Discurso no Senado Federal

REALIZAÇÃO DO 'SEMINARIO DAS TESES DE CONSENSO', EM WASHINGTON, NOS ESTADOS UNIDOS, NO QUAL FOI CONSTATADA A ATUAL FALTA DE POLITICAS DE ESTADO CONTRA A POBREZA NOS PAISES EM DESENVOLVIMENTO.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • REALIZAÇÃO DO 'SEMINARIO DAS TESES DE CONSENSO', EM WASHINGTON, NOS ESTADOS UNIDOS, NO QUAL FOI CONSTATADA A ATUAL FALTA DE POLITICAS DE ESTADO CONTRA A POBREZA NOS PAISES EM DESENVOLVIMENTO.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 29/09/1999 - Página 25664
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, TASSO JEREISSATI, GOVERNADOR, ESTADO DO CEARA (CE), PUBLICAÇÃO, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ASSUNTO, POLITICA INTERNACIONAL, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, INCAPACIDADE, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA.
  • REGISTRO, CONTESTAÇÃO, AUTORIA, ORGANISMO INTERNACIONAL, INEFICACIA, MODELO ECONOMICO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, NECESSIDADE, ATENÇÃO, POLITICA SOCIAL, RETOMADA, FUNÇÃO, ESTADO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, PAIS.
  • DEFESA, GOVERNADOR, ESTADO DO CEARA (CE), RENEGOCIAÇÃO, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), PROPOSTA, REVISÃO, POLITICA, OBJETIVO, REDUÇÃO, EMPOBRECIMENTO, BRASIL.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não quero me alongar para não retardar a interferência da nobre Senadora Marina Silva, que vai, logo mais, usar a tribuna para falar como Líder. Queria apenas registrar entrevista concedida pelo Governador Tasso Jereissati ao Jornal O Globo , domingo, 26 de setembro, e pinçar rapidamente alguns pontos dessa entrevista que julgo importantes.  

S. Exª concedeu essa entrevista às vésperas de viajar para os Estados Unidos, a convite do Banco Mundial, para um seminário de revisão das teses do chamado Consenso de Washington, que privilegiam a manutenção da estabilidade monetária como prioridade da economia. E diz S. Exª, durante essa entrevista, que tem críticas à condução da política econômica, que vão desde a crítica do modelo em si até a sua operacionalização. Não obstante reconhecer méritos da administração do Presidente Fernando Henrique, a maior crítica que ele faz é quanto à "incapacidade que o modelo teve" — e as palavras são suas — "de gerar uma política de desenvolvimento e de desconcentração de renda", ou seja, de superação da pobreza.  

Sua Excelência insiste nessa tecla ao longo da entrevista, mostrando que, hoje, são as instituições multilaterais internacionais, como o Banco Mundial, o FMI, a Unctad e outros organismos, além de estudiosos, cientistas políticos e economistas, que consideram que o modelo está-se revelando inviável, uma vez que os sacrifícios exigidos desses países foi muito grande. No entanto, as questões básicas, que dizem respeito à existência do ser humano, as questões sociais, as questões ligadas ao emprego, à educação e à saúde, não foram resolvidas. Pelo contrário, muitas delas se agravaram em função das mudanças estruturais que estão sendo empreendidas por conta da execução dessas políticas.  

Portanto, há uma contestação à concepção das políticas econômicas agora revelada. Os organismos internacionais que patrocinaram essas políticas agora mostram que há necessidade, pelo menos, de introduzir elementos de proteção social que, ao lado da busca da estabilidade da economia, do combate à inflação, ao desperdício e ao déficit público, protejam essas populações, principalmente as mais pobres, as mais necessitadas, aquelas que demandam ainda muito da ação do Estado. Outra coisa que ele faz questão de dizer nessa entrevista é que não há por que afastarmos o Estado, nesses países em desenvolvimento, da execução de tarefas que são extremamente importantes para o desenvolvimento do país e para a melhoria das condições sociais das suas populações.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - V. Exª me concede um aparte?  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Concedo um aparte a V. Exª, com toda a alegria, Senadora Heloisa Helena.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Lúcio Alcântara, tive oportunidade de discutir, na semana passada, nesta Casa, as últimas declarações das chamadas instituições multilaterais, especialmente as quatro mundiais mais poderosas: BID, BIRD, FMI e ONU. Sinceramente, irrita-me profundamente a suposta mea culpa que essas instituições fazem hoje em relação ao Brasil. Como V. Exª dizia, foram elas mesmas quem impuseram, especialmente aos países em desenvolvimento - que, para elas, são os mercados emergentes, sendo que muitos gostam de ser chamados assim -, esse tipo de ajuste fiscal e que redundou na fome, na miséria, no desemprego, na humilhação e no sofrimento. Hoje, esses organismos estão numa suposta mea culpa internacional. Aqui discutíamos que, se elas estão realmente fazendo mea culpa , se estão preocupadas e desenvolveram um sentimento repentino de solidariedade internacional, poderiam abrir mão de algumas imposições, especialmente em relação aos juros e serviços da dívida externa. Poderiam até antecipar a posição que Bill Clinton está tomando hoje, como ocorreu há dois meses no tocante aos países pobres e miseráveis da África. Naquela ocasião, em uma reunião do G-7, numa suposta demonstração de solidariedade internacional, ele afirmou que seria o momento de discutir o perdão da dívida ou novos moldes de renegociação da dívida dos países miseráveis e pobres daquele Continente. Talvez seja a hora de debater esse assunto. Realmente, sentimos uma profunda irritação, Senador Lúcio Alcântara, quando escutamos as críticas das instituições multilaterais assim como suas alegações de que "a globalização e a abertura comercial ocorridas na década de 90 provocaram efeitos perversos nos países em desenvolvimento". Elogiam a China e a Índia por terem sido os dois únicos países que conseguiram crescer um pouco, asseverando – são as palavras deles – que "resistiram à tentação de perseguir uma prematura liberalização comercial e uma rápida integração ao Sistema Financeiro Internacional". V. Exª já pensou nisso, Senador Lúcio Alcântara? No ano passado - há poucos meses, portanto - eram os dinossauros que diziam isso. As críticas são feitas, não à globalização - porque é uma realidade que qualquer pessoa de bom-senso entende - mas à forma de nela se inserir. Quando criticávamos a inserção subordinada e a liberalização comercial exagerada, diziam que éramos os dinossauros. Agora, eles mesmos fazem críticas. Como V. Exª também falou – e todos sabemos –, a própria Rede de Proteção Social foi inspirada em documentos do Banco Mundial, que diziam ser necessário criá-la, e alguns programas específicos, em virtude de os processos de ajuste fiscal aumentarem a miserabilidade e o empobrecimento da população. Portanto, em vez de demagogia, as instituições multilaterais deveriam ter gestos como o de fiscalizar empréstimos conferidos a esses países e que simplesmente equivalem a dar dólares para que os países em desenvolvimento tenham essa moeda no Tesouro para pagarem os juros e serviços da dívida ou garantir a agiotagem internacional. Se eles estão preocupados com a pobreza no mundo e agora estão realizando um mea culpa internacional, que o demonstrem num gesto concreto de sensibilidade para que não pareça demagogia. Imagine, Senador Lúcio Alcântara, nós, que somos nordestinos e sabemos da miséria e da situação das cestas básicas, que não são repassadas, ouvirmos o Fundo Monetário Internacional, respondendo à Folha de S. Paulo , dizendo à opinião pública que não são responsáveis pelos cortes de cestas básicas e que o corte foi feito pelo Governo Federal, nós dissemos que queríamos apenas o superávit! Compartilho as preocupações que V. Exª traz a esta Casa. Seria nossa obrigação não esperar, mas exigir. Nós, brasileiros, que estamos nessas instituições multilaterais e que somos seus acionistas importantes, queremos ver, por parte delas, uma ação enérgica, uma ação concreta pelos pobres e um gesto de solidariedade, porque até o momento não houve nenhum gesto de solidariedade. Não me contive. Senti necessidade de fazer o aparte a V. Exª.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senadora Heloisa Helena, pelo seu aparte.  

Vou concluir, porque não quero faltar com a palavra que empenhei à Senadora Marina Silva. Quero apenas dizer que pouco tenho a acrescentar. A Senadora Heloisa Helena, com a sua contundência, com a ira santa que revela em seus pronunciamentos, tem toda a razão. Essas instituições, ou erraram – e o problema é que os economistas, quando erram, erram em massa –, ou agiram de má-fé, o que é pior!  

O fato é que todos nós sabemos que os programas de ajuste são necessários, as nações têm que se modernizar, o Estado tem que se reformar. Ninguém discute isso, mas o preço que tem sido pago é muito alto. É o preço da desagregação social, do aumento do desemprego, do agravamento das condições de vida de populações marginalizadas.  

Se eles estão revendo isso, que o façam também no plano concreto, com novas políticas, com novas propostas. Uma das idéias do Governador é que o Governo brasileiro renegocie o acordo que fez com o FMI, para tornar mais suaves as metas que assumiu, uma vez que estamos assistindo à pauperização da população brasileira. Aquilo que nos fora dito como sendo a liberalização dos mercados, a abertura das fronteiras econômicas, a diminuição do Estado, a alienação das empresas controladas pelo Estado, tudo isso, por si só, geraria o desenvolvimento, empregos e o progresso. A inclusão social não aconteceu, não está acontecendo.  

Temos que, de um lado, pedir, insistir, reclamar para que essas instituições revejam essas políticas e, de outro, falar de maneira mais afirmativa nos fóruns internacionais, mostrar de maneira mais categórica, mais veemente, nossa insatisfação com isso que está acontecendo. E, dentro do possível, dentro da margem de manobra que tivermos, com o mercado que temos, com o porte da economia brasileira, com o espaço territorial que possuímos, com a população que temos, devemos apresentar nossa posição de revisão dessas políticas.  

O que for bom, o que for útil devemos manter e aperfeiçoar. Tudo aquilo que venha em detrimento do País, do povo, da população não pode contar com nosso apoio. Não podemos ficar passivos diante dessa situação.  

Sr. Presidente, meu pronunciamento tinha como objetivo registrar essas declarações do Governador. S. Exª diz que o Presidente Fernando Henrique está sensível a essas posições que ele defende, mas não há ainda um consenso dentro do Governo sobre a forma de reajustar a política econômica, de reformular essa política que está sendo colocada em prática. Espero que o Governo se curve a essa realidade e pressione esses organismos internacionais, os países ricos do chamado G-7, para uma revisão nessas políticas, que, sob certos aspectos, estão se revelando desastrosas para o Brasil e para os países subdesenvolvidos.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/09/1999 - Página 25664