Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Precariedade das rodovias brasileiras, em especial no Estado do Piauí. Recebimento de expediente do Ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, acerca das providências para amenizar os problemas nas estradas federais.

Autor
Freitas Neto (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Antonio de Almendra Freitas Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Precariedade das rodovias brasileiras, em especial no Estado do Piauí. Recebimento de expediente do Ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, acerca das providências para amenizar os problemas nas estradas federais.
Publicação
Publicação no DSF de 03/02/2001 - Página 299
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • REGISTRO, RECEBIMENTO, CORRESPONDENCIA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DOS TRANSPORTES (MTR), INFORMAÇÃO, PROVIDENCIA, MELHORIA, RODOVIA, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO PIAUI (PI).
  • COMENTARIO, DADOS, PESQUISA, CONFEDERAÇÃO, TRANSPORTE, AVALIAÇÃO, CONTINUAÇÃO, DETERIORAÇÃO, RODOVIA, BRASIL, PREJUIZO, POPULAÇÃO, PATRIMONIO PUBLICO, CUSTO, FRETE, TRANSPORTE DE CARGA, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • COMENTARIO, EXCESSO, VALOR, PEDAGIO, RODOVIA, PRIVATIZAÇÃO, REDUÇÃO, QUALIDADE, CONCENTRAÇÃO, REGIÃO SUDESTE, REGIÃO SUL, AUMENTO, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, SOLUÇÃO, TRANSPORTE RODOVIARIO, AUSENCIA, AUMENTO, TRIBUTAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. FREITAS NETO (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao se encerrarem os trabalhos legislativos de 2000, no dia 27 de dezembro, recebi do Ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, correspondência relativa a pronunciamento em que analisei o estado das rodovias que cortam o território piauiense. Nessa mensagem, o Aviso GM/MT nº 1.696, comunicava-me o Ministro Eliseu Padilha providências tomadas para a melhoria das condições da malha rodoviária.

            De acordo com o Ministro, já se realizara licitação para completa restauração da BR-497, trecho Picos-Paulistana-Divisa PI-PE, previa-se a licitação de fase de programa de restauração que inclui a BR 316-PI, trecho Teresina-Picos-Divisa PI-PE, e ainda a intensificação dos serviços de conservação de pista, tendo em vista a melhoria das condições de trafegabilidade das rodovias federais no Estado do Piauí.

            Tenho, efetivamente, denunciado freqüentemente, desta tribuna, o mau estado das rodovias brasileiras. Suas condições, infelizmente, têm efetivamente se deteriorado, tornando cada vez mais concreta a possibilidade de que em breve regiões inteiras vejam-se privadas de transporte rodoviário. Não falo sem provas. A quinta versão da Pesquisa Rodoviária da Confederação Nacional do Transporte, uma pormenorizada avaliação das condições das rodovias brasileiras, foi divulgada no final de dezembro e constatou não só que a situação geral havia piorado mas também que a degradação do sistema fora maior em determinadas regiões, particularmente no Nordeste. Realizada no segundo semestre de 2000, a Pesquisa Rodoviária avaliou 43.283 quilômetros de estradas, cerca de 500 quilômetros mais do que o constatado na edição anterior da pesquisa, de 1999. Desse total, 38.571 quilômetros correspondem a rodovias federais pavimentadas e os demais 4.712 a estradas estaduais. Incorporo a este pronunciamento os quadros que mostram essa situação dramática.

            A pesquisa anterior mostrava que o estado de conservação das rodovias pesquisadas estava péssimo, ruim ou deficiente em 77,5% de sua extensão. Desta vez, as rodovias nessas condições chegam a 80,3%. As rodovias em bom estado, que atingiam 19,7% do total, agora são apenas 18%. As julgadas em ótimo estado caíram de 2,8% para míseros 1,7%.

            Em números absolutos, dos 42.815 quilômetros pesquisados, 34.736 podem ser considerados em estado deficiente, ruim ou péssimo, contra 33.303 em 1999. Apresentam-se em bom estado 7.803 quilômetros, quando em 1999 eram 8.412, e estão em ótimo estado 744 quilômetros, quando no ano passado eram 1.200. Observa-se, dessa forma, que se generaliza a deterioração. Esvai-se a pequena melhora que se verificara em 1999 em relação a 1998.

            A constatação que surge de imediato é a de que estamos assistindo a uma verdadeira dilapidação do patrimônio nacional. As rodovias que a falta de conservação faz desaparecer constituem produto de impostos e taxas pagos com enorme sacrifício pela população brasileira. Deveríamos estar zelando pelo resultado desse sacrifício, fazendo o mínimo que se espera de qualquer administrador: preservar o que recebeu.

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, esses dados falam por si. A destruição das rodovias deste país prejudica a totalidade de seus cidadãos. A conta da construção da malha rodoviária foi paga por todos os brasileiros e, infelizmente, todos também pagarão pelo descaso dos gestores de seu patrimônio.

            No entanto, alguns suportam ônus ainda maior que os demais.

            Como brasileiro, indignei-me ao observar o quadro revelado pela Pesquisa Rodoviária. Como nordestino e como piauiense, revoltei-me. É que, se as condições das rodovias mostram-se dramáticas em todo o país, no Nordeste a destruição se acentua. No Piauí ainda mais.

            Pode-se constatar com clareza essa situação ao se verificar que, das dez piores rodovias brasileiras, nove cortam o Nordeste. Aliás, são justamente as nove piores de todo o território nacional. Oito têm todo o seu traçado em terras nordestinas.

            Em contrapartida, das dez melhores, nove cortam as regiões Sul e Sudeste. O Nordeste conta com apenas um pequeno trecho dessas dez estradas, o que liga a BR-101, na Bahia, a Teófilo Otoni, em Minas Gerais. A rodovia restante a integrar esse seleto escalão está na Região Centro-Oeste, ligando Brasília a Cuiabá.

            Nada tenho contra a existência de boas rodovias no Sul e no Sudeste. Pelo contrário, gostaria que apresentassem excelente conservação - o que nem nessas regiões ocorre, conforme demonstra a pesquisa. O recomendável, porém, seria que todas as estradas do país recebessem a atenção indispensável para a preservação da sua trafegabilidade.

            No Nordeste, comprova a Pesquisa Rodoviária, a degradação acelerou-se. E o Piauí foi um dos estados mais afetados por esse processo perverso. Pasmem: dessas dez piores rodovias do País, cinco estão em território piauiense. Das três piores, duas cortam o Piauí. Das cinco piores, três servem nosso Estado.

            Ainda mais doloroso: houve sensível deterioração em relação à situação apurada em 1999. A ligação entre Teresina e Barreiras, na Bahia, era a quinta pior do país em 1999. Hoje, de acordo com a Pesquisa Rodoviária 2000, é a vice-campeã de destruição. A ligação Picos-Salgueiro manteve-se em terceiro lugar. O percurso entre Teresina e Petrolina, pelas BR-222 e BR-343, saltou do 14º para o 4º lugar. A Teresina-Fortaleza sequer estava no conjunto das dez piores do ano passado, quando ocupava o 19º lugar. Agora está em 9º e o 8º é ocupado pela BR-020, entre Fortaleza e Picos.

            Na análise pormenorizada que a Pesquisa Rodoviária faz de cada estrada, constata-se que a avaliação está correta, precisa. Tome-se como exemplo a ligação Teresina-Barreiras. A pavimentação está ruim ou péssima em 506 quilômetros, o que representa 46,4% do total. Está deficiente em outros 434. Apenas 150 quilômetros podem ser considerados em ótimo ou bom estado. A sinalização é ruim ou péssima em 95,4% da rodovia, 1.040 quilômetros.

            O relatório sobre as condições da estrada diz tudo: “O pavimento apresenta longos trechos totalmente destruídos. Está recapeado sem remendos. O estado do pavimento exige baixíssima velocidade de trânsito. Na sinalização horizontal, a pintura das faixas é inexistente. A sinalização vertical está ausente em todo o percurso. Foram encontrados animais na pista em boa parte do percurso”.

            Trata-se de rodovia extremamente importante para a economia regional. A própria Pesquisa Rodoviária observa que a carga nela predominante é de produtos agrícolas, seguida por produtos industrializados. A verdade é que em todo o país, e principalmente nas regiões em que as estradas mais se deterioram, o custo do transporte de carga eleva-se exponencialmente em função das más condições de tráfico. Infelizmente, o peso das rodovias em nossa matriz de transportes é muito grande, implicando elevado grau de dependência de nossa economia em relação às condições das estradas. Como as deficiências na conservação duplicam ou mesmo triplicam a duração prevista para determinados percursos, a destruição das rodovias termina por representar um alto custo para o transportador e, em conseqüência, para o consumidor.

            O gasto de combustível também cresce em proporções elevadas. Ao anunciar os resultados da pesquisa, o presidente da Confederação Nacional do Transporte, Clésio Andrade, mostrou a dimensão desse problema: de acordo com seus cálculos, um caminhão que transite pelas estradas brasileiras tem um aumento entre 20 a 30% no consumo de combustíveis.

            Esses custos são ampliados ainda mais pelos danos causados aos veículos - particulares, de transporte de passageiros ou de transporte de carga - pelas falhas de conservação das rodovias; multiplicam-se esses custos. A reposição de componentes nos veículos ou de veículos das frotas representa um gasto ainda maior ao determinar a paralisação ou a suspensão dos seus trabalhos.

            É evidente que essa situação representa, ao lado dos problemas econômicos, extremo desconforto para a população, especialmente a de menor renda, que não tem outras opções para viajar e que, com freqüência, precisa usar as rodovias para se deslocar aos locais de trabalho. Nas áreas metropolitanas e mesmo nos pólos médios de industrialização ou de serviços, o percurso entre moradia e trabalho costuma dar-se por meio de rodovias. O tempo de deslocamento se estende por tempo muito superior ao que seria normal. As estradas esburacadas, desgastadas, semi-destruídas, tornam os percursos mais demorados e mais difíceis.

            É interessante observar também o que ocorreu com as rodovias privatizadas. A elas se atribuiu, com razão, a pequena melhoria constatada entre o levantamento realizado em 1999 e o anterior, em 1998. Desta vez, registrou-se um recuo nesse processo. Por exemplo, a Via Dutra, que ocupava o primeiro lugar, está hoje em segundo, com 200 quilômetros, ou 49% do total, considerados deficientes.

            Constataram-se, nesse e em outros casos, carências na gestão das rodovias hoje controladas por empresas privadas. Embora boa parte delas permaneça entre as melhores do país, não se justifica qualquer retrocesso, em especial quando se sabe que a sua qualidade se deve à existência de pedágio que a própria Confederação Nacional do Transporte considera elevado e que, em conseqüência, onera a produção. Citando uma vez mais o Presidente Clésio Andrade, “a CNT é favorável à privatização, mas considera exageradas as atuais taxas de pedágio”. Afinal, a população já paga numerosos tributos e entre as finalidades dessa receita está também a construção e preservação de rodovias.

            O simples fato de que as rodovias privatizadas estejam entre as melhores do País, por si positivo, implica uma constatação dolorosa. A lógica do mercado estimula o interesse do setor privado pelas rodovias que cortam as regiões economicamente mais fortes do País e, por isso mesmo, essas estradas ainda se encontram em melhor estado de conservação. O contrário ocorre nas regiões mais pobres: Norte e Nordeste. É de se pensar, portanto, que as condições da malha rodoviária acentuarão o impulso, cada vez mais perceptível, para o alargamento do abismo histórico entre as regiões ricas e as regiões pobres deste País.

            Sr. Presidente, a omissão dos responsáveis pelo patrimônio rodoviário brasileiro está conduzindo à sua perda. Está impondo custos maiores aos consumidores internos e aos exportadores, que deixam de obter as divisas de que o Brasil tanto precisa. Está atormentando a população que precisa do transporte rodoviário para se locomover, em especial para trabalhar. Está colocando óbices praticamente intransponíveis para o desenvolvimento nacional. E está, por fim, aprofundando os desníveis, já imensos, entre os ricos e pobres neste País.

            Os piores trechos das rodovias brasileiras estão localizados na região Nordeste. Nove entre dez das mais deterioradas estradas do País cortam o território nordestino. Esse quadro, nítido já nas pesquisas rodoviárias anteriores, agravou-se sensivelmente na versão 2000 desse estudo.

            Os dados da Pesquisa Rodoviária de 1999 proporcionavam-nos o consolo de que, considerando-se o conjunto da malha rodoviária brasileira, podia-se identificar alguma melhora nas condições de tráfego. De um ano para cá, registrou-se movimento contrário. As estradas voltaram a deteriorar-se. Todo o País perde com isso.

            As regiões mais pobres perdem ainda mais. Não apenas suas rodovias são as que apresentam mais significativo e acelerado processo de deterioração, como inexiste esperança de melhora. Os dados da Pesquisa Rodoviária contribuem para aumentar ainda mais essa preocupação.

            De um lado se mostra que as melhores rodovias, ainda que em estado pior que o registrado no ano passado, são as que passaram pelo processo de privatização. Inexiste interesse, por parte do setor privado, em adquirir o controle e a gestão das estradas do Nordeste. O retorno dos investimentos tende a ser menor. De outro lado, alegando carência de recursos, o Poder Público pouco fez para reverter a situação das rodovias localizadas nas regiões Nordeste e Norte.

            Uma vez mais, portanto, a Pesquisa Rodoviária da CNT confirma, com informações provenientes de um cuidadoso levantamento de campo, uma constatação que todo o povo do nosso Nordeste faz há longo tempo e que venho denunciando sem trégua. Comprova-se que não apenas o Governo está permitindo a dilapidação de um patrimônio que é de todo o povo brasileiro como, ao permitir que isso ocorra, está contribuindo para aprofundar ainda mais as desigualdades regionais. Compreendo os problemas de natureza orçamentária que afetam o Ministério dos Transportes e reconheço os esforços do Ministro Eliseu Padilha para fazer frente aos graves desafios que encontrou na Pasta. Mas a população quer respostas.

            A quem denuncia, quem critica, quem aponta erros administrativos costuma-se cobrar que aponte soluções. Neste caso, a solução é simples. Não depende, como se tornou moda dizer, de se apontar novas fontes de renda ou de se criarem novas - vale dizer, aumentar a já extorsiva carga tributária que pesa sobre os brasileiros. A solução, no caso, é muito simples. Basta que o Governo governe. Os impostos são pagos hoje pelos contribuintes na suposição, elementar, de que servirão ao menos para manter o patrimônio construído, no passado, pelos impostos então cobrados. Que isto seja feito.

            Agradeço a atenção do Ministro dos Transportes, ao mesmo tempo em que manifesto o desejo de que as providências por S. Exª comunicadas em seu aviso consigam, senão solucionar, ao menos amenizar os problemas enfrentados pelos que dependem das rodovias brasileiras. Espero, como todos os cidadãos deste País, que uma ação efetiva e um esforço cada vez maior do Poder Público consigam reverter o processo mostrado nas sucessivas pesquisas sobre as condições das estradas em nosso País.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR FREITAS NETO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

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            Modelo15/8/245:46



Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/02/2001 - Página 299