Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à vinculação do êxito do programa "Luz no Campo", do Ministério das Minas e Energia, à privatização do setor elétrico no Brasil.

Autor
Carlos Wilson (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA. MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.:
  • Críticas à vinculação do êxito do programa "Luz no Campo", do Ministério das Minas e Energia, à privatização do setor elétrico no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2000 - Página 23663
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA. MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, RODOLPHO TOURINHO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, ELETRIFICAÇÃO RURAL, ELOGIO, AMPLIAÇÃO, ACESSO, POPULAÇÃO, ENERGIA ELETRICA, POSSIBILIDADE, DESENVOLVIMENTO, PREVENÇÃO, EXODO RURAL.
  • APREENSÃO, RETROCESSÃO, ELETRIFICAÇÃO RURAL, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA DE ELETRICIDADE DE PERNAMBUCO (CELPE), EXISTENCIA, RECURSOS, AUSENCIA, RESULTADO, NECESSIDADE, FISCALIZAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA (ANEEL).
  • ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), ESCLARECIMENTOS, ELETRIFICAÇÃO RURAL, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE).

  SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. CARLOS WILSON (PPS - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, No jornal Folha de S.Paulo de 27/11 passado, foi publicado artigo de autoria do Ministro das Minas e Energia, Rodolpho Tourinho, sob o título “ Cidadania é luz”, contendo dados e metas relativas a um programa de eletrificação rural em curso no país, de caráter tão otimista, que, ao invés de me tranqüilizar com os rumos do setor, ao contrário, aumentaram minhas dúvidas e perplexidades a respeito do assunto.

            Assim, conforme S. Exª, o Ministro Rodolpho Tourinho, merecedor, aliás, de todo nosso crédito, o programa governamental conduzido por sua Pasta e denominado “Luz no Campo” vem se desenvolvendo, desde o início deste ano, com vistas a dotar de luz elétrica até o final do atual Governo, em 2002, cerca de um milhão de propriedades e com previsão de chegar-se à universalização da cobertura de todo território nacional até 2005.

            S. Exª festeja, com justa razão, a ousadia de tal programa, que identifica como o maior da América Latina, e que, em termos de Brasil estaria beneficiando mais propriedades rurais do que foi feito nos últimos 30 anos de nossa História.

            Segundo ele, isso só teria sido possível, graças à privatização, em andamento, do setor elétrico do Brasil, cujo modelo gerou recursos financeiros, através da Reserva Global de Reversão da ELETROBRÁS (RGR), capazes de financiar programas sociais da envergadura deste “Luz no Campo”.

            À propósito, a RGR é um fundo formado pelas contribuições das empresas do setor elétrico, correspondendo a 2,5% de suas receitas brutas, até o máximo de 1% de seus ativos imobilizados.

            De acordo ainda com o Ministro, antes das privatizações do setor elétrico estes recursos ficavam comprometidos com obras de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, hoje a cargo da iniciativa privada concessionária desses serviços.

            O único obstáculo, na visão do Ministro, que ainda pode oferecer algum embaraço ao êxito do “Luz no Campo”, retardando, em suas palavras “os contornos finais do programa” seria a demora na aprovação pelo Congresso Nacional do Projeto de Lei nº 2905/2000, enviado pela Presidência da República à Câmara dos Deputados e que estabelece, entre outras disposições, as metas de universalização para as concessionárias.

            Estranhamente, no entanto, o próprio Governo Federal, através de suas Lideranças na Câmara dos Deputados, em 14/06/2000, mandou retirar o regime de urgência que já vinha sendo atribuído à tramitação do projeto.

            Em todo caso, esta é, em síntese, a manifestação do Ministro Tourinho esta semana, na imprensa, sobre a matéria.

            Em primeiro lugar, é preciso saudar os planos do Governo de tirar da escuridão milhões de famílias, cujas condições de vida na região rural do Brasil, sem energia elétrica, carecem de um mínimo aceitável de dignidade, consistente na fruição de bens elementares de civilização, como a própria possibilidade de conservação de seus alimentos e o acesso mais rápido a notícias geradas nas cidades, sem falar na impossibilidade de irrigação e de criação intensiva de animais, bem como no entrave à pecuária leiteira, dependente do preparo das rações.

            Com a chegada da luz elétrica, além de atribuir-se um mínimo de cidadania ao homem do campo, pode-se também minimizar o êxodo rural de legiões de deserdados que a cada ano deixam suas terras e seus casebres esfumaçados e escuros em busca das luzes das cidades.

            Sem contar que a energia elétrica traz, além disso, novos hábitos de consumo, não só de eletrodomésticos, mas, igualmente, de bens e serviços essenciais à eficiência da produção agrícola.

            Não há linguagem nem palavras para descrever a reação do camponês beneficiado com a luz elétrica.

            Tive a feliz ocasião, durante o período de menos de um ano em que sucedi ao Governador Miguel Arraes, no Governo de Pernambuco, em 1989, de inaugurar algumas linhas de transmissão de energia elétrica, através da CELPE, na época ainda não privatizada, e de me emocionar, como poucas vezes em minha vida, ao ver o camponês jogar fora o velho candeeiro, como quem se livra afinal de um estigma de inferioridade social, civil, e política, como quem ganhasse, enfim, uma alforria atrasada de um século.

            Ninguém que tenha passado por tal experiência no exercício de função pública tem o direito de desconhecer a importância vital duma conquista como essa, a da luz elétrica pelo homem do campo.

            É assunto, por sua natureza, quase sagrado de tão sério, e, portanto imune à demagogia ou a ser objeto de qualquer tentativa de aproveitamento partidário ou eleitoral.

            No entanto, a própria seriedade do assunto me obriga a comparar os êxitos do programa ora anunciado pelo Ministro Tourinho e as expectativas nele depositadas, certamente de boa-fé, por S. Exª, com seus resultados concretos, que constato em meu Estado, Pernambuco, cuja eletrificação rural tem conhecido retrocesso indisfarçável desde a privatização da CELPE, ocorrida no início do corrente ano.

            Lembro-me, de que, na administração de Arraes, de 1986 a 1990, a CELPE, ainda sob controle estadual, eletrificou mais de 40 mil propriedades rurais, sem contar 18 mil durante minha interinidade no Governo de Pernambuco.

            Com a privatização, não só tem caído a qualidade da oferta dos serviços urbanos, como parecem virtualmente interrompidos os trabalhos de eletrificação rural.

            E o mais grave é que, pelo Programa “Luz no Campo”, Pernambuco é um dos oito Estados brasileiros contemplados com a meta de eletrificação total no campo até 2002, um Estado, considerado assim, desse ponto de vista, como prioritário pela União.

            Ora, se há recursos destinados a este fim como revela o Ministro Tourinho e Pernambuco é dos seus beneficiados preferenciais, onde e como estariam sendo aplicadas tais verbas ?

            É preciso cobrar-se um mínimo de transparência das autoridades estaduais na utilização desses recursos públicos, e, se houver omissão da concessionária privada responsável, cabe ao poder concedente estadual tomar providências e aplicar as penalidades cabíveis, bem como a ANEEL cumprir sua missão fiscalizadora.

            Em vista disso, ou seja, da existência de recursos disponíveis e alocados para a eletrificação rural em Pernambuco e na ausência de resultados perceptíveis de seu uso adequado e na falta de qualquer publicidade quanto à prestação de contas de tais verbas, nem por parte do Governo Estadual, nem das concessionárias privadas titulares da prestação dos serviços, encaminho hoje ao exame desta Casa, um requerimento de informações dirigido ao Ministro Rodolpho Tourinho para que nos ofereça os devidos esclarecimentos acerca da matéria, na forma do artigo 50 § 2º da Constituição Federal.

            Por outro lado, sabe-se que a CELPE, transferida à iniciativa privada por cerca de 1 bilhão de dólares em 17/02/2000, sempre foi considerada pelos especialistas do setor como uma das melhores empresas de distribuição de energia elétrica do país, tecnologicamente atualizada, sem dívidas, com mercado em expansão de 1,9 milhão de consumidores, 2.600 empregados e com uma receita operacional líqüida de 663 milhões de reais e lucros líqüidos auferidos em 1999 de 67 milhões de reais.

            A privatização de tal empresa, assim eficiente e lucrativa, só se justificaria pelo aumento dos investimentos a realizar com vistas à universalização da oferta de seus serviços e pela melhoria da qualidade das prestações que, eventualmente, coloque à disposição da população, sem o que sua transferência ao controle particular terá sido lesiva ao interesse público.

            Além disso, é preciso não frustrar as expectativas do Ministro Tourinho de levar luz elétrica às mais de 4 milhões de propriedades rurais hoje privadas desse bem essencial, das quais mais de 100 mil só em Pernambuco.

            Isso porque as expectativas do Ministro não são só dele, mas pertencem a mais de 5 milhões de brasileiros, que, no limiar do novo milênio, encontram-se, de modo inadmissível e intolerável, excluídos de uma tecnologia velha de mais de um século - a luz elétrica - e dependente de recursos naturais, hídricos, renováveis e abundantes no Brasil.

            É o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado


            Modelo14/26/244:55



Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2000 - Página 23663