Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ABORDAGEM SOBRE A DECISÃO DA COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA DE NÃO VOTAR PROJETOS DE AUTORIA DE S.EXA., QUE TRATAM DE REDIVISÃO TERRITORIAL DA AMAZONIA.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • ABORDAGEM SOBRE A DECISÃO DA COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA DE NÃO VOTAR PROJETOS DE AUTORIA DE S.EXA., QUE TRATAM DE REDIVISÃO TERRITORIAL DA AMAZONIA.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2000 - Página 10198
Assunto
Outros > DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • REGISTRO, DECISÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, ADIAMENTO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, DIVISÃO TERRITORIAL, REGIÃO AMAZONICA, OBJETIVO, AUDIENCIA, MINISTRO DE ESTADO, GOVERNADOR, REGIÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, DIVISÃO TERRITORIAL, APROVEITAMENTO, ELEIÇÃO MUNICIPAL, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, POPULAÇÃO, REGIÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), IMPORTANCIA, PROTEÇÃO, FRONTEIRA, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL – RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, gostaria hoje de abordar um outro assunto; contudo, em face da decisão tomada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, quando da apreciação dos três projetos de decreto legislativo de minha autoria atinentes à redivisão territorial da Amazônia, resolvi voltar a esse tema.  

Considero democrática a decisão de não votar os projetos, embora estes já tenham recebido pareceres favoráveis: tanto o do Senador Jefferson Péres, que optou pela apresentação de um substitutivo propondo não a criação de um Estado por desmembramento de Municípios do Amazonas, criando-se assim o Estado do Solimões, mas a criação de três territórios federais naquela região, coincidindo quase que in totum com a proposta externada pelo Sr. Ministro da Defesa nos meios de comunicação nacional, depois de uma viagem de inspeção que fez àquela imensa região fronteiriça do oeste do Amazonas; também o parecer com relação ao projeto de criação do Estado do Tapajós, de autoria do Senador Romeu Tuma, favorável à realização do plebiscito; e, com relação ao Estado do Araguaia, com o parecer da Senadora Maria do Carmo Alves.  

Ora, Sr. Presidente, houve algumas confusões ou pelo menos alguns equívocos na apreciação desses projetos. Primeiro, o projeto pede apenas a realização de plebiscito, porque é o que exige a Constituição, para que a população se pronuncie se quer ou não que haja o desmembramento dos Municípios para a formação ou de um território federal ou de um Estado.  

O que se discute realmente, a grande tese que move esta questão é que aqueles três imensos Estados da Região Amazônica - Amazonas, Pará e Mato Grosso - não podem, com a geografia que possuem, permitir uma administração correta e sequer fazer a adequada defesa das fronteiras do Brasil com aqueles países cheios de conflitos, produtores de drogas, onde a guerrilha e o narcotráfico imperam. E, o que é pior, são Estados latifúndios comprovadamente, do ponto de vista administrativo, ineficazes. Os próprios governadores, como o Governador Amazonino Mendes, defendem publicamente o desmembramento para a criação dos territórios.  

Eu particularmente defendo Estados, Sr. Presidente e Srs. Senadores, porque eu nasci em um Território Federal, fui deputado por um Território Federal. Portanto, conheço o modelo autoritário de um território federal, onde o governador é nomeado sem consulta à população, onde não existe um Tribunal de Contas nem Tribunal de Justiça.  

Essa, todavia, é uma questão que – repito – deveria ser discutida num segundo momento. Discutir a questão econômica, como vai ficar o FPE, como vai ser a viabilidade, quantos vão ser os componentes das assembléias, isso tudo seria objeto do projeto de lei complementar, que só seria apreciado depois da aprovação do plebiscito pela população e depois da aprovação pelas assembléias legislativas, conforme prevê a Constituição Federal. No entanto, todo debate é relevante, é democrático, deve acrescentar alguma coisa. É importante que a população que vai votar no plebiscito saiba o que pensam as autoridades, a começar pelos governadores dos Estados e os ministros que estão afetos a essa área, como o Ministro da Integração Nacional, o Ministro do Planejamento, o Ministro da Defesa – considero que falta o Ministro do Desenvolvimento.  

Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, levantou-se a questão de que seria interessante constituir uma comissão para estudar a redivisão territorial do País. Parece-me que é apenas, com certeza, um descuido, uma má informação de alguns colegas. Essa comissão, composta de cinco Deputados Federais, cinco Senadores e cinco ilustres membros do Poder Executivo, foi constituída de acordo com o art. 12 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Funcionou, apresentou seu relatório, que foi publicado em março de 1990, portanto há 11 anos.  

O relatório concluiu pela oportunidade da redivisão territorial da Amazônia, justificando longamente o porquê dessa necessidade, dizendo claramente, por exemplo, que enquanto áreas do Nordeste, Sudeste e Sul têm Estados de 200 quilômetros quadrados em média, na região Norte apenas os Estados do Pará e do Amazonas respondem por um terço da extensão do Brasil. O Amazonas, sozinho, é maior do que os sete Estados do Sul e do Sudeste.  

É fundamental que o Brasil dê uma nova olhada no seu mapa, que os brasileiros tenham uma nova visão dessa geografia, dessa geopolítica do País, que só foi mexida em três ocasiões históricas. Primeiro, em 1943, quando Getúlio Vargas resolveu criar cinco territórios federais no Brasil, dos quais persistiram apenas Roraima - naquela época chamado de Rio Branco -, o Amapá e Rondônia, chamada à época de Guaporé.  

No que resultou essa redivisão territorial? Na visão de Getúlio Vargas, era uma questão de defesa nacional, uma questão de desenvolvimento daquelas regiões. Realmente, resultou no desenvolvimento e na presença brasileira em fronteiras estratégicas.  

A outra vez em que se mexeu na geografia do País foi com Juscelino Kubitscheck, que deslocou a capital do Brasil do litoral carioca para o interior do Centro-Oeste, propiciando com isso o surgimento e o desenvolvimento de várias áreas do Centro-Oeste e do próprio norte brasileiro, interligando o País de norte a sul.  

Em 1988, discutiu-se novamente na Constituinte, da qual V. Exª brilhantemente fez parte, a questão da redivisão territorial, resultando apenas na criação do Estado do Tocantins. É preciso fazer aqui também uma referência, que, na época do regime militar, foi criado o Estado do Mato Grosso, outra redivisão territorial.  

A Comissão recomendou a criação do Estado do Tapajós por desmembramento de Município do Estado do Pará; a criação do Território do Rio Negro, por desmembramento de Município do Estado do Amazonas; a criação do Território do Alto Solimões; a criação do Território Federal do Araguaia, no Mato Grosso; outras propostas, como a Unidade Territorial do Abunã, uma figura não existente na Constituição; e a redivisão de outras regiões, como, por exemplo, a criação do Estado do Triângulo.  

Eu me ative, Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, aos três maiores Estados do País, que, por coincidência, estão na Amazônia, têm dificuldades administrativas claras e problemas de fronteira muito sérios com países onde o narcotráfico impera, a guerrilha domina e onde, acima de tudo, a lei não existe.  

Pensar na nova geopolítica do País, creio eu, é um imperativo do momento, que está atrasado. Na verdade, foi parcialmente uma decisão da Constituinte que criou essa comissão que concluiu pela redivisão territorial. Entretanto, acredito que demos um passo na medida em que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania decidiu – embora, repito, colocando de certo modo a carroça antes dos bois -, antes de ouvir o povo num plebiscito, ouvir os ministros e os governadores. Mas o que excede em diálogo e em debate não prejudica.  

Essa audiência deve ser feita o mais rápido possível. A minha proposta é que esse plebiscito pudesse ser feito juntamente com a eleição municipal para não haver custo adicional, porque o eleitor será convocado a votar para vereador e para prefeito. Então, ao mesmo tempo em que votará, opinará se deseja ou não a criação de Território ou de Estado.  

O certo, Sr. Presidente, é que esse modelo geopolítico e geográfico do País é injusto para com todas as regiões, porque não garante o desenvolvimento tampouco a defesa das nossas fronteiras, engessando esse sistema que se está perpetuando.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT – AL) – Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL – RR) – Ouço V. Exª com prazer.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT – AL) – Senador Mozarildo Cavalcanti, compreendo o pronunciamento de V. Exª e tive a oportunidade de acompanhar esse debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. A minha preocupação, relacionada a qualquer discussão de uma nova geopolítica para a região, embora todos nos debrucemos sobre os dados relacionados ao Orçamento, sobre os novos gastos com as novas estruturas administrativas criadas, a rediscussão do FPE, além desse outro debate, que acaba sendo feito de alguma forma, acredito que há um ponto preliminar, que se refere à discussão da Amazônia. Infelizmente, o Governo Federal não tem tido a responsabilidade de discutir essa questão do ponto de vista das alternativas para o desenvolvimento econômico, dinamização da economia local, geração de emprego e renda, produção de alimentos, enfim, da questão do desenvolvimento sustentável, que não é sonho, não é referência romântica. Existe possibilidade concreta de garantir o desenvolvimento econômico e social pautado na sustentabilidade.  

Além disso, há uma questão que me tem causado muita preocupação, que tive inclusive oportunidade de partilhar com V. Exª, e sobre a qual fiz pronunciamentos nesta Casa, assim como V. Exª. Trata-se da discussão sobre um novo instrumento, uma nova instituição com vida própria, que é a secretaria para operacionalizar o Tratado da Amazônia. Não se trata apenas de uma estrutura burocrática para realizar uma operacionalização com outros países referente ao Tratado. O problema reside no fato de que há uma nova instituição, que já foi criada, com vida própria e que pode até estabelecer mecanismos de financiamentos multilaterais com instituições que dispõem de vida própria, sem precisar discutir com os parlamentos, tampouco com os executivos desses países. Então, de que forma isso será discutido e de que modo o regimento a ser vislumbrado por essa secretaria será tratado? Será mediante consenso ou por maioria? Sabemos como essas instâncias de decisão por maioria acabam servindo a interesses das grandes nações. Apesar de entender todo o pronunciamento de V. Exª, a discussão que foi feita, os debates sobre a questão da administração, dos novos recursos que terão que ser implementados, os novos custos, a questão operacional do planejamento, do orçamento e pela gestão, tem algo fundamental que é o País não ter uma política de desenvolvimento para a Amazônia e que respeite a soberania nacional. Essa é a preocupação que trago a V. Exª, embora saiba que não esse é o instrumento principal de seu pronunciamento; mas, como diversos Senadores fizemos vários debates sobre a soberania nacional e a Amazônia, antes de qualquer posicionamento, de qualquer modificação da estrutura geopolítica, precisaríamos discutir uma política de desenvolvimento sustentável, uma política de segurança para a Amazônia e de soberania nacional.

 

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL – RR) – Senadora Heloisa Helena, os argumentos que V. Exª traz podem e devem ser discutidos paralelamente, nem antes nem depois.  

Uma coisa é discutirmos a política que o governo quer para a Amazônia – acredito que não quer nenhuma -, outra coisa é discutirmos a geopolítica, a divisão territorial da Amazônia. Está provado que somente os três Estados que cito, o Amazonas, o Pará e o Mato Grosso, compõem mais da metade da área territorial do País, e isso não é algo inexpressivo do qual pudéssemos descuidar. Somente o Amazonas, repito, é maior que os sete Estados das regiões Sul e Sudeste.  

Esta é uma questão não somente de extensão, mas também de levar em conta os cidadãos que ali vivem, que ficam marcando passo. Por isso precisamos discutir o assunto com celeridade. Não se trata de um tema novo, levado pela emoção ou questões menores; tem pelo menos um registro histórico na Constituinte de 1988, um registro documental em março de 1990 com a publicação do relatório da comissão de redivisão territorial do País criada pela Constituição.  

Assim, este Congresso, basicamente o Senado, que representa os Estados, tem a obrigação de discutir profundamente o tema. Finalizo, apelando não só aos Senadores membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mas a todos os colegas para que analisemos o problema com um olhar mais brasileiro e menos localizado nessa ou naquela região, porque o Brasil está marcando passo quando tem apenas três Estados que respondem por mais da metade de sua área territorial, três Estados que fazem fronteira com sete países da América Latina, países que têm conflitos sérios, inclusive o mais sério deles, que é o do narcotráfico – está aí a CPI do Narcotráfico para comprovar o quanto é importante para o Brasil e para o mundo o combate ao narcotráfico que, muitas vezes, deve e pode começar pela simples presença do poder público mais próximo de nossas fronteiras. Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2000 - Página 10198