Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ANUNCIO DA PUBLICAÇÃO PELO SENADO FEDERAL DO LIVRO COM OS ANAIS DA CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE RENDA MINIMA, REALIZADA EM 1998.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • ANUNCIO DA PUBLICAÇÃO PELO SENADO FEDERAL DO LIVRO COM OS ANAIS DA CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE RENDA MINIMA, REALIZADA EM 1998.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2000 - Página 3973
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, PUBLICAÇÃO, SENADO, DOCUMENTO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, DISCUSSÃO, RENDA MINIMA, REGISTRO, EXPERIENCIA, BRASIL, MUNDO, DEPOIMENTO, AUTORIDADE.
  • LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, DESTINATARIO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), ENCAMINHAMENTO, PUBLICAÇÃO, RENDA MINIMA, ANALISE, DESEMPREGO, BRASIL, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, POBREZA.
  • EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, COMBATE, POBREZA, DEFESA, DESTINAÇÃO, MAIORIA, RECURSOS, PROJETO, RENDA MINIMA, IMPORTANCIA, ATENDIMENTO, GOVERNO, RECOMENDAÇÃO, ECONOMISTA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA).

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Ademir Andrade, encaminho às mãos de V. Exª a recente publicação do Senado relativa à "Conferência Internacional sobre Renda Mínima, Discussões e Experiências", realizada no Senado Federal, por iniciativa do Grupo Interparlamentar Americano sobre População e Desenvolvimento, GPI, então presidido pela Deputada Marta Suplicy; da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, então presidida pelo Senador Pedro Piva; da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, então presidida pelo Deputado Germano Rigotto; e ainda com a colaboração do Fundo de População das Nações Unidas, da Rede Européia da Renda Básica, da BIEN e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA.  

Coloco o exemplar do livro à disposição dos interessados em estudar as inúmeras experiências e o debate sobre a renda mínima. Nessa publicação, constam depoimentos importantes, como o do Dr. Robert Greenstein, do Centro de Estudos Orçamentários e de Políticas Públicas dos Estados Unidos da América; do Professor Guy Standing, Presidente da Rede Européia da Renda Básica e representantes de inúmeros parlamentos.  

O Professor Guy Standing fez uma exposição sobre a evolução desta proposição e de diversas experiências no mundo; o Professor Robert Greenstein falou da vigência do EITC, nos Estados Unidos, do Earned Income Tax Credits ; tivemos aqui exposições do Deputado Artur Penedos, de Portugal, a respeito de como lá se introduziu a renda mínima, seguindo o que se passou na França; da Espanha, tivemos a exposição do Deputado Juan Antonio Gil Melgarejo; do Embaixador Jorge Navarreti, ouvimos a respeito da forma lá instituída, o chamado Programa Progresso; tivemos aqui o depoimento do Deputado Carlos Navarro, da Venezuela, sobre a forma de Beca Escola, e depois modificada na Venezuela em anos recentes; as proposições das Deputadas Elisa Carrió e Elisa Carca, na Argentina; ouvimos os depoimentos de Antônio Maria da Silveira, José Márcio Camargo, João Sabóia, dos Professores e economistas como Paulo Valle, Lena Lavinas, Júlio Jacobo Waiselfisz, Maria Ozanira da Silva e Silva, Ricardo Henriques, Márcio Pochmann, Samir Cury, Sérgio Mendonça, do Governador Cristovam Buarque e, ainda, as experiências aqui relatadas a respeito de como se introduziram projetos de renda mínima nos mais diversos Municípios brasileiros por Antônio Palocci, em Ribeirão Preto; de Castro, em Belo Horizonte; Edmilson Rodrigues, em Belém; Mauro Bragatto, em Presidente Prudente; Félix Sayão, em Cantaduva; Bruno Fleury, que relatou experiências de Goiânia, Osasco, Amapá; os representantes do Governador Alberto Capiberibe.  

Foi com grande destaque que ouvimos e aqui registramos o depoimento da Prefeita Dorcelina Folador, de Mundo Novo, cidade sul-mato-grossense, fronteiriça ao Paraguai, com 17 mil habitantes. A Prefeita, com extraordinária garra, introduziu logo no início de sua gestão, em janeiro de 1997, o Programa Bolsa-Escola. Em outubro de 1999, quando foi assassinada, 204 famílias estavam inscritas no Programa.  

Além de outros depoimentos importantes, houve o debate com o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, do qual participou também o Presidente Antonio Carlos Magalhães.  

Ontem, encaminhei pessoalmente ao Ministro Pedro Malan o ofício, que passo a ler, a respeito dessa Conferência, bem com das decisões importantes que estamos por tomar, relativas ao Fundo da Pobreza, ao salário mínimo e à renda mínima. Eis o teor do ofício que entreguei ontem à noite ao Ministro da Fazenda, Pedro Malan:  

Senhor Ministro,  

Faço essa visita para agradecer-lhe a atenção de ter participado da sessão de encerramento da Conferência Internacional sobre a Renda Mínima, realizada no Senado Federal, em agosto de 1998, e para lhe entregar a publicação que reúne todos o debates realizados na ocasião.  

Aproveito a oportunidade para trazer-lhe algumas reflexões sobre o tema. A dinâmica do mercado de trabalho brasileiro, nos anos recentes, caracterizou-se pela redução dos empregos com carteira assinada e pela precarização das relações trabalhistas dos novos postos gerados. Por outro lado, foi mantida a escassez dos mecanismos de proteção social ao trabalhador no mercado formal, com a vigência apenas do seguro-desemprego. E no que tange ao trabalhador informal ou autônomo, a legislação vigente não dispõe de nenhum mecanismo que lhe garanta os rendimentos necessários à sua sobrevivência e à de sua família.  

Em 1999, os indicadores do mercado de trabalho corroboraram as trajetórias observadas ao longo dos anos noventa, de baixo dinamismo na oferta de trabalho, incremento do desemprego e elevação do grau de escolaridade da população economicamente ativa.  

Em dezembro de 1999 – mês que normalmente é o de maior atividade econômica em função das festas natalinas e do 13º –, o total de desempregados na grande São Paulo atingiu o patamar de 1.715.000 (um milhão, setecentos e quinze mil) desempregados, segundo a Fundação Seade/Dieese. Por outro lado, a taxa anual média do desemprego continuou a trajetória de crescimento que vinha tendo desde 1994, passando de 18,2%, em 1998, para 19,3%, em 1999, segundo a Fundação Seade/Dieese.  

Quando se observa os valores dos rendimentos dos trabalhadores, o quadro não é animador. O salário mínimo real calculado pela Fundação Seade/Dieese, mostra uma queda do poder aquisitivo no ano de 1999. A despeito do reajuste irrisório concedido ao salário mínimo, em maio, chegou-se em dezembro de 1999 com um valor 4,4% menor que o de dezembro de 1998.  

Se considerarmos os dados do IBGE, verificamos trajetória semelhante. A taxa de desemprego aberto médio, para as seis regiões metropolitanas principais, de 1998 a 1999, permaneceu estacionada no elevado patamar de 7,6%, depois de registrar um aumento de 3% de 1995 a 1999.  

Outro indicador que demonstra a gravidade da situação refere-se à redução do número de trabalhadores que possuem carteira assinada. Em 1995, esses trabalhadores representavam 48,4% da massa de empregados e dispunham dos benefícios daí decorrentes. Em 1999, esse número caiu para 44,5%. Além da precarização das relações de trabalho, o atual quadro de redução da oferta de emprego confirma a premente necessidade da reformulação da estratégia de política econômica até agora adotada. É necessário que o Governo adote políticas que permitam alcançar, simultaneamente, o crescimento, o pleno emprego, a estabilidade de preços, a eqüidade na distribuição da renda e da riqueza e o equilíbrio das contas externas. Para isso, faz-se necessário levar em consideração valores como a solidariedade, a ética, a busca da justiça. Daí a importância de se conjugar esforços para a implementação de instrumentos racionais que permitam avançar nessa direção.  

Dentre as ações, as experiências internacionais e algumas adotadas, ainda em escala modesta no Brasil, demonstram que a universalização do direito a uma renda suficiente para as necessidades vitais do indivíduo é um importante instrumento para a construção da cidadania.  

O formato de um programa de garantia de renda mínima pode ser o de um imposto de renda negativo que procure evitar as denominadas armadilhas do desemprego ou da pobreza. Para isso deve sempre existir o estímulo ao progresso, ao trabalho, mas garantindo que todos possam participar da riqueza da nação. Esse programa também pode ser relacionado à educação, de maneira a propiciar meios para que as famílias mais pobres disponham de um complemento de renda que permita as suas crianças irem à escola, ao invés de trabalharem precocemente.  

Como até abril se definirá o novo valor do salário mínimo, é fundamental a coordenação dos dois instrumentos: salário mínimo e renda mínima. A elevação gradual e significativa do valor real do salário mínimo deve ser acompanhada da instituição de um programa de renda mínima. Cabe assinalar que instrumentos de imposto de renda negativo e de renda mínima convivem em diversos países. Nos EUA, por ocasião de sua mensagem sobre "O Estado da União", em janeiro deste ano, o Presidente Bill Clinton anunciou considerável aumento do Earned Income Tax Credit (EITC). Este programa proporciona um crédito fiscal por remuneração recebida a 20 milhões de famílias que trabalham mas têm renda inferior a um determinado patamar. Ou seja, um complemento de renda para que os trabalhadores possam sair da condição de pobreza. No Reino Unido, há um instrumento semelhante ao "EITC", o Family Income Support , que tem sido expandido pelo Governo Tony Blair, ao mesmo tempo em que se institucionalizou o salário mínimo na Grã-Bretanha. Na França, em 1988, o Governo François Mitterrand e Michel Rocard instituiu a Renda Mínima de Inserção (RMI). Desde então, estão coordenados os valores da RMI com os do salário mínimo.  

Esses resultados demonstram a urgente necessidade de o Governo Federal alterar o atual desenho de política econômica e implementar medidas que permitam a melhora do quadro de pobreza em que vive a população brasileira.  

Por ocasião da Conferência Internacional sobre a Renda Mínima, Vossa Excelência reiterou o seu apoio à proposição de se garantir o direito a uma renda mínima aos brasileiros, ponderando, entretanto, que seria favorável que o programa fosse instituído de forma descentralizada, com a possível coordenação da União e dos Estados, mas com a implementação a cargo dos Municípios. É este, aliás, o sentido da Lei nº 9.533, de 1997, que autoriza o Governo Federal a financiar em 50% os gastos dos Municípios que instituem o Programa de Renda Mínima associado às ações socioeducativas. O Senado Federal aprovou, em novembro último, projeto de lei de minha autoria que modifica a fórmula do benefício para as famílias que tenham renda até meio salário mínimo mensal per capita e crianças até 14 anos. A fórmula prevista neste projeto para o benefício é: B=0,40 (nº de pessoas na família X R$68,00 – renda familiar), o que torna muito mais racional a aplicação do direito à renda mínima.

 

No momento em que o Senado está por votar a Proposta de Emenda à Constituição que cria o Fundo de Combate à Pobreza que prevê arrecadar, pelo menos, R$4 bilhões, se for seguida a recomendação do IPEA e da Comissão Mista de Combate à Pobreza de destinar, pelo menos, 75% dos recursos diretamente para as famílias que não recebem o suficiente para a sua sobrevivência, criar-se-á a oportunidade para o fortalecimento significativo da garantia do direito à renda mínima. Está aí a possibilidade de coordenar melhor os instrumentos de renda mínima e do salário mínimo.  

Na ocasião, o Sr. Ministro Pedro Malan me disse da importância de considerar os programas atualmente vigentes, de vez que não seria propício instituir algo que simplesmente não levasse em conta a contribuição a cerca de 9 milhões de pessoas que hoje recebem o salário mínimo em forma de aposentadoria – inclusive no setor rural – e de remuneração vitalícia – para aqueles que alcançaram idade avançada. Ressaltou o referido Ministro que essa remuneração constitui um fator de ativação das economias dos municípios onde, por vezes, não há grandes alternativas de emprego, eis que não há empresas ou mesmo atividade econômica forte.  

Obviamente, disse eu ao Sr. Ministro Pedro Malan que a instituição de um programa de renda mínima não se daria em substituição a esses programas, mas em acréscimo a eles, uma ampliação, de modo a universalizar o direito de todos os brasileiros participarem do usufruto da riqueza da Nação. Convidou-me S. Exª para discutir e examinar, com os economistas do IPEA, num grupo de trabalho, o conteúdo dos gastos sociais e os diversos programas que poderiam ser implementados. De pronto aceitei esse convite; contudo, o que eu gostaria de aqui reiterar é a importância de o próprio Governo estar ouvindo as recomendações de economistas, sobretudo daqueles do IPEA que participaram desta Conferência Internacional sobre a Renda Mínima e dos que prestaram depoimentos na Comissão Mista de Combate à Pobreza.  

Se seguirmos as recomendações dos economistas do IPEA, como Roberto Borges Martins, Ricardo Paes de Barros, Ricardo Henriques, Lena Lavinas, Sônia Rocha e outros que, não sendo daquele órgão, fizeram recomendações semelhantes, então, certamente, estaríamos agora colocando que a maior parte dos recursos do Fundo de Combate à Pobreza devem ser destinados a transferências diretas de renda para aquelas famílias que não alcançam determinado patamar de rendimentos e que tenham crianças de até 16 anos, o que seria, exatamente, ampliar significativamente os programas de renda mínima, universalizando esse direito por todo o Brasil.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2000 - Página 3973