Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO DIA NACIONAL DO IDOSO.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DO DIA NACIONAL DO IDOSO.
Aparteantes
Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DSF de 29/09/1999 - Página 25498
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • NECESSIDADE, DEBATE, SITUAÇÃO, IDOSO, BRASIL.
  • ANALISE, DADOS, COMPOSIÇÃO, POPULAÇÃO, EXPECTATIVA, VIDA, DOENÇA, MOTIVO, MORTE, CONCLUSÃO, DESPREPARO, ATENDIMENTO, IDOSO, ESPECIFICAÇÃO, AREA, SAUDE.
  • APREENSÃO, CORTE, APOSENTADORIA, IDOSO, FALTA, DEFINIÇÃO, POLITICA PREVIDENCIARIA, BRASIL.
  • HOMENAGEM, IDOSO, PAIS.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero externar a minha satisfação pela aprovação do requerimento que apresentei à Mesa, ainda no mês de abril, para que fosse dedicado um dia dos trabalhos do Senado Federal à reflexão sobre a real situação do idoso no nosso País e nos países do Terceiro Mundo. Debatendo o assunto, poderemos chegar a uma conclusão acerca da melhor maneira de sensibilizar os executores das políticas públicas para que achem um caminho mais claro, mais verdadeiro e mais atual sobre o que fazer com os idosos do nosso País e sobre como aprendermos com eles. Em síntese: como tratar com dignidade esse problema.  

Quero dizer da minha satisfação de me manifestar da tribuna do Senado após tê-lo feito, com um belíssimo discurso, o nobre Senador Artur da Távola. Em suas palavras, S. Exª manifesta respeito dos mais profundos sobre o que é ser idoso neste País e o que é contemplar e ter a responsabilidade de encarar o idoso no nosso País hoje.  

Vou tentar mostrar, de maneira muito clara, o papel do idoso no nosso País hoje, lembrando que temos pela frente o desafio de conviver, no ano 2025, segundo as estatísticas do IBGE, com 34 milhões de idosos. Hoje, deparamo-nos com 13,5 milhões idosos no nosso País, com uma distribuição de 5,7% dos idosos na Região Norte do Brasil; 8,4% na Região Nordeste; 6,1% na Região Centro-Oeste; 8,5% na Região Sul; e 9,5% dos idosos na Região Sudeste. Situações especiais que surgem porque o nosso País, em 1900, tinha uma expectativa de vida de 33,5 anos; em 1950, o nosso País apresentou uma expectativa de vida de 39,6 anos; e, hoje, deparamo-nos com as pessoas vivendo, em média, 68,5 anos, com uma progressão da expectativa de vida nos anos que se aproximam.  

Lamentavelmente, tivemos uma inversão de realidade do ponto de vista epidemiológico, do ponto de vista da lógica social, porque o que predominava nos anos 50 eram as doenças infecciosas e parasitárias, com responsabilidade por 40% das mortes neste País. Hoje temos as doenças crônico-degenerativas, de maneira muito especial as doenças cardiovasculares, responsáveis por 40% das mortes neste País. Se formos computar todas as crônico-degenerativas, sem contarmos apenas as cardiovasculares, se incluirmos as patologias pulmonares, as patologias ósseas, doenças como o câncer, teremos uma ampliação muito maior dessa estatística lamentável, que encontra um País literalmente despreparado para cuidar dos idosos.  

Se fizermos um apanhado nas universidades brasileiras, vamos verificar que nem 5% delas formam especialistas para cuidar de pessoas de idade avançada, os chamados geriatras. Não existe a cadeira de Geriatria na maioria absoluta das universidades brasileiras. Não temos um modelo de saúde preparado para receber e acolher o idoso neste País.  

Temos uma estatística da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo apontando que a maioria das internações hospitalares deste País, ou seja, 55% delas, é de pacientes em idade avançada e não de pacientes adultos jovens ou crianças e adolescentes. E todos os olhos do setor de saúde pública deste País apontam para o atendimento materno-infantil como prioritário. Houve, portanto, uma inversão da realidade social deste País, uma inversão da lógica de saúde pública e o Brasil não se preparou para enfrentar o problema dos idosos.  

Se visitamos um prédio de uma grande cidade, vamos perceber que a sua área de lazer está preparada para acolher e trazer divertimento apenas às crianças, não havendo absolutamente nada que envolva uma boa acolhida a uma pessoa de idade. Se entramos em um ônibus, observamos e testemunhamos o sacrifício de um idoso ao pegar um bastão e subir o degrau do ônibus, uma verdadeira tortura e um risco iminente de acidente grave.  

Na área da arquitetura brasileira não há adaptação e preparo para acolher, dentro de uma moradia, uma pessoa de mais idade. Se nos transferirmos para o setor social, vamos verificar, por exemplo, que o sistema previdenciário age com a mais profunda perversidade em relação ao idoso em nosso País.  

Agora mesmo, junto com o Senador Nabor Júnior e a Senadora Marina, visitando o Estado do Acre, colaborando com o Governo na discussão do orçamento participativo, ouvimos o testemunho de mais de 200 idosos. Lá, pessoas com 80 anos ou mais, que se apoiam em um bastão, porque já não têm forças para se manterem em pé sozinhas, contaram que tiveram sua aposentadoria cancelada porque não comprovaram atividade na agricultura na atualidade. Isso é uma coisa que não é possível entender. Trata-se de uma brutalidade, de falta de sensibilidade de um Estado que não olha de fato com atenção, com respeito as políticas públicas que visam atender às pessoas de mais idade.  

O Sr. Nabor Júnior (PMDB - AC) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Com imenso prazer, Senador Nabor Júnior. Só gostaria de fazer antes a leitura de dois pontos que considero de muita importância nesta discussão. Logo em seguida concederei o aparte a V. Exª.  

Trata-se de uma frase de um senhor chamado S. N., em um estudo que foi feito sobre o idoso pelo Congresso Nacional:  

Antigamente, os filhos tratavam os pais na palma da mão.  

Hoje, os filhos se afastam, o mundo se afasta da velhice.  

(...) As pessoas se afastam porque acham que velho atrapalha.  

Há outro belíssimo artigo do jornal Folha de S. Paulo , do jornalista Marcelo Leite, em que a Srª Ecléa Bosi, coordenadora da Universidade da Terceira Idade da Universidade de São Paulo e autora de um clássico sobre a velhice, chamado Memória e Sociedade - Lembranças de Velhos , Companhia das Letras, afirma:  

O velho é oprimido pelos "pequenos detalhes desumanos" da cidade, das calçadas quebradas aos degraus altos dos ônibus.  

Ele fica "engaiolado em casa", pois na rua é empurrado "brutalmente", diz Ecléa. A cidade e a cultura não lhe deixam muito espaço: "A velocidade é um bem para essa sociedade. E o velho é uma pessoa que anda devagar" (em todos os sentidos, inclusive o da reflexão).  

Nas sociedades tradicionais, pré-urbanas, os velhos tinham uma função clara: lembrar, mostrando que o presente tem, ou deveria ter, raízes.  

Isso já não parece necessário. Segundo Massimo Canevacci, não é só a velhice que está desenraizada, mas também a juventude, a família e o trabalho. Isso pode representar, na sua opinião, uma oportunidade, um desafio para a invenção de novos papéis. Não caberia à sociedade, enfim, definir quem é o idoso: "Ele é que deveria autodefinir-se como uma pessoa que quer fazer coisas e, sozinho ou com outros, elaborar projetos socialmente úteis", recomenda o antropólogo. "Nada e ninguém é sem retorno."  

Concedo o aparte ao nobre Senador Nabor Júnior.  

O Sr. Nabor Júnior (PMDB - AC) - Senador Tião Viana, quero me associar às justas homenagens que o Senado Federal está prestando nesta tarde ao idoso brasileiro. Temos convivido com larga parcela da população do nosso País e, principalmente, do nosso Estado do Acre, e podemos constatar que realmente o idoso brasileiro, hoje, está enfrentando o momento de maior dificuldade de toda a sua existência, por causa, inclusive, da urbanização da população. Antes, o idoso vivia na zona rural, com a sua família, trabalhando na lavoura, criando seu gado, etc., e ia sobrevivendo. Com a urbanização da população rural nesses últimos 50 anos, o idoso passou a ser uma pessoa incômoda no seio da sociedade. Muita gente não dá valor ao idoso, que é sempre relegado ao segundo plano nos atendimentos médico e social. Quando vai fazer compra em um supermercado, padaria, drogaria, ou buscar os serviços de um estabelecimento bancário, nunca é tratado com o respeito que deveria merecer. O mais grave de tudo isso, e que causou revolta durante a nossa recente estada em alguns Municípios do Acre, foram os protestos que ouvimos ali de pessoas idosas, com idade de 70 ou 80 anos, que foram aposentadas pelo Funrural, mas agora estão tendo esses benefícios cancelados pelo Ministério da Previdência e Assistência Social. Ora, se o próprio Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, quando esteve recentemente no nosso Estado declarou, em uma reunião com os Prefeitos, com o Governador e com os Parlamentares, que esse programa de aposentadoria dos trabalhadores rurais idosos pelo Funrural representava a melhor distribuição de renda deste País, não se justifica que agora o Ministério da Previdência esteja tentando suprimi-lo. Penso que esse momento é de reflexão, principalmente por parte das autoridades ligadas àquele Ministério, que precisam entender a gravidade dessa situação e não cancelar a única fonte de receita e o meio de sobrevivência para eles e suas famílias. Vimos, no Município de Cruzeiro do Sul, vários velhinhos doentes, revoltados com a possibilidade do cancelamento de sua aposentadorias de apenas um salário mínimo, que mesmo assim o Governo quer sustar.  

Quero, portanto, associar-me às homenagens que V. Exª presta neste momento ao idoso brasileiro, fazendo votos para que ele venha merecer o respeito e a consideração das nossas autoridades e de todo o povo brasileiro.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Incorporo, com o mais absoluto respeito, o aparte de V. Exª, Senador Nabor Júnior.  

Gostaria de reafirmar a preocupação com o corte da aposentadoria de velhinhos deste País, porque essa aposentadoria, segundo estudos do próprio IBGE e do IPEA, complementa a renda familiar na ordem de 33% a 45% hoje em dia. Assim, a renda proveniente da aposentadoria tem um valor enorme, sob os pontos de vista humano e social. Temos o dever de decidir, no chamado desafio da reforma da Previdência, o caminho que vamos seguir.  

A França e os países escandinavos assumiram a responsabilidade pública absoluta em relação aos cuidados com as pessoas que já cumpriram seu papel no setor produtivo da sociedade. Alguns países, como os Estados Unidos, apontam a previdência privada, segmentos do terceiro setor envolvidos e a responsabilidade individual com o cuidado de pessoas da terceira idade.

 

O nosso País não se define. Há uma luta orgânica dentro dos órgãos políticos para decidir o caminho a ser adotado. O que mais importa, numa hora como esta, é o sentimento e a dimensão da responsabilidade real que deve ter o nosso País em tratar adequadamente as pessoas que cumpriram seu papel e sua responsabilidade na vida produtiva.  

Não podemos virar as costas para esse problema. O Brasil está omisso nessa discussão. Enfrentaremos 34 milhões de pessoas de idade avançada, e não há sequer médicos preparados para cuidar desses pacientes. Temos de achar um caminho e uma alternativa efetiva.  

Atualmente, discute-se até a sexualidade da juventude e da criança, mas não se aborda o assunto da sexualidade do idoso. É como se fosse um dogma ou um assunto proibido de ser tratado pela sociedade. É como se o idoso não tivesse direito à alegria, ao lazer, à integração social e não pudesse mostrar à sociedade as raízes que ele testemunhou e ajudou a construir para que fôssemos o que somos hoje.  

Vale lembrar a máxima chinesa que diz: "Um pai cuida perfeitamente de dez filhos, mas dez filhos não sabem cuidar de um pai". Esse é o desafio da minha geração, da geração que tem a responsabilidade de construir o Brasil do amanhã. O que faremos com as minorias - e uma minoria que será enorme neste País -, com as pessoas de idade avançada ou, como são carinhosamente denominadas em Cuba, os "adultos maiores"?  

Termino meu discurso ressaltando meu mais absoluto respeito aos idosos do nosso País, às pessoas de idade avançada, esperando que o Poder Público tenha sensibilidade e responsabilidade e seja capaz de entender e traduzir o que é necessário fazer por eles.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

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SEGUEM DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR TIÃO VIANA EM SEU PRONUNCIAMENTO.  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/09/1999 - Página 25498