Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO DIA NACIONAL DO IDOSO.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DO DIA NACIONAL DO IDOSO.
Publicação
Publicação no DSF de 29/09/1999 - Página 25518
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DEBATE, SITUAÇÃO, IDOSO, PAIS, RESPONSABILIDADE, POLITICA SOCIAL, GOVERNO, ATENDIMENTO, AUMENTO, PROPORCIONALIDADE, VELHICE, POPULAÇÃO.
  • CRITICA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, PREJUIZO, APOSENTADO, COMENTARIO, ESTUDO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), PESQUISA, VIDA, IDOSO.
  • ANUNCIO, MOVIMENTAÇÃO, AMBITO INTERNACIONAL, OBJETIVO, AUMENTO, INTEGRAÇÃO, IDOSO, SOCIEDADE.
  • HOMENAGEM, IDOSO, BRASIL.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em muito boa hora, nesta tarde, o Plenário do Senado da República dispensa seus primeiros minutos de manifestações para comemorar o Dia Nacional do Idoso.  

Parece-me que a palavra "comemorar" seria a ideal, mas é muito forte ou talvez ainda seja indevida diante da realidade que o País enfrenta. Este é um dia para se refletir sobre o papel do idoso no País, sobre os avanços, as conquistas, a luta e, inclusive, a resistência dos idosos diante da conjuntura nacional, sob os pontos de vista econômico e social. Uma das questões de maior relevância é a mudança de mentalidade dos próprios idosos e das famílias, a qual está sendo vivida também pelas escolas, a partir da educação que está sendo ministrada no País.  

Mas, em hipótese alguma, pode-se retirar o grau de responsabilidade dos nossos governantes, a partir de ações concretas, de políticas públicas, de políticas de destinação de recursos e, principalmente, de medidas nos campos educacional, social e assistencial. Dessa forma, poderemos afirmar que, no nosso País, aqueles que já deram sua contribuição, que já demonstraram sua experiência, que ajudaram a construir e a desenvolver o Brasil realmente são percebidos como seres humanos dignos de respeito e de valorização.  

Por isso, quero cumprimentar os Senadores que aqui se manifestaram. Solidarizo-me com o enfoque dado em seu discurso pelo Senador Tião Viana, que, como médico, ressaltou a postura adotada pelo País diante da questão.  

Em síntese, quando se fala em saúde, imediatamente devemos pensar em vida e não em doença ou em morte, como muitas vezes acontece em nosso País. A saúde seria a plenitude da vida se realmente fosse dado valor para o ser humano, para as nossas crianças, para as mulheres e, principalmente, para as pessoas portadoras de deficiências e para os idosos.  

Como já foi dito, segundo o IBGE - portanto, são dados oficiais do próprio Governo -, os idosos já são 8,7% da população brasileira ou 13,5 milhões de pessoas. Esses dados são de 1997, mas, certamente, agora, deverá haver números mais atualizados.  

De acordo com projeções do mesmo Instituto, em 20 anos esse número dobrará, o que aponta para a urgência com que a sociedade precisa tratar dessa nova realidade. E quando falo em sociedade, estou-me referindo aos Governos, especialmente ao Governo Federal, que deve ter uma política estratégica para o País nesse setor, e também às famílias, aos filhos, aos professores e aos próprios idosos.  

Desde 1960, o grupo com 60 anos ou mais de idade é o que mais cresce no Brasil, enquanto a população jovem vem registrando um processo de desaceleração de crescimento. A partir de 1970, o crescimento da faixa jovem foi de 18% apenas - a década anterior registrara um crescimento de 31%. De 1980 até o ano 2000, o grupo na faixa de 0 a 14 anos terá crescido apenas 14% contra 107% de crescimento na faixa dos 60 anos ou mais.  

Em resumo, iniciaremos o novo século com a população idosa crescendo proporcionalmente oito vezes mais que os jovens e quase duas vezes mais que a população total. Isso, em um quadro em que o idoso é excluído do mercado de trabalho e em que cerca de 75% deles recebem, no máximo, três salários mínimos, é extremamente preocupante. E mais grave ainda é o quadro, se considerarmos a postura da sociedade - a cultura, a forma de agir, de pensar e de se posicionar -, do mercado de trabalho e mesmo do próprio Governo, como se verificou em vários episódios onde se insiste em tratar os idosos como seres improdutivos e descartados.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o alerta inicial sobre essa questão foi dado em 1960, com o primeiro discurso de vulto sobre o idoso na Organização das Nações Unidas. A partir daí, ano após ano, por meio de eventos por todo o mundo, caminhou-se para a criação e a implementação de políticas para o idoso na busca de soluções para o problema. A propósito do I Seminário Internacional - Envelhecimento Populacional: uma Agenda para o Final do Século, sediado em Brasília, em 1996, que contou com a participação de 38 países, houve uma movimentação maior no sentido da operacionalização de ações efetivas, articulação em nível nacional e internacional, das organizações governamentais e não-governamentais que trabalham em prol da terceira idade. O que vem se constatando, de forma cada vez mais intensa, é que, a partir das mudanças significativas na pirâmide populacional, já se fazem sentir as conseqüências sociais, culturais, epidemiológicas, que exigem uma preparação imediata da sociedade para enfrentá-las.  

Apesar disso, a imprensa ainda registra, cotidianamente, a triste realidade a que os idosos são submetidos constantemente, refletindo ainda a pouca preparação da sociedade e, em muitas situações, o descaso dos governantes. É o que se verifica com as filas, com a falta de atendimento à saúde, com o criminoso aumento de preços dos medicamentos, com a situação precária e desumana das entidades assistenciais aos idosos, com a falta de políticas públicas e, principalmente, com o desrespeito às pessoas idosas, que são recebidas com desconsideração - em muitas oportunidades até publicamente - por parte dos mais jovens e, às vezes, por parte dos adultos. Também verificamos tal descaso pelas medidas que estão sendo adotadas pelas autoridades, como os cortes nos direitos da aposentadoria.  

É muito fácil entendermos a importância da valorização da criança, da mulher, do idoso. O nosso reconhecimento e comprometimento - particularmente nós que temos um cargo público, que temos o poder de aprovar leis para o País -com essa camada significativa da população brasileira, além dos pronunciamentos e das manifestações que fazemos, têm um peso muito maior, porque marcam definitivamente a visão política do assunto. Esse comprometimento evidencia-se, quer queira, quer não, no momento em que os Parlamentares, sejam os de uma assembléia legislativa, os da Câmara Federal ou os desta Casa do Senado da República, votam leis que atingem de forma direta ou indireta o cidadão brasileiro.  

O aposentado tem sido, muitas vezes, vítima das votações que se realizam nesta Casa. Quando fazemos o cálculo para a aposentadoria levando em conta o tempo de sobrevida com um prejuízo real para os trabalhadores, para os salários dos aposentados e das mulheres, de certa forma estamos dando uma demonstração concreta de que, às vezes, o nosso discurso é um e a prática é bem diferente.  

Por isso, acredito que sessões como esta nos levam a refletir, a nos comprometermos e, principalmente, a reafirmarmos nossa postura e nossa análise diante do que está sendo hoje discutido no País. E o que percebemos é que hoje estão sendo feitos cortes nos direitos da aposentadoria e, mais recentemente, na regulamentação da lei, prejudicando homens e mulheres, inclusive com uma sobrecarga de tempo de trabalho. Vejam bem que será medido o valor da aposentadoria colocando-se mais uma sobrecarga de trabalho e levando em consideração o famoso tempo de sobrevida.  

No entanto, mesmo diante das dificuldades, que em muitos casos chegam à desumanidade, os idosos brasileiros, como a maioria da Nação, têm procurado sintonizar-se com essa nova realidade demográfica. Recentemente, o IPEA realizou pesquisa inédita intitulada "Como vive o idoso no Brasil". A pesquisa comprovou que as pessoas com mais de 65 anos estão cada vez mais ativas, confirmando que o perfil do idoso brasileiro é o de pessoa com iniciativa, com disposição para a vida, porque ele observa e incorpora gradativamente o fato de que isso faz parte de um direito seu como ser humano e não porque o Governo o obriga a continuar trabalhando, não lhe dando direito ao lazer e à saúde e lhe oferecendo baixos salários. O próprio idoso está fazendo sua parte. Ele está se reconhecendo, o que é altamente positivo. O que falta é o reconhecimento em relação a ele. Isso impõe que a sociedade, que os empresários, que os Governos levem em conta essa realidade em seus planejamentos econômicos e sociais.  

No próximo dia 2, simbolicamente, o mundo inteiro se abraça para comemorar o Ano Internacional do Idoso, num gesto magnífico, com o objetivo de lembrar e afirmar o texto da Declaração dos Princípios para os Idosos, aprovado em 3 de dezembro de 1982, pela ONU. Frente a isso, perguntamos, com base nesse documento: o que estamos fazendo concretamente em relação à independência, à participação, ao bem-estar, ao desenvolvimento e à dignidade dos nossos idosos? O Governo Federal, de certa forma, está dando um passo importante com a adoção de uma nova política, onde o envelhecimento não é mais sinônimo de doença, mas sim de "limitação" das pessoas diante de determinadas tarefas. Mas isso, que consta nesse documento, precisa sair do papel e ganhar efeitos práticos e concretos.  

É preciso assegurar o direito dos idosos à alimentação, à moradia, ao abrigo, ao vestuário, aos cuidados médicos e, mais do que isso, à oportunidade de trabalho e - por que não? - de estudo, de forma ampla e universal. É preciso garantir a integração plena dos idosos na sociedade, a sua participação na elaboração e implementação de políticas que afetem diretamente o seu bem-estar, fazendo ainda com que eles dividam seus conhecimentos com os jovens. Também é preciso garantir-lhes o direito ao desenvolvimento de seus potenciais, à dignidade, à segurança, ao tratamento com justiça, independente de idade, sexo ou raça.  

Aproveito a oportunidade para fazer um alerta, um apelo especial ao nossos colegas professores, aos chefes de família, homens e mulheres: é fundamental a participação dos idosos na educação, seja ela formal - aquela dada nas salas de aula, nas escolas -, seja ela informal - aquela que é da responsabilidade das famílias e do contexto da sociedade. É impossível que não se dê essa conotação de valorização e de respeito tão indispensáveis àqueles que nos antecederam, àqueles que começaram antes de nós, àqueles que fizeram com que este País chegasse até onde chegou, para que hoje pudéssemos usufruir do mercado de trabalho, da participação na política, enfim, de todo o desenvolvimento do País, independentemente do grau de exclusão e de pobreza e da situação profundamente injusta em que milhões de brasileiros vivem.

 

Por isso, é importante que dados como os que nós e os demais Parlamentares registramos sejam considerados.  

Um outro fato que cabe ressaltar é que, num levantamento feito em nossa legislação, especialmente no Plano Integrado de Ação Governamental Para o Desenvolvimento da Política Nacional do Idoso, pode-se constatar que, do ponto de vista de leis, várias questões estão cuidadosamente alinhavadas, incluindo campanhas de conscientização, motivação e sensibilização dos idosos. Mas, paralelamente, verifica-se um descuido imperdoável do ponto de vista objetivo e, às vezes, até mesmo um desrespeito inaceitável, como ocorreu num caso presenciado pela sociedade brasileira, perante o qual praticamente todos ficaram boquiabertos: o descuido do próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso em relação às pessoas mais idosas deste País. Quando falamos em pessoas idosas, relacionamos diretamente aos aposentados. O Presidente da República, talvez por descuido - é o que se pode pensar, pois seria impossível imaginar que fosse de propósito ou porque Sua Excelência realmente pense assim -, dirigiu-se aos aposentados tachando-os de vagabundos. É impossível admitir que um País respeite seus idosos e utilize essa expressão para denominá-los.  

Há, portanto, um distanciamento substancial entre o cotidiano dos idosos, o tratamento que eles recebem, as dificuldades que atravessam no seu dia-a-dia simplesmente pelo direito de viver com um mínimo de dignidade e respeito pelo que já fizeram, direta ou indiretamente, durante anos, pelo desenvolvimento do País, e a realidade das leis que aí estão, em termos de igualdade, respeito e valorização dos seres humanos.  

É com esse sentimento de valorização dos idosos, Srs. Senadores, que falo nesta sessão sobre aqueles que permanecem ativos, pelas mais diversas razões, até mesmo, ou principalmente, porque precisam seguir trabalhando para sobreviver. Estamos ficando uma sociedade mais velha, é certo; mas, diante disso, é preciso romper com o infame preconceito neoliberal e considerar os idosos como membros da sociedade, em todas as suas instâncias. O que aparentemente é tratado como um problema, com a vivência, com a experiência e com a maturidade dos idosos, poderá ser uma solução para tornar nossa sociedade mais racional, mais fraterna e, principalmente, mais humana e sábia.  

Eram as nossas considerações, ao tempo em que transmito o nosso reconhecimento, a nossa solidariedade e o nosso compromisso com os idosos deste País, que representam a experiência e a energia positiva para continuarmos avançando.  

Muito obrigada.  

 

Z J


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/09/1999 - Página 25518