Discurso durante a 152ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa de projeto de lei de autoria de S.Exa. que flexibiliza o sigilo bancário, permitindo o acesso aos dados sem prévia autorização judicial. Considerações sobre o processo de apuração eleitoral nos Estados Unidos..

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Defesa de projeto de lei de autoria de S.Exa. que flexibiliza o sigilo bancário, permitindo o acesso aos dados sem prévia autorização judicial. Considerações sobre o processo de apuração eleitoral nos Estados Unidos..
Aparteantes
Roberto Requião, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/2000 - Página 22309
Assunto
Outros > BANCOS. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, APROVAÇÃO, SENADO, REGULAMENTAÇÃO, QUEBRA, SIGILO BANCARIO, CRITICA, SUBSTITUTIVO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • IMPORTANCIA, FLEXIBILIDADE, SIGILO BANCARIO, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, SONEGAÇÃO FISCAL.
  • COMENTARIO, PROBLEMA, ELEIÇÕES, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ATRASO, APURAÇÃO, RESULTADO, COMPARAÇÃO, ELOGIO, ELEIÇÃO MUNICIPAL, BRASIL.
  • ANALISE, PROCESSO, VOTAÇÃO ELETRONICA, BRASIL.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, inicialmente eu gostaria de abordar matéria que está no Estado de S.Paulo de hoje sob o título “Devassa bancária rende até 11 bilhões, diz Lando”. Essa manchete se refere ao projeto de minha autoria que flexibiliza o sigilo bancário, permitindo o acesso a esses dados sem que antes haja autorização do Poder Judiciário.

Esse projeto que apresentei foi aperfeiçoado, inclusive com vistas a obter o apoio do Poder Executivo, pelo nosso saudoso colega, o Senador Vilson Kleinübing. Ele foi aqui aprovado, salvo engano, por unanimidade, para depois dormir um sono profundo nas gavetas da Câmara - à unanimidade, me corrige o nosso querido colega Roberto Requião, que agora revela, entre tantas, mais uma faceta: a de lingüista. Solicitarei o concurso dele durante o meu pronunciamento para comentarmos a eleição americana e a informatização das eleições - S. Exª que muito tem se dedicado a esse tema.

Pois bem. Na Câmara, o projeto ficou praticamente esquecido, para ressuscitar, depois de dois anos, sob a forma de um substitutivo que coloca a situação pior do que é hoje. Quer dizer, a vingar o substitutivo da Câmara, é melhor deixar a situação como está hoje, porque o relator passou a propor a listagem dos tipos de crimes nos quais se pode pedir a quebra do sigilo. Foi estabelecido também um prazo para o juiz de primeira instância se pronunciar, mas se não o fizer, não se impõe que instância superior se manifeste imediatamente.

O projeto foi muito piorado, descaracterizado, está irreconhecível e é pior do que a legislação vigente hoje, que já não é boa. O sigilo se transformou em algo sagrado, sacralizaram o sigilo bancário no Brasil - não para garantir nossa individualidade, a nossa privacidade, mas para permitir que, baixando as cortinas, fechando as janelas e portas, possa ser praticado todo tipo de crime contra a sociedade.

            Dias atrás, o General Alberto Cardoso deu uma declaração - li-a nos jornais -, dizendo que o crime no Brasil está mais organizado do que as instituições do governo. É verdade. Então, temos uma arma para ferir de morte o crime organizado, que é justamente essa flexibilização do sigilo. A notícia dá conta de que na próxima semana os líderes vão se reunir para a aprovação desse projeto, que poderia viabilizar, pelas informações que o Senador Amir Lando tem trazido - S. Exª que muito tem lutado como relator da Comissão de Orçamento para 2001 -, a detecção de fontes que permitam a elevação do salário mínimo. Se esses R$11 bilhões puderem ser realmente recuperados pela Receita Federal, o salário mínimo realmente vai poder ser elevado.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Meu caro Senador Lúcio Alcântara, pedi este aparte exatamente para consubstanciar as colocações de V. Exª. Participei da reunião...

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - V. Exª esteve na reunião das lideranças da Comissão...

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - ...na Comissão de Orçamento, faço parte do Comitê de Receita da Comissão de Orçamento, que está definindo quais são as receitas que devem financiar o Orçamento 2001, e ouvimos textualmente do Secretário Everardo Maciel, em primeiro lugar, que a proposta aprovada pelo Senado daria condições de uma atuação da Receita que elevaria a arrecadação entre R$11 e R$20 bilhões, mas depois que a proposta foi modificada na Câmara dos Deputados, pelo relator, a situação piorou, pois se passou a proteger os sonegadores...

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Está confirmando o que estou dizendo.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - ...de uma maneira mais forte do que a que existente. Portanto, é um contra-senso o Senado ter feito o esforço que fez para aprovar esta proposta por unanimidade, e depois termos a necessidade de buscar fontes permanentes para o funcionamento do salário mínimo. Não é taxar os fundos de pensão e receber os atrasados, porque isso não é fundo permanente. A melhoria da arrecadação da Receita através...

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Como, aliás, prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Esta sim é uma fonte permanente. E mais do que isso, termos a responsabilidade de criar procedimentos que façam com que a legislação seja cumprida e que quem atue corretamente seja protegido, mas o bandido, aquele que está na marginalidade, não tenha a mesma proteção, não tenha a mesma condição de ter o que hoje, infelizmente, a Câmara dos Deputados quer fazer. Fazendo um paralelo ao que V. Exª está dizendo agora, penso que esses entendimentos que estão fazendo sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal é a mesma coisa. Farei um pronunciamento na próxima semana indo contra o entendimento que se está tendo de que prefeito pode deixar “Restos a Pagar” porque antes de 20 de outubro a Lei de Penalidades não estava valendo, a lei não pode retroagir, isso é um grande...

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - A lei não pode retroagir.

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Não sou advogado, mas sou economista. Queria dizer que “Restos a Pagar” é o que sobra de empenho no final do ano que fica para o próximo ano. Ninguém empenhou, nenhum prefeito comprou nada em abril, maio, junho, julho, agosto e setembro empenhando como “Restos a Pagar”. Portanto, até 31 de dezembro não existe “Restos a Pagar”, que só vão ocorrer a partir de 1º de janeiro de 2001, quando já existe a Lei de Responsabilidade Fiscal, que está vigorando desde maio, e a Lei de Penalidades, que começou a vigorar a partir de outubro. Sendo assim, no meu entender de economista, todos os prefeitos que deixarem “Restos a Pagar” e ferirem a Lei de Responsabilidade Fiscal estarão imputáveis pela pena, porque o balanço que apura esta situação se faz no dia 31 de dezembro de 2000. Não adianta querer dar um jeitinho para burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal, não adianta querer dar um jeitinho para não deixar pagar, a impunidade não pode ficar pior do que está, porque não vamos construir uma Nação democrática, arrecadando os recursos que são necessários para se melhorar a condição social e econômica do País, da forma como estão querendo se dar esses entendimentos. Eu gostaria de deixar claro, portanto, que há uma necessidade urgente, e uma obrigação moral por parte da Câmara dos Deputados, em aprovar a proposta, já aprovada pelo Senado, neste momento que precisamos melhorar a arrecadação do País. Além disso, também quero deixar o meu alerta e a minha proposição de um discurso na próxima semana sobre essa questão da Lei de Responsabilidade Fiscal, protestando contra qualquer tipo de entendimento que possa afrouxar ou facilitar qualquer tipo de irregularidade cometida pelos atuais prefeitos.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Romero Jucá. V. Exª traz uma contribuição a esse debate sobre a questão das penalidades em que poderão incorrer os prefeitos, em função da Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que o problema dos “Restos a Pagar” só se caracteriza depois de 31 de dezembro. E só não seria dessa maneira se fosse levado em conta a época em que a despesa foi autorizada, mesmo assim, quando a despesa foi autorizada não significa que vai ficar como “Restos a Pagar”.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Concedo o aparte ao Senador Roberto Requião.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Eu gostaria apenas de complementar a visão do Senador Romero Jucá. Em um primeiro momento, temos o crime de responsabilidade, que era um crime sem combinações especiais, derivando da Lei de Responsabilidade Fiscal. Em um segundo momento, temos as penas específicas, que é a lei sancionada em outubro. Mas esquecem os hermeneutas da Câmara, que às vezes, Senador Lúcio Alcântara, transforma-se em Câmara mortuária dos projetos do Senado, como ocorreu com o seu projeto de quebra de sigilo, que não é flexibilização, é quebra de sigilo em determinadas circunstâncias.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Quebra em determinadas situações e de quem está sendo alvo de investigação pelo Fisco.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Mas o outro aspecto é o seguinte: ontem, aqui no plenário, levantei a tese do crime continuado, ou seja, quem infringiu a Lei de Responsabilidade Fiscal a partir de maio, ficaria sujeito a um crime de responsabilidade. A partir de outubro, teriam as cominações específicas. Mas se depois de outubro continuar empenhando sem cobertura possível, vai se enquadrar na figura doutrinária do crime continuado, e o crime continuado retrotrai a maio, porque a nova lei, em função da continuidade do processo de gastança, vai ser atingida, sim, por aquela espécie de código penal específico que votamos no Congresso Nacional. Então, Srs. Prefeitos, barba de molho e muito cuidado com os hermeneutas da Câmara dos Deputados, porque o Judiciário não vai aceitar essas teses absurdas de que, embora existisse a Lei de Responsabilidade Fiscal, era impossível qualquer cominação. Não, não era! Há o crime de responsabilidade e há o crime continuado.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - De fato, só há sentido em ficar “Restos a Pagar” quando ficar constatado que não houve tempo hábil para se proceder ao pagamento do serviço solicitado ou da mercadoria ou bem adquirido. Aí sim se justifica a passagem para o ano seguinte. Mas havia a dotação. Realmente a despesa teria sido efetuada em condições normais.

Sr. Presidente, eu gostaria apenas de concluir esse pronunciamento me referindo a um outro assunto, que é esse vexame da apuração eleitoral nos Estados Unidos. Há pouco, recebemos aqui no plenário, tive a oportunidade de cumprimentar, apresentado a ele que fui pelo Senador Eduardo Suplicy, o candidato de oposição no Peru. E os Estados Unidos deram ao mundo um espetáculo de exigências sobre o governo peruano, a justiça peruana, sobre o processo eleitoral.

Não quero julgar e analisar o que aconteceu no Peru, embora me pareça que tenha havido realmente uma grande manipulação, além de abuso de poder e outras tantas irregularidades para assegurar ao atual Presidente do Peru mais um mandato. Enfim, estabeleceu-se uma confusão, naquele momento, em nosso país vizinho, o Peru. Mas agora, nos Estados Unidos, estamos assistindo a uma situação vexatória. Jornais chegaram a editar quatro edições dando resultados diferentes nas suas manchetes. As emissoras de televisão se confundiram completamente. Os próprios candidatos chegaram a trocar telefonemas, um aceitando a vitória do outro e depois telefonaram novamente, dando o dito pelo não dito. E agora a Justiça da Flórida diz que só no dia 17 é que se dirá realmente qual o resultado eleitoral na Flórida, ou seja, quem venceu.

O Presidente Fernando Henrique deve estar até achando engraçada a situação, porque se isso acontecesse no Brasil, Senador Roberto Requião, haveria crítica para todo o lado, da imprensa, de todo o mundo, que o Brasil não sabe fazer nada, que é tudo errado, que não funciona. Os “fracassomaníacos” teriam realmente uma grande arma para exercitar essa “fracassomania”.

Mas o que aconteceu foi que tivemos uma eleição no Brasil em que os resultados foram conhecidos rapidamente. E tivemos segurança. Penso que a última coisa que nos faltava era assegurar que a vontade do eleitor fosse colhida e o resultado das apurações oferecido imediatamente, atestando a lisura do pleito.

Como fiquei com uma dúvida sobre esse processo, posteriormente farei uma pergunta a V. Exª, Senador Roberto Requião, pois sei que V. Exª conhece esse assunto e tem se dedicado a ele.

Nos Estados Unidos, há uma combinação de eleição direta e indireta, que é um mecanismo antigo, do século passado, em que o Colégio Eleitoral referenda ou não o resultado colhido pela vontade popular. E a confusão naquele primeiro momento foi tão grande, que só ontem soubemos que o candidato Gore tem a maioria da votação popular. E essa pequena diferença é mais grave, porque, como o voto não é obrigatório nos Estados Unidos, o comparecimento do eleitor às urnas gira em torno de 50% - salvo engano, nessa eleição, foi de 51%.

Tenho lido na imprensa que muitos eleitores estão reclamando que não conseguiram encontrar sua seção eleitoral; mudaram a sessão e não avisaram ao eleitor, que, assim, não sabia onde deveria votar. Outros se confundiram na votação, porque parece que o desenho da cédula se prestava a isso, tanto que o candidato do Partido Reformista, Pat Buchanan, obteve, num reduto democrata, uma votação surpreendente. Aparentemente, as velhinhas, as aposentadas, confundiram-se na hora de escolher o seu candidato. Tudo isso está gerando uma grande confusão, uma grande perplexidade, naquela que é considerada a nação mais rica, a maior democracia e a maior potência econômica do mundo. Aquele país se vê agora numa situação que vivemos no Brasil há alguns anos, quando as apurações se arrastavam, quando, muitas vezes, havia manipulação dos mapas eleitorais para beneficiar determinados candidatos.

Gostaria que fosse dada uma contribuição pelo Senador Roberto Requião, no sentido de S. Exª confirmar ou não o que vou dizer. Na Flórida, a lei determina que, quando a diferença entre um candidato e outro for abaixo de 0,5%, seja feita a recontagem dos votos, e parece que no Brasil isso não é possível. Se isso é verdade, é preocupante, pois, numa eleição no futuro, poderá haver uma margem muito pequena de votos que possa suscitar dúvidas.

Nessas eleições, tive oportunidade de assistir, nas pequenas cidades, a este fenômeno novo que decorre da votação eletrônica: a morte súbita. O candidato nem pode se acostumar com a idéia de perder, porque a apuração é realizada muito rapidamente. Essa é uma situação diferente da que existia anteriormente, principalmente nos pequenos Municípios, onde a apuração demorava até três dias. Havia ainda a dificuldade de interpretar se o eleitor tinha assinalado realmente o número certo, se a marca estava ou não dentro do quadro. Quem tem experiência de apuração de eleições naquele sistema antigo sabe que, muitas vezes, surgiam essas dúvidas.

Há alguns anos, acompanhei um caso em que um candidato perdeu a eleição, se não me engano, por seis votos, em uma cidade do interior do Ceará. Foi feita a recontagem, e o outro candidato terminou ganhando por 12 votos. Passa-se, praticamente, a fazer um julgamento de cada voto, quando não está clara a intenção do eleitor, quando não está claro o número que ele marcou. Há nesses casos um exercício de subjetividade e de força política, junto àqueles que constituem a comissão apuradora, que pode descaracterizar a vontade do eleitor.

Assim, se não pudermos fazer a recontagem nesse sistema eletrônico de hoje, futuramente poderá haver situações em que a diferença dos votos é pequena. Em um pequeno Município, isso deve ter ocorrido. Entretanto, em uma eleição para Governador, Prefeito de uma capital ou Presidente da República, uma situação desse tipo pode causar mal-estar. Não se pode transferir - e não estou pensando assim - a situação americana para o Brasil, mas um resultado apertado pode perfeitamente ocorrer aqui.

Portanto, gostaria que o Senador Roberto Requião, com a serenidade que tem e a isenção com que costuma se posicionar nesses assuntos, comentasse esse aspecto. É possível a recontagem dos votos?

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Senador Lúcio Alcântara, morte súbita é uma marca de cerveja belga, a mort subite.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - E conseguem vender uma cerveja com esse nome?

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - É excepcional essa cerveja. E esse é o nome da cerveja e o de uma série de cervejarias de Bruxelas também. E morte súbita teve o processo democrático de transparência brasileira com a abrupta introdução do mal pensado sistema informatizado. Existem hoje dezenas de Deputados estaduais e federais que ganharam mandato de presente, porque os eleitores se equivocaram digitando o número do candidato majoritário em primeiro lugar, quando a lei exige que em primeiro lugar se vote no candidato proporcional. Quarenta e cinco apertaram o botão pensando que estavam votando em Fernando Henrique e acabaram por eleger algumas dezenas de Deputados federais do PSDB. Esse é um erro.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - V. Exª quer dizer que o voto de legenda pode causar um erro?

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - É um erro facilmente detectável, principalmente quando V. Exª me dá o argumento. Se nos Estados Unidos, no famoso país do Primeiro Mundo, do povo alfabetizado, a mudança do formato da cédula provocou o engano e a confusão dos eleitores, imagine o que provoca a utilização de uma máquina?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Pelo que vi na imprensa, a cédula americana foi muito malfeita mesmo. E parece que o sistema eletrônico americano é primitivo.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - É uma evolução o Senador Lúcio Alcântara estar começando a criticar os Estados Unidos, o Primeiro Mundo, o nosso padrão de desenvolvimento. Voltemos à nossa crítica. Em primeiro lugar, não há uma confiabilidade em relação à capacidade do eleitor que se assusta diante de uma máquina. Se ele se assusta e se confunde diante da modificação de uma cédula, a introdução da máquina comprovadamente levou a enganos na ordem de votação. Muitos votos de legenda não seriam dados ao Deputado da mesma legenda, mas, com a inversão - o brasileiro considera mais importante o Executivo do que o Legislativo na hora de votar -, o cidadão vota no 15 ou no 13, aperta, confirma e dá o voto de legenda, quando poderia votar num outro candidato de uma outra legenda.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Para confirmarmos a tese de V. Exª, precisaremos de dois dados: primeiramente, o número de voto de legenda aumentou substancialmente no Brasil depois da votação eletrônica; em segundo lugar, o número de votos em branco para Parlamentares aumentou muito - o que não ocorreu, mas, pelo contrário, diminuiu.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - O número de votos de legenda aumentou geometricamente.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - O número de votos em branco praticamente acabou.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - É verdade.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Então, o eleitor votou depois no Parlamentar.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Não votou depois, pois o Parlamentar é o primeiro. Ele votou na legenda.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Ele não votou na legenda; ele votou no primeiro.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - O número de votos de legenda aumentou. O voto em branco é que diminuiu.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Vamos discutir isso com números da votação de legenda.

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - E isso aconteceu. O segundo aspecto é a absoluta falta de possibilidade de o sistema ser auditado. Por exemplo, se a Flórida tivesse usado esse método brasileiro, nunca poderia ser feita auditoria, porque é “inauditável” o nosso sistema. No entanto, é muito fácil criar um sistema moderno e sujeito à auditoria. Por exemplo, o Japão, que é o país da informática no mundo, utiliza esse sistema. No Japão, o cidadão vota numa cédula normal. Ele marca uma cruz no local adequado e depois coloca a cédula num leitor ótico, como ocorre com a loteria esportiva. Não há milagre algum, não é tecnologia desconhecida no Brasil. A cédula passa pelo leitor ótico, é contabilizada automaticamente e cai dentro da urna. Se houver suspeita de que a urna foi fraudada, é possível apurá-la, recontando fisicamente a cédula que cai na urna. Por outro lado, há um sistema de pré-auditagem. Cada Partido escolhe 3% das urnas e faz a apuração manual, para constatar se existe uma distorção no programa que leve a um erro. Quanto a nós, temos um sistema hermético, elitizado, a que só meia dúzia de técnicos do Tribunal Superior Eleitoral têm acesso. Na verdade, nem eles têm acesso, porque compram softwares de empresas privadas e não dominam nem esses programas que introduzem no nosso sistema de votação. Temos que mudar isso. O voto tem que ser algo singelo, auditável. O eleitor deve ter segurança absoluta de que seu voto foi dado a determinado candidato. Isso estabelece uma questão essencial no processo eleitoral: a confiabilidade do eleitor no resultado da apuração. Nos Estados Unidos, a fraude já foi apurada. Num primeiro momento, Bush havia ganhado a eleição na Flórida por 1.800 votos; na recontagem, esse número já baixou para 225, e ainda não contaram os 5.500 votos que vêm pelo correio, de pessoas que estão fora do Estado ou do País. Aqui, no Consulado americano, houve uma simulação, e a vitória de Al Gore sobre Bush foi simplesmente fantástica. Provavelmente e não necessariamente, o Presidente dos Estados Unidos será Al Gore, porque, se se reduziu o número de votos, já na contagem da Flórida, de 1.800 para 225 - quando se tem notícia de que o voto no Exterior é francamente favorável a Al Gore -, haverá essa modificação. Por outro lado, voto indireto e urna eletrônica são artifícios das elites para se manterem no poder, para dificultar o voto do pobre e da pessoa menos informada. Por que não buscarmos uma situação tão singela e confiável quanto a loteria esportiva? Nem eu nem V. Exª tivemos notícia de algum engano no preenchimento de um cartão da loteria esportiva até hoje, sendo que a leitura é ótica, e o preenchimento, manual. Consegui até um video tape do processo japonês, que pretendo trazer ao Senado no momento oportuno. A nossa lei de modificação do sistema eleitoral, a meu pedido, voltou para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania; creio que podemos fazer algumas modificações. Pedi que essa matéria voltasse para aquela Comissão porque o Ministro Nelson Jobim havia dito que um parágrafo de minha autoria possibilitava uma interpretação que não era a que eu queria; pedi para a matéria voltar para se corrigir isso. Mas hoje há essas sugestões de adotarmos a solução japonesa, para que haja a computação aceleradíssima pela leitura ótica, mas sempre com a possibilidade de uma consistência, de uma auditoria e de uma verificação posterior. O sistema de leitura ótica é extraordinariamente mais barato do que aquele utilizado hoje no Brasil, além de dispensar o computador e a impressora. É uma máquina simples de leitura ótica e totalização, como é a nossa máquina de hoje, mas sempre deixando a possibilidade de auditagem.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Roberto Requião.

Sr. Presidente Lauro Campos, agradeço a V. Exª pela tolerância.

Concluo o meu pronunciamento dizendo que examinaremos todos esses aspectos. Penso que a situação americana suscita novamente o debate nesta Casa, com vistas ao aperfeiçoamento do processo eleitoral, cujas etapas, em sua totalidade, precisam ser concebidas e executadas de molde a garantir e a assegurar a vontade do eleitor, soberano nesse processo.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Lúcio Alcântara?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Senador Ramez Tebet, dependo da autorização do Sr. Presidente, Senador Lauro Campos, que já sinalizou que o meu tempo está esgotado. É um homem benevolente, mas a Presidência o obriga a esse rigor. Dessa forma ficamos privados da contribuição de V. Exª, que certamente virá em outro momento, já que este debate não se esgotará nesta manhã de hoje.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/2000 - Página 22309