Discurso durante a 26ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REGISTRO DA VISITA DO MINISTRO DA JUSTIÇA AO ESPIRITO SANTO. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS RESULTADOS INICIAIS DO PROGRAMA BRASIL EMPREENDEDOR E SOBRE A LEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTA AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS.

Autor
Paulo Hartung (PPS - CIDADANIA/ES)
Nome completo: Paulo César Hartung Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • REGISTRO DA VISITA DO MINISTRO DA JUSTIÇA AO ESPIRITO SANTO. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS RESULTADOS INICIAIS DO PROGRAMA BRASIL EMPREENDEDOR E SOBRE A LEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTA AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS.
Publicação
Publicação no DSF de 15/02/2000 - Página 2415
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, JOSE CARLOS DIAS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES).
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, RESULTADO, PROGRAMA DE GOVERNO, REFERENCIA, POLITICA DE CREDITO, TREINAMENTO, PESSOAL, VIABILIDADE, REGULAMENTAÇÃO, FUNDOS, AVAL, PROGRAMA, CRIAÇÃO, EMPREGO, RENDA, GARANTIA, RISCOS, FINANCIAMENTO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, BENEFICIO, MICROEMPRESA, PEQUENA EMPRESA.
  • IMPORTANCIA, PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, NATUREZA FISCAL, MICROEMPRESA, PEQUENA EMPRESA, POSSIBILIDADE, REGULARIZAÇÃO, SITUAÇÃO, EMPRESA, RECEITA FEDERAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), VIABILIDADE, ACESSO, BENEFICIO, CREDITOS.
  • IMPORTANCIA, REGULAMENTAÇÃO, ESTATUTO DA MICROEMPRESA, ABERTURA, POSSIBILIDADE, APOIO, NATUREZA CREDITICIA, AMPLIAÇÃO, FACILIDADE, EXPORTAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, CAPACIDADE, INSTITUIÇÃO EMPRESARIAL.

O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Senadores, inicialmente, para dizer, desta tribuna, que o Ministro da Justiça, José Carlos Dias, estará no Espírito Santo, na próxima quarta-feira.

Por meio dos jornais, tenho conhecimento de que S. Exª vai ao meu Estado por solicitação do Sr. Governador e de diversas entidades de meio ambiente, que lutam contra a impunidade e contra a violência.

Antes de entrar no meu pronunciamento propriamente dito, que é sobre a questão da microempresa no Brasil, eu gostaria de deixar registrado que o Ministro vai com total apoio nosso - creio que, como representante do Espírito Santo, é bom dizer isso aqui, em alto e bom tom.

Espero que S. Exª se some à luta de nosso povo; espero que contribua com o nosso Estado; libere recursos humanos, materiais, financeiros para o trabalho da segurança pública no Espírito Santo; e reforce o trabalho da Polícia Federal, hoje desmantelada no Estado. Digo isso interpretando o sentimento do cidadão capixaba - e precisava fazê-lo. Eu, que era o quarto orador inscrito, esperei pacientemente a oportunidade de manifestar-me acerca deste assunto, mas valeu a pena para ver a emoção da Senadora Heloisa Helena e uma série de fatos discutidos e relatados nesta tarde, no plenário do Senado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lançado em outubro do ano passado, o Programa Brasil Empreendedor já apresentou, naquele último trimestre, alguns resultados importantes. Dados oficiais publicados recentemente dão conta de que, nesse período, o Programa, que considero relevante, formou mais de 5 mil agentes de crédito, treinou 86 mil empreendedores e contratou mais de 207 mil operações de crédito, num valor superior a R$2,5 bilhões.

A perspectiva do Programa é de que, para este ano, os resultados esperados sejam melhores, dependendo, evidentemente, de uma série de regulamentações de que quero tratar neste pronunciamento. A primeira delas é a regulamentação do Funproger - Fundo de Aval do Programa de Geração de Emprego e Renda - Setor Urbano, o chamado Proger Urbano, que será operado pelo Banco do Brasil.

Regulamentado pelo Codefat nos últimos dias de 1999, com uma dotação de recursos de R$50 milhões, o Funproger terá como finalidade garantir parte do risco dos financiamentos concedidos pelas instituições financeiras oficiais federais, diretamente ou por intermédio de outras instituições financeiras - e todos sabemos que o grande problema que faz com que o crédito não chegue para quem precisa está no fato de que as instituições financeiras não querem assumir o risco das operações. Nesse sentido, o Funproger vem aliar esforços a outros dois fundos de aval, constituídos com recursos públicos, já em operação: o FGPC - Fundo de Garantia de Produtividade e Competitividade, do BNDES; e o Fundo de Aval do Sebrae - Fampe.

Gostaria de lembrar, ainda, uma segunda implementação, a do Refis - Programa de Recuperação Fiscal, ao qual já fiz menção em pronunciamento recente desta tribuna. Muito embora aberto a empresas de qualquer porte, na minha visão, o Refis é especialmente interessante para as pequenas e microempresas, pois, ao regularizarem sua situação junto à Receita Federal e ao INSS, elas poderão ter acesso aos benefícios desse Programa Brasil Empreendedor, especialmente os relacionados ao crédito, ao treinamento e à política de compras do Governo.

As empresas devedoras da Receita Federal e do INSS têm, a partir de hoje, Sr. Presidente, até o dia 31 de março para se inscrever no Refis. É interessante assinalar que, no refinanciamento das dívidas, não está previsto o tradicional parcelamento de débitos, com prazo determinado e prestações fixas. Ao contrário, adota-se o critério - um avanço, a meu juízo - do comprometimento de uma parcela do faturamento; uma parcela diferenciada segundo a capacidade de pagamento de cada setor. Nesse sentido, da parte do Governo, a implementação do Refis não deixa de ser uma confissão de culpa muito clara. Culpa pela extorsiva política monetária praticada no País nos últimos anos e pela crescente carga fiscal, que já passou dos 30% do nosso Produto Interno Bruto.

Embora, Sr. Presidente, represente um avanço, pois reabre as perspectivas para a expansão do segmento, o Refis está ainda muito aquém das necessidades e das possibilidades das pequenas e microempresas do nosso País.

O fato é que o critério de apuração do saldo devedor - o estoque - tem por base a Selic, essa taxa interbancária. Isto é incorreto e inaceitável. É inaceitável porque transfere para o futuro um saldo decorrente de um erro de política econômica; é incorreto porque a Selic, por ser um instrumento de política monetária e creditícia, é uma taxa de juros macroeconômica e volátil por natureza. É uma taxa de juros sem qualquer relação com as variáveis que regem a economia na produção do dia a dia, no comércio, na indústria e assim por diante.

É muito importante falar isso aqui, Sr. Presidente, porque o fluxo está bem resolvido: é pelo faturamento; o fluxo está bem resolvido, porque a correção no fluxo é pela TJLP. Todavia, o estoque das dívidas vem comprometido.

A terceira medida, Sr. Presidente - e quero ater-me a ela -, é a regulamentação do Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, votado por este Congresso ainda no ano passado, cujo decreto regulamentador está para ser publicado, espero, nos próximos dias. Fui informado de que o Ministério do Desenvolvimento Econômico já enviou o texto para a Casa Civil, a fim de que ali se analisasse o teor dessa regulamentação.

Resultado da Lei aprovada pelo Congresso Nacional, articulada pela Frente Parlamentar da Pequena e Média Empresa, o Estatuto abriu perspectivas muito promissoras, especialmente as relacionadas ao apoio creditício, às maiores facilidades para a exportação, ao desenvolvimento empresarial e à sociedade de garantia solidária, que é uma inovação.

Também são dignos de nota o regime de prioridade nas compras governamentais e o Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte.

O que se pretende na regulamentação do Estatuto é que, a partir de agora, os órgãos públicos que forem realizar compras sob a modalidade de "convite" estejam obrigados a convidar 50% das concorrentes no universo de microempresas e empresas de pequeno porte. O Fórum, por seu turno, viabiliza um ambiente, onde o Governo, em conjunto com as entidades de apoio e representação das empresas de pequeno porte, passará a formular as ações e políticas sintonizadas com a necessidade do segmento.

Então, houve um momento, que chamo de "a ventania do liberalismo", em que se perdeu essa salutar atividade de formulação de políticas públicas. Penso que esse Fórum reabre a possibilidade de se discutir políticas efetivas para os segmentos empresariais do nosso País, principalmente este que tem um papel enorme na geração de emprego e renda no Brasil.

Precisamos, Sr. Presidente, ter a consciência de que a regulamentação do novo Estatuto, a capacitação empresarial, o crédito diferenciado, a política de compras do Governo e os fundos de aval são fatores institucionais absolutamente inovadores. Eles seriam capazes de impulsionar a expansão do segmento das pequenas e microempresas. Contudo, precisamos ter a consciência também de que, apesar dessas inovações, não há um horizonte para o crescimento sustentado no nosso País se não houver ajustes no sistema financeiro às necessidades de financiamento da economia produtiva.

Nessa perspectiva, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Reforma Tributária, embora não relacionados diretamente ao chamado Programa Brasil Empreendedor, sem dúvida, também trarão benefícios ao segmento de pequenas e microempresas.

É inegável que a instauração de um estável regime de financiamento do setor público, com base tributária, carga tributária e procedimentos arrecadatórios - ajustados à realidade da economia - combinados com um regime de gastos austero e responsável, por certo, acabará trazendo implicações sobre toda a estrutura de funcionamento da economia, inclusive do sistema financeiro, ampliando o crédito, reduzindo o custo financeiro das empresas e desonerando a produção e o emprego.

Não há dúvidas, Sr. Presidente, de que o sistema financeiro brasileiro, na forma como aparece organizado não está estruturalmente preparado para financiar o desenvolvimento. Os bancos oficiais, à exceção do BNDES, são avessos ao financiamento produtivo de longo prazo no nosso País; têm ainda mais dificuldades de financiar compartimentos específicos da nossa economia, como a agricultura, as pequenas e microempresas, a moradia popular e assim por diante.

A realidade é que o crédito no Brasil é um elemento raro e suprido em condições inadequadas ao funcionamento do setor produtivo. Para agravar a situação, nos últimos dois anos, o Governo adotou uma explícita e ostensiva política de restrição ao crédito, baseada em juros extremamente elevados, no franco endividamento do setor público e em forte compulsório sobre os depósitos à vista nos bancos comerciais. Em conseqüência, os bancos privados voltaram suas linhas fundamentalmente ao financiamento do Governo e tornaram-se bancos essencialmente especulativos, fugindo do risco que traz um empréstimo bancário.

Matéria publicada na Veja, há poucos dias, mostra que em nenhum outro grande país capitalista o crédito é tão escasso e tão caro como no Brasil, especialmente o crédito ao consumidor.

A matéria revela que na Alemanha, no Japão e nos Estados Unidos a oferta de crédito representa mais de 70% do Produto Interno Bruto. No caso da Alemanha (123%) e Japão (116%) chega mesmo a ser maior que o próprio PIB. Mesmo em economias com níveis de desenvolvimento similares à nossa, a oferta de crédito em relação ao tamanho do PIB é incomparavelmente maior do que a observada na economia brasileira. Enquanto que no Brasil a oferta de crédito representa algo em torno de 28% do PIB, na Tailândia representa 115%; na Coréia do Sul, 74%; e na Indonésia, 51%.

Ainda segundo a reportagem, se tomarmos as taxas básicas de juros praticadas pelos bancos centrais de todo o mundo, descontada a inflação, a nossa só é ligeiramente superada pelas da Argentina e da Indonésia. E não é só isso, Sr. Presidente: a nossa taxa básica de juros é 3,7 vezes maior que a do Chile e 4,7 vezes maior que a do México, países latino-americanos com características muito próximas à nossa realidade.

Quanto ao crédito pessoal, no caso das financeiras, chegamos a suportar taxas de 293% ao ano, sem falar naquelas praticadas pelos agiotas, que também estão presentes principalmente nas áreas mais pobres e carentes do nosso País, nas periferias dos grandes centros urbanos, para onde precisamos levar as instituições de microcrédito, o famoso banco do povo. É uma tarefa que precisamos pegar em nossas mãos. Mesmo no caso das taxas praticadas no financiamento das pessoas jurídicas, como o financiamento de capital de giro, a revista constata algo inaceitável: taxas de 48% ao ano para uma economia com inflação menor do que 10%.

Sr. Presidente, terminando o meu pronunciamento - para o qual esperei muito - e rompendo a angústia da Mesa, o fato é que, no Brasil, em matéria de crédito nos anos recentes, temos a destacar apenas a criação da TJLP, a implementação do Pronaf e a institucionalização dos fundos de aval. No entanto, essas criativas soluções são medidas que ressaltam as virtudes do nosso sistema financeiro e, mais do que isso, denunciam sua fragilidade e sua inadequação.

Se analisarmos a relação entre empréstimos concedidos e o patrimônio líquido, a relação entre esses empréstimos e o total de ativos ou mesmo a relação entre os empréstimos de longo prazo e aqueles de curto prazo, constataremos o grau de aversão ao risco dos nossos sistemas financeiro e bancário - que tão bem conhecemos.

Agora que a economia passou pelo teste da desvalorização e a taxa de juros não cumpre mais papel tão essencial no ajuste externo, não há mais como se justificar uma política monetária e creditícia tão apertada - que o setor de pequena e média empresa, responsável por quase 60% da geração de emprego, não suporta. O Banco Central, Sr. Presidente, precisa ter coragem e ousar, dando continuidade ao que foi realizado em 1999 e prosseguindo na política de redução de juros no nosso País, porque isso é fundamental para não comprometer a possibilidade de o País crescer de forma sustentada e gerar emprego e renda.

Era sobre esse assunto que eu queria me pronunciar, que considero da maior relevância para a economia do País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/02/2000 - Página 2415