Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

POSICIONAMENTO CONTRARIO A UTILIZAÇÃO DA VIOLENCIA PELO MST NAS REIVINDICAÇÕES PELA REFORMA AGRARIA. CONSTATAÇÃO DO EMPOBRECIMENTO DO TRABALHADOR RURAL.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA. REFORMA AGRARIA. POLITICA AGRICOLA.:
  • POSICIONAMENTO CONTRARIO A UTILIZAÇÃO DA VIOLENCIA PELO MST NAS REIVINDICAÇÕES PELA REFORMA AGRARIA. CONSTATAÇÃO DO EMPOBRECIMENTO DO TRABALHADOR RURAL.
Publicação
Publicação no DSF de 26/05/2000 - Página 10905
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA. REFORMA AGRARIA. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • REPUDIO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MUNICIPIO, SÃO PAULO (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), OCORRENCIA, AGRESSÃO, MARIO COVAS, GOVERNADOR, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS).
  • REPUDIO, EXCESSO, VIOLENCIA, TRABALHADOR, SEM-TERRA, REIVINDICAÇÃO, REFORMA AGRARIA, EFEITO, REDUÇÃO, PRESTIGIO, MOVIMENTO TRABALHISTA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, RENDA, PEQUENO PRODUTOR RURAL.
  • DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, INCENTIVO, POLITICA AGRICOLA, POLITICA FUNDIARIA, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, ASSENTAMENTO RURAL, OBJETIVO, REDUÇÃO, DESEMPREGO, COMBATE, DESIGUALDADE SOCIAL.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a escalada da violência está mudando seus personagens. Agora, já não temos apenas a velha guerra diária entre os bandidos e suas vítimas, num país submetido ao terror do crime organizado ou à rotina dos assaltos de rua. É de assustar o que aconteceu em São Paulo. Um governador, um homem público com a dimensão e o passado de Mário Covas, leva uma paulada na cabeça. Uma paulada desferida por um manifestante político, em plena via pública e sob as vistas de centenas de testemunhas. O Ministro José Serra foi vítima de outra agressão a padrões mínimos de civilidade, quando quebraram um ovo em seu rosto. O Presidente Fernando Henrique Cardoso condenou as duas agressões, afirmando que elas caracterizam desrespeito à democracia. Para mim, mais do que isso, e perdoem-me a veemência, foram coices na democracia.  

O País não pode aceitar passivamente essa inversão dos valores básicos da convivência democrática. E essas minorias não têm o direito de abusar das franquias democráticas para pisotear a democracia. Não acredito que os partidos populares e os sindicatos concordem com esses desvios de conduta de provocadores profissionais. Mas acho que esses episódios devem servir de alerta contra o descontrole de confrontos de rua e de ataques a instituições ou autoridades. Violência é uma coisa que a gente sabe quando começa, mas não sabe quando termina. Ela se nutre de si mesma, e não costuma atender às lideranças, quando o combustível da ira descontrolada se alastra dentro dos grupos de protesto.  

Estamos vivendo um período rico de explosões sociais e de riscos. Primeiro foram os sem-terra que invadiram prédios públicos e prenderam reféns. Depois foram os índios. Seguiu-se a greve dos caminhoneiros. Agora são estudantes e funcionários públicos que protestam nas ruas de São Paulo. Não tenho nada contra as reivindicações que motivaram esses movimentos dos últimos dias, começando pelas comemorações do Descobrimento. O que lastimo é o descompromisso, o desrespeito, a violência, a quebra de princípios democráticos de coexistência, a radicalização, tudo levando à supressão do diálogo, à ruptura das vias do entendimento. Pressionar, protestar, promover passeatas pacíficas, sim. Agredir, não.  

Decididamente, esse quadro é preocupante para um país que tem tradição de convivência democrática. A violência não constrói, mas destrói. E a sociedade não pode ficar refém de minorias que nem sempre representam maiorias. A violência intranquiliza a sociedade, que em sua maioria quer a paz, sem ser insensível à justiça das boas causas sociais. Mas é preciso ter cuidado com a generalização conceitual, quando se fala em violência. Os limites de resistência da pobreza estão saturados, e poucos vêm as raízes, vendo apenas os efeitos. Os elos de coexistência e de equilíbrio social estão ameaçados de rompimento, ou pelo desemprego, ou pela desesperança, ou pelas diversas formas de desespero que levam à violência e ao crime.  

Dois fatos recentes traumatizaram Goiânia. Odimer José de Oliveira, empresário querido de toda a cidade, proprietário de restaurantes, foi assassinado friamente, com um tiro no peito, ao chegar em sua residência. Os criminosos ainda arrastaram a mulher da vítima, de dentro do automóvel, e a atacaram a coronhadas, sob ameaça de morte. Na mesma semana, gangues de jovens e adolescentes assustaram os frequentadores da Feira de Agropecuária, promovendo arrastões diários, porque faltou o policiamento que era de responsabilidade do governo local. São crimes comuns, não guardam qualquer semelhança com a violência derivada de motivações políticas, mas denunciam a crescente desigualdade social num país em que a corda já esticou demais.  

O Movimento dos Sem-Terra, que abriga milhares e milhares de excluídos sociais, tem estado sob os holofotes da exposição nos últimos dias, porque suas táticas de confronto estão levando a sociedade à exaustão. A revista Veja dedicou destaque de capa a uma longa reportagem sobre as motivações políticas do movimento. O país descobriu o esquema de desvio dos recursos da Reforma Agrária para sustentar a onda de protestos do MST. E a revista Época desta semana publica uma extensa matéria sobre os resultados positivos do programa de Reforma Agrária do governo atual, e traça um perfil sobre "a classe média dos campos". Não quero dizer que seja uma contra-ofensiva deliberada para mostrar que o MST exagera na tática e nas reivindicações. Mas é aquela velha história: quem procura acha. E os veículos de comunicação estão cumprindo o seu papel exibindo as duas faces da moeda. Com isso cai a credibilidade do movimento, suas lideranças perdem autoridade diante da opinião pública, e a própria causa da Reforma Agrária, legítima e indispensável, multiplica desconfianças. São os efeitos inevitáveis da radicalização. O açodamento, a politização, a violência, não podem continuar prejudicando o futuro da Reforma Agrária no país.  

Sr. Presidente, os dados da realidade mostram que o MST, descontados os meios radicais de ação, tem fortes razões para protestar. São razões que se misturam com as dos pequenos proprietários rurais que não fazem parte dos assentamentos, e que não têm crédito adequado e pontual, sementes e fertilizantes. Ganham ou já têm a terra, mas não têm como cultivá-la. Os pequenos produtores tradicionais acabam indo para as cidades, aumentando a demanda sobre serviços urbanos ineficientes, estimulando os índices de violência, ampliando a exclusão social. E muitos desses chefes de família acabam aderindo ao MST. Na semana passada, a imprensa exibiu números apreensivos sobre essa realidade. Na última década, um milhão de minifúndios foram abandonados, segundo a revista Veja. A mesma revista transcreve a advertência de Eliseu Alves, respeitado pesquisador da Embrapa: "Se nada for feito, 10 milhões de pessoas vão deixar o campo. Isso é uma bomba populacional".  

Segunda-feira, a Folha de S. Paulo publicou um excelente trabalho de página inteira sobre o empobrecimento no campo. A renda caiu 5,8 por cento entre 1995 e 1998, informa o jornal, com base em levantamentos realizados pela professora Ângela Corrêa, da Universidade Metodista de Piracicaba. Reproduzo aqui uma das principais constatações a que chegou a reportagem: "Duas das regiões onde a renda média caiu, o Sul e o Nordeste, registraram juntas 56 por cento das invasões de terra no mesmo período. O empobrecimento do trabalhador rural é uma das principais alegações do MST ao cobrar do governo mudanças na política fundiária". O Centro-Oeste não foi uma exceção nesse quadro negativo, mas começa a reagir, de acordo com levantamento recente que foi publicado pela Gazeta Mercantil . No primeiro trimestre deste ano, os empregos contratados pelo setor rural chegaram a pouco mais de 22 mil, contra 8 mil no mesmo período do ano passado. É evidente que o período de safra teve influência nesses dados, distorcendo a sua média no tempo, mas de qualquer forma eles são positivos, mostrando a força da região e a crescente necessidade de uma eficiente infra-estrutura de transportes para consolidar a economia primária regional.  

Mas a realidade nacional da mão-de-obra tradicionalmente agrícola é um barril de pólvora que vai acabar explodindo, se não forem adotadas medidas sociais compensatórias, e, nesse particular, o MST apenas dá o brado de alerta para despertar a sociedade. Por isso, estou absolutamente de acordo com o MST, discordando apenas das formas violentas de protesto. A questão não é apenas a de ocupação da terra. Há uma questão social muito mais ampla, e um universo de políticas públicas a implementar. Em artigo publicado hoje pela Gazeta Mercantil , o renomado professor José Graziano da Silva chama a atenção para os efeitos da tecnologia. Ele diz que "o impacto das novas tecnologias baseadas na microeletrônica tende a acelerar ainda mais a queda do emprego agrícola". E defende uma reforma agrária que "permita a combinação de atividades agrícolas e não-agrícolas". É um trabalho que merece a nossa reflexão, porque ele faz várias propostas para reduzir a desumanidade de nossos aparthaids sociais, incluindo a necessidade de políticas sobre moradia. Eu acho sinceramente que não adianta condenar o MST e o estridência de sua denúncia social. O MST é parte de nossa realidade, existe, tem que ser ouvido, respeitado e atendido. Cabe ao governo dar sinais dessa disposição, para inibir a violência dos segmentos mais radicais do MST. No mínimo porque ele é de fato, hoje, o único movimento social forte e organizado que temos, para denunciar as nossas mazelas, e por isso presta um grande serviço à sociedade.  

O governo atual tem méritos que devem ser reconhecidos. A média de assentamentos, segundo as fontes oficiais, tem sido de 80 mil anuais, contra apenas 10 mil até 1994. As tensões entre um governo que quer ser reconhecido como eficiente, e um MST que quer mais terras para assentar, precisam sair desse nó. Nem o governo deve retaliar, nem o MST deve radicalizar, vetando o diálogo com o Ministro Raul Jungmann e exigindo o Ministro Pedro Malan como interlocutor. Assunto de reforma agrária tem que ser tratado com o Ministro da Reforma Agrária. Mas esse impasse merece uma reflexão: é fato notório para todo o país que os canais de diálogo entre o MST e o Ministro Jungmann estão irremediavelmente esgarçados depois de muitos meses de trocas de acusações e de desencontros. O ministro é um servidor do Estado com larga experiência, com credenciais especialíssimas na resistência democrática, além de ser um idealista e um intelectual de reconhecida consistência. Valerá a pena desgastá-lo ainda mais? Ou ele poderá assumir, renovado, uma outra área importante do governo? Acredito que ganhariam o governo, os sem terra, o próprio ministro e o país. O governo não estaria se curvando a imposições do MST, mas estaria demonstrando disposição para seguir em frente e abrir uma grande parceria de mútua confiança com o MST. Não faltariam nomes em condições de assumir esse desafio, sobretudo no Congresso, onde sobram quadros calejados na prática do entendimento, nos avanços, nos recuos, na superação de impasses.

 

O Presidente Fernando Henrique Cardoso tem alternado momentos de desabafo, em que pede mais compreensão e menos radicalização ao MST, com instantes em que reconhece a necessidade de grandes mudanças na estrutura arcaica de nossa organização fundiária. Ele pode escolher o homem certo para conduzir esse processo, abrindo alternativa para combater o desemprego e diminuir o inchaço das grandes cidades. A criação e a existência de um movimento forte, aguerrido e organizado como o MST é um fato que toda a Nação deve louvar como instrumento positivo de transformação de nossas realidades econômicas e sociais. Sem o uso das táticas do confronto, o MST não é um problema, mas uma solução para ser respeitada e apoiada por toda a nossa sociedade. Uma solução que não se insurja contra a preservação da ordem pública, da Constituição e da lei, uma solução de paz e de justiça, uma solução poderosa contra a exclusão social e que saiba conviver em clima de harmonia com toda a sociedade brasileira.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

é g ¿ dÀ Xà te utilizada na Universidade. Serve como material didático nos cursos de extensão de educação ambiental. O Ministério do Meio Ambiente está inclusive patrocinando a produção de 10 títulos sobre a Chapada do Araripe. Os cordéis são produzidos pela Academia de Cordelistas do Crato, em convênio com a Fundação do Desenvolvimento Tecnológico do Cariri, com edição de 5 mil cópias por título, num total de 50 mil exemplares. A URCA está estudando, no momento, uma forma de administrar a gráfica de cordel, em convênio com alguns órgãos oficiais. Vejamos outro exemplo de integração da Universidade com a região que a circunvizinha. Consciente do imenso patrimônio natural que constitui a Chapada do Araripe - designada inclusive de Santuário Paleontológico do Nordeste - a Universidade Regional do Cariri sediou o XVI Congresso Brasileiro de Paleontologia, que reuniu perto de 130 paleontólogos, e contou com a presença de pesquisadores brasileiros, argentinos e italianos. Nesse encontro, foi aprovada moção a favor da indicação da jazida fossilífera da bacia do Araripe como "patrimônio da humanidade". Ainda dentro da programação do Congresso, foi dedicado um dia inteiro a Santana do Cariri, cidade que abriga o Museu de Paleontologia da URCA e o Parque Temático Terra dos Pterossauros. É inegável que a visita dos pesquisadores à região é uma forma de torná-la mais visível e integrá-la à comunidade de cientistas brasileiros e estrangeiros. A cidade de Santana do Cariri tem condições de projetar-se como a maior reserva fossilífera do mundo. Na oportunidade, vale ressaltar, alguns pesquisadores mostraram-se preocupados com a exploração predatória de calcário laminado para a construção civil, observada por eles em visita à chapada do Araripe. Sr. Presidente, poderia ficar eu discorrendo sobre a nossa Universidade do Cariri por muitas horas mais. Recomenda o bom senso, todavia, que eu não me alongue por demais, para não monopolizar a palavra e para não tornar enfadonho meu pronunciamento. Por isso, encerro minha fala por aqui. Mas não posso fazê-lo sem antes manifestar meu contentamento pessoal por ter podido, nesta tribuna, exaltar o feito de nossa brava gente cearense, essa gente que se desdobra e dá seu sangue e suor para manter cada vez mais elevada a chama da educação em nosso País. À competente Reitora Violeta Arraes dirijo meus cumprimentos sinceros, parabenizando, em sua pessoa, a comunidade acadêmica que tão bem administra e dirige. Faço votos para que os diretores, professores e estudantes da URCA continuem a sonhar com o sonho possível de trazer o desenvolvimento sustentado à região de sua Universidade e façam de tudo para torná-lo cada dia mais concreto. Era o que eu tinha a dizer. Muito obrigado a todos. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/05/2000 - Página 10905