Discurso durante a 79ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

HOMENAGEM A MEMORIA DO SR MANOEL SAMPAIO LUZ, EX VICE GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS.

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM A MEMORIA DO SR MANOEL SAMPAIO LUZ, EX VICE GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS.
Publicação
Publicação no DSF de 17/06/2000 - Página 13266
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, MANOEL SAMPAIO LUZ, LIDER, POLITICO, ESTADO DE ALAGOAS (AL).

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB – AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia 23 de março de 1976, o então Senador Teotônio Vilela, com o brilho de sua incomparável retórica, veio a esta tribuna do Senado Federal para, em um pronunciamento repassado do lirismo de que só ele era capaz, sempre que se referia à nossa terra, tributar sua homenagem à memória do amigo e conterrâneo, Manoel Sampaio Luz, falecido dez dias antes, exatamente com 75 anos.  

Sem que tenha a aspiração de um dia ombrear-me com aquele que foi um dos maiores políticos alagoanos de todos os tempos, cumpro, em sua ausência, o dever de desincumbir-me de uma tarefa bem mais grata, a de registrar em nossos Anais o centenário de nascimento desse líder sertanejo que, em vida, se tornou conhecido pelos apelidos com que o povo o chamava carinhosamente: Juca Sampaio para uns, "seu Juca" para outros, Juca para quase todos.  

Patriarca de larga descendência, fincou raízes em uma das mais aprazíveis e encantadoras cidades de Alagoas, Palmeira dos Índios, coincidentemente, Sr. Presidente, a terra natal de nossa Senadora Heloisa Helena. Os seus títulos de várias vezes Prefeito Municipal, Deputado Estadual, vice-Governador do Estado, além dos títulos de empresário, agricultor, comerciante, empreendedor, pioneiro e visionário que lutou e conquistou implantar a segunda emissora de televisão do Estado, a TV Alagoas , talvez não fossem bastantes, como já disse Teotônio, para justificar esse registro. O que assinalamos aqui é algo mais valioso que as conquistas materiais e mais nobre que as vitórias na vida pública e privada. Refiro-me, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, às qualidades humanas e às condições morais daqueles que, como Juca Sampaio, venceram as adversidades do próprio destino e foram capazes, como tantos outros Jucas Sampaios espalhados pelo interior do Nordeste, de dar sentido, alento e rumo à própria vida e à daqueles que lhes coube liderar, mais do que pela pregação, pelo exemplo.  

As instituições municipais foram, durante mais de três séculos, e continuaram a ser, nos dois séculos seguintes da nossa existência como Nação, as únicas a que, na maioria das vezes, podia recorrer o cidadão esquecido e desamparado que, na constatação de Capistrano de Abreu, devassou e revelou o Brasil, abrindo o que ele mesmo chamou de "os caminhos antigos", a que devemos a unidade nacional, a continuidade territorial e a conquista da língua, graças à qual nos comunicamos em qualquer parte do País. É verdade que, em muitos casos, essa descentralização serviu, como escreveu Victor Nunes Leal, para oprimir, mas em inúmeros outros, serviu também para redimir. Em alguns municípios está a raiz da oligarquização, mas em outros plantou-se e fez-se vicejar a semente da democratização. Os mais aptos e os mais fortes tomavam em suas mãos o destino coletivo para tornar a vida mais suportável e as agruras menos doídas. Esses homens tinham a consciência de seu próprio destino, mas tinham também a noção de seus compromissos para com o meio em que viviam. Foram eles que, a despeito do Poder Público e alguns até contra o próprio poder, suportaram o ônus de dar abrigo aos desamparados, socorrer os desassistidos e manter acesa a chama da esperança contra as adversidades do meio que, no sertão e no agreste nordestino, tornaram dura e incerta a própria sobrevivência nos períodos de seca. Uma saga, Sr. Presidente, que, há mais de um século, vive o povo nordestino, ainda hoje desamparado do que mais seja a precariedade dos programas de emergência.  

Esses homens que, como Juca Sampaio, plantaram a semente do civismo e a sustentaram inúmeras vezes com o sacrifício e até com o risco da própria vida são aqueles varões de Plutarco, heróis anônimos de um mundo para muitos desconhecido, que sustentaram a vida pública nos confins perdidos deste Brasil com padrões éticos irrepreensíveis que tanta falta hoje nos fazem. Eles não encarnavam só a autoridade do poder político, quando se investiam dos mandatos a que concorriam, mas, sobretudo, a do patrão, a do amigo, verdadeiras instituições públicas que a urbanização, o progresso e o tempo aos poucos fizeram desaparecer do cenário político brasileiro.  

No caso de Manoel Sampaio Luz, está viva a sua memória, cultuada não só pela presença e pela atuação dos filhos sobreviventes, mas também pela sua viúva, Dª Heloisa, hoje com 94 anos de idade, ainda a presidir e a participar do centenário tão celebrado. Dois de seus filhos foram Deputados Federais: José Sampaio, já falecido, e Geraldo Sampaio, meu grande amigo que, como ele, foi Deputado Estadual, Conselheiro e Presidente do Tribunal de Contas de Alagoas e hoje, também como o pai, é Vice-Governador do Estado. Juca Sampaio foi vice de outro grande homem público, também do interior, de São Luís do Quitunde, Lamenha Filho, que foi um dos grandes governadores que Alagoas teve durante todos os tempos. O outro dos filhos, Gileno Sampaio, ocupou o cargo de Prefeito, o mesmo que o pai tantas vezes exerceu. Alguns de seus netos, sobretudo o que leva o seu nome, seguem-lhe o rumo e a estes, companheiros de minha geração, alguns outros mais jovens do que eu, dedico esta homenagem como tributo a quem foi cidadão exemplar, político equilibrado, competente e sereno, homem público austero e dotado de retidão de caráter que ainda hoje honra a sua memória.  

As instituições municipais que alicerçaram o poder político e mantiveram acesa a chama da vida cívica, muitas vezes com a paixão que extravasa as próprias famílias para se espraiar por gerações e pelas legiões de seguidores, hoje estão decadentes. E isso ocorre não porque lhes faltem virtudes, mas porque se viram cada vez mais abandonadas pela tendência centralizadora da União que lhes nega recursos, impõe-lhes ônus de encargos que não podem assumir e a elas apelam, Sr. Presidente, sempre que os seus projetos falham, seus programas claudicam e suas metas não se cumprem.  

A oportunidade das comemorações do centenário de Manoel Sampaio Luz, exemplo e paradigma desse espírito empreendedor e de devotamento à causa pública, pode e deve ser aproveitado como homenagem ao que ele representou em vida. Nas palavras de Teotônio Vilela - Político do Interior : "Vidas que morrem ignoradas dos palácios e da História, vidas simples que sofrem pelas grandes causas, pelos encantos e desencantos da refrega política. Nascem e morrem nas vilas, nos povoados, nas pequenas cidades e nos campos toda uma existência, coberta de veneração pelos dirigentes do País, toda uma existência dedicada a ensinar aos filhos e à população as virtudes da Pátria, o destemor dos seus heróis, a grandeza sem par dos pleitos políticos, os benefícios de uma vitória, a perspectiva do desenvolvimento da comunidade. A missão do político do interior é multiforme. A pobreza o convida a socorrê-la, a dor o chama".  

Assim foi a vida de Juca Sampaio, e na homenagem que lhe presto, em honra de tantos que ao contrário dele foram esquecidos, lembro à sua família, com o meu testemunho, que sua vida pode ter sido ignorada pelos palácios, cujo poder é efêmero, mas não pela História nem por seu povo, menos ainda por sua gente, sua terra, seu Estado e por todos aqueles que, como ele, persistiram até a morte na senda da política, como instrumento da capacidade de redenção do Estado de Alagoas.  

Muito obrigado, Sr. Presidente. Mais uma vez, peço desculpas pela veemência, mas, sinceramente, não poderia deixar de fazer esse registro, que considero muito importante para Alagoas e para o seu passado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/06/2000 - Página 13266