Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o desenvolvimento e o futuro da Amazônia.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. SOBERANIA NACIONAL.:
  • Considerações sobre o desenvolvimento e o futuro da Amazônia.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2000 - Página 23656
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, DIMENSÃO, REGIÃO AMAZONICA, NECESSIDADE, SOLUÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, CRESCIMENTO ECONOMICO, PROTEÇÃO, FRONTEIRA, SOBERANIA NACIONAL.
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), COMBATE, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE, ENERGIA, REGIÃO AMAZONICA, ALEGAÇÕES, RISCOS, MEIO AMBIENTE, OPINIÃO, ORADOR, LOBBY, PAIS ESTRANGEIRO, AMEAÇA, SOBERANIA NACIONAL.
  • DEFESA, AMPLIAÇÃO, PROCESSO, INTEGRAÇÃO, MODERNIZAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, DESENVOLVIMENTO, TRANSPORTE, HIDROVIA, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, REFORMA AGRARIA, CRIAÇÃO, EMPREGO, CONTROLE, FISCALIZAÇÃO, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE, UTILIZAÇÃO, ZONEAMENTO ECOLOGICO-ECONOMICO, PLANEJAMENTO, CRESCIMENTO ECONOMICO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo hoje a tribuna desta Casa para voltar a falar sobre o futuro da Amazônia, um dos temas mais preocupantes para a maioria do povo brasileiro.

            Como um dos representantes daquela imensa região no Congresso Nacional, tenho procurado com freqüência, em minha atuação parlamentar, trazer os seus problemas para debate. Portanto, são incontáveis as minhas intervenções sobre a Amazônia, especialmente quando emergem discussões sobre as questões do planejamento do nosso desenvolvimento, da integração nacional, do respeito ao meio ambiente e da soberania brasileira sobre o seu território.

            Como todos nós sabemos, desde o início de nossa história, o tema Amazônia sempre esteve na ordem do dia de nossas preocupações mais importantes.

            Sua problemática é sempre de primeira grandeza porque o seu território é gigantesco, porque as suas riquezas são fabulosas, porque a sua fronteira é extensa, porque desperta interesses internacionais altamente preocupantes e porque os seus problemas exigem grandes desafios para serem solucionados.

            É importante relembrar que a Amazônia Brasileira é um verdadeiro continente, com 5.046.143 km², representando 59% do nosso território. Sua faixa de fronteira é da ordem de 12 mil quilômetros e estende-se desde as Guianas até a Bolívia, passando pela Venezuela, pela Colômbia e pelo Peru. Sua extensão territorial ocupa quase 30% do total da América do Sul e quase 70% da Amazônia total.

            No momento em que se discute, por todas as partes do mundo, a dimensão dos problemas ecológicos e a questão da água, a Amazônia detém a maior fonte de água doce do planeta e 1/3 das florestas tropicais compactas, com fantástica riqueza biológica.

            Por sua vez, merece destaque a sua bacia hidrográfica com mais de 6 milhões de quilômetros quadrados, reunindo uma capacidade incomparável de potencial hidrelétrico, hidroviário e imensos recursos pesqueiros, sem falar de suas vastas extensões de terrenos de várzeas com capacidade agrícola ainda pouco explorada.

            Em contradição com esse potencial, vale dizer que, em termos populacionais, a Amazônia abriga apenas 11,3% da população brasileira, e em termos de geração de riqueza, contribui apenas com 6,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do País. Como se pode constatar, o velho problema persiste na região: a Amazônia continua precisando de gente e de desenvolvimento para garantir a sua integridade.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em plena aceleração do processo de integração mundial de nossa economia, como acontece no resto do Brasil, o desenvolvimento da Amazônia tem se realizado de maneira totalmente deformada. Em sua evolução, existe uma “perfeita combinação” entre modernização econômica, miséria, desagregação social e destruição dos ecossistemas, que é extremamente perigosa para o seu futuro político, econômico e social.

            Apesar dos erros cometidos e das enormes distorções provocadas pelos fracassados planos de ocupação, ainda é possível estabelecer uma nova concepção de desenvolvimento regional que concilie a necessidade não radical da preservação, com a urgência da exploração econômica de suas riquezas naturais. Essa é a única resposta concreta para atenuar os efeitos perversos dos processos predatórios de viabilização econômica e demográfica acontecidos nas últimas décadas.

            Por culpa desses planos errôneos, vêm se agravando, desde o início do século, as condições de vida, os níveis de renda e de emprego da grande maioria da população, submetida ainda a influências culturais completamente diferentes das suas, trazidas por missionários e outras organizações que atuam na região.

            A grande imprensa tem, nos últimos tempos, divulgado o pensamento de organizações não governamentais, organismos nacionais e internacionais, que têm suas atenções voltadas para a Amazônia, sobre suas posições contrárias a programas do governo federal para o desenvolvimento da região. Notadamente os programas que compõem o chamado “Avança Brasil” têm como prioritários investimentos em infra-estrutura, especialmente em transporte (rodoviário e hidroviário) e geração de energia.

            Essas organizações fazem projeções drásticas para o futuro da região, especialmente do ponto de vista do meio ambiente, considerando a fragilidade dos ecossistemas amazônicos. Fazem projeções baseadas no modelo desordenado de ocupação da Amazônia e suas conseqüências até os dias presentes.

            A meu ver, Srªs. e Srs. Senadores, os posicionamentos manifestos por essas organizações, que, na sua maioria, são financiadas por organismos internacionais, trazem em seus discursos e em suas ações vestígios de interesses muitas vezes estranhos aos interesses da Nação brasileira e da própria região amazônica.

            A defesa do meio ambiente de forma extremada e desconectada de outros aspectos da região, como tem manifestado essas organizações, é tão perversa para a Amazônia quanto a visão de pura exploração econômica que não leva em consideração as peculiaridades da região. Portanto, por outro extremo, a visão empreendida por essas organizações incorrem nos mesmos erros do passado: o de não ver a Amazônia na sua magnitude e complexidade.

            Hoje, com os padrões científicos e tecnológicos de que dispomos, é perfeitamente possível buscar o progresso econômico sem destruir os sistemas ecológicos. Evidentemente, esse modelo de desenvolvimento com equilíbrio social e racionalidade na exploração dos recursos naturais requer mudanças culturais e políticas de grande profundidade. Aliás, o próprio Governo precisa mudar esse contexto, porque ainda não conseguiu definir claramente o que pretende fazer de concreto na Amazônia para promover a utilização sustentável de sua base de recursos.

            Um novo processo de integração e modernização da Amazônia deve ser abrangente e não concentrado, ou seja, restrito a alguns núcleos de investimento e produção. Tal política, a da concentração dos investimentos, foi aplicada anos a fio por diversos governos. A herança que ficou são os sucessivos fracassos, com somas valiosas de dinheiro público desperdiçados e que serviu apenas para agravar os desequilíbrios intra-regionais, aumentar a miséria e atender aos interesses de alguns aproveitadores.

            Infelizmente, é dessa maneira que a Amazônia prepara-se para entrar no século XXI, com boa parte de seu território excluído dos instrumentos da cidadania, alheia à presença estatal, o que abre enormes possibilidades para a exploração irregular de suas riquezas, para a destruição dos seus ecossistemas, para as dificuldades no domínio da informação e no acompanhamento dos seus problemas, e para todos os tipos de atividades irregulares e criminosas.

            Nos dias de hoje, com o desenvolvimento impressionante das ações dos narcotraficantes e com as facilidades existentes para a prática do contrabando generalizado, a necessidade de integração total da Amazônia ao resto do Brasil, confronta-se com problemas relativamente novos que praticamente não existiam há alguns anos.

            Diante dessa nova realidade, que já abriu inclusive uma significativa discussão internacional, principalmente nos Estados Unidos e na Europa Ocidental, e que coloca em sério perigo a nossa gestão sobre o território amazônico, precisamos pensar seriamente na construção imediata de uma infra-estrutura econômica e social adequada para agilizar o processo de integração. Precisamos desenvolver rapidamente a área de transporte, notadamente a utilização da imensa rede hidrográfica, que é pouco explorada; elevar os baixos níveis educacionais da população, com um combate sistemático contra o analfabetismo e contra as dificuldades de acesso à escola; definir com clareza novos parâmetros para corrigir as enormes injustiças agrárias, geradoras de sérios conflitos; promover uma reforma agrária realista para impedir que fortes correntes migratórias continuem a se dirigir para a periferia das cidades, agravando a anarquia do processo de urbanização; priorizar as atividades econômicas geradoras de emprego e renda; e colocar em prática mecanismos realistas de gestão ambiental, que tenham a real capacidade de monitorar, controlar e fiscalizar o bom andamento dos programas do desenvolvimento sustentável.

            É algo inquestionável a necessidade de dotar a região da infra-estrutura necessária para utilização racional de suas riquezas, de forma a gerar desenvolvimento e emprego, possibilitando à população que lá vive melhores condições de vida. E qualidade de vida, Sr. Presidente, aprendemos com a lição que a história ensinou, é o desenvolvimento sustentável. Não me refiro ao termo “progresso”, mas o desenvolvimento que tenha como diretriz a justiça social que integra o respeito aos direitos sociais dos trabalhadores, a proteção dos diversos ecossistemas, do meio ambiente e a particular cultura dos povos da região.

            Assim, a reestruturação da base produtiva regional, com o objetivo de elevar a capacidade de competitividade da economia local, a renda e criar empregos, deve ser buscada pela consolidação, integração e verticalização dos pólos e complexos econômicos já existentes; pela modernização e dinamização das atividades tradicionais; pela identificação de novas oportunidades de investimento vinculadas aos recursos naturais renováveis e à biodiversidade; e pela participação efetiva da população amazônica nos processos mais competitivos de produção e comercialização das riquezas produzidas. Neste sentido o zoneamento econômico-ecológico é, sem dúvida, um dos instrumentos básicos para o planejamento desse desenvolvimento.

            Outro aspecto que deve ser considerado num processo de desenvolvimento planejado da região é a necessidade de elevar o nível de informação e conhecimento da própria região. Investimentos nas áreas de pesquisa e do desenvolvimento científico e tecnológico são fundamentais para essa estratégia. Em se tratando desse ponto, não podemos desconhecê-lo como de extrema importância para a exploração adequada dos recursos naturais, para a redução dos problemas socioeconômicos e ambientais, enfim, para disciplinar todas as etapas do desenvolvimento sustentado.

            Por fim, a integração da Amazônia no cenário nacional é outro aspecto de grande relevância nessa discussão. Não temos nenhuma dúvida de que é de vital importância a integração física, socioeconômica e cultural da Amazônia em si, com o resto do Brasil e com os centros internacionais de consumo.

            Os projetos que constam no programa “Brasil em Ação” do governo federal, não estão lá por uma dádiva do governo Fernando Henrique Cardoso. Refletem anseios dos vários segmentos populacionais amazônidas, e estão lá por pressão política da região. A conclusão de obras como: eclusas de Tucuruí e hidrovia araguaia-tocantins; asfaltamento da rodovia BR 230 - Transamazônica; BR 422 - Tucuruí-Novo Repartimento e BR 163 - Santarém-Cuiabá, dentre outras obras de infra-estrutura previstas para a região, são de fundamental importância para essa integração. Essas obras não são inadequadas para a região, como têm afirmado várias organizações ambientalistas a que me referi no início dessa minha fala. Creio, porém, que dadas as características da região amazônica, o governo deva desenvolver ações paralelas, através dos órgãos de meio ambiente, desenvolvimento regional, dentre outros, direcionando a ocupação e o desenvolvimento dentro de parâmetros condizentes com a realidade socioambiental da região, respeitando suas vocações.

            Do ponto de vista social, também há um enorme fosso separando os amazônidas do restante dos brasileiros. Portanto, o homem amazônico precisa se beneficiar de todo o processo de mudança e modernização necessários à região. Somente dessa forma poderemos atingir os objetivos de erradicar a miséria, superar os níveis de exclusão social e garantir a cidadania para todos.

            Finalizo, Srªs. e Srs. Senadores, afirmando que, em se tratando de colocar em prática um projeto sério de desenvolvimento para uma região que é vital para o Brasil, temos o dever de colocar de lado as diferenças ideológicas, as idiossincrasias partidárias e as divergências políticas. A questão da Amazônia é uma questão de inteligência e, às vezes, a visão apaixonada, de um lado e de outro, ofuscam nossa vistas, cegando-nos para aquilo que é evidente. É preciso unir a nossa inteligência para tratar da Amazônia. Seja do ponto de vista militar, científico, tecnológico, seja do ponto de vista político, econômico e social, é preciso que utilizemos todo o nosso potencial para promover de maneira acertada, um desenvolvimento soberano da região, que podemos considerar como a mais rica do País e uma das mais prosperas do mundo.

            Era o que tinha a dizer.


            Modelo14/24/248:59



Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2000 - Página 23656