Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DAS SANTAS CASAS DE MISERICORDIA NO ATENDIMENTO AOS POBRES. NECESSIDADE DE RECUPERAÇÃO DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • IMPORTANCIA DAS SANTAS CASAS DE MISERICORDIA NO ATENDIMENTO AOS POBRES. NECESSIDADE DE RECUPERAÇÃO DO SISTEMA UNICO DE SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/1999 - Página 31811
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, HISTORIA, CRIAÇÃO, SANTA CASA DE MISERICORDIA, IMPORTANCIA, SAUDE PUBLICA, POPULAÇÃO CARENTE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CRISE, POSTERIORIDADE, IMPLANTAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), MOTIVO, INFERIORIDADE, VALOR, TABELA, PAGAMENTO.
  • DEFESA, RECUPERAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), REAJUSTE, TABELA, REGISTRO, CAMPANHA, PRESERVAÇÃO, SANTA CASA DE MISERICORDIA.
  • REGISTRO, PROGRAMA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), AUXILIO, HOSPITAL, OBRA FILANTROPICA, ATRASO, LIBERAÇÃO, RECURSOS, EMPRESTIMO.
  • APOIO, TRAMITAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, VINCULAÇÃO, REPASSE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, SAUDE.

O SR.CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em Portugal, no longínquo ano de 1498, Dona Leonor de Lencastre, a "Rainha dos Sofredores e Piedosa", instituiu, na Capela de Nossa Senhora da Piedade, a primeira Irmandade da Misericórdia, nomeando seu provedor Frei Miguel de Contreras, espanhol, membro da Ordem da Santíssima Trindade e seu confessor. A Misericórdia assumiu, imediatamente, a manutenção do Hospital Real de Todos os Santos e foi o inicio de uma das obras filantrópicas mais importantes que o mundo veio a conhecer.  

Desde aquela época as Irmandades de Misericórdia, que se disseminaram por Portugal, Brasil, África, Índia, Japão, Arábia, Pérsia, Indochina, China e Indonésia, já exerciam uma ação social que deveria ser responsabilidade do Estado: o cuidado com a saúde dos necessitados.  

Da expedição de Martim Afonso de Souza, que aportou ao Brasil em 1532, fazia parte o fidalgo Braz Cubas, neto de Nuno Rodrigues, fundador e mantenedor da Santa Casa de Misericórdia do Porto. Provavelmente por essa razão, resolveu construir no sopé do outeiro de Santa Catarina um hospital que foi inaugurado no dia de Todos os Santos, 1° de novembro de 1543. Chamou-o de Hospital de Todos os Santos. E, em 1551, conseguiu de D. João III, em Almeirim, o alvará real de privilégios.  

Logo após essa inauguração, algumas outras Misericórdias foram criadas no Brasil: a da Bahia, de Tomé de Sousa; a do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, de José de Anchieta; a de Olinda, de João Pais Barreto e a de São Paulo. De lá para cá centenas de outras Santas Casas foram construídas no País, quase todas com a finalidade principal de atendimento à população de baixa renda.  

Essas Misericórdias fazem parte intrínseca da História do Brasil. Foram os primeiros hospitais a cuidar de nosso povo. Trataram pobres e ricos com a mesma competência e bondade, características que lhes são inerentes. Atenderam a nobres e seus vassalos; a fazendeiros e seus escravos; a desbravadores e condenados e até hoje mantêm o mesmo espírito. Recebem patrões e operários, empregados e desempregados com o mesmo espírito humanitário, sem qualquer distinção.  

Durante séculos, as Santas Casas desempenharam papel que cabe ao Estado, garantindo à população excelentes serviços de saúde gratuitos. A assistência que prestam tem caráter público, no exercício de um trabalho permanente, autêntico sacerdócio. Infelizmente, a Constituição de 1988, mesmo ao reconhecer que a saúde é direito de todos e dever do Estado, desconsiderou o trabalho das Santas Casas e demais entidades filantrópicas. Permitiu que elas participassem do sistema de saúde de forma complementar, relegando a plano secundário o trabalho público que essas entidades, mesmo privadas, vinham prestando secularmente ao País. E, desde então teve início a montagem do terrível e vergonhoso quadro de abandono da saúde pública, como se o Estado nada tivesse a ver com ela.  

Este intróito foi apenas para lembrar o papel importante que as Santas Casas de Misericórdia vêm desenvolvendo no Brasil, há quase quinhentos anos. Em muitas cidades são o único lugar em que os pobres e excluídos encontram atendimento médico. A crise que assola a saúde pública no Brasil tem repercutido profundamente nessas instituições, algumas das quais viram-se obrigadas a fechar suas portas.  

O Sistema Único de Saúde – SUS, introduzido no País na Constituição de 1988, foi tomado como exemplo em vários países do mundo. O tempo, entretanto, está nos mostrando que tal sistema não pode funcionar enquanto o Governo insistir na atuais tabelas de pagamento. É inacreditável que o SUS pague por uma diária hospitalar R$ 3,50 e por uma consulta médica R$ 2,04, enquanto uma diária de presidiário custa R$ 24,00 e a de um menor internado na FEBEM, R$ 57,00.  

Urgente, assim, torna-se a recuperação do SUS para atendimento à população que não tem condições de pagar planos de saúde. O reajuste nas tabelas de serviços do SUS é o primeiro passo para que se impeça o fechamento de instituições beneficentes que atuam na área de saúde. Em setembro passado, a justiça gaúcha concedeu a primeira liminar garantindo um aumento imediato da tabela do SUS de 9,56%, fato esse que ainda não foi consumado, porque só agora em novembro são efetuados os pagamentos referentes ao mês de agosto.  

A situação dos hospitais filantrópicos deteriorou-se de tal forma que foi lançada no início deste ano a Operação Salva-Vidas, cujo slogan é "quem salva vidas está morrendo". O Brasil possui 2.600 hospitais beneficentes com 215 mil leitos, que respondem por 1,2 milhão de consultas médicas e ambulatoriais por mês, realizam 250 mil exames complementares e são responsáveis por 450 mil empregos diretos. Cinqüenta dessas instituições fecharam no último ano, devido a dívidas e muitas outras estão em vias de fazer o mesmo, caso não resolvam seus problemas financeiros.  

Sensibilizado pela campanha das Santas Casas, o Ministro da Saúde, José Serra, lançou, no primeiro semestre deste ano, um programa que viria em auxílio desses nosocômios. Seria uma espécie de PROER das Santas Casas, uma operação de socorro financeiro, por meio de uma linha de financiamento. Foi criado então o Programa de Reestruturação Financeira e Modernização Gerencial dos hospitais filantrópicos vinculados ao SUS, que seria implantado pelo Ministério da Saúde, em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES e a Caixa Econômica Federal.  

Seriam R$ 300 milhões destinados a socorrer, ainda este ano, as Santas Casas e hospitais beneficentes que se encontravam mergulhados em dívidas. Dois terços do Programa têm origem no Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT e o resto vem de dividendos do BNDES, que deveriam ser repassados ao Tesouro Nacional. Os R$ 100 milhões iniciais previstos para liberação ainda não o foram, provavelmente em razão da burocracia que impera em nosso serviço público.  

Esses empréstimos previam um ano de carência e até oito anos para o pagamento, com juros de 1% mais 50% da Taxa de Juros a Longo Prazo – TJLP. O primeiro contrato foi assinado em 21 de junho passado, com a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, que faria jus a R$ 32 milhões, até hoje não recebidos integralmente pela entidade. Entraves burocráticos não permitiram ainda que outros empréstimos, que estão sendo negociados desde o lançamento do Programa, fossem concluídos. Assim, o Hospital Santa Marcelina, em São Paulo, a Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte e mais dez outros hospitais que pediram inclusão no programa não foram até hoje atendidos.  

A situação agravou-se de tal forma que, no dia 21 de setembro passado, donos e empregados de hospitais, vestidos de branco, foram à Esplanada dos Ministérios para tentar a aprovação de duas emendas à Constituição que obriguem União, Estados e Municípios ao repasse de valores equivalentes, anualmente, para o custeio dos serviços de saúde.  

Com o apoio do Ministro da Saúde, favorável à vinculação orçamentária para o setor saúde, o Deputado Ursino Queiroz, relator das Emendas apresentadas pelos Deputados Eduardo Jorge e Carlos Mosconi, uniu-as em uma só para apressar a tramitação e a votação. Se aprovada, essa Emenda trará um reforço de caixa considerável para o setor saúde. A elevação dos atuais gastos de R$ 170 para R$ 250 por habitante seria uma conseqüência dessa Emenda.  

Recentemente, foi aprovado, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Emenda Constitucional que defendeu a vinculação constitucional do repasse para a saúde de 64% da arrecadação da Cofins e da fonte sobre lucro das empresas. A vinculação será gradativa, iniciando com 47% dessas receitas no ano 2000 até chegar a 64% em 2004. A contrapartida dos Estados e Municípios também varia de 12% a 15% de seus orçamentos, começando com 7%. Esperamos que essa Emenda continue sua tramitação com sucesso, pois se promulgada, será de grande valia para a saúde pública de nosso País.  

Muito obrigado.  

 

P ªÂ


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/1999 - Página 31811