que os eminentes Senadores estão tomando o discurso do Senador Leomar Quintanilha.  

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PPB - TO) - É realmente um processo democrático da discussão, mas, estabelecendo-se o confronto e o debate entre os dois, acabaria tomando a oportunidade de eu manifestar aqui o meu pensamento com relação a esse movimento, nobre Senador Eduardo Suplicy.  

Como disse no início da minha fala, entendo tratar-se de uma situação que nós todos devemos louvar, que é a da democracia. Efetivamente, o Brasil conquistou um espaço enorme no concerto das nações com essa situação onde há liberdade de pensamento e de sentimento.  

Mas, daí a entender que segmentos desse movimento evocam o impeachment do Presidente, ficamos até sem entender. Não há fundamento algum, absolutamente algum, que possa embasar qualquer sentimento nesse sentido. E o Presidente Fernando Henrique Cardoso, dirigindo um País com as dimensões e problemas que o Brasil tem, herdados inclusive de administrações anteriores, está havendo-se com muita competência. Há dificuldades? Há, tanto que Sua Excelência convocou a sociedade inteira para participar dessa verdadeira cruzada, cortando na carne, exigindo um sacrifício de toda a sociedade para colocar o Brasil novamente nos seus rumos.  

Os sinais de que a economia volta a ter possibilidade de crescimento e, com isso, encontrar a solução às mazelas sociais são claros. Basta ver os índices apresentados pelo próprio IBGE, que já registra um pequeno índice de crescimento; a entrada novamente de dólares no País em investimentos concretos também é um outro sinal.  

Enfim, sem essas providências e sem o ajustamento da máquina administrativa, não seria possível governar este País.  

A Constituição de 1988 deixou praticamente engessado o Governo, com muitas dificuldades de ações, e essas correções, que estão acontecendo sob o patrocínio do Congresso Nacional, vão permitir, vão viabilizar a retomada do crescimento econômico do País.  

Vejam a propositura já apresentada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, o seu Segundo Plano Plurianual de Desenvolvimento, que é o programa mais inteligente, mais bem concebido que já vi, e que se propõe a integrar o País interna e externamente. Ele dará ao Brasil a oportunidade de alavancar o seu crescimento e, certamente, com a adução das ações relacionadas com as reformas, principalmente a reforma tributária, nós teremos condições de promover esse crescimento.  

Portanto, o Presidente Fernando Henrique Cardoso conta com o nosso apoio e está no caminho certo. Haverá de consagrar-se como um dos mais importantes presidentes que este País já teve em relação aos rumos que ele traçou para o seu Governo, em relação à condução que ele dá ao País.  

Era o que eu tinha a registrar, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/1999 - Página 22261