Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O CRESCIMENTO DO NARCOTRAFICO NA AMERICA LATINA.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. DROGA. :
  • PREOCUPAÇÃO COM O CRESCIMENTO DO NARCOTRAFICO NA AMERICA LATINA.
Publicação
Publicação no DSF de 30/09/1999 - Página 25749
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. DROGA.
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, AMERICA LATINA, ESPECIFICAÇÃO, GUERRILHA, RECESSÃO, TENSÃO SOCIAL, AUTORITARISMO, GOVERNO.
  • CRITICA, MODELO ECONOMICO, LIBERALISMO, PROVOCAÇÃO, EXCLUSÃO, CLASSE SOCIAL, VIOLENCIA, AUMENTO, TRAFICO, DROGA.
  • COMENTARIO, DADOS, CRESCIMENTO ECONOMICO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), AMERICA LATINA, AUMENTO, POBREZA, REGISTRO, CRISE, POLITICA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, COLOMBIA.
  • GRAVIDADE, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, POSSIBILIDADE, INTERVENÇÃO, EXERCITO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • REGISTRO, POSIÇÃO, POLITICA EXTERNA, BRASIL, REPUDIO, DESRESPEITO, SOBERANIA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, CRITICA, AÇÃO MILITAR, FORÇAS ESTRANGEIRAS.
  • APREENSÃO, AUMENTO, CONSUMO, DROGA, BRASIL, REGISTRO, LEVANTAMENTO DE DADOS, PROCURADORIA DA REPUBLICA, POLICIA FEDERAL, REFERENCIA, CRIME ORGANIZADO, TRAFICO, ESTADO DO ACRE (AC).
  • DEFESA, AUMENTO, ATUAÇÃO, FORÇA AEREA BRASILEIRA (FAB), PATRULHA, ESPAÇO AEREO, BRASIL, NECESSIDADE, REGULAMENTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, INTERCEPTAÇÃO, AERONAVE.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres Colegas, a América Latina volta a conviver com a tempestade da crise, depois de experimentar uma fase de bonança, desde o início da década de 90, quando se transformou em um dos principais pólos de atração de investimentos no mundo. Problemas que pareciam coisa do passado, como guerrilha, recessão, crise social e arroubos autoritários de governantes voltaram ao primeiro plano de noticiário e fizeram ressurgir o receio com o futuro, especialmente quanto a possível aumento de violências sociais.  

A convicção é de que o modelo econômico adotado pelos principais países da região agravou a exclusão social e a expectativa é de que isso gere episódios de violência, que já tiveram início, embora ainda sem grande impacto, sobre o sistema político. O modelo econômico neoliberal foi adotado pela maioria dos países do continente no início dos anos 90 e se baseia na abertura da economia, nas privatizações e em grande fluxo de recursos para a região.  

Com esses recursos externos, os países latino-americanos conseguiram controlar o crônico processo inflacionário que sofriam desde o início da década de 80 e voltaram a crescer. A Argentina acumulou uma taxa de crescimento de 50% entre 91 e 98, para despencar, a seguir, em processo de recessão econômica e de problemas no balanço de pagamentos, do qual ainda não conseguiu sair.  

O PIB (Produto Interno Bruto) da região deverá experimentar uma queda de 0,5 a 1,5%, enquanto alguns países sofrerão bruscos aumentos nas taxas de desemprego, que chegarão a 15% da sua força de trabalho. O Produto Interno Bruto da Venezuela registrará a queda recorde de 6%, a Argentina 2% a 3%, e o Brasil e a Colômbia entre 1% e 1,5%. Os países latino-americanos sofreram uma aceleração nos seus injustos níveis de distribuição de renda, com o aumento da pobreza em todos eles, apesar do crescimento registrado no início da década de 90.  

A Venezuela revive uma experiência autoritária com a eleição do Tenente-Coronel Hugo Chávez por um eleitorado profundamente decepcionado pelo fracasso da experiência partidária na qual democratas cristãos e socialdemocratas se revezaram no poder nos últimos quarenta anos. Chávez empunha a bandeira do sonho latino-americano de Símon Bolívar, promete estatismo e nacionalismo econômico e mantém um Congresso acuado pela Constituinte que convocou. O desfecho desse insólito processo ainda é imprevisível.  

A Colômbia, Sr. Presidente, está internamente dilacerada pela guerra civil, na qual se envolvem as Forças Armadas, grupos guerrilheiros que têm mais de 40 anos de experiência e dominam quase metade de seu território, e organização paramilitar financiada pelos militares, que causam sofrimentos dolorosos aos camponeses suspeitos de colaborar com os guerrilheiros, torturando-os e matando-os às dezenas.  

O narcotráfico é o estigma que agrava a guerra intestina na Colômbia, hoje, transformada no centro que concentra produção, refino e tráfico para suprir os mercados latino-americanos e, principalmente, europeus e norte-americano. Os diplomatas comentam que os Estados Unidos já decidiram intervir na Colômbia para combater a guerrilha e o narcotráfico – só não descobriram, ainda, qual a forma da intervenção.  

O General Barry McCaffrey, designado pelo Presidente Bill Clinton para coordenar as políticas de combate ao tráfico de drogas, já esteve duas vezes no continente, tendo sustentado, em diversas oportunidades, que o problema colombiano já ultrapassou os limites fronteiriços do país para se transformar numa ameaça regional. E anunciou que pedirá mais US$2 bilhões ao Congresso dos Estados Unidos, grande parte para ajudar as Forças Armadas da Colômbia a combater a guerrilha e os traficantes.  

A Secretária de Estado, Madeleine Albright, escreveu recente artigo no importante jornal New York Times em defesa da política de seu país para a Colômbia, cuja situação é ali descrita como uma ameaça à segurança nacional dos Estados Unidos. Os grandes jornais norte-americanos exprimem o receio de que a Colômbia se transforme em uma nova Guatemala, país que sofreu 40 anos de ditadura militar e se converteu em palco de chacinas que dilaceraram seu organismo social.  

Nosso Governo já advertiu os Estados Unidos, através do Embaixador em Washington, Rubens Barbosa, que o Brasil estará disposto a dar respaldo político e institucional, mas não militar, se o governo daquele país pedir ajuda para o combate às drogas. Nosso representante informou à Casa Branca que qualquer ingerência nos assuntos internos da Colômbia entra em conflito com os fundamentos da política externa brasileira, de respeito à autodeterminação dos povos.  

Sr. Presidente, nobres colegas, a crise econômica é um caldo de cultura que favorece a expansão do tráfico de drogas na América Latina. A região transformou-se no grande centro produtor e transformador de narcóticos para consumo de seus países e dos ricos mercados europeu e norte-americano. Nos últimos tempos, essa verdadeira hidra, que é o crime organizado, ganhou grande desenvoltura em uma ação que pretende transformar o Brasil não apenas no corredor estratégico para o tráfico de tóxico, mas, também, em centro consumidor.  

A imprensa acaba de revelar a existência de um cartel brasileiro, responsável pela distribuição de mais de 80 toneladas de drogas com um rendimento seis vezes superior à arrecadação do Estado. Levantamento elaborado pela Procuradoria da República e a Polícia Federal, chamado "Dossiê Cartel do Acre", representa uma mudança de tudo quanto se sabia a respeito do tráfico de drogas no Brasil.  

Por outro lado, segundo cálculos do Programa das Nações Unidas para o Controle Internacional de Drogas (UNCDP), as quadrilhas, os grupos organizados na produção e distribuição de tóxicos movimentam cerca de US$ 750 bilhões, uma cifra astronômica que lhes confere poder político e econômico sem igual, para se infiltrar e contaminar pessoas e instituições.  

É muito dinheiro, Sr. Presidente. Calcula-se em US$750 milhões (setecentos e cinqüenta milhões de dólares) o movimento gerado.  

Na sua recente viagem à América latina, inclusive ao Brasil, o General Barry McCafrey revelou que saem da Colômbia 80% da cocaína e heroína consumidas nos Estados Unidos. Isso significa que os Cartéis de Cali e Medellín, que se impuseram à própria Máfia na organização do cultivo, produção e tráfico de drogas no mundo, importou a papoula, nativa da Turquia e de outros países do Oriente, para produzir também heroína, estupefaciente derivado da morfina, que por sua vez é obtido do ópio, um dos narcóticos mais pesados que existem e que causam graves malefícios ao organismo humano.  

Nesse mister, os grupos criminosos, cujas teias se estendem pelas selvas dos países amazônicos, inclusive do Brasil, até as grandes cidades, não vacilam em utilizar o conhecimento dos índios sobre a intrincada e imensa rede de igarapés, a fim de transportar as drogas destinadas ao consumo dos grandes centros urbanos, fugindo à fiscalização dos Estados nacionais.  

Os especialistas sustentam que é de apenas 20% a 30% o índice de recuperação dos viciados, mas reconhecem que, a custo de um esforço clínico considerável e da cooperação do dependente, o nível real de recuperação não excede a 10%. Não há dúvida de que o vício leva geralmente à morte prematura, não sendo preciso lembrar os gastos consideráveis que faz o Estado para financiar programas de recuperação.  

Dados de posse do Programa das Nações Unidas para o Controle Internacional de Drogas (UNCDP) estima que um exército de cem mil pessoas dá suporte às atividades das quadrilhas responsáveis pelo refino e distribuição de drogas no Brasil. Veja bem, Sr. Presidente, nobre colegas, um exército de cerca de cem mil pessoas trabalha no preparo e distribuição da droga. Só no Rio de Janeiro, espalhados pelos morros e na periferia, dez mil pessoas foram recrutadas para a atividade criminosa, ganhando salários que vão de R$5.000,00 a R$50.000,00, dependendo do grau de hierarquia do cargo. A atividade econômica nesse setor não conhece as agruras da recessão, que atinge aqueles que se dedicam a negócios honestos.  

É um exército que se movimenta à vontade, ora sob o rótulo de economia informal, ora sob a capa de contravenções várias, quando não do banditismo puro e simples. Estima-se que existe uma legião de um milhão de camelôs, sendo 300 mil só no Rio de Janeiro, além de 50 mil apontadores do jogo do bicho e de dez mil flanelinhas. Claro que a maioria é constituída de gente honesta, mas muitas dessas pessoas não relutam em servir às inúmeras atividades do tráfico, atraídas por remuneração sempre generosa, ainda que enfrentando os riscos inerentes a qualquer atividade criminosa.  

Ao depor perante a Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga o tráfico de drogas, o delegado Vicente Chelotti, ex-diretor da Política Federal, revelou que, de forma impune, o narcotráfico viola diariamente o espaço aéreo brasileiro. Aquele policial estima que 400 toneladas de pasta de cocaína cruzam as selvas de avião, desde os centros de produção e refino, no Peru, até a Colômbia, transportadas pelos cartéis no imenso território brasileiro.  

Sr. Presidente, faço esta exposição porque entendo a sua importância. Como restam 12 minutos para o término desta sessão, ocuparei esta tribuna por mais quatro ou cinco minutos, ao fim dos quais o eminente Senador do Espírito Santo Paulo Hartung poderá fazer considerações sobre este importante tema. Se não me for possível expor todo o tema que trago por escrito, peço à Mesa que o faça constar dos Anais desta Casa.  

Continuo. 

Os especialistas defendem maior participação da Força Aérea Brasileira no patrulhamento e no abate de aviões que invadam o espaço aéreo do País, sustentando que essa instituição militar tem meios para identificar e interceptar as aeronaves clandestinas. E vêm reclamando a urgente regulamentação da lei que permite o abate de aviões suspeitos, que se recusarem a aterrissar imediatamente e que foi aprovada pelo Congresso há mais de um ano.

 

Todos concordam que a implantação do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) permitirá maior controle do espaço aéreo brasileiro. Mas como controlar a rede de transporte da droga que opera à sombra da mata fechada, cujas copas se elevam a mais de 20 metros de altura e que se utilizam do conhecimento milenar dos índios sob a direção da intrincada rede de igarapés que cortam a floresta inteira?  

São temas que devem ser debatidos.  

Oportunamente, Sr. Presidente, apresentaremos à Casa requerimento de informações ao Ministério da Aeronáutica, para que revele detalhadamente o atual estágio de implantação do projeto de segurança na Amazônia - o Sivam, o balanço das suas atividades e os gastos decorrentes, bem como a estimativa de prazo para a conclusão de todo o projeto. A vigilância sobre a imensa região só terá eficiência quando o Estado brasileiro alocar recursos ao projeto, visando a garantir uma atualizada tecnologia de ponta, para que possamos atingir os nossos objetivos, aí incluso o de segurança das nossas fronteiras.  

Sr. Presidente, peço a V. Exª que receba este pronunciamento, que ainda contém sete ou oito páginas. Ao arrolar esses fatos impressionantes, meu objetivo é alertar a sociedade brasileira e, particularmente, o Governo Federal, para que fiquem vigilantes diante dos riscos que o Brasil e a América Latina estão correndo, principalmente nesta fase de grandes dificuldades econômicas que ora atravessamos.  

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SEGUE NA ÍNTEGRA DISCURSO DO SENADOR CASILDO MALDANER.  

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(Continua o Sr. Casildo Maldaner)  

Sendo assim, Sr. Presidente, deixo mais uma vez o alerta que fazem professores, estudiosos e educadores do assunto: que toda a sociedade seja envolvida neste tema de segurança, pois a questão da Colômbia está extrapolando as fronteiras do nosso País, uma vez que usa os igarapés e as selvas amazônicas. De acordo com os números levantados, a questão está causando-nos preocupação, porque o nosso País começa a ser um meio para que isso se prolifere. Precisamos estar todos preocupados não só com o cancelamento da produção do tráfico, mas também com as medidas preventivas para que, principalmente nossos jovens, tenham cuidado.  

Então, precisamos inculcar para quê? Nas nossas escolas, desde o início, e cada vez mais, em sintonia, em parceria com todos os setores, esse trabalho deve ser deflagrado.  

Trago este tema e peço a V. Exª, Sr. Presidente, que dê por recebida toda a minha análise para constar nos Anais desta Casa e para que possamos também ouvir o eminente Senador Paulo Hartung.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/09/1999 - Página 25749