Discurso durante a 23ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DE UMA SOCIEDADE BASEADA EM VALORES MAIS FRATERNOS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO AOS IDOSOS.

Autor
Luzia Toledo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Luzia Alves Toledo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA SOCIAL.:
  • DEFESA DE UMA SOCIEDADE BASEADA EM VALORES MAIS FRATERNOS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO AOS IDOSOS.
Publicação
Publicação no DSF de 10/02/2000 - Página 2074
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, BRASIL, AUMENTO, PRIVILEGIO, DESIGUALDADE SOCIAL, DISCRIMINAÇÃO, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE.
  • ANALISE, DADOS, AUMENTO, NUMERO, IDOSO, POPULAÇÃO, DESPREPARO, PAIS, ATENDIMENTO, PREVIDENCIA SOCIAL, ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR, PLANO, SAUDE.
  • APREENSÃO, PREVISÃO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA E ASSISTENCIA SOCIAL (MPAS), AUMENTO, DEFICIT, PREVIDENCIA SOCIAL, ANALISE, NECESSIDADE, CORREÇÃO, SEGURIDADE SOCIAL, AMBITO, FISCALIZAÇÃO, MELHORIA, BENEFICIO, COMBATE, INJUSTIÇA, INCLUSÃO, ECONOMIA INFORMAL, ARRECADAÇÃO, REDUÇÃO, ALIQUOTA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO, CORTE, RECURSOS, POLITICA SOCIAL, PREJUIZO, IDOSO.

A SRª LUZIA TOLEDO (PSDB – ES) – Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ao longo desses quinhentos anos, toda a nossa formação histórica e cultural resultou do binômio: autoritarismo interno e dependência internacional.  

Diante dessa realidade, as elites do poder nunca tiveram grande preocupação em construir uma sociedade baseada em valores mais fraternos; nunca procuraram fortalecer as relações interpessoais; nunca se importaram em tornar as instituições nacionais mais sérias, com o fim da impunidade e dos privilégios descabidos; nunca valorizaram a democracia e, principalmente, nunca procuraram integrar a parte mais pobre da população ao processo histórico de formação econômica, política e social, promovendo, de maneira mais justa, a distribuição dos fantásticos benefícios que ele proporcionou nesses quinhentos anos de acumulação capitalista em nossas terras.  

Muito pelo contrário, ao longo de toda essa trajetória, os privilegiados ficaram cada vez mais ricos e poderosos, e os pobres, cada vez mais sofridos e marginalizados, recebendo, quando muito, apenas as migalhas do grande bolo.  

Inegavelmente, o resultado desse processo gerou uma sociedade perigosamente deformada, atingida pela corrupção, pelo paternalismo, pelo egoísmo e pelo individualismo, pela impunidade dos poderosos, pela violência indiscriminada e pelas injustiças sociais que crescem assustadoramente.  

Lamentavelmente, não podemos deixar de reconhecer que a nossa sociedade está completamente impregnada pelos valores negativos que foram gerados no universo das elites e que constituem, no dia a dia dos indivíduos, a ideologia de suas relações sociais.  

Por exemplo, no campo dos preconceitos, podemos afirmar categoricamente, que o tecido social brasileiro está impregnado por forte rejeição a pobre, índio, negro, mulato, japonês, português, nordestino, cigano, velho, homossexuais, enfim, as chamadas minorias.  

Por outro lado, no que diz respeito à modernização das relações capitalistas, percebe-se que, nos últimos anos, notadamente nas chamadas economias emergentes, com o avanço impressionante da sociedade de consumo, que abriu as portas para a era da informação digital e da globalização, tem havido um desgaste ainda mais considerável nas relações interpessoais e um deformação ainda mais grave das estruturas sociais.  

Assim, nessa sociedade complexa e globalizada, onde o mercado dita as regras, e da qual somos o exemplo mais importante no Terceiro Mundo, vimos aumentar a segregação; a separação física e política dos incluídos em relação aos excluídos; as dificuldades cada vez maiores desses últimos em realizar desejos sociais, culturais e materiais reprimidos; o isolamento dos indivíduos nas megalópoles, já ameaçadas em sua governabilidade; e a impossibilidade de as camadas desfavorecidas cobrarem o cumprimento de suas demandas, teoricamente garantidas pelo Estado, mas nem sempre respeitadas.  

A bem da verdade, a globalização trouxe consigo a solidão que é o contrário da solidariedade social, levou o indivíduo à impotência, e a ter de lutar praticamente sozinho, em defesa das pequenas conquistas consignadas depois de muitas lutas e ao longo de toda uma vida de trabalho.  

Entre esses milhões de indivíduos que lutam sozinhos para sobreviver no quotidiano de suas vidas, estão os idosos, cujo número não para de crescer na pirâmide demográfica brasileira.  

Segundo estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), desde o início da década de 1960, o Brasil vem apresentando um aumento importante no envelhecimento de sua população. Aliás, o que sempre foi uma realidade dos países desenvolvidos, passa agora a ser também dos países do Terceiro Mundo como Nigéria, Paquistão, México, Indonésia, Índia, Brasil e outros mais.  

Por sua vez, consultando as projeções estatísticas feitas pela Organização Mundial de Saúde, temos que, entre 1950 e 2025, a população de idosos no Brasil crescerá 16 vezes enquanto que a população total aumentará de apenas 5 vezes. Se essas previsões se confirmarem, o Brasil será o sexto país do mundo em população idosa, com cerca de 32 milhões de habitantes com 60 anos e mais.  

Porém, o maior problema que teremos de enfrentar é que não estamos ainda preparados para assumir as responsabilidades dessa nova realidade, que já é constatada nos dias de hoje em nosso País. É preciso saber que o desafio desta questão não envolve apenas programas de Governo voltados para a terceira idade. O maior desafio mesmo é cultural, e como já vimos, extremamente difícil de ser rompido em uma sociedade, onde as pessoas idosas são consideradas como um estorvo.  

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, os idosos estão vivendo com muita dificuldade e as perspectivas de melhora são muito tímidas. A Previdência não vê com bons olhos o crescimento dos investimentos que tem de fazer a cada ano para atendê-los; os hospitais por sua vez não estão equipados para recebê-los; a publicidade e a sociedade de consumo os ignoram; e muitas famílias os rejeitam e os internam em asilos precários, onde freqüentemente acontecem acidentes fatais. Não faz muito tempo, em 1996, o genocídio da Clínica Santa Genoveva, no Rio de Janeiro, demonstra muito bem, o tamanho do descaso com os idosos em nosso País. Finalmente, no que se refere aos planos de saúde, a partir dos 55 anos de idade, os custos vão às alturas, ao mesmo tempo em que os benefícios são drasticamente reduzidos.  

Segundo previsões do Ministério da Previdência Social, nos próximos dez anos, os acréscimos dos gastos com saúde dos idosos e com pagamentos de novas aposentadorias, deverão elevar o déficit da seguridade social para algo como 4% do Produto Interno Bruto.  

Tal notícia é das mais preocupantes quando sabemos que as contribuições previdenciárias são bastante elevadas, tanto para o empregador quanto para o empregado. Enquanto as empresas recolhem 22% ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), inclusive seguro-acidente, os empregados são obrigados a recolherem, em média, quase um terço do que ganham.  

Mais preocupante, ainda, é saber que essas contribuições provêm apenas da metade da força de trabalho, enquanto a outra metade, que vive na economia subterrânea, nada paga e ainda contribui para estrangular o sistema. Além do mais, os que nada pagam, usam o Sistema Único de Saúde (SUS) em caso de doença ou acidente, e recebem verbas assistenciais do INSS depois dos 65 anos de idade. Enquanto isso, o atendimento deixa de ser eficiente e os que pagam, enfrentam as piores situações, como todos nós já conhecemos.  

Como se não bastasse essa grande distorção, outra igualmente grave se soma para tornar o sistema, como um todo, sem condições concretas para dar atendimento decente aos que realmente têm direito e aos que mais necessitam. De um lado, estão os gastos exorbitantes que a seguridade realiza com poucos, prejudicando a maioria, e do outro, estão as injustiças sociais e os aposentados precoces que complementam o caos previdenciário.  

Grosso modo, para que o atendimento seja mais decente, as distorções precisam ser imediatamente corrigidas. Assim dizendo, seria necessário melhorar a fiscalização, melhorar os benefícios, acabar com as injustiças, criar exigências para que a arrecadação da economia informal seja realmente efetivada, e reduzir as atuais alíquotas de contribuição. Só assim, a previdência social no Brasil poderia atender com dignidade aos que dela dependem. Caso contrário, os idosos continuarão a sofrer nas filas dos hospitais, nas filas dos bancos e nas filas da própria previdência.  

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, em pleno Ano Internacional do Idoso, consagrado pela Organização das Nações Unidas (ONU), os presentes não foram bons para a terceira idade. Devemos reconhecer que as ações governamentais no campo social estão muito longe de representar as aspirações dos que já atravessaram a barreira dos 60 anos de idade. Portanto, seja lá onde for, no SUS, nas repartições públicas em geral, junto às empresas de transporte público e nas ruas, os idosos são maltratados. O tão propalado Programa Nacional de Assistência ao Idoso, lançado há dois anos, mal saiu do papel. Para agravar ainda mais a situação, logo após a crise do real, no início deste ano, importantes programas nas áreas de saúde e assistência social, tiveram seus valores diminuídos. Segundo conclui-se, cerca de um milhão e novecentos mil idosos foram atingidos diretamente pelos cortes governamentais.  

A rubrica em que os idosos estavam incluídos e que dispunha inicialmente de 410 milhões de reais, sofreu um corte da ordem de 35%. No que se refere ao investimento per capita com a população idosa, é importante dizer que, em conseqüência dos abalos econômicos, ele caiu de R$ 8,48 para R$ 5,90 ao ano.  

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, a crise econômica e social que vivemos tem gerado distorções alarmantes. Em meio a esse vendaval, os idosos têm pago um alto preço porque encontram-se juntamente no lado mais frágil da cadeia social e os seus direitos não são respeitados.  

Pelo que se vê, de nada adianta comemorações em torno do Ano Internacional do Idoso, aplausos à aprovação do Estatuto do Idoso e outras legislações, em um País que precisa, em primeiro lugar, de educação e de mudança de mentalidade para aprender a cumprir e respeitar as leis. É justamente aí que entra a questão da impunidade, à qual já fizemos referência no início deste pronunciamento.  

Para finalizar, gostaria de dizer que é preciso criar, em nosso País, uma nova identidade política e moral. Todos nós sabemos que a reversão é difícil, mas não é impossível. Acredito que os fundamentos dessa nova vida política e moral repousam, justamente, no seio das organizações sociais mais ativas, e nos grandes movimentos que lutam pela regeneração da solidariedade. Vale a pena procurá-los.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigada.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/02/2000 - Página 2074