Discurso durante a 159ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Protestos contra a política de privatização em curso no País.

Autor
Roberto Saturnino (PSB - Partido Socialista Brasileiro/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Protestos contra a política de privatização em curso no País.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2000 - Página 22922
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, PRIVATIZAÇÃO, BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S/A (BANESPA), QUESTIONAMENTO, INFERIORIDADE, PREÇO, AVALIAÇÃO, GOVERNO, COMPARAÇÃO, VALOR, LEILÃO.
  • APREENSÃO, PERDA, PATRIMONIO PUBLICO, EMPRESA ESTATAL, POSSIBILIDADE, CRISE, SEMELHANÇA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA.
  • APREENSÃO, EXCESSO, CAPITAL ESTRANGEIRO, PRIVATIZAÇÃO, SETOR, SERVIÇOS PUBLICOS, BANCOS, PROTESTO, FALTA, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL, PREJUIZO, SOBERANIA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AVISO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), NECESSIDADE, REDUÇÃO, IMPORTAÇÃO.
  • GRAVIDADE, AUMENTO, REMESSA DE LUCROS, EXTERIOR, EXPECTATIVA, PUNIÇÃO, CRIME DE RESPONSABILIDADE, GOVERNO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ROBERTO SATURNINO (PSB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, a privatização do Banespa - Banco do Estado de São Paulo -, ocorrida há dois dias, foi muito saudada pelo Governo como recolhimento de uma soma de recursos que ultrapassou, e muito, todas as expectativas das autoridades da nossa política econômica.

Na verdade, Sr. Presidente, embora muito louvada e apresentada pela grande imprensa dessa maneira, a verdade é que essa privatização deixou muito mal o Governo, porque, depois de uma avaliação de R$1,8 bilhão, que já havia sido contestada pelo Ministério Público e por críticos e analistas conhecedores do nosso sistema bancário, a realidade mostrou que o valor do Banco andava pela casa dos R$7 bilhões - mais de três vezes o valor mínimo fixado pela avaliação das nossas autoridades.

Que explicação pode ter um erro dessa magnitude? Esse fato gerou desconfianças que já existiam durante todo o processo, todo o colar de operações de privatização que o Governo ainda pretende realizar, ignorando a nossa resistência e a oposição da opinião pública do País.

Trata-se de um fato inexplicável. Essa diferença de avaliações não tem explicações. Um dia, Sr. Presidente, teremos neste Congresso uma CPI que tratará dessas operações de privatização, quando encontraremos as explicações para fatos como a diferença entre a avaliação do Governo e o valor real do banco vendido ao mercado financeiro por meio da operação de leilão.

A operação foi saudada também porque trouxe para o Brasil uma soma de recursos em dólar que serviu para fechar um balanço de pagamentos deste ano que já se encontrava em dificuldades. Conseguiu o Brasil fechar seu balanço de pagamentos neste ano porque ainda havia esse patrimônio tão valioso a ser vendido. Mas o patrimônio brasileiro está-se esgotando. O que acontecerá depois?

A Argentina vendeu praticamente todo o seu patrimônio e encontra-se, provavelmente, na maior dificuldade de toda a sua história econômica, a ponto de o ex-Presidente Carlos Menem propor abertamente a dolarização da economia argentina, isto é, a abdicação da soberania econômica argentina por meio da substituição da sua moeda por uma estrangeira. Que irresponsabilidade é essa? A que ponto chegamos?

O Sr. Carlos Menem deveria estar respondendo a um processo de crime de responsabilidade pelo forma em que jogou a economia argentina, com seus malabarismos neoliberais. Perdidas a soberania e a moeda, não se recupera nunca mais a capacidade de uma nação resolver por si mesma seu próprio destino.

Sr. Presidente, mais de uma vez, falei sobre a irresponsabilidade cambial do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A venda para empresas estrangeiras de setores que não geram exportações, mas geram passivo cambial e remessas de lucros e dividendos para o exterior, vai produzindo uma bomba de efeito retardado que cairá sobre os governos futuros. Vendem-se para capital estrangeiro empresas de energia elétrica, de telefonia, de serviços públicos de um modo geral, bancos. Agora, a nova onda que se anuncia é a venda de empresas de saneamento, de água e esgoto.

Nada disso produz receita de exportação nem alívio no balanço de pagamentos, mas, ao contrário, produz peso, resultado negativo, déficits crescentes, que vão sendo fechados à custa de venda de patrimônio, até que se esgotem nossos bens. Nesse caso, o que mais o Brasil vai oferecer? Alugar a Amazônia? Vender a Amazônia? É o que vai restar.

Espero não ter o dissabor de ver aqui representantes, Senadores, Líderes do Governo a justificar, por exemplo, o aluguel da Amazônia com a finalidade de equilibrar o balanço de pagamentos e de dar continuidade ao processo de destruição da economia brasileira, ao processo de entrega sucessiva de setores e setores econômicos que constituem, enfim, a nossa riqueza e que foram construídos com grande sacrifício da classe trabalhadora. Gerou-se, com isso, um quadro de injustiça social muito grande, mas se produziu um patrimônio, que hoje está sendo dilapidado da forma mais irresponsável.

Protesto contra essa irresponsabilidade. Não há por que ficarmos a cobrar dos prefeitos a responsabilidade fiscal, ameaçando-os com punições por crimes de responsabilidade fiscal, quando o próprio Governo Federal comete a irresponsabilidade em grau muito maior, comprometendo todo o futuro da soberania do País, com esse passivo crescente resultante da venda de setores que remetem lucros e dividendos, mas não exportam, como é o caso dos serviços públicos de modo geral.

            Sr. Presidente, evidentemente, como eu, há muitas pessoas alertando e protestando, não obstante a insistência e a inflexibilidade do Governo no prosseguimento de uma política suicida em termos de soberania, que vai acabar nos levando a situações de impasse muitos graves. Eles devem estar pensando: “Essa bomba de retardo cairá nas costas, no colo do Lula. Ele que se vire”. É a postura irresponsável de um Governo que produz, da forma mais aberta possível, uma situação de inflexibilidade e de dureza para um futuro próximo, não um futuro remoto. Em menos de dez anos, será gravíssimo o quadro sob o ponto de vista cambial.

Sr. Presidente, a Folha de S.Paulo publicou um artigo, em 6 de novembro último, que diz: “um documento interno do Ministério do Desenvolvimento...” - documento oficial - “...alerta que o Brasil corre risco de uma nova crise cambial, caso o Governo não intervenha rapidamente para diminuir as importações”. Isso constitui crime, na opinião do Sr. Pedro Malan e das autoridades econômicas do Governo. Tentar, de alguma forma, controlar importações é crime e atinge interesses do mercado financeiro, produzindo retaliações do mercado financeiro, fugas de capitais, enfim, resultados negativos.

Mas o Ministério do Desenvolvimento alerta que é preciso diminuir as importações. O documento oficial diz ser urgente adotar medidas para estimular a fabricação local de componentes - componentes eletrônicos -, hoje adquiridos no exterior. Avisa ainda que o adiamento dessa iniciativa pode representar a elevação dos riscos de uma crise cambial.

O Brasil explode em telefones celulares, por exemplo. Só que, à medida que se privatizaram os serviços de telefonia, as empresas telefônicas de capital estrangeiro estão remetendo lucros e dividendos para o exterior e não estão gerando exportações, mas grandes volumes e valores de importação, visto que os componentes vêm sendo importados para a fabricação desses celulares.

            Sr. Presidente, o balanço de pagamentos se desequilibra de uma forma absolutamente alarmante. Mas o neoliberalismo é a lei, e o mercado financeiro é o dono da lei. O Governo brasileiro perdeu a noção de soberania e interesse nacional e curva-se às exigências do mercado financeiro.

Segue a matéria da Folha de S.Paulo:

“O relatório do Desenvolvimento deixa claro, também, que as dificuldades vão muito além da fronteira das importações. Por duas razões principais: a primeira é que o fluxo de investimento estrangeiro tem sido ótimo, mas o fenômeno não é eterno e tende a diminuir”.

Por que tende a diminuir? Porque o nosso patrimônio está-se esgotando. Vende-se isso, vende-se aquilo, no final vai restar a Amazônia! Vão justificar este absurdo, este crime contra o interesse nacional mas é o que vai restar. O mercado financeiro é inflexível, atende a conta-gotas para resolver uma situação de emergência como é o caso da Argentina. O FMI vai financiar aquele país para evitar a morte, mas vai aumentar a asfixia, isto é, manter a situação de dependência, manter a situação de subserviência por parte das autoridades que já abriram mão da soberania nacional e vão atendendo uma a uma as exigências. Eles não deixam morrer o freguês, vêm com um pequeno financiamento suficiente para manter a vida econômica do país, desde que resulte em lucros, juros, dividendos, remessas para engordar o patrimônio dos detentores da riqueza mundial que estão hoje comandando esta economia e as decisões do Governo brasileiro.

O documento alerta para o fato de que “o fluxo de investimentos tem sido ótimo, mas o fenômeno não é eterno e tende a diminuir”.

E continua:

“Em segundo lugar, para piorar as coisas, o que tende a aumentar é o fluxo de dólares que vai embora do Brasil. O País gasta cada vez mais dinheiro com o pagamento de juros e remessa de lucros e dividendos por parte de empresas estrangeiras.

Em 1994, a saída de divisas para o pagamento de juros, remessa de lucros e dividendos representou 20,5% do valor das exportações. No ano passado, esse percentual passou para 40,2%”.

            Esse percentual representou o valor das nossas exportações remetido à conta de juros, lucros e dividendos. Aonde vai parar isso? Não vai diminuir porque, ao contrário, o passivo externo está aumentando, o passivo cambial está aumentando, estão se vendendo, cada vez mais, empresas para o capital estrangeiro. Anteontem, vendeu-se o Banespa. É mais um. Esse Banco Santander vai querer remeter lucros e dividendos para a Espanha, onde fica sua matriz. E esse fluxo só vai aumentar. Então, esse percentual, que dobrou de 1994 para 1999, que passou de 20% para 40% das nossas exportações, vai chegar já, já a 60%. Quero ver o que vão fazer essas autoridades. Provavelmente estão pensando assim: “isso vai cair no colo do Lula e ele que se vire”. Isto se chama irresponsabilidade no mais alto grau porque o que está em jogo é a soberania do País, é o patrimônio da Nação e do povo brasileiro.

Diz mais o relatório:

“Ao lado da rigidez das exportações, dobraram os gastos com o pagamento de juros e remessa de lucros e dividendos. Não há nenhuma expectativa de curto prazo dessa tendência; ao contrário”.

Pelo contrário, a expectativa é justamente de se agravar essa tendência, de não se aliviar essa tendência.

Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, o que fazer? Estamos aqui a protestar, mas é preciso fazer ver a essas autoridades que isto não vai ficar assim e que essas pessoas terão que responder a crime de responsabilidade pelo que estão fazendo, porque a situação do Governo muda. Nós, ao assumirmos o Governo, não ficaremos passivamente a enfrentar essas dificuldades criadas pela irresponsabilidade deles sem que os chamemos a uma responsabilização.

Quero ver os responsáveis por toda a nossa política de abdicação da nossa soberania e de alienação do nosso patrimônio responder perante tribunais da Nação que vão lhes indagar por que fizeram isso e com a consciência do que estão fazendo. É impossível que não estejam a observar aquilo que todos estão observando, que aparece nos jornais, que todos os pronunciamentos da Oposição indicam a cada momento. É o sentimento nacional que está em jogo. Vejam bem: esse resultado de eleições municipais já traduziu esse sentimento. Esse sentimento vai se multiplicar muitas vezes e essas autoridades vão ter que responder futuramente pelo que estão fazendo.

Fica aqui registrada, Sr. Presidente, a minha indignação, o meu protesto e também a minha advertência: isso não vai acabar bem, mas não vai ficar assim, não! Essas pessoas que agem irresponsavelmente vão responder por essa atitude. Espero que isso ocorra antes de situações mais graves, que ocorrerão caso não haja nenhuma mudança na política econômica que vem sendo praticada pelo Governo brasileiro.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2000 - Página 22922