Discurso durante a 17ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

NECESSIDADE DE ALOCAÇÃO DE RECURSOS PARA OBRAS DE INFRA-ESTRUTURA DO SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA - SIVAM.

Autor
Luiz Otavio (S/PARTIDO - Sem Partido/PA)
Nome completo: Luiz Otavio Oliveira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).:
  • NECESSIDADE DE ALOCAÇÃO DE RECURSOS PARA OBRAS DE INFRA-ESTRUTURA DO SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA - SIVAM.
Aparteantes
Ernandes Amorim, José Fogaça, Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2000 - Página 4937
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), ACOMPANHAMENTO, CONTROLE, MEIO AMBIENTE, IMPEDIMENTO, EVASÃO FISCAL, EFEITO, CONTRABANDO, ILEGALIDADE, EXTRAÇÃO, MADEIRA, MINERIO, AMPLIAÇÃO, CONHECIMENTO, BIODIVERSIDADE, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO, NATUREZA ECONOMICA, FLORESTA, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESTINAÇÃO, RECURSOS, PROGRAMA DE SANEAMENTO, MUNICIPIOS, IMPLANTAÇÃO, UNIDADE OPERACIONAL, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), REGIÃO AMAZONICA.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB – RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Sr as e Sr s Senadores, os jornais de hoje, do centro do País, trazem uma notícia bastante interessante a respeito da Argentina e de seu Presidente. O Presidente Fernando de La Rúa, que assumiu recentemente o Poder na Argentina, depois de uma vitória significativa nas eleições por meio de uma aliança de centro-esquerda, tem sido um homem, de certa forma, estrategicamente decisivo nesse processo de questionamento que vem sofrendo o Mercosul.  

Fernando de La Rúa iniciou o seu Governo anunciando medidas internas duras, altamente restritivas do ponto de vista de política monetária, anunciou o exercício de um controle fiscal rígido e, sobretudo, assumiu uma postura marcante: disse que, para ele, o Mercosul era definitivo, ou seja, para a Argentina e para o seu Presidente o Mercosul deveria continuar.  

Nessa construção do presente e do futuro, claro, S. Exª, o Presidente argentino, acabou encontrando os percalços, as dificuldades, os obstáculos que o momento oferece para a Argentina, sob o ponto de vista da moeda. A Argentina está, por lei, presa ao dólar por meio de um sistema chamado currency board , que é a perfeita e absoluta vinculação da moeda argentina com a moeda americana.  

É evidente que se trata de uma situação desgastante para um país que está integrado a outro que acaba de desvalorizar sua moeda, como o Brasil fez no último ano, em torno de 40% ou 50%, chegando a graus maiores, com índices 60%, 70% ou 80% de desvalorização do real.  

É evidente que num processo de integração econômica, numa integração de mercados, principalmente nesse modelo de integração ao qual aderiram o Brasil, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai - que é o de uma união aduaneira tipicamente caracterizada - a instabilidade das moedas cria dificuldades, cria momentos extremamente delicados. E este momento que estamos vivendo é um destes, talvez seja o mais delicado, talvez seja, estrategicamente, o momento mais sensível da história do Mercosul. Por isso, trago aqui, enfaticamente, a importância da palavra do Presidente Fernando de La Rúa. As suas declarações concorrem efetivamente, contribuem, de maneira inequívoca, para a consolidação do Mercosul. Ele não faz apenas um discurso, ele não apenas toma ou assume uma postura política, mas aponta uma direção concreta, que tem enormes custos políticos, principalmente na sua visão de esquerda. Mas ao dizer, como disse hoje, que postula uma moeda única no Mercosul, penso que o Sr. Fernando de La Rúa está dando um passo, está marcando uma posição, está assumindo uma definição política da maior importância, que o tornam ímpar, que o tornam, sem dúvida nenhuma, líder de um processo de soberania regional.  

Por que falo em soberania? Porque todos nós, sistematicamente, discutimos a questão da soberania a partir do ponto de vista de que soberania é aquela do Estado-Nação, nos seus marcos geográficos, nos seus limites fronteiriços, na sua inserção diplomática e no seu papel político.  

Nunca nos damos conta de que, possivelmente, mesmo cedendo essa soberania formal a alguns Estados irmãos e vizinhos, mesmo cedendo algumas parcelas desse conceito formal de soberania para alguns Estados da nossa circunvizinhança, poderemos estar construindo um novo patamar, um novo conceito, um novo padrão de soberania, que é diferente dessa soberania formal do Estado-Nação: é a capacidade que possam ter povos em desenvolvimento, povos marginalizados do mundo desenvolvido, nações que sofreram espoliação imperialista ao longo do século XIX - e, em boa parte do século XX, foram submetidas a todos os diferentes papéis de dependência nesse processo internacional -, mas é a possibilidade de que essas nações possam se afirmar economicamente e pleitear uma política econômica independente e efetivamente soberana em relação aos mais poderosos, em relação aos chamados centros internacionais de poder.  

Na minha opinião, o Presidente Fernando de La Rúa, da Argentina, ao dizer que deseja que o Mercosul tenha uma moeda única, deseja, sim, essa soberania real, concreta, efetiva, de fato - e não apenas formal e de direito -, em relação aos centros de decisão, aos centros internacionais de poder, que estão localizados, como se sabe, na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia.  

Ora, hoje, o peso argentino é frágil, apesar da sua vinculação dura ao dólar. A moeda brasileira, possivelmente, pela possibilidade ilimitada que atingiu de flexibilidade, que dá mais liberdade à política monetária, aos dirigentes e construtores da política monetária brasileira, esteja mais segura do que a argentina. Mas, mesmo assim, temos uma moeda frágil, permanentemente passível de sofrer um ataque especulativo e um processo repentino de deteriorização e desvalorização. Da mesma forma, também o Uruguai e, quem dirá, o Paraguai e os países que têm se aliado conosco.  

Ora, a idéia da moeda única é talvez aquela pela qual se possa chegar a esse caminho de afirmação soberana de fato, perante os centros internacionais de decisão e poder, perante esse capital especulativo internacional.  

E aí, Sr. Presidente, temos que fazer uma pergunta: por que algumas figuras estrategicamente importantes, intelectualmente influentes, vêm fazendo a defesa da dolarização das moedas nos países em desenvolvimento?  

Na revista Amanhã deste mês, publicada no meu Estado, Rio Grande do Sul – revista extremamente séria, da maior credibilidade, da melhor qualidade jornalística, que analisa questões de ordem econômica -, há uma entrevista com o professor estadunidense Albert Fishlow, brasilianista, estudioso do Brasil, que prega, de maneira aberta, clara, sem sofismas, a necessidade de os países em desenvolvimento, principalmente os da América Latina e do sudoeste da Ásia, caminharem para a efetiva dolarização das suas moedas. E mais: ele prova tecnicamente que tanto o México quanto o Canadá deverão fazê-lo muito em breve. Estão esses dois países já, inevitavelmente, no caminho irrecorrível da dolarização, que, segundo ele, será, no futuro, um bom caminho para outros países, como o Brasil e a Argentina, por exemplo.  

O Professor Albert Fishlow não é um homem de má-fé, é um homem que gosta do Brasil, um homem responsável, um intelectual sério. Não é um porta-voz de interesses subalternos. Mas está errado e podemos contestá-lo. Evidentemente, ao analisarmos as fragilidades presentes das moedas sul-americanas, dispomos de poucos instrumentos para dizer que, ao longo de toda a primeira década do próximo milênio, vamos enfrentar, de maneira estável e equilibrada, esse processo ameaçador e instável do rapidíssimo fluxo internacional do capital especulativo em crescimento, cujo potencial de ameaça vai aumentar nesse futuro imediato.  

Como podemos argumentar que as nossas frágeis moedas poderão fazer frente a esse futuro com segurança, autonomia, estabilidade, independência e força para pressionar os mercados e assegurar estavelmente fluxos permanentes de capital? Digo-lhes que fica muito difícil fazer essa argumentação. Contudo, o Presidente Fernando De La Rúa, da Argentina, informou-nos, em seu pronunciamento de ontem, o caminho para os países membros do Mercosul e possivelmente da América Latina. Trata-se da formação de um padrão único, de uma serpente monetária que culmine na criação de uma moeda única para aqueles países. A propósito, os Presidentes José Sarney e Raúl Alfonsin já haviam previsto isso, dando inclusive nome a essa moeda – o gaúcho -, o tipo humano comum às três fronteiras – Uruguai, Argentina e Brasil. Obviamente essa moeda, já prevista nos tratados do Mercosul, não precisa manter tal denominação. Considero-a, porém, inevitável para assegurar soberania, independência política, estabilidade perante a fluidez dos capitais internacionais na próxima década. Certamente, no momento em que apontamos essa direção, estamos renunciando também a muita coisa, mas principalmente à política monetária e fiscal demagógica e irresponsável. Quem quer ter moeda única não pode ter uma política fiscal irresponsável, mas séria, padronizada, harmônica e duramente responsável. É por isso que crescem, para mim, o vulto e a figura do Presidente Fernando de la Rúa, que está apontando um caminho contra o imperialismo – se essa palavra já não está defasada historicamente - nesse novo padrão de imperialismo criado pela fluidez e pela instabilidade dos capitais internacionais, principalmente os especulativos. Ele está dando o caminho.  

Se considerarmos uma moeda como o euro, vamos ver que não é outro o objetivo da fortaleza européia senão o de criar instrumentos de defesa contra o poder do dólar. Hoje, na América Latina periférica, como nós poderemos fazer frente a duas poderosas moedas estáveis: o euro, na Europa, e o dólar, nos Estados Unidos? Se amanhã ou depois, como diz o Prof. Albert Fishlow, México e Canadá, integrantes do Nafta, vierem a assumir o processo efetivo de dolarização, ou seja, transformarem o dólar em suas moedas nacionais, como ficará o real? Como ficarão o peso argentino, o peso uruguaio e o guarani paraguaio?  

Parece-me que a tomada de posição do Presidente Fernando de la Rúa tem que ser medida, analisada e levada em consideração pelos dirigentes da economia brasileira. É da maior seriedade e da maior importância, Sr. Presidente!  

Sou um grande admirador de um político italiano chamado Massimo D´Alema. Eu o leio constantemente, sempre que posso, e acompanho a sua vida e o seu papel político recentemente exercido com muita exuberância na Itália. Massimo D´Alema foi o homem que transformou o Partido Comunista Italiano no Partido Della Sinistra – PDS, o Partido da esquerda italiana. Coincidências ou talvez por esses fatores imprevisíveis da história, coube ao Partido Comunista Italiano, hoje denominado Partido Della Sinistra, carregar a economia italiana, conduzi-la no momento mais duro, mais amargo, mais difícil, mais antidemagógico, mais anti-irresponsável que se possa imaginar para um país que, no período da chamada democracia cristã italiana – que tinha sempre uma pendência mais para a direita –, foi um país irresponsável do ponto de vista fiscal e, depois se soube, altamente desonesto do ponto de vista do comportamento dos seus dirigentes, conforme ficou provado na chamada "Operação Mãos Limpas".

 

Para mim, a figura de Massimo D´Alema cresce na Itália, porque coube ao Partido da Esquerda, ao Partito della Sinistra , conduzir o País no momento em que era preciso ter o mais duro controle fiscal e implantar medidas amargas na Previdência. Quem fez isso foi a Esquerda italiana por intermédio de Massimo D’Alema. Ele, como todo o seu Partido, por meio de uma convenção, tomou essa decisão de maneira consciente e aberta, pensando, é claro, no futuro do seu país. Dessa forma, a Itália se integrou ao Tratado de Maastricht e aderiu ao que possibilitou a construção do Euro.  

Primeiramente, para entrar nessa serpente européia, o país precisaria ter um padrão inflacionário da sua moeda que não fosse nem 1,5% acima das médias de inflação dos últimos cinco anos dos demais doze integrantes da União Européia. A Itália cumpriu isso sob o comando de Massimo D’Alema. Era preciso reduzir a dívida pública para 60% do Produto Interno Bruto e estabelecer - isso também é muito difícil - um déficit fiscal anual que não superasse 3%. Sabemos que essa talvez seja uma das tarefas mais amargas e difíceis e até das mais impraticáveis pelos dirigentes de países com dificuldades econômico-financeiras ou com desestruturação nas suas contas públicas.  

Massimo D’Alema fez isso. A Itália integra a serpente do euro e, em pouco tempo, ele será moeda única. É verdade: é possível que esses países estejam subordinados a um banco central único e que, no futuro, as suas moedas próprias tenham desaparecido. Mas os referidos países não estão entregues a outro centro de decisão de política monetária que estabelece os fluxos internacionais, que é o Banco Central dos Estados Unidos. Esses países conseguiram independência em relação ao dólar norte-americano. O Banco Central norte-americano não tem a influência de antes e terá gradativamente menos influência à medida que o euro for se consolidando.  

Esta é a nova conceituação de soberania que se deve aceitar hoje: ceder certa parcela de soberania em relação aos Estados-irmãos – aos Estados-Nações vizinhos –, mas criar um patamar superior quanto a outros centros internacionais de decisão de política monetária.  

É o que Fernando de la Rúa está dizendo e é o que o Brasil ainda não decidiu. Nem nós congressistas conseguimos entender isso. Esse é um tema que no Congresso não encontra repercussão; até por entendermos que se trata de um assunto muito longe de nós outros, temos fugido dele muitas vezes.  

Sr. Presidente, devo encerrar meu pronunciamento, mas gostaria de dizer antes que, infelizmente, esse não é um assunto que está no momento atraindo a atenção da equipe econômica do Governo brasileiro. De qualquer forma, faço esse registro. O Sr. Fernando de la Rúa marcou um ponto favorável a si mesmo como alguém capaz de assumir uma posição de liderança no contexto desta nova América do Sul que queremos ter antes da Alca - Área de Livre Comércio das Américas -, que visa à integração futura, que visa a uma união aduaneira entre todos os países das Américas, do Alasca até a Terra do Fogo, no extremo sul da Argentina. Parece-me que a palavra dada por Fernando de la Rúa é uma forma de apontar o futuro, de apontar um novo e superior conceito de soberania.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2000 - Página 4937