Discurso durante a 138ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância das Forças Armadas na colonização da Amazônia.

Autor
Luiz Otavio (S/PARTIDO - Sem Partido/PA)
Nome completo: Luiz Otavio Oliveira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS. SOBERANIA NACIONAL.:
  • Importância das Forças Armadas na colonização da Amazônia.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Gilberto Mestrinho.
Publicação
Publicação no DSF de 20/10/2000 - Página 20772
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, COLONIZAÇÃO, POVOAMENTO, REGIÃO NORTE, PAIS, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, GARANTIA, SEGURANÇA, SOBERANIA NACIONAL.
  • DEFESA, CONTINUAÇÃO, TRABALHO, FORÇAS ARMADAS, POVOAMENTO, REGIÃO NORTE, ESPECIFICAÇÃO, NECESSIDADE, COLONIZAÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA, OBJETIVO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, AGRICULTURA, AGROINDUSTRIA, SIMULTANEIDADE, RESPEITO, BIODIVERSIDADE.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, CRIAÇÃO, COMISSÃO TEMPORARIA, SENADO, OBJETIVO, DEBATE, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, REGIÃO AMAZONICA, POVOAMENTO, DEFESA, TERRITORIO NACIONAL.

O SR. LUIZ OTÁVIO (Sem Partido - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, a colonização da Amazônia, ensina Artur César Reis, foi consolidada pelo tripé: colono, missionário e soldado. A cada vilarejo que prosperava, a partir do Forte do Castelo, com a fundação de Belém em 1616, logo sucediam aos colonos portugueses os padres, no seu ministério de catequização, e os militares, para a segurança de todos. Pedro Teixeira, saindo de Cametá em 1637, com poucas centenas de soldados e milhares de índios, ao contrário do que fizera Orellana, em 1541, navegou o Rio Amazonas, chantando padrões de posse em nome da coroa portuguesa até Napo, só se detendo ao ser barrado pelo “adelantado” de Espanha, já em Quito. Foi, pois, uma ação militar que permitiu a Portugal a conquista do oeste amazônico, levando a fronteira ao rio Javari e anulando o Tratado de Tordesilhas, que concedia toda a imensa região aos espanhóis.

Os fortes construídos para defesa contra qualquer invasão a partir dos Andes ou do Orenoco constituíram proteção para todo o Arco Oeste da Amazônia, desde o Forte de São Joaquim, no hoje Estado de Roraima, até o Forte Príncipe da Beira, às margens do rio Guaporé, na divisa com a Bolívia. Operações militares se sucederam no período colonial, no Norte, até a conquista definitiva do forte de Macapá, onde os franceses foram derrotados.

A ação militar, pois, atravessa os séculos no desenho de nossas fronteiras amazônicas, complementada pela diplomacia brasileira na solução por arbitragem: no Amapá, com a França; e em Roraima, com a Inglaterra. Eu diria que a Amazônia, ontem como hoje, teve o seu destino umbilicalmente ligado aos militares, quer os portugueses, quer os brasileiros, de quem herdamos a soberania sobre a grande planície florestal.

Esse passado é, hoje mais que nunca, um símbolo que devemos cultuar, fazendo-nos dignos dele no momento em que nos cabe a sua guarda. Numa homenagem a esse passado, os quartéis mantêm como legenda a frase que diz: “Árdua é a missão de desenvolver e defender a Amazônia. Muito mais difícil, porém, foi a dos nossos antepassados de conquistá-la e mantê-la”.

Em 1956, começou o Exército a prestigiar a Amazônia. Criou o Comando Militar da Amazônia (CMA), mais tarde desdobrado em CMA, em Manaus - ponto lógico de qualquer instalação de defesa do Arco Oeste da Amazônia -, e Comando Militar do Norte (CMN), em Belém. Levou os Batalhões de Engenharia de Construção para a floresta, rasgando estradas. Os tradicionais Batalhões de Caçadores, sediados em Manaus e Belém, passaram a integrar os Batalhões de Infantaria de Selva, desde Marabá - onde tive o privilégio de servir como tenente R/2 convocado - até as mais recônditas paragens da Floresta Amazônica. Seu efetivo, hoje, inclui quatro Brigadas de Infantaria de Selva, um Grupamento de Engenharia, uma unidade da aviação do Exército, o famoso Centro de Instrução de Guerra na Selva, de Manaus, e o pessoal de apoio. Tropas antes sediadas no Rio Grande do Sul foram instaladas no âmago da floresta, em São Gabriel da Cachoeira, Normandia, Surucucu (um pelotão na terra indígena ianomâmi), Maturacá, Brasiléia e Assis Brasil, no Acre; enfim, uma seqüência de unidades ao longo dos 12 mil quilômetros de fronteira. Para Boa Vista, veio a tropa anteriormente aquartelada em Petrópolis.

Não foi apenas o Exército que modificou o paradigma antes voltado para o leste e o sul do País. Na Amazônia, a Aeronáutica e a Marinha de Guerra também estão presentes no 1º Distrito Naval e no 1º COMAR (antiga 1ª Zona Aérea), sediados em Belém. Promovendo as mudanças necessárias e condizentes com os dias atuais, essas forças emprestam o apoio indispensável às atividades do Exército e promovem um inestimável trabalho de assistência social às populações da hinterlândia amazônica.

A FAB ampliou suas bases e instalações, interiorizando-as. Sabemos que a tecnologia aeronáutica desenvolveu-se no século XX, mas, sem ela, não teria sido possível manter o controle sobre tamanha extensão territorial. O Ministério da Aeronáutica foi criado em 1941, mas apenas em 12 de dezembro de 1956 viu-se efetivado o interesse sobre a Amazônia, com a instalação da Comissão para a Criação de Aeroportos na Região Amazônica - COMARA. E os aviões Catalina (anfíbios) continuaram por muitos anos como sinônimo de esperança de vida, pois, por meio deles, as populações ribeirinhas tinham acesso a médicos, remédios, missionários, alimentos, roupas e educação.

Com a construção de pistas de pouso, foram criadas também bases aéreas e destacamentos de proteção ao vôo. O apoio da Aeronáutica passou a ser de extrema importância para a manutenção das unidades do Exército instaladas nas fronteiras, para a localização e coibição de queimadas, em conjunto com o Ibama, e no apoio à Funai, na assistência às comunidades indígenas.

Além dessas ações, a Aeronáutica vem sendo de fundamental importância no trabalho com a Polícia Federal na repressão ao garimpo ilegal. Mais recentemente, com o desenvolvimento do Projeto Calha Norte, que consiste na ocupação racional dos espaços vazios ao longo dos rios Solimões e Amazonas, visando a propiciar a essa extensa área as condições mínimas para o desenvolvimento, ficou demonstrado que é praticamente impossível para o Brasil manter a soberania sobre a Amazônia sem a participação efetiva da Aeronáutica. Em 1990, a FAB já voava mais de 1000 horas anuais para atendimento a missões desse projeto.

No meu modo de ver, merece destaque especial a implantação do Projeto Sivam - Sistema de Vigilância da Amazônia -, cuja concepção e cujo gerenciamento de implantação foram atribuídos à Aeronáutica por determinação presidencial. Esse sistema tem propósitos muito amplos, servindo de base para a coleta, tratamento e distribuição de dados para o Sistema de Proteção da Amazônia - Sipam, projeto que contará com a participação de vários ministérios, secretarias, governos estaduais e prefeituras.

A estrutura do Sivam se apoia em três Centros Regionais de Vigilância - CRVs, localizados em Belém, Manaus e Porto Velho, atendidos por um Centro de Apoio Logístico instalado em Manaus e gerenciados por um Centro de Coordenação Geral, em Brasília. Dispõe, ainda, de 32 sítios de comunicações para proteção ao vôo, sendo 25 deles equipados com radares, dos quais seis são transportáveis, para atender a necessidades em áreas de maior interesse operacional ou para substituir unidades que se encontrem em manutenção.

Além desses equipamentos, há o sensoriamento por satélites, com apoio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, complementado pelas informações colhidas por três aeronaves EMB-145, dotadas de visualização óptica e infravermelho, além de quatro aeronaves Caravan para apoio às equipes de manutenção. Apesar dos problemas apontados à época da implantação, hoje é inquestionável a necessidade dos sistemas Sipam/Sivam para a soberania brasileira sobre a Amazônia. A esses sistemas se atribuem dois grandes ramos de atividades: primeiro - vigilância e controle (espaço aéreo, navegação fluvial, fronteiras, pistas de pouso clandestinas, plantio/cultivo de espécies proibidas, extração de recursos naturais, áreas indígenas, rotas de narcotráfico e contrabando, reservas naturais, comunicações clandestinas); e segundo - apoio a iniciativas de meio ambiente e saúde (mapeamento de bacias hidrográficas, condições atmosféricas, queimadas e desflorestamentos, classificação de flora, poluição de rios, mapeamento de endemias e epidemias).

Os serviços prestados pela Aeronáutica na Amazônia devem ser reconhecidos por toda a sociedade, pois, devido às distâncias e às dificuldades de locomoção, muitas localidades ficariam totalmente esquecidas, não fosse o empenho dos integrantes dessa força.

Também a Marinha do Brasil tem uma presença marcante na Amazônia -presença que, aliás, remonta aos tempos do Brasil Colônia. Em 1728, o Governador da Província do Maranhão e Grão-Pará, Alexandre de Souza Freire, criou a Divisão Naval do Norte, com sede na cidade de Santa Maria de Belém do Grão-Pará, para controlar a entrada de navios no rio Amazonas. Em 1729, com a finalidade de construir e reparar canoas de guerra para prestarem serviços nessa região, foi criada a Casa das Canoas, que teve a denominação alterada para Arsenal de Marinha do Pará a partir de 1761, tendo este sido desativado em 1950, quando a base naval de Val-de-Cães iniciou suas atividades.

Com a abertura da navegação do rio Amazonas às nações amigas, em 1868, foi criada a Flotilha do Amazonas, que hoje dispõe de navios de patrulha fluvial e de navios de assistência hospitalar. Em 1994, foram criados o Comando Naval da Amazônia Ocidental e o 3º Esquadrão de Helicópteros de Emprego Geral. São onze mil milhas de vias fluviais, com a importância estratégica de fazer limite com sete países: Bolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Seria muito difícil, Srªs e Srs Senadores, manter a identidade nacional e a integridade territorial do Brasil sem a participação da Marinha, pois, para as populações ribeirinhas da região, o único sinal da presença do Estado são os navios e lanchas dessa força.

Para se ter uma idéia da importância do controle oficial sobre os meios de transporte da Amazônia é bom saber que cerca de 70 mil embarcações de todos os tipos e tamanhos trafegam pelos seus rios anualmente. Com capacidade para mais de 100 passageiros, são 1.100 barcos cadastrados na Amazônia Ocidental e 800 cadastradas na Amazônia Oriental. A solução encontrada para dar mais eficiência às ações da Marinha foi a criação das “Capitanias Flutuantes”, unidades que viajam para localidades extremas do território amazônico registrando embarcações, ministrando aulas aos ribeirinhos e expedindo certificados para condutores e marinheiros de barcos. Embora a maioria das embarcações cumpra as normas de segurança, o baixo poder aquisitivo dos habitantes da região, que leva ao achatamento das tarifas, constitui-se em estímulo ao excesso de carga e de passageiros, para cobrir os custos de operação das empresas, exigindo uma atenção especial da Marinha para coibir os abusos e fazer com que sejam cumpridas as normas de segurança.

A Marinha do Brasil realiza, ainda, operações de Assistência Cívico Social e Assistência Hospitalar. As operações de assistência social aproveitam as atividades de adestramento para possibilitar a chegada de profissionais da área da saúde a locais de difícil acesso, para prestar atendimento médico e odontológico e distribuir medicamentos e gêneros de primeira necessidade à população. As operações de assistência hospitalar são realizadas em convênio com o Ministério da Saúde e duram aproximadamente 20 dias. A atividade dos “navios da esperança”, como são carinhosamente chamados, está representada em palestras sobre higiene pessoal, medidas profiláticas e de tratamento da água, vacinação, atendimento médico-odontológico, além do apoio a programas como o Amazônia Solidária, que fornece cestas básicas às famílias dos seringueiros, e o Amazônia Visão 2000, de atendimentos clínicos e cirúrgicos na especialidade oftalmológica.

É bastante ilustrativo da importância social dessa atuação um relatório colocado à nossa disposição, reportando que, em uma viagem de 21 dias, partindo de Manaus para atendimento ao Pólo Javari, um navio da Marinha realizou 1179 ações básicas de saúde, sendo 817 de assistência médica e 362 de assistência odontológica. Quase 1200 atendimentos em três semanas, incluído, aí, o tempo gasto em locomoção. Outro demonstrativo aponta para uma quantidade que beira os 30 mil atendimentos no ano de 1999, nos 12 pólos em que está dividida a região. É possível avaliar a importância dessa assistência para os habitantes dos mais inóspitos rincões deste País continental, que talvez ficassem esquecidos pelos formuladores das políticas públicas, não fosse a atenção que lhes conferem as Forças Armadas.

Para que tenhamos uma idéia do volume de trabalho, é necessário apresentar alguns números colocados à nossa disposição pela própria Marinha do Brasil. Em 1998, para um total de 62.898 embarcações inscritas na Amazônia, foram abordadas 28.915, demonstrando que não se trata de simples amostragem, mas de uma ação efetiva e abrangente: quase metade das embarcações foram fiscalizadas -, chegando-se ao quantitativo de 3.656 multas aplicadas.

Seria necessário, Sr. Presidente, que houvesse a necessidade de investimento para gerar atividades com retorno econômico e, assim, manter a região, além de atrair outros trabalhadores.

O SR. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - Nobre Senador, V. Exª me permite um aparte?

O SR. LUIZ OTÁVIO (Sem Partido - PA) - Pois não, Senador Gilberto Mestrinho.

O SR. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - O discurso de V. Exª faz justiça ao trabalho fantástico que as Forças Armadas realizam na Amazônia. Sou testemunha de todo o esforço na realização e execução desses programas na nossa imensa região. A Amazônia sempre teve nas Forças Armadas um aliado e defensor, que tem sido de uma persistência extraordinária: a Aeronáutica, desde a época do Correio Aéreo Nacional; a Marinha, especialmente na fase dos navios hospitais, da assistência médica e social nos beiradões; e o Exército, nos postos mais avançados das fronteiras. As Forças Armadas na Amazônia têm um papel civilizador, agregador e integrador da soberania nacional e da Amazônia no contexto nacional. Assim, o discurso de V. Exª é justo ao mostrar que as Forças Armadas têm uma importância extraordinária na Amazônia. Mas, lamentavelmente, as Forças Armadas brasileiras são as que recebem menos recursos em toda a América Latina. Cada vez mais há o empobrecimento orçamentário das Forças Armadas. O esforço maior deve-se à dedicação, ao patriotismo e à vontade de servir o País que têm os integrantes de nossas Forças Armadas. Parabéns a V. Exª pelo discurso!

O SR. LUIZ OTÁVIO (Sem Partido - PA) - Agradeço a V. Exª o aparte, que incluo em meu pronunciamento.

Aproveito a oportunidade para lembrar que a Folha de S. Paulo, neste mês, publicou uma matéria do Ministro Geraldo Quintão, em que S. Exª aborda a necessidade e já a decisão de serem criadas cidades ao longo da fronteira. Já estão, inclusive, definidas cinco cidades a serem criadas agora, ao longo da nossa fronteira amazônica.

            Aliás, talvez a melhor forma de defesa da região seja mesmo sua ocupação ordenada, capaz de gerar progresso e desenvolvimento auto-sustentado. É difícil entender que uma área territorial equivalente à metade do território nacional seja habitada por apenas 10% da população brasileira.

Claro está, Sr. Presidente, que há necessidade de investimentos para gerar atividades com retorno econômico e, assim, manter o nativo na região, além de atrair outros trabalhadores para lá. No início deste ano, o Banco Axial celebrou um convênio com a Associação Brasileira para o Uso Sustentável da Biodiversidade da Amazônia (Bioamazônia), visando a assegurar a propriedade das riquezas naturais da região antes que todo o conhecimento seja contrabandeado por meio da biopirataria. Essas duas instituições constituíram um consórcio para administrar o Fundo Permanente para a Biodiversidade da Amazônia, iniciando com um capital de US$1 milhão, doados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e pelo Fundo das Nações Unidas.

Imaginem os senhores o potencial de desenvolvimento a partir desse Fundo e a implantação do Centro de Biotecnologia da Amazônia, que a Bioamazônia está construindo em Manaus. Os setores industriais de fármacos, cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfumaria e suplementos nutricionais utilizam-se cada vez mais de produtos naturais e de seus derivados sintetizados, o que resulta no aumento da procura de novos compostos orgânicos bioativos da natureza.

Quanto à biodiversidade da Amazônia, é simplesmente impossível abrangê-la em tão poucas linhas como as que estou utilizando para esta minha modesta fala. De 30 milhões de espécies de insetos que se estima existirem no mundo, de 10 a 15 milhões estão presentes na região. Também se podem encontrar aí cerca de 22% das espécies vegetais do planeta, num total aproximado de 55 mil espécies. E poderíamos continuar a enumeração inacreditável: 524 espécies de mamíferos, 517 de anfíbios, 1.622 de pássaros, 3 mil de peixes de água doce.

Outro segmento de grande potencial a ser explorado para induzir um desenvolvimento não-prejudicial à Amazônia pode ser o turismo de natureza, que já movimenta, em todo o mundo, a espetacular quantia de 260 bilhões de dólares anuais, dos quais o Brasil participa com apenas 70 milhões. Para se ter uma idéia do potencial de geração de riquezas dessa atividade, basta dizer que a Costa Rica, um país do tamanho do Estado do Espírito Santo, faturou, apenas em 1996, cerca de 600 milhões de dólares, firmando-se como a floresta tropical preferida pelos americanos, enquanto a Amazônia, quase cem vezes maior, faturou apenas 40 milhões de dólares no mesmo ano. E para dar apoio a esse ramo do turismo, que vem crescendo em níveis impressionantes no planeta, calcula-se que atualmente existem, na Amazônia, cerca de 30 hotéis de selva.

Sabe-se que entre os fatores que impedem uma intensificação dessa atividade estão a falta de infra-estrutura, o número reduzido de vôos internacionais diretos para os Estados Amazônicos, a falta de capacitação dos recursos humanos e a quase inexistente divulgação desses atrativos no exterior. Evidentemente, é um ramo que pode contribuir com uma parcela significativa para a geração de empregos e renda na região.

E que dizer do potencial mineralógico? Os olhos dos grandes grupos econômicos, se assim podemos dizer, crescem em direção à Amazônia. Muitas estimativas têm sido feitas sobre as reservas minerais, mas creio eu que essas reservas são incalculáveis e as mais variadas, podendo-se citar: metálicos: bauxita (alumínio), cobre, cassiterita (estanho), ferro, manganês, cromo, nióbio, níquel, ouro, prata, tungstênio, zinco, zircônio; e não-metálicos: argilas e argilas refratárias, bauxita refratária, calcário, caulim, cianita, dolomita, fluorita, gipsita, granito, mica, potássio, leucita, nefsienito, quartzito industrial.

Tomei a liberdade de nomear apenas alguns tipos mais conhecidos, Srªs e Srs. Parlamentares, para demonstrar o porquê da cobiça de que a Amazônia é objeto pelos estrangeiros.

Ainda podemos falar de outras atividades como a agricultura e a pecuária, que têm de ser realizadas respeitando-se as características do solo, que defensores da Amazônia afirmam ser muito pobre. Para esses, corre-se o risco de, com o tempo, transformar essa região num deserto. No entanto, respeitadas as suas características, essas atividades poderiam fazer-se acompanhar da instalação de agroindústrias, aumentando a capacidade de geração de emprego e renda.

Quanto à indústria madeireira, há que se fazer respeitar as normas que regulamentam essa atividade e a razoabilidade, com o competente reflorestamento das áreas de extração, o que pode levá-la a se transformar em atividade perene.

E a pesca predatória sendo coibida, os rios também servirão de sustento permanente para as populações ribeirinhas, possibilitando, inclusive, que elas sobrevivam da atividade pesqueira.

Já me referi ao passado laboriosamente construído, do qual somos herdeiros. Já descrevi sucintamente o potencial da Região Amazônica. Quero falar, ainda, das conseqüências da Nova Ordem Mundial, do mundo unipolarizado, das notícias insistentes de internacionalização da Amazônia, dada a sua importância estratégica e econômica no novo século a iniciar-se.

Têm sido constantes as denúncias que falam da planetarização da Amazônia, da sua condição de detentora de incalculáveis riquezas minerais, da sua incomparável biodiversidade, da sua enorme disponibilidade de 1/5 da água potável do mundo, das valiosíssimas jazidas - de que tem 80% do total mundial - de nióbio, essencial na indústria astronáutica. Num mundo que caminha para atingir, em poucas décadas, 8 bilhões de criaturas humanas, a Amazônia é um patrimônio inestimável, que precisamos defender de qualquer cobiça estrangeira, não importa a origem.

Não acompanho os que, tomados de alarmismo, vêem ameaças imaginárias à Amazônia.

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Luiz Otávio.

O SR. LUIZ OTÁVIO (Sem Partido - PA) - Pois não, Senador Bernardo Cabral, com muita honra.

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador Luiz Otávio, evidentemente, interrompendo, nesta hora, o seu discurso denso de pesquisa e da seriedade necessária quando se trata da Amazônia, talvez eu quebre um pouco a linha que V. Exª vinha traçando. Entretanto, é bom fazê-lo para demonstrar a admiração que seus colegas nutrem pela sua atuação, pela defesa que faz da região - natural que é do Pará -, e sobretudo para demonstrar, primeiro, quando V. Exª anunciava a presença das Forças Armadas na nossa região, que poucas pessoas se dão conta, a não ser aqueles que ali vivem, sofrem, moram e produzem riquezas para o resto do País, que é muito difícil se conseguir alguma coisa. Veja V. Exª que o antigo projeto Calha Norte, hoje Programa Calha Norte, somente não foi extinto pela defesa que todos nós, da região, fizemos. Enquanto no sul do País, precisamente na área do Rio de Janeiro, existem 44 mil soldados, temos apenas 22 mil para guarnecer toda aquela área, e os tecnoburocratas retiram-lhe recursos orçamentários pensando que ali se faz brincadeira. Agora mesmo, na 4ª Reunião de Secretários de Defesa das Américas, ficou mais do que demonstrado que aquela área precisa, por esse rol de riquezas minerais que V. Exª apontou, sem esquecermos a água - repito sempre, o ouro do Século XXI -, que nos voltemos para ela. Se um Secretário de Defesa, como o Sr. William Cohen, chega de manhã à capital do Amazonas, Manaus, e sai à noite, é porque aquela reunião é muito importante para que fiquemos olhando de soslaio, em vez de mirarmos na direção certa. Quero cumprimentar V. Exª. Todas as vezes que nos unimos em torno do ideal da Amazônia ainda fazemos pouco, porque estamos tentando alertar aqueles que estão distantes da Amazônia de que ela é nossa e de que os problemas nacionais devem ter soluções nacionais. Neste particular, na Operação Colômbia, as Forças Armadas e também a nossa diplomacia declararam que não serão instrumentos para desrespeitar a autonomia e a autodeterminação dos povos - aquilo que temos defendido durante toda a nossa vida política. Cumprimento V. Exª, Senador Luiz Otávio. Volte sempre à tribuna, para que possamos levar a solidariedade ao discurso de V. Exª.

O SR. LUIZ OTÁVIO (Sem Partido - PA) - Agradeço a participação de V. Exª e me sinto honrado em poder lhe conceder este aparte.

Algumas dessas denúncias só servem para desmoralizar a vigília que devemos manter. Assim foi quando se tratou da hiléia amazônica, um projeto internacional realmente inconveniente, mas que foi de iniciativa precisamente do embaixador brasileiro Berredo Carneiro, na UNESCO. Os Estados Unidos negaram-se, aliás, a comparecer à conferência de Iquitos. O projeto, que teve neste Senado firme condenação do Senador Augusto Meira, representante do Pará, e, na Câmara, do Deputado Arthur Bernardes, foi arquivado no Congresso.

Outra denúncia falsa, ainda volta e meia repetida, é a relacionada com o Conselho Mundial das Igrejas Cristãs, que teria declarado a Amazônia patrimônio da humanidade, cuja posse pelo Brasil não seria reconhecida. O prestigioso jornal O Estado de S. Paulo publicou o suposto documento, dando-lhe crédito. Imediatamente, foi constituída uma CPI mista, da qual foi relator o então Senador Ronan Tito. A CPI concluiu por unanimidade que se tratava de uma farsa, não sendo o documento verdadeiro. O grande jornal paulista, que acompanhou os trabalhos da CPI, aceitou ter sido vítima de uma falsidade.

É fora de dúvida que o então Presidente francês François Mitterrand, certa feita, em Tóquio, disse que “os países que detêm a posse de florestas equatoriais úmidas precisam compreender que sua soberania sobre elas é relativa”. Seu Primeiro-Ministro Michel Rocard, pouco depois, na Conferência de Haia, em abril de 1989, repetia as mesmas palavras, provocando oportuna resposta do embaixador brasileiro Flecha de Lima. No livro A Proposta, volume II, de discursos de autoria de Mikhail Gorbachev, publicado no Brasil pela Editora Expressão e Cultura, há uma passagem em que ele diz, na ONU, tratando de proteção do meio ambiente: “Há uma tendência geral de os Estados delegarem parte dos seus direitos aos organismos internacionais competentes, os quais, agindo em nome deles, decretam normas racionais de aproveitamento dos recursos naturais.”

Bem mais recentemente, o Secretário-Geral da ONU, o africano Kofi Annan, em sessão plenária da Comissão de Direitos Humanos, assim se expressou: “O mundo não mais vai permitir que as nações que praticam a violência contra o homem possam esconder-se atrás da soberania nacional.” Juntando direitos humanos com proteção do meio ambiente, o então Secretário de Estado americano Warren Christopher, ainda na ONU, disse, curto e grosso: “Em matéria de direitos humanos violados e ecologia degradada não há soberania absoluta.” É a tese do direito de ingerência, que torna inócua a soberania nacional. Tese que, felizmente, há poucos dias, o Itamaraty contrariou na OEA, na apreciação do caso peruano. Mas o mesmo Warren Christopher, no seu livro O Curso da História, editado em 1998 pela Universidade de Stanford, onde ele se graduou, ao falar sobre direitos humanos e ecologia, objetos da política externa americana, disse: “Para levar a cabo a política externa americana e assuntos ecológicos que ameaçam a nossa saúde e o nosso futuro, usaremos, sem dúvida, a nossa diplomacia, apoiada por fortes forças militares.” Já não é mais ele o Secretário de Estado no segundo governo do Presidente Clinton, mas não consta que, ao dizer o que disse, não representasse o pensamento do seu presidente, e ainda recentemente, Al Gore, candidato a presidente dos EUA, afirmou que “ao contrário do que pensam os brasileiros, a Amazônia é de todos nós”.

Estamos, pois, em face de um fato concreto na Nova Ordem Mundial: o enfraquecimento do conceito tradicional de soberania nacional. Já li, inclusive, de magistrados brasileiros insuspeitos quanto ao seu patriotismo, que de fato o conceito de soberania nacional está mudado. Claro que é nosso o interesse de preservar o meio ambiente. A conservação da floresta amazônica, queremos tê-la em desenvolvimento auto-sustentado, não por medo de ingerência estrangeira, mas para melhorar as condições de vida de nosso povo e cooperar com o esforço nacional pela retomada do crescimento. Combatemos, pois, a exploração predatória da floresta, um crime contra o nosso patrimônio comum. Quanto a direitos humanos, não temos conflitos étnicos como os dos Bálcãs e da África Negra. Nossos povos autóctones têm na Constituição um amparo que poucos países garantem aos seus.

Ainda agora, estamos diante de uma nova ameaça à paz e ao equilíbrio da região. Refiro-me ao Plano Colômbia, que prevê a participação dos Estados Unidos e de países europeus no combate ao tráfico de entorpecentes e às guerrilhas, responsáveis pela grave crise que acomete aquela nação sul-americana. Com o combate ao narcotráfico, pretende-se minar a base de sustentação dos guerrilheiros que dominam grandes parcelas do território colombiano.

Os Estados Unidos devem ajudar o governo colombiano com recursos financeiros e apoio logístico, e têm pressionado outras nações sul-americanas, entre elas o Brasil, a participar dessa ofensiva. Para isso, inclusive, está prevista para os próximos dias a vinda do Secretário de Defesa americano, William Cohen, que, além de manter contatos com o Presidente Fernando Henrique Cardoso e com o Ministro da Defesa, Geraldo Quintão, participará do encontro latino-americano de ministros da Defesa, a realizar-se precisamente em Manaus, nos dias 17 e 19.

O Brasil, na recente reunião dos presidentes dos países latino-americanos, já se manifestou contrariamente à participação nesse projeto que, seguramente, é fonte de preocupação para todos nós. O principal risco dessa ofensiva contra o tráfico, como admitem os próprios Estados Unidos, é a transposição dos conflitos, de vez que os narcotraficantes, se expulsos da Colômbia, devem procurar outros territórios para assentar suas bases.

No entanto, há outros riscos. O Plano Colômbia, entre outras ações - algumas menos questionáveis, como a reforma do Judiciário colombiano -, prevê operações militares em grande escala nas proximidades de nossas fronteiras. Nessa ofensiva, não faltam aqueles que pretendem desencadear uma guerra biológica contra as plantações de coca, com a utilização de um fungo - o Fusarium Oxysporum - cujo impacto no meio ambiente ainda é desconhecido.

A ação militar, especialmente com a utilização de forças alienígenas, na tentativa de solução da crise colombiana, é altamente questionável. O Brasil deve participar, com empenho, de soluções diplomáticas que contribuam para pôr fim aos conflitos que vêm afetando a Colômbia. Mas as circunstâncias exigem, mais do que isso, o reforço da presença militar e a intensificação da vigilância em toda a região. 

Sem fazer alarde descabido, temos, porém, de cumprir o destino da Amazônia, desde a sua colonização. O Projeto Calha Norte, infelizmente, ainda não se efetivou por falta de verbas, mas o pelotão do Exército em Surucucu é a prova maior de que a presença dos militares representa a garantia da conservação do meio ambiente e da proteção e assistência aos índios. O recado do Exército, aliás, das Forças Armadas, está na presença dos milhares de militares bem treinados, sediados em toda a fronteira, desde a Guiana Francesa até o Forte Príncipe da Beira, dizendo todos os dias, ao hastear e ao arriar a Bandeira brasileira, que esta terra tem dono. Todavia, a responsabilidade pela ocupação política e sobretudo econômica da Amazônia não é somente dos militares, mas, e principalmente, de nós, políticos, parlamentares e governantes, brasileiros do Norte, do Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste, que temos a obrigação de nos unir para, depois de séria e dedicada análise da realidade atual, debater e propor programas e projetos a serem executados a curto e médio prazos, voltados ao atingimento daquele desiderato.

Por essa razão, e para que façamos a nossa parte, estou saindo do discurso para a prática e apresentando um requerimento de instalação da Comissão Temporária da Amazônia, a ser formada por senadores representantes de todas as regiões do País, sem qualquer conotação política de apoio ou oposição ao Governo e muito menos dos conceitos de Amazônia Ocidental e Oriental, com o objetivo de ouvir e debater, com os governantes e técnicos da Amazônia Brasileira, os problemas e as soluções possíveis de serem encaminhadas ao Poder Executivo.

Ao apresentar tal requerimento, reafirmo minha convicção, que acredito ser também a de numerosos Pares, de que somente a efetiva ocupação econômica da Amazônia poderá manter a soberania brasileira sobre esta região.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR LUIZ OTÁVIO EM SEU PRONUNCIAMENTO:

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/10/2000 - Página 20772