Discurso durante a 26ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

TRANSPARENCIA DOS DADOS DO BANCO CENTRAL NA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO PROER, DURANTE A INTERVENÇÃO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. REUNIÃO, HOJE, DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO, PARA JULGAR O LITIGIO ENTRE AS EMPRESAS EMBRAER E BOMBARDIER, ENVOLVENDO A CONCORRENCIA PARA FORNECIMENTO DE AERONAVES A EMPRESA AMERICANA CONTINENTAL EXPRESS.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. COMERCIO EXTERIOR.:
  • TRANSPARENCIA DOS DADOS DO BANCO CENTRAL NA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO PROER, DURANTE A INTERVENÇÃO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. REUNIÃO, HOJE, DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO, PARA JULGAR O LITIGIO ENTRE AS EMPRESAS EMBRAER E BOMBARDIER, ENVOLVENDO A CONCORRENCIA PARA FORNECIMENTO DE AERONAVES A EMPRESA AMERICANA CONTINENTAL EXPRESS.
Aparteantes
Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 01/04/2000 - Página 5809
Assunto
Outros > BANCOS. COMERCIO EXTERIOR.
Indexação
  • COMENTARIO, PUBLICAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), BALANÇO, ESPECIFICAÇÃO, DADOS, PROGRAMA DE ESTIMULO A REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO AO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (PROER), UTILIZAÇÃO, RECURSOS, RESERVA MONETARIA, DEPOSITO COMPULSORIO, BANCOS, IMPORTANCIA, ESCLARECIMENTOS, OPERAÇÃO FINANCEIRA, AUSENCIA, GASTOS PUBLICOS, RECURSOS ORÇAMENTARIOS.
  • REGISTRO, PROBLEMA, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, ACUSAÇÃO, AUTORIA, EMPRESA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, CANADA, DESTINATARIO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), REFERENCIA, SUBSIDIOS, INDUSTRIA AERONAUTICA, CONCORRENCIA DESLEAL.
  • ANUNCIO, DECISÃO, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), PENDENCIA, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER).
  • DEFESA, ATUAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, REPOSIÇÃO, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), DIFERENÇA, CUSTO, JUROS, BRASIL, AMBITO, PROGRAMA, EXPORTAÇÃO.
  • DEFESA, ABERTURA, MINORIA, CAPITAL SOCIAL, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), CONSORCIO, EMPRESA ESTRANGEIRA, OBJETIVO, REFORÇO, COMPETIÇÃO INDUSTRIAL, COMBATE, LOBBY, MERCADO INTERNACIONAL.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB – RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dois fatos trazem-me à tribuna nesta manhã.  

O Banco Central publicou, ontem, um balanço importante, dando transparência aos seus números. Ali sobressai um dado para mim muito significativo e bastante revelador: fica demonstrado que, no Proer, o programa de recuperação das instituições financeiras que sofreram intervenção após a criação do real - entre elas os bancos Nacional, Econômico e outros menores –, foram utilizados recursos das chamadas reservas monetárias do Banco Central da ordem de R$15 bilhões, aproximadamente. Após a venda ou a transferência dos ativos desses bancos para novos bancos que assumiram essas instituições, houve um saque das chamadas reservas monetárias, do chamado depósito compulsório dos bancos, de aproximadamente R$14 bilhões, o que significa dizer que R$29 bilhões foram retirados dos recursos que constituem o depósito compulsório, cujo guardião é o Banco Central, para dar provimento às necessidades das diversas instituições financeiras, que foram recuperadas mediante a transferência de recursos ou mediante esse financiamento do Banco Central.  

É importante, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ressaltar que, pela primeira vez, começa-se a ter uma noção clara dos custos dessa operação do Proer, que visou à recuperação das instituições financeiras logo após o Plano Real.  

É preciso ficar claro que o custo não foi de R$29 bilhões, porque essa quantia não foi retirada do Orçamento público, dos gastos com saúde, com educação, com construção e manutenção de estradas e creches, com pagamento de funcionários públicos. O dinheiro do Orçamento, que resulta da cobrança de impostos, não foi tocado para esse fim. Então, de onde o Banco Central pegou esse dinheiro para repassar aos bancos? Pegou esse dinheiro de um depósito feito pelos próprios bancos junto ao Banco Central, que tem o nome de depósito compulsório e que representa algo em torno de 80% dos depósitos à vista dos bancos comerciais brasileiros. Desses recursos que pertencem aos bancos, R$29 bilhões foram passados para essas instituições em recuperação.  

A grande pergunta, para que se possa avaliar o quanto isso custou ou virá a custar no futuro, é: qual a capacidade de retorno? Qual a possibilidade de essas novas instituições financeiras, recuperadas a partir do Proer, fazerem frente a seus compromissos junto ao Banco Central? E, para isso, o próprio Banco Central deu uma indicação, evidentemente que ainda não inteiramente acabada e definida, mas, desde logo – pode-se dizer prenunciada -, o Banco Central indica que cerca de R$9 bilhões precisam ser provisionados, ou seja, precisam ser emitidos e depositados sob a forma cautelar de um provisionamento para, possivelmente, fazer frente a uma inadimplência, ou a uma defasagem nesses pagamentos por parte das instituições financeiras, uma vez que o Banco Central é o terceiro na ordem de recebimento das chamadas massas falidas - ele não é o primeiro, mas é o terceiro entre os credores habilitados a receber da massa falida, das instituições que acabaram fechando.  

De modo, Sr. Presidente, que aí está um primeiro indício, uma primeira nota, um primeiro sinal do que pode ter custado o Proer para os cofres públicos. Porque, a partir dessa emissão de R$9 bilhões, em torno da qual o Governo terá que pagar juros, esses juros pagos sobre esse valor já são o imediato custo desta operação chamada Proer.  

O segundo assunto que me traz à tribuna nesta manhã, Sr. Presidente, é relativo à Embraer, uma empresa brasileira, hoje privatizada, que produz aviões de pequeno e médio porte, principalmente jatos regionais, que freqüentam as rotas das companhias comerciais no mundo inteiro.  

Recentemente, numa disputa com sua concorrente mais importante, a empresa canadense Bombardier, a Embraer venceu a concorrência, venceu a licitação e vendeu à empresa americana Continental Express uma encomenda de aviões a jato de pequeno porte, jatos regionais, da importância de US$6,7 bilhões. Encomendas, portanto, que têm uma significação enorme.  

A Bombardier, a partir do momento em que perdeu essa concorrência, passou a acusar ferozmente a Embraer junto à OMC – Organização Mundial de Comércio - com sede em Genebra, na Suíça, exigindo que a Embraer - e com a Embraer o Brasil - fosse punida por receber subsídios do Governo brasileiro, e, por receber subsídios, poder fornecer equipamentos mais baratos, vencendo a concorrência com a Bombardier.  

É importante ressaltar que a Embraer deu uma resposta a altura, acusando também a Bombardier de receber subsídios do governo canadense.  

Chamo atenção para esse fato porque os jornais estão registrando que exatamente no dia de hoje a Organização Mundial de Comércio está reunida na Suíça para dar o parecer e o julgamento final desta pendência entre a Bombardier e a Embraer.  

A disputa por esse mercado é intensa e violenta, Sr. Presidente, pois trata-se de um mercado que movimenta anualmente cerca de US$2bilhões.  

A Embraer é uma empresa brasileira que, embora privatizada, continua sendo inteiramente uma empresa nacional. E a Embraer tem uma carteira de encomendas para os próximos anos que pode chegar a US$17bilhões. É importante ressaltar que o que o Governo brasileiro fez em relação a Embraer foi simplesmente cobrir aquilo que se poderia chamar de custo Brasil.  

O que é o custo Brasil?  

A Embraer, ao fazer financiamento junto a instituições financeiras internacionais, foi obrigada a pagar, além dos juros normais, dos juros comerciais, dos juros internacionais mais ou menos padronizados, um plus, um spread, uma taxa de juros a mais porque as instituições financeiras internacionais não tinham, naquele momento, confiança na capacidade de pagamento, na capacidade de as autoridades brasileiras honrarem as suas dívidas internacionais, em dólar. E, diante desse chamado risco Brasil, ou seja, da possível incapacidade das autoridades brasileiras terem em caixa os dólares para fazer frente ao seu cronograma de dívidas, diante desse risco, dessa ameaça, dessa possibilidade, os bancos cobraram uma taxa de risco, um spread, que o Programa de Exportação, o chamado Proex, acabou financiando junto à Embraer. Portanto, o subsídio dado pelo Governo brasileiro foi relativo tão-somente a essa taxa especial que a Embraer não teria se ela fosse uma empresa localizada em outro país. Ela só tem esse spread, esse custo a mais, esses juros a mais, porque ela é uma empresa localizada no Brasil. Portanto, trata-se de um custo que é determinado tipicamente por ela ser uma empresa brasileira. Logo, parecia justo ao Programa de Incentivo e Financiamento às Exportações que a Embraer recebesse esses subsídios.  

Mas, Sr. Presidente, é importante que se ressalte aqui que o Senado discutiu, há algumas semanas, com a presença da direção da Embraer e com a presença do Comandante da Aeronáutica, uma iniciativa da empresa no sentido de abrir o seu capital em 20% para um consórcio de empresas estrangeiras - dentre as quais a mais importante, possivelmente, a Aerospatiale, da França - abriu o seu capital em 20%, e aqui, no Senado, pelo menos, e em boa parte das opiniões que foram publicadas nos jornais, isso foi visto como o início da desnacionalização, o início da venda e da transferência da Embraer para mãos estrangeiras totalmente no futuro. Possivelmente, o único Senador que, naquela reunião, chamou a atenção para o fato de que, no momento em que a Embraer procurava uma aliança com os grandes players do setor de fabricação de aviões, da chamada indústria aeronáutica, essa associação, essa aliança, essa vinculação que a Embraer estava procurando junto a empresas que tenham grande poder, influência e capacidade de operar nesse mercado internacional, o único Senador que chamou a atenção para o fato de que aquela abertura de capital significaria essa aliança estratégica, e, portanto, um fortalecimento da Embraer como player nesse mercado, o único Senador foi este Senador, que se dirigiu, então, ao comandante da Aeronáutica para tentar colocar essa visão estratégica.  

Vejo agora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, de fato, o necessário caminho para uma aliança, que seja limitada a uma pequena parcela de capital muito inferior a 49%, portanto apenas da ordem de 20%, não é só uma necessidade de captar investimentos, de fortalecer-se financeiramente e capitalizar-se, mas é também uma opção de política de mercado, de política de comércio, uma opção estratégica internacional da Embraer, no sentido de fazer frente a essas poderosas pressões internacionais que querem, junto à OMC, inviabilizar a Embraer como empresa. A inviabilização da Embraer como concorrente, como uma pleiteante viável nesse mercado internacional de jatos regionais, significa que o Brasil perderá, nos próximos anos, divisas da ordem de US$17 bilhões que ela será capaz de atrair para o nosso país mediante suas exportações. Parece-me que isso fica muito claro no momento em que se sabe que a Bombardier obteve apoio junto a poderosos lobbies norte- americanos, inclusive não só do Canadá mas dos Estados Unidos. Sabendo-se inclusive que Senadores e Deputados do Congresso americano pressionaram o Fundo Monetário Internacional para que essa instituição estabelecesse limites, pressões e fizesse tudo que fosse possível para retirar da Embraer esse financiamento, que lhe é dado pelo programa do Proex. Portanto, enfraquecê-la nesse mercado, nessa disputa, nessa concorrência pela venda de aviões regionais a jato.  

De modo, Sr. Presidente, que não me arrependo de ter dito aquilo que disse naquela reunião, como agora vejo confirmada a necessidade que tem a Embraer de não se isolar como uma empresa inteiramente nacional, mas a necessidade que tem de se associar e se aliar nesse mercado para, continuando sendo uma empresa inteiramente nacional, com controle de capital de 80%, poder contar com o apoio de outras empresas, outros players

e de outras forças. Porque, senão, ela seria - e possivelmente, venha enfrentar essa enorme dificuldade - derrotada pela pressão dessa poderosa empresa canadense e também do Governo canadense junto à OMC, e pela pressão de deputados e senadores dos Estados Unidos que têm interesses vinculados a Bombardier , que desejam, evidentemente, excluir a Embraer desse mercado.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB - RS) – Com muita honra, concedo o aparte ao Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) – Caro Senador José Fogaça, pedi esse aparte por duas razões. Primeiro para corroborar com as colocações de V. Exª. Realmente naquela discussão, com a presença do Ministro da Aeronáutica, V. Exª teve essa posição clara. Com a competência de sempre, colocou aquilo que grande parte desta Casa pensa, que é exatamente a necessidade de a Embraer ter a condição de se inserir cada vez mais no contexto internacional, num jogo extremamente pesado. Temos visto os lances, V. Exª também relata com brilhantismo o peso dos lances pela disputa desse mercado regional que, com tanta competência, a Embraer tem galgado a cada dia. Gostaria também, de além de aplaudir o posicionamento de V. Exª, registrar que é importante que o próprio Senado da República e a Comissão de Assuntos Econômicos ajam de forma forte a defender os interesses nacionais, como age - e V. Exª o mencionou aqui - parte do Congresso Americano. Sem dúvida nenhuma, nesse processo de globalização, é importante que o País e as empresas nacionais tenham sustentação de mecanismos políticos, legítimos, para que efetivamente não entrem em descompasso com a realidade internacional. Quero registrar a importância dessa associação da Embraer, sem dúvida nenhuma uma associação que foi demonstrado cabalmente que é legítima, que é regular, que é legal. Como V. Exª disse também, 20% nessa associação dão uma amplitude à empresa e não se perdem o caráter nacional e o de controle determinado, inclusive quando do processo de privatização, por ser uma questão estratégica. E, portanto, dentro dessa linha, todos nós temos que nos unir e buscar mecanismos para fortalecer a presença brasileira no mercado internacional, o que a Embraer faz com muita competência. Quero saudar e apoiar o discurso de V. Exª nesta manhã.  

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB - RS) – Muito obrigado, Senador Romero Jucá.  

Sr. Presidente, para encerrar, apenas faço mais uma vez o registro, primeiro, da minha satisfação pessoal de ver que o ponto para o qual chamamos atenção dos Srs. Senadores agora se torna evidente e indiscutível, e, sobretudo, também, para dizer que, feliz ou infelizmente, hoje a participação de empresas como a Embraer neste jogo duríssimo, neste jogo bruto, que é o jogo de interesses do mercado da indústria aeronáutica no mundo, não pode deixar de ter a nossa atenção, a nossa preocupação institucional. Sei que há por parte de alguns setores da política nacional, alguns setores partidários brasileiros uma certa atitude de antipatia para com a Embraer por ter sido privatizada e, por hoje, ser uma empresa privada, gerida por mãos privadas, mas é uma empresa brasileira, gera divisas para o País, continua mantendo empregos, incorporando tecnologia e produzindo resultados concretos para a vida do País, e é muito importante que consigamos reconhecer isso e dar a nossa parcela de contribuição.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/04/2000 - Página 5809