Discurso durante a 97ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o posicionamento da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC e da Academia Brasileira de Ciências sobre os transgênicos.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Considerações sobre o posicionamento da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC e da Academia Brasileira de Ciências sobre os transgênicos.
Publicação
Publicação no DSF de 12/08/2000 - Página 16853
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • REGISTRO, DIVERGENCIA, MANIFESTAÇÃO, SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIENCIA (SBPC), ACADEMIA BRASILEIRA DE CIENCIAS (ABC), REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, BRASIL, ALIMENTOS, PRODUTO TRANSGENICO.
  • DEFESA, DEBATE, SOCIEDADE, CONGRESSO NACIONAL, ALTERAÇÃO, GENETICA, ALIMENTOS, POSSIBILIDADE, COMBATE, FOME, DOENÇA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, SEGURANÇA, RISCOS, TECNOLOGIA, AUMENTO, ESCLARECIMENTOS, POPULAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil é palco atualmente de um amplo e instigante debate acerca dos transgênicos. De um lado, estão aqueles que defendem a sua liberação, para cultivo e uso no País. No outro pólo, encontram-se aqueles que, com veemência, arrolam uma série de malefícios que a prática acabaria por trazer aos consumidores, e pedem moratória e maiores investigações.

            Ainda agora no mês de julho, por ocasião da 52ª Reunião Anual da SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizada aqui em Brasília, assistimos a uma troca de notas entre duas respeitáveis instituições voltadas para o conhecimento científico no País. A SBPC pediu maior rigor na liberação do cultivo e da distribuição dos alimentos com DNA recombinante, enquanto que a octogenária Academia Brasileira de Ciências divulgou documento, respaldado por cientistas de outros cinco países - entre eles Grã-Bretanha, Índia e México, apoiando o cultivo de produtos geneticamente modificados.

Na verdade, a SBPC defende uma moratória para a introdução e utilização dos transgênicos no País, sob o argumento de que é preciso treinar a burocracia responsável pela fiscalização dos procedimentos previstos na Lei de Biossegurança. A entidade entende ainda que essa Lei deve ser revista, em decorrência dos vetos recebidos.

A matéria é realmente muito controversa, merece a nossa melhor atenção, sendo, pois, mais do que salutar a colocação na agenda do País de assunto de tamanha relevância para toda a sociedade. A tomada de posição, as discussões em distintos âmbitos, e também aqui mesmo, neste plenário, permitem aos cidadãos a análise, sob todos os seus diferentes ângulos, de uma questão naturalmente polêmica, que poderá afetar a curto e longo prazo a saúde de todos nós. E esclarecer a sociedade, dissipar suas dúvidas, preconceitos e temores eventualmente infundados é uma das mais relevantes missões do poder público, em suas várias instâncias.

Como sabemos, a engenharia genética registrou, a partir do início dos anos 70, significativos avanços nas técnicas que permitiriam manipular efetivamente a base da vida, chegando-se ao DNA recombinante, ou seja, a possibilidade de combinar genes de espécies distintas. As descobertas que a ciência vem realizando acabam por alterar em sua essência todo um conjunto de crenças e valores desenvolvidos ao longo dos séculos, alargando de forma sem precedentes os horizontes da experiência humana.

A transgenia representa um formidável avanço para acabarmos com a fome no planeta, elevarmos a qualidade de vida das populações e instrumentalmente pode significar também um passo decisivo na prevenção, imunização e cura de inúmeras moléstias que afligem contingentes expressivos de seres humanos, especialmente em países pobres e periféricos. Pode transformar-se, portanto, em importante veículo de implementação de políticas de saúde pública.

Logo, é evidente que os avanços que a ciência nos tem proporcionado no campo da biotecnologia devem ser saudados, sem dúvida, mas com as devidas cautelas, haja vista que estamos diante de práticas ainda muito recentes, e nem mesmo os cientistas independentes são capazes de garantir que os organismos geneticamente modificados não causam danos à saúde. O que a ciência pode afirmar até o momento é que ainda não existem evidências contrárias ao uso humano desses produtos.

Por tudo isso, o que me preocupa como profissional da saúde e homem público é justamente o grau de esclarecimento que a sociedade brasileira detém sobre a matéria. Nós ainda não dispomos de pesquisas capazes de fornecer um quadro realista a propósito do nível de informação ao alcance do brasileiro médio sobre os transgênicos. Ignoramos até mesmo se o cidadão nacional minimamente escolarizado conhece o termo transgênico.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio, criada em 1995 e instalada no ano seguinte, realiza atualmente uma enquete de baixa estimulação em seu sítio na Internet. Em meados de julho pouco mais de 500 pessoas tinham respondido ao questionário online, o que não nos permite validar seus resultados parciais, até porque no Brasil, segundo o Ibope, existem perto de cinco milhões de usuários da rede mundial de computadores, o que significa um pequeno estrato da sociedade.

Não dispondo de dados a respeito da realidade nacional, valho-me, para fins unicamente ilustrativos, de pesquisa efetuada nos Estados Unidos, que teve a participação espontânea de mais de 13 mil internautas, e que oferece um quadro merecedor de atenção sobre o grau de esclarecimento, entre os usuários da Internet, a respeito dos transgênicos.

De acordo com essa pesquisa conduzida pela MSNBC, o portal mantido pela Microsoft e pela rede norte-americana NBC, 74 por cento dos participantes mostraram-se preocupados com o potencial ainda não dimensionado de conseqüências para a saúde e o ambiente das plantas e animais geneticamente manipulados. Quando se trata da necessidade de um teste prévio à comercialização de produtos transgênicos, 89% acreditam que é preciso esse tipo de precaução, prática amplamente utilizada no caso de aditivos e conservantes.

Além disso, 80 por cento entendem que o governo deve exigir a rotulagem dos produtos geneticamente modificados, prática que os Estados Unidos não adotam no momento. De maneira que fica claro, pelos dados recolhidos em uma pesquisa que aparentemente reflete sobretudo a posição da sociedade norte-americana, sem perder entretanto um certo caráter multinacional, a preocupação do cidadão com os alimentos transgênicos e a sua inequívoca vontade de obter mais informações.

E é exatamente nesse ponto que eu quero insistir, Sr. Presidente, conclamando as autoridades brasileiras a utilizarem todos os meios necessários para levar o esclarecimento à sociedade. Parece-me inclusive extremamente viável exigir de todas aquelas empresas produtoras e/ou distribuidoras de transgênicos no País que realizem campanhas de esclarecimento, através dos veículos de comunicação de massa. É uma proposta a ser estudada e avaliada pela CTNBio.

Além de ações dessa natureza e do escrupuloso controle que deve ser exercido pela CTNBio e demais órgãos competentes, entendo que a troca de experiências e relatos com órgãos similares de outros países, em uma espécie de monitoração permanente por meio de um observatório multinacional, seria uma iniciativa extremamente oportuna e útil para toda a sociedade.

É preciso lembrar sempre, e colocar em perspectiva e destaque, o interesse da espécie, pois o que eventualmente pode ser colocado em risco é a saúde dos seis bilhões de habitantes do planeta, alcançando indistintamente dos nascituros aos idosos.

Em 11 de julho, o jornal Correio Braziliense publicou nota afirmando que o Ministério da Justiça estaria na iminência de editar portaria obrigando a aposição, no rótulo de todos os produtos fabricados com componentes geneticamente modificados, da expressão produto transgênico. É uma iniciativa importante, mas não basta! É preciso informar mais e melhor a sociedade.

O mesmo jornal, em edição posterior, informou que o Instituto de Defesa do Consumidor e a Greenpeace analisaram 31 produtos, durante o mês de junho, comprovando que nove continham material transgênico. Mesmo considerando que no Brasil ainda é ilegal a produção e distribuição de alimentos geneticamente modificados, estão no mercado creme de milho, salsicha, batata frita, macarrão e leite de soja, todos de consumo popular, que agregam em sua composição transgênicos, isso sem que a população seja previamente advertida.

Com certeza, o Governo Federal, a despeito das pressões dos distintos segmentos envolvidos em torno de tão momentosa e disputada questão, saberá defender e preservar os interesses permanentes da sociedade brasileira.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/08/2000 - Página 16853