Discurso durante a 14ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DIFICULDADES PARA A INDUSTRIA ARTESANAL DE AGUARDENTE COM A IMPOSSIBILIDADE DE OPÇÃO PELO SIMPLES.

Autor
Ricardo Santos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo Ferreira Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • DIFICULDADES PARA A INDUSTRIA ARTESANAL DE AGUARDENTE COM A IMPOSSIBILIDADE DE OPÇÃO PELO SIMPLES.
Publicação
Publicação no DSF de 16/03/2001 - Página 3201
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, INDUSTRIA, AGUARDENTE, BRASIL, DETALHAMENTO, CARACTERISTICA, PEQUENA EMPRESA, MEDIA EMPRESA, EMPRESA, PARTICIPAÇÃO, PROGRAMA, EXPORTAÇÃO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), BENEFICIO, OPÇÃO, SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E DAS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (SIMPLES).
  • CRITICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), EXCLUSÃO, EMPRESA, ARTESANATO, AGUARDENTE, RECOLHIMENTO, SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E DAS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (SIMPLES), AUMENTO, TRIBUTAÇÃO, PROVOCAÇÃO, FALTA, VIABILIDADE, INDUSTRIA, EXPORTAÇÃO, EXPECTATIVA, REVISÃO, REEDIÇÃO, NORMA JURIDICA.

O SR. RICARDO SANTOS (PSDB - ES) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, permitam-nos abordar, nesta oportunidade, algumas características da indústria artesanal de aguardente no País, para inferir sobre os impactos da recente exclusão desse segmento da opção pelo SIMPLES, explicitada na Medida Provisória n.° 2033-39, de 21 de dezembro próximo passado.

O articulista da Veja, Luiz Felipe Alencastro, na edição de 7 de fevereiro deste ano, faz uma abordagem singular sobre o setor: “a cachaça dos engenhos e engenhocas coloniais terá sido o primeiro manufaturado americano e, certamente, o primeiro produto colonial brasileiro a desbancar similares europeus no mercado internacional”, ao se referir à preferência européia pela bebida, em detrimento da aguardente extraída da uva, no período colonial.

Perdemos, de há muito, essa posição conquistada no passado, mas vêm sendo implementados, nos últimos tempos e em vários Estados brasileiros, esforços importantes com vistas à reascensão internacional da aguardente, à semelhança do que fizeram os mexicanos com a “tequila” e os italianos com a “grappa”.

A indústria de aguardente não se encontra suficientemente dimensionada no País, mas se reconhece uma dicotomia nas plantas industriais, onde as grandes unidades respondem pela maior parcela da produção nacional e os pequenos e médios alambiques, formais e informais, não chegam a 40% da produção total.

O volume de produção nacional é de cerca de 1,3 bilhões de litros. Contudo, se a ela agregarmos o processamento informal, nada desprezível, a produção chega a alcançar 2 bilhões de litros anuais.

O impressionante, neste setor, é a participação da aguardente no consumo de destilados no Brasil. Levantamentos da ABRABE - Associação Brasileira de Bebidas, de 1996, mostravam que o consumo representava cerca de 20 vezes o consumo do segundo destilado mais vendido no País, o conhaque.

Dentre as principais características da indústria artesanal de aguardente, destacam-se:

§     São unidades de produção familiar com contratação de mão-de-obra complementar, tanto na produção da cana-de-açúcar, quanto nas atividades de moagem, fermentação, destilação, engarrafamento e distribuição;

§     A aguardente artesanal é processada em pequenas indústrias (alambiques), com capacidade de produção que varia de 10.000 a 100.000 litros anualmente, cuja infra-estrutura varia da mais simples até aquela de padrão mais elevado.

Estudo elaborado pelo Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais - INDI, em 1982, revelou que a agroindústria de aguardente representava importante segmento da atividade rural mineira, contudo marginalizado pelas políticas de desenvolvimento. Desse entendimento, resultou um esforço estadual para melhorar a cadeia produtiva e, em especial, a qualidade da aguardente mineira e sua distribuição, tanto no mercado interno, quanto no externo. Esse trabalho rendeu frutos e permitiu a reconquista do prestígio da aguardente artesanal mineira, hoje amplamente reconhecida pelos principais veículos de comunicação do País.

Com a inclusão da aguardente entre os 62 produtos prioritários no Programa Especial de Exportações do País, implementado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, vários Estados brasileiros, em atuação conjunta com instituições de capacitação e fomento, passaram a conceber programas voltados para o desenvolvimento da cachaça artesanal, com participação efetiva dos produtores, centrados, basicamente, nos aspectos de qualidade do produto e organização do mercado, tanto para distribuição interna quanto para exportação.

Seguindo essa nova tendência, pela primeira vez na história do desenvolvimento rural capixaba, a produção de aguardente passou a receber apoio oficial, envolvendo instituições do poder público, como a Delegacia Federal da Agricultura no Espírito Santo, a Secretaria de Estado do Planejamento, a Secretaria de Estado da Agricultura, o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural e o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Espírito Santo.

O Espírito Santo também carece de informações quantitativas mais apuradas sobre a indústria artesanal de aguardente. O número de estabelecimentos estimados é da ordem de 320 alambiques, entre formais e informais, sendo aproximadamente 120 formais, ou seja, registrados no Ministério da Agricultura e do Abastecimento. São, na maioria absoluta, pequenos estabelecimentos, instalados em áreas rurais, que ocupam, no processo de produção local, cerca de 6.000 pessoas, produzindo entre 10.000 e 20.000 litros/safra.

Na verdade, os problemas de natureza tecnológica, a pequena escala de produção, a concorrência com aguardentes do setor informal, inclusive de outros Estados, e a pesada carga tributária incidente sobre o setor caracterizavam o quadro de crise com que se defrontavam os produtores de cachaça artesanal no Espírito Santo.

Neste sentido, a oportunidade de opção pelo SIMPLES - Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, criado pela Lei Federal 9.317/96, e a redução da alíquota estadual de ICMS de 25% para 7%, em 1999, permitiram certo alento aos produtores.

O interesse dos microempresários produtores de aguardente no Espírito Santo em melhorar os padrões de qualidade e a escala de comercialização se expandiu ainda mais a partir da inclusão do produto no Programa Especial de Exportações do Governo Federal e das ações estaduais de desenvolvimento da cachaça artesanal, levando à organização de duas cooperativas, a UNICANA - Cooperativa dos Produtores de Cachaça do Espírito Santo, reunindo os fabricantes da região de São Roque do Canaã e a COOPAS-ES - Cooperativa dos Produtores de Aguardente do Sul do Espírito Santo, com sede em Cachoeiro de Itapemirim.

O SIMPLES privilegiou as pequenas e médias empresas de todo o País, sobretudo por diferenciá-las das empresas de grande porte, proporcionando para os optantes uma carga tributária mais justa, não só sobre o seu faturamento total mas também sobre a folha de pagamento de seus funcionários.

Com a indústria artesanal de aguardente não foi diferente: a opção pelo SIMPLES e as expectativas favoráveis decorrentes de sua inclusão no Programa Especial de Exportações, deu inicio ao seu processo de organização, modernização de alambiques e aumento da produtividade industrial, preparando-a para uma iniciativa importante: a exportação.

Entretanto, a reedição da Medida Provisória n.º 2033-39, de 21 de dezembro de 2000, no seu artigo 14, exclui a indústria artesanal de aguardente da opção pelo SIMPLES. Como decorrência, todos os benefícios oriundos do regime tributário especial se extinguiram, passando essa indústria a ser tratada como as grandes empresas de bebidas.

O impacto da exclusão do SIMPLES atinge a indústria artesanal de aguardente em três pontos cruciais:

§     Aumenta o recolhimento de tributos incidentes sobre o faturamento, como o PIS, o COFINS e o IPI;

§     Aumenta o recolhimento de tributos incidentes sobre o lucro, como a Contribuição Social e o Imposto de Renda;

§     Aumenta os recolhimentos incidentes sobre a folha de pagamento, em especial o INSS da empresa e de terceiros e suas incidências sobre férias e 13° salário.

Simulações realizadas pela Cooperativa dos Produtores de Aguardente do Sul do Espírito Santo mostram que para uma empresa com nível de produção mensal de 12.000 litros, 4 funcionários e faturamento total de R$ 10.080/mês, haveria um aumento de 787% nos tributos incidentes sobre o faturamento e o lucro. A carga tributária sobre a folha de pagamento seria 400% superior àquela existente à época do recolhimento pelo SIMPLES.

A exclusão da industria artesanal de aguardente da opção pelo SIMPLES traz, em si, contradições profundas:

Em primeiro lugar, o Poder Executivo, ao instituir o Programa Especial de Exportações e nele incluir a aguardente entre os produtos a serem estimulados, não poderia excluir da opção do SIMPLES as pequenas e médias indústrias de aguardente.

Em segundo lugar, entendemos que as renúncias fiscais e previdenciárias nunca serão corrigidas com medidas tópicas dessa natureza.

Em terceiro lugar, a produção de aguardente artesanal reflete muito bem o que se passa na pequena produção rural: são também pequenos industriais, muitos na informalidade, com poucas chances de se regularizar. O SIMPLES vinha permitindo a redução do nível de informalidade das empresas e, no mercado de trabalho do meio rural, a criação de novos empregos - uma prioridade absoluta para o País, refutada com uma simples alteração de Medida Provisória.

Nossa esperança, Srªs. e Srs. Senadores, é a de que a correção desse ato inoportuno possa ser rápida. Para isto, estamos nos articulando com as bancadas de outros Estados, com a Confederação Nacional da Agricultura, com a Confederação Nacional da Indústria e também com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, para que seja reeditada nova Medida Provisória, corrigindo este erro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/03/2001 - Página 3201