Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apoio ao financiamento público das campanhas eleitorais. Críticas ao aumento da dívida pública brasileira em virtude da política econômica defendida pelo Governo Federal.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Apoio ao financiamento público das campanhas eleitorais. Críticas ao aumento da dívida pública brasileira em virtude da política econômica defendida pelo Governo Federal.
Aparteantes
Edison Lobão, José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2000 - Página 22476
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANALISE, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, OMISSÃO, PRESTAÇÃO DE CONTAS, ELEIÇÕES, TOTAL, PARTIDO POLITICO.
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, POSSIBILIDADE, FINANCIAMENTO, CAMPANHA, FUNDOS PUBLICOS, SUPRESSÃO, VINCULAÇÃO, CANDIDATO ELEITO, INTERESSE, EMPRESARIO, PAGAMENTO, INVESTIMENTO, INDEPENDENCIA, LEGISLATIVO, EXECUTIVO.
  • NECESSIDADE, ESCLARECIMENTOS, POPULAÇÃO, VANTAGENS, FINANCIAMENTO, FUNDOS PUBLICOS, CAMPANHA ELEITORAL, MELHORIA, DEMOCRACIA.
  • GRAVIDADE, DIVIDA PUBLICA, BRASIL, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, PREJUIZO, PATRIMONIO PUBLICO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os problemas internos do Governo Fernando Henrique Cardoso e daqueles que fizeram parte de sua Equipe, que ajudaram na arrecadação e que foram demitidos do Governo - o Sr. Eduardo Jorge e, agora, o Presidente dos Correios; todas as informações dizem que as denúncias surgidas do caixa 2 da campanha do Presidente Fernando Henrique Cardoso vieram em função da vingança do ex-Presidente dos Correios - constituem um dos principais assuntos da mídia nacional.

Enquanto algumas pessoas do Governo Fernando Henrique Cardoso assumem a verdade dos fatos, ou seja, declaram publicamente, com muita coragem e transparência, que toda campanha política tem caixa 2 - alguns dos seus arrecadadores dizem isso -, outros tentam omitir essa realidade, dizendo que foi tudo correto, que foi tudo certo, tudo bem feito, tudo bem elaborado.

Na verdade, caixa 2, dinheiro irregular de campanha política é muito comum em nosso País e ocorre em todas as campanhas políticas. Não direi, evidentemente, que a Direita faz muito mais porque o segmento da elite brasileira, o segmento empresarial, os latifundiários, os banqueiros e as multinacionais financiam muito mais os candidatos dos Partidos tradicionais de sustentação do Governo: o PFL, o PSDB, o PMDB, o PTB e o PPB. Esses Partidos, evidentemente, levam grande vantagem nesse sistema de campanha política, porque recebem dinheiro, não o declaram e o utilizam como bem desejam, o que não quer dizer que também a Esquerda não receba dinheiro que não declare nas suas prestações de contas. Isso é muito comum em qualquer campanha política brasileira.

Dirijo-me aos Ministros e às pessoas que hoje estão defendendo intransigentemente o Presidente Fernando Henrique Cardoso, mentindo para a sociedade brasileira dizendo que tudo foi feito de maneira correta. Não foi. Todos nós sabemos disso - nem a do Presidente nem a de muitos candidatos a governador, na sua época, nem de muitos candidatos a prefeito, hoje, inclusive com candidatos nossos. Esse sistema de prestação de contas montado pela Receita chega a ser uma coisa ridícula, até pela falta de tempo, de contabilidade e de organização da sociedade brasileira para exigir que uma campanha seja feita de maneira limpa e transparente, e faz com que a própria Esquerda desleixe-se nesses instantes e utilize, na correria do processo da campanha política, dinheiro que não declara na sua prestação de contas.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, mais do que ninguém, fez isso. O País tem tradição nessa prática, haja vista o que fizeram Collor de Melo e, agora, o Presidente da República nas suas duas campanhas políticas. E essa prática, que se tornou assunto na imprensa nacional, faz voltar à pauta a questão do financiamento público de campanha.

Esse tema tem sido debatido por esta Casa. O Presidente da República e muitos dos seus Ministros já demonstraram estar a favor dessa proposta. Acreditamos que esta é a oportunidade para modificar a legislação político-eleitoral brasileira e possibilitar o financiamento público de campanha.

Muitos dizem que o povo não aceita financiamento público de campanha. É verdade, o povo não compreende por que se gastar dinheiro público em financiamento de campanha política. Aliás, o povo não entende como o Brasil se modernizou tanto a ponto de realizar, em todo o território nacional, uma eleição computadorizada, com urnas eletrônicas, de forma a permitir que se tenha o resultado quase instantâneo após o término da eleição, e não tenha dinheiro para coisas mais simples como a saúde, a educação, a reforma agrária, etc. Essa é uma questão sobre a qual se deveria fazer uma indagação muito séria.

Os Estados Unidos, atualmente, enfrentam um grande problema: é o País tecnologicamente mais avançado do mundo, que tem o maior produto interno bruto e a economia mais forte do mundo, mas que no processo eleitoral para Presidente da República ainda usa a cédula eleitoral, em que o cidadão escreve o nome do candidato em quem ele quer votar. Nós avançamos em tecnologia no que diz respeito ao processo eleitoral e gastamos bastante dinheiro - não sei se isso é mais importante -; no entanto, não vi nenhum questionamento da população a respeito do fato de o Governo ter investido tanto na aquisição de urnas eletrônicas, ao mesmo tempo em que deixou de investir em áreas que contribuiriam para a melhoria da qualidade de vida do nosso povo.

            Há ainda uma questão mais grave que o povo questionará, quando souber que serão dados tantos milhões para o candidato A e tantos milhões para o candidato B, etc. E ainda ficará mais indignado do que poderia ter ficado com a urna eletrônica, tendo consciência das suas dificuldades, ao ver tanto dinheiro ser jogado numa campanha política.

Repito o que disse o Senador José Eduardo Dutra: pode parecer que o povo não está interessado em quanto cada um gastará na campanha política porque não é dinheiro dele, mas de empresário. Mas todos sabem que o empresário depois virá cobrar a ajuda, virá cobrar o recurso que investiu em determinado candidato. É graças a esse tipo de campanha política que a maioria dos políticos brasileiros, principalmente os daqui do Congresso Nacional, é eleita com compromissos e responsabilidades perante esse segmento, essa elite que financia as suas campanhas. É por isso que a legislação brasileira não muda para possibilitar o nosso desenvolvimento.

Ora, se apresentarmos um projeto de lei dizendo que no setor público, pelo menos no setor público, ninguém pode ganhar 30 vezes mais do que o salário mínimo, é evidente que o projeto não será aprovado em hipótese nenhuma pelo Congresso atual, porque é um Congresso conservador, que usa a desculpa da não vinculação, que não aceita mudar a Constituição e estabelecer limite entre o que ganha mais e o que ganha menos. Propostas nesse sentido foram rejeitadas nesta Casa desde a Constituição de 1988. Hoje, por exemplo, um Diretor da Petrobras ganha R$25 mil por mês, enquanto funcionários das prefeituras ou mesmo de alguns governos estaduais ganham R$151,00. Quer dizer, um funcionário público de uma empresa estatal ganha 300 vezes mais do que o que ganha menos, quando nos países civilizados essa diferença não supera 1 para 10 e existem países, como a Suécia, em que essa diferença é de 3 para 1. É uma demonstração clara de que o Congresso Nacional representa a elite brasileira. Digo sempre que a representação política do povo brasileiro é uma pirâmide invertida: enquanto uma pirâmide na posição normal representa a população, ou seja, na base dela está a maioria, que é constituída de gente pobre, carente, e no cume, a elite, que é uma pequena parte da população. Então, repito: a representação política do Congresso Nacional é uma pirâmide de cabeça para baixo, ou seja, a maioria dos Parlamentares do Congresso Nacional representa o interesse das elites dominantes desta Nação, enquanto grande parcela da nossa população não tem aqui quem defenda seus direitos.

Se, por exemplo, sugeríssemos aqui um projeto de lei estabelecendo que nenhum brasileiro ou estrangeiro pode ter mais de 3 mil hectares de terra - embora justo, coerente, pois distribuiria a propriedade da terra -, evidentemente, jamais esse projeto seria aprovado pelo Congresso Nacional, que é eminentemente conservador e, de certa forma, não contribui para a realização da reforma agrária, não contribui para a distribuição da terra em nosso país. Na verdade, quem financia grande parte dos Senadores e Deputados Federais - e somos nós os responsáveis pela elaboração das leis que ditam as regras das nossas relações sociais - é a elite conservadora, que quer perpetuar seus privilégios.

Por isso, mais do que nunca, se faz necessário o financiamento público de campanha. Obviamente, nunca de imediato deixará de existir o caixa 2, porque quem vai servir a esse segmento privilegiado pelo Governo e pelas leis, que não permitem que criminosos do colarinho branco fiquem na cadeia mais de uma semana, são naturalmente os Congressistas. O poder econômico sempre irá, além do financiamento público de campanha e na medida do possível, por trás, financiar seus candidatos, para que eles defendam os interesses dele no Congresso Nacional.

Mas se o povo se aborrecer, porque haverá financiamento público, nós também poderemos, ou o próprio Governo, fazer uma campanha de esclarecimento para dizer que ele gasta com o serviço da dívida. No Orçamento de 2001 há previsão de R$140 bilhões para o serviço da dívida interna e externa brasileira. São 140 bilhões de reais! Não dá para comparar os gastos previstos no Orçamento da União como os R$15 bilhões para a educação, os R$24 bilhões para a saúde, os R$20 bilhões para as Forças Armadas, R$1,8 bilhão para a reforma agrária, e assim por diante. Se somarmos tudo que tem no Orçamento da União não dá para comparar com o que se gasta com o serviço dessa dívida impagável, dessa dívida que só cresce, apesar de todas as privatizações. Ela foi constituída basicamente durante os seis anos do Governo Fernando Henrique, pois no início do seu mandato, a dívida interna era de R$60 bilhões e hoje está na casa dos R$ 540 bilhões. Portanto, a nossa dívida interna, em seis anos, aumentou mais de mil por cento, enquanto a inflação nesse período talvez esteja ainda na casa dos 80%.

Então, é preciso dizer isso à população, meu querido Senador de Minas Gerais, para que ela compreenda que a modificação da lei eleitoral e a sua fiscalização, a sua presença e a sua participação no processo eleitoral podem mudar essa realidade, porque pode trazer ao Congresso Nacional uma representação mais - digamos assim - de acordo com o que deseja a maioria do povo brasileiro.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouço o aparte de V. Exª com muita satisfação.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - O relato que faz V. Exª quanto ao problema salarial deste nosso Brasil não é diferente daquele que eu também faria. Em verdade, o salário mínimo é muito baixo ainda - mesmo vindo a ser de R$180,00, há de se considerar que não é um grande salário. Falo isso com a autoridade de quem pertence a um Partido que madrugou na luta por um salário mínimo mais elevado. Temos lutado por isso desde o começo do ano. Devo dizer a V. Exª que a Governadora do meu Estado veio a Brasília, quando da discussão do problema, comprometendo-se a pagar um salário mínimo de US$100 - e está pagando, sendo que nosso Estado não é dos mais ricos da Federação. Agora, também não entendo que os salários mais elevados sejam absurdos se comparados aos salários pagos no mundo moderno. Ainda mais, Senador Ademir Andrade, não localizo grande culpa no Congresso Nacional por essas distorções que acontecem no Brasil, conforme se refere V. Exª: a começar pelos salários pagos em empresas estatais, em que V. Exª identifica remunerações a diretores de algumas delas superiores a R$20 mil, ao tempo em que nós, com assento aqui no Congresso Nacional, temos um subsídio que corresponde a menos da metade disso. Portanto, se alguém precisava dar o exemplo, nós o estamos fazendo. A partir do Congresso Nacional, estamos expedindo um exemplo de quem compreende a situação dos mais pobres e que, por isso mesmo, não deseja se colocar num patamar bem mais elevado. Quanto ao financiamento público de campanha, posso dizer a V. Exª que o Senador Pedro Simon e eu fomos os precursores desse debate. Temos ambos projetos, apresentados ao Senado Federal há dois anos, criando o financiamento público de campanha, para o qual se prevê, em cada eleição, recursos da ordem de R$700 milhões. É muito? É claro que a sociedade brasileira considera muito - e, realmente, não é pouco. Todavia, é de se perguntar: em que resultaria esse montante de R$700 milhões? Penso que não seria suficiente sequer, Senador José Alencar, para pagar a impressão dos cartazes de cada candidato. Ainda assim, a opinião pública e nós próprios consideramos que é uma quantia exuberante, mesmo que não seja suficiente sequer para pagar, como disse, os cartazes eleitorais. Entretanto, é bom que alguma coisa se faça até para que se purifique, cada vez mais, o processo eleitoral. Tivemos o implemento da urna eletrônica, que foi um grande avanço, sobretudo no interior do País. Com a urna eletrônica, tivemos a segurança de que não haveria fraudes eleitorais. De fato, não houve e não haverá fraude eleitoral com a urna eletrônica. Ainda que não se tivesse feito nada em matéria eleitoral, só isso já seria um grande passo. No entanto, Senador Ademir Andrade, tenho a convicção de que este é um País que cresce. Diz V. Exª que o Brasil paga mais de U$100 bilhões por ano só de serviços da dívida - o que é verdadeiro; diz, ainda, que este Governo recebeu o País com U$60 ou U$70 bilhões de dívida interna - e a dívida externa já era de mais de U$100 bilhões - e que agora é mais de U$400 bilhões. É bom que não nos esqueçamos de que, no Governo João Goulart, o Brasil era o mesmo: o País devia apenas US$2 bilhões, e ninguém emprestava um centavo sequer ao Brasil por conta de estarmos quebrados com aquela dívida. Assim, há de se considerar que o montante da dívida não tem muito a ver com aquilo que parece ser, mas sim com a sua relação com o PIB nacional. Não há dúvida de que a dívida existente hoje já é elevada em relação ao PIB; porém, há inúmeros países desenvolvidos que possuem uma dívida infinitamente superior à do Brasil se considerado o respectivo PIB. A Itália, por exemplo, deve mais de 100% do seu PIB. De toda maneira, os números apresentados por V. Exª são verdadeiros.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Senador Edison Lobão, agradeço o aparte de V. Exª.

Reafirmo que o Congresso pode tudo, sendo, na minha opinião, o grande culpado pela situação do Brasil. Ainda que tivéssemos um Presidente da República que desejasse fazer reformas estruturais que realmente permitissem a distribuição da riqueza do nosso País, tenho certeza de que não teria condições de fazê-lo com o atual Congresso.

Por exemplo, a Constituição brasileira é a única Constituição do mundo - estou dizendo isso porque fiz uma pesquisa profunda sobre a matéria - que estabelece que o Congresso Nacional não pode mexer nos recursos destinados ao serviço da dívida. Não há nenhuma Constituição no mundo que permita isso; apenas a do Brasil. Há um artigo, que entrou no fim da elaboração da Constituição de 1988, estabelecendo que os recursos destinados ao pagamento da dívida são absolutamente intocáveis.

Propus a este Congresso Nacional uma emenda modificando esse artigo da Constituição Federal de 1988, que foi tranqüilamente rejeitada. O Congresso Nacional retirou aquela cláusula que estabelecia juros de 12% ao ano, que passou evidentemente por uma revolta até do segmento da UDR, do centrão. Naquele momento, a indignação com os juros altos provocou o estabelecimento dessa norma na Constituição Brasileira e o Governo Fernando Henrique, depois, conseguiu fazer com que o Congresso a retirasse.

Senador Edison Lobão, seria muito justo se propuséssemos uma emenda constitucional que limitasse o valor entre quem ganha mais e quem ganha menos no serviço público - por exemplo, um limite de 30%. Essa proposta tentei apresentar e também foi rejeitada. Seria uma questão de justiça. Na Europa, esse limite natural não ultrapassa 10%. Nos Estados Unidos, um parlamentar ganha US$6 mil mensais e o salário mínimo está em torno de US$1.200,00 - portanto, a diferença é de um para cinco. Nós, de nossa parte, estamos sem aumento há seis anos como todo o funcionalismo público brasileiro e é mais do que justo que não haja uma majoração. Para isso ocorrer, é preciso que se dê também um aumento aos funcionários públicos. Percebemos quase setenta salários mínimos. Vejam a diferença entre os vencimentos de um parlamentar dos Estados Unidos - aproximadamente cinco salários mínimos - e os de um parlamentar brasileiro, que ganha quase setenta salários mínimos. Imaginem V. Exªs o Presidente da Petrobras, que deve ganhar algo em torno de trezentos salários mínimos!

Repito: a situação é tal que, se apresentarmos uma lei que limite a propriedade da terra a três mil hectares, tenho certeza de que o Partido de V. Exª, como os demais Partidos que fazem parte da base de sustentação do Governo, jamais a aprovariam.

Por último, o Partido de V. Exª, inclusive, está pedindo algo que eu particularmente considero absurdo, que é a redução do tempo de televisão reservado à propaganda eleitoral gratuita. Quer dizer, no passado eram sessenta dias, com uma hora de duração à tarde e uma hora de duração à noite. Já reduziram para quarenta e cinco dias, com trinta minutos à tarde e trinta minutos à noite, mais as inserções. Agora, o Senador Jorge Bornhausen, que é o Presidente do Partido de V. Exª, aliás, um defensor da privatização da Petrobras, do Banco do Brasil e defensor público desta questão, pede agora que seja reduzido já para trinta dias o tempo de televisão reservado à propaganda eleitoral gratuita. Ora, a televisão é o meio que pode esclarecer a opinião pública quem é quem, o que cada um deseja, o que cada um quer, e vai-se fazer uma proposta desse tipo? É o Presidente do Partido de V. Exª...

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - V. Ex.ª me permite mais uma ligeira interrupção?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Só para permitir que V. Exª dê um aparte mais completo, quero acrescentar o seguinte: V. Ex.ª afirmou que o valor da dívida não é talvez tão importante. Ora, a dívida pública interna brasileira é hoje de US$540 bilhões, já chegando à casa dos 47% do PIB nacional, e a dívida externa está em US$236 bilhões, que correspondem aproximadamente a 40% do PIB nacional. Então, veja bem que nós, em termos de dívida, já estamos alcançando praticamente a totalidade do valor do PIB nacional. Não haveria grandes conseqüências se não fôssemos um país, em função dessa dívida, Senador Edison Lobão, obrigados a gastar US$140 bilhões somente em seu serviço, como está previsto no Orçamento de 2000. Mas, pior do que isso, V. Exª sabe muito bem que, no acordo aprovado e assinado no Congresso Nacional entre o Governo brasileiro e o Fundo Monetário Internacional, somos obrigados a ter um superávit primário em nossas contas de R$32 bilhões. Fomos obrigados em 1999, estamos sendo em 2000 e seremos em 2002.

Isto significa dizer que arrecadamos da sociedade, eu, V. Exª e tantos outros, pagamos ao Governo, que, entre o que arrecada da sociedade e aplica em benefícios, tem a obrigação de ter um superávit primário de R$32 bilhões. Isso é quatro vezes mais do que está previsto em investimento para desenvolvimento e infra-estrutura na Pátria brasileira, ou seja, quatro vezes mais em tudo o que o Governo pretender gastar em estradas, em ferrovias, em hidrovias, em hidrelétricas.

Somado tudo isso, o Governo é obrigado pelo Fundo Monetário Internacional, pelas condições em que assinou o contrato, a arrecadar R$32 bilhões a mais do que tem que gastar. Esses R$32 bilhões arrecadados não serão suficientes para pagar os juros da dívida, o que faz com que ela cresça permanentemente. E não está valendo absolutamente nada tudo que estamos privatizando na Pátria brasileira.

Apresento esses dados, Senador Edison Lobão, para que V. Exª faça o aparte em função das colocações mais claras. E digo que a dívida externa brasileira criou a dívida interna. V. Exª sabe que, há seis anos, a balança comercial brasileira está estagnada, sem superávit. Em alguns anos, tivemos déficit na balança comercial. O Presidente Fernando Henrique fez uma opção diferente, para continuar cumprindo os compromissos com a dívida externa. Ou seja, Sua Excelência fez captação de recursos lá fora, aplicou no nosso sistema financeiro interno e fez a opção por pegar dólares de quem trouxe de lá de fora, transformá-los em reais, aplicando no nosso sistema financeiro interno. Dessa forma foi criado esse monstro, que passou de R$60 bilhões para R$540 bilhões. Foram aplicadores externos que colocaram aqui seus dólares, transformados em reais, aplicados no sistema financeiro, ganhando 30% ao ano, ao passo que nos seus países de origem, quando muito, chegariam a 4%, e levando esse dinheiro e esse lucro de volta. Como a balança não pode crescer em função dessa política da estabilidade monetária, o Presidente Fernando Henrique fez a opção de conseguir dólares por meio da aplicação no sistema financeiro interno, e criou esse monstro. Hoje, as regras da nossa economia são ditadas por esse monstro chamado dívida, que interfere na minha vida, na vida de V. Exª e na vida de todo o povo brasileiro.

Portanto, a questão da dívida pública brasileira é grave, manda nos destinos da nossa sociedade, define as regras da nossa economia, e, por isso, ela é tão ruim para o povo brasileiro.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Senador Ademir Andrade, ao ouvir V. Exª, pode-se até ter a sensação de que, com as palavras do eminente Senador do Pará, chegar-se-á à conclusão de que o Presidente Getúlio Vargas, o Presidente João Goulart, o Presidente Eurico Gaspar Dutra, o Presidente Juscelino, o Presidente Café Filho, todos os Presidentes da República que, por igual, endividaram o País, cada qual no seu montante, segundo a riqueza nacional da época, fizeram isso por prazer pessoal. Não é isso! A dívida de qualquer país, dos Estados Unidos inclusive, existe para o benefício daquela nação. Essa é a concepção. Para fazer as estradas, para fazer os telefones que constituem o conforto do povo, para financiar o sistema de saneamento nacional, colocar água em cada residência, esgoto, para financiar a educação do País - hoje, já temos 96% das crianças em idade escolar, de 7 a 14 anos, na escola, o que não tínhamos -, para reduzir a mortalidade infantil. Essa dívida toda é constituída não pelo Fernando Henrique, mas por todos os governadores do País, pelos prefeitos municipais. Agora, o Governo Federal assume essa dívida toda, negocia com os Estados. A União Federal paga, mas os Estados pagam também e os Municípios, por igual, também pagam a sua dívida. Então, tudo isso é feito, no sentido de beneficiar o povo brasileiro. Aqui e acolá, há de se entender que algum governante pode ter cometido um equívoco, um erro. Nunca, governante algum agiu de má-fé! Nenhum governante pode endividar o Brasil de má-fé. Isso é inconcebível! Só se faz isso para o benefício do povo, embora, em muitos momentos, repito, possa ter havido algum equívoco. Sempre foi assim, e não haverá de ser diferente. O que fazer com a dívida que existe e que vai continuar aumentando? No próximo mandato, quem vai ser o Presidente da República? Seja quem for o Presidente da República,...

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Será nosso. E V. Exª será testemunha do que faremos com o País.

            O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Não acredito nisso. Mas, para argumentar, ad argumentandum, vamos admitir que seja do PT. Mais tarde, se for governador de seu Estado - e estimo que o seja - e aqui voltar em dado momento de seu governo, indagarei V. Exª em quanto estará a dívida do Estado, que era de 500 ou 600 milhões. Já no governo novo do PT, estará em 700 ou 800 bilhões. E não vou criticá-lo. É o destino de todo governo. O endividamento é feito para promover o desenvolvimento nacional. Não para outra coisa. O que quero dizer é que nenhum governante, seja de que partido for, promove o endividamento por maldade. O endividamento é feito com boa intenção, nada mais nada menos do que isso. E naqueles momentos - neste ponto gostaria de chamar a atenção de V. Exª - em que alguns governos resolveram congelar a dívida e dizer que não pagariam, o País pagou um preço elevadíssimo como conseqüência econômica, de inflação, de desenvolvimento inteiramente estagnado e outras. Mas concluo meu aparte voltando às leis políticas a que acabou de se referir V. Exª, ao tempo de televisão. Em primeiro lugar, o Brasil é um dos países que maior tempo de televisão tem para atividade político partidária. Aliás, não conheço nenhum outro país que tenha maior tempo de televisão e rádio do que o Brasil para o efeito de fazer política. Muito bem. Sabe quem deseja reduzir esse tempo, Senador Ademir Andrade? Não é exatamente o Senador Jorge Bornhausen, não; é o povo. O nosso povo brasileiro é que se impacienta com a presença político partidária na televisão todos os dias. É o povo que, pelas pesquisas, está demonstrando que não deseja que esse tempo seja tão vasto assim. Então, não acuse o nosso partido ou qualquer outro de estar cometendo um dano, porque não está. É o povo que não deseja esse tempo tão vasto assim.

            O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Senador Ademir Andrade, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouvirei já V. Exª, Senador José Eduardo Dutra.

Agradeço muito a participação do Senador Edison Lobão, porque isso faz com que a opinião pública ouça opiniões divergentes e julgue aquele que seja mais convincente. V. Exª, Senador Edison Lobão, realmente tem o mérito de ser uma pessoa que se expressa muito bem e de ser muito convincente. Parabéns a V. Exª.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Não tanto quanto V. Exª.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Obrigado, Senador.

Em primeiro lugar, penso que a questão da dívida vem muito da incompetência, da incapacidade de saber como resolver o problema. Não posso julgar como competente um governo que chegou, como o Governo Fernando Henrique, a pagar 50% de juros ao ano, na captação de títulos públicos, aos banqueiros nacionais. E sabemos que os bancos repassam esse título a cerca de 25% ao cidadão comum. Os bancos tomam o dinheiro do cidadão comum, repassam ao Governo, tornando-se intermediários e ganhando 20% de juros ao ano numa transação como essa. Num período de inflação de 6% ao ano, um governo pagar 50% de juros na captação de títulos públicos é realmente ser muito incompetente.

           Em segundo lugar, ele fez isso porque optou por continuar mantendo os compromissos externos, visto que ele não conseguia superávit na balança comercial, como não conseguiu ao longo dos seis anos do seu mandato.

           Em terceiro lugar, há a parte da irresponsabilidade. Cito um exemplo aqui - e V. Exª é da região e deve ter conhecimento disso: O Governo começou a fazer a Hidrelétrica de Tucuruí com um orçamento de US$1,5 bilhão e gastou US$6 bilhões. Esses US$6 bilhões, com os custos financeiros dos recursos tomados para executar a obra, chegaram a US$11 bilhões. E o Governo agora pretende vender aquela hidrelétrica, que custou ao povo brasileiro US$11 bilhões, por apenas US$1,5 bilhão, e construindo a segunda etapa com o nosso dinheiro, quando poderia passar isso para a iniciativa privada.

           Portanto, não penso que o povo deseja a redução da mídia, do tempo na televisão, porque aliás é o que está fazendo o povo avançar. A Oposição ganhou em 12 capitais do Brasil - seis do PT, quatro do PSB, duas do PDT -, um avanço extraordinário na política. Tenho certeza de que o povo brasileiro haverá de dar aos Partidos de centro-esquerda o comando do destino desta Nação a partir de 2002.

           O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - V Exª me permite um aparte?

           O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Causa-me muita satisfação discutir esta questão no Congresso Nacional, mas tenho um compromisso inadiável agora às 18 horas. Vou ouvir V. Exª com muita alegria e em seguida encerrar meu discurso em função do meu compromisso externo.

           O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Senador Ademir Andrade, eu estava em meu gabinete, ouvindo o pronunciamento de V. Exª, quando ouvi o aparte do Senador Edison Lobão. Não resisti à tentação de voltar aqui para tecer comentários sobre o aparte de S. Exª. Gosto muito de debater com S. Exª, mas, infelizmente, tenho que fazê-lo por vias transversas. O Senador Edison Lobão estabeleceu uma comparação com outros Governos - citou Juscelino Kubitschek, Getúlio Vargas e Café Filho - para dizer que todos fizeram dívidas. É verdade! O Ministro Pedro Malan tenta estabelecer um comportamento de estado como o comportamento de uma pessoa física e diz que só se pode gastar o que se arrecada. Não concordo com essa lógica. Penso que, por vezes, para viabilizar desenvolvimento, crescimento social e econômico, o Estado tem que se endividar. A grande diferença entre os quatro grandes ciclos de endividamento que o Brasil teve em sua história é o resultado deles. Houve endividamentos que geraram a Companhia Siderúrgica Nacional, a Usina de Paulo Afonso, o Sistema Telebrás, a Vale do Rio Doce - a grande infra-estrutura que transformou o Brasil, bem ou mal, na oitava economia do mundo. Isso foi feito em vários Governos, inclusive no dos militares. Quero fazer um parêntese para não dar a impressão de que estou com saudades da ditadura, mas o período de endividamento da ditadura também deixou resultados em infra-estrutura. É a grande diferença. Neste Governo, o grande ciclo de endividamento é decorrente, exclusivamente, de uma política monetária que não deixou qualquer resultado sob o ponto de vista da infra-estrutura e do desenvolvimento de nosso País. Essa é a diferença entre esses ciclos de endividamento. Em função de uma política de juros absurda e de um gesto de irresponsabilidade em relação ao câmbio - porque o fato é que, já em julho de 1998, quando veio a crise da Rússia, todo mundo dizia que ia ter que desvalorizar ali, mas o Governo não o fez porque tinha que garantir a reeleição -, como as forças do mercado são muito vorazes, e o mercado é muito volúvel, o Governo acabou tendo que fazer a desvalorização sem qualquer controle, o que resultou em o Brasil perder, em apenas dois meses, agosto e setembro de 1998, US$ 45 bilhões de suas reservas cambiais.

           Essa, infelizmente, é a realidade do nosso País, capitaneada pelo Governo e apoiada pelo Senador Edison Lobão.

           O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Agradeço a V. Exª. Em outra oportunidade, teremos condições de continuar este tão importante debate.

           Encerro minhas palavras, dizendo que o financiamento público de campanha é assunto extremamente importante, e, em função de tudo o que está sendo dito pela imprensa brasileira, esta é a hora de o Senado tomar para si a responsabilidade e aprovar o mais rápido possível a lei.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2000 - Página 22476