Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CRITICAS AOS PRIVILEGIOS FISCAIS CONCEDIDOS PELO GOVERNO FEDERAL AS ENTIDADES FILANTROPICAS.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • CRITICAS AOS PRIVILEGIOS FISCAIS CONCEDIDOS PELO GOVERNO FEDERAL AS ENTIDADES FILANTROPICAS.
Aparteantes
Edison Lobão.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2001 - Página 3780
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • NECESSIDADE, PROVIDENCIA, GOVERNO, RELAÇÃO, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, RESPOSTA, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA, ESPECIFICAÇÃO, ATENÇÃO, RENOVAÇÃO, CONCESSÃO.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, ESTADO, BRASIL, FAVORECIMENTO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, ESPECIFICAÇÃO, SUBSIDIOS, GRUPO ECONOMICO, CLASSE SOCIAL.
  • ELOGIO, URGENCIA, WALDECK ORNELAS, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA E ASSISTENCIA SOCIAL (MPAS), RESPOSTA, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, ISENÇÃO FISCAL, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE.
  • REGISTRO, DADOS, RENUNCIA, CONTRIBUIÇÃO, COTA PATRONAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS).
  • SOLICITAÇÃO, MOREIRA MENDES, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), JULGAMENTO, MERITO, CONTESTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RELAÇÃO, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, DEFESA, ORADOR, RESTAURAÇÃO, EFICACIA, LEI FEDERAL, COMBATE, APROPRIAÇÃO, DINHEIRO, SETOR PUBLICO, LUCRO, EMPRESA.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero reportar-me, dando continuidade a uma intervenção que fiz há um ano, à situação em que vivem as instituições filantrópicas no Brasil e ao papel da política de gestão do Governo Federal em relação a essas instituições.

Observamos, na ordem do dia da imprensa brasileira, escândalos como o da Legião da Boa Vontade, que transmitem ao Governo brasileiro a necessidade de tomarmos, mais do que nunca, uma providência rápida. E agora o Brasil tem em suas mãos essa oportunidade, pois é a fase de renovação de concessão às instituições filantrópicas.

Trata-se de um assunto da maior gravidade, que impõe uma medida de Governo à altura da moralidade e do interesse público, conhecendo-se a escassez de recursos existentes no País.

O Estado brasileiro tem sido, historicamente, agente concentrador de renda. Não é à toa que somos, já há muito tempo, uma das três sociedades campeãs do mundo em desigualdade social. Por razões de formação histórica e de valores culturais herdados, por razões de incompetência administrativa e de ineficiência do Poder Judiciário - razões que ultrapassam em muito o escopo deste breve discurso -, o Estado tem sido, entre nós, presa fácil das elites e da burocracia nele instalada, patrimônio sem dono, pronto a ser apropriado pelo mais rápido ou pelo mais esperto. A coisa pública - a res publica dos romanos -, aqui, não é o que é de todos, mas o que não pertence a ninguém. Se não é de ninguém, quem chegar primeiro pega. Essa, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores - é lamentável admitir -, tem sido a mentalidade que impera no Brasil em relação à coisa pública.

Quem se beneficia mais do patrimônio público - é natural que seja assim, natural no sentido sociológico - é quem tem mais poder. Portanto, os grandes grupos empresariais, os grandes grupos financeiros, os grandes grupos políticos, são os que mais espoliam o Estado. E sobra também um pouco para a nossa classe média, que, neste imenso País de miseráveis, também faz parte da elite. Muitas vezes essa espoliação de que lhes falo se dá de forma perfeitamente legal. Outras vezes, ela acontece de forma ilegal: é a sonegação de impostos, é o roubo, por exemplo. A tudo isso nossa Justiça assiste com olhar tímido e complacente.

Assim, os subsídios a grupos econômicos; a elisão e a sonegação fiscal; os incentivos e rebates fiscais excessivos; os subsídios à moradia dos ricos, como é o caso de grande parte do passivo do Fundo de Compensação das Variações Salariais; os descontos no Imposto de Renda da classe média, relativos a gastos com planos de saúde privados e ensino privado; as indenizações milionárias por desapropriações de terras; e, é claro, a corrupção pura e simples, tudo isso se vai avolumando num montante que é apropriado pelas classes favorecidas. Tudo isso, em última análise, é pago pelo povo brasileiro, na forma de impostos. Está formado, então, o quadro no qual os recursos do País são transferidos dos pobres aos ricos; quadro no qual o Estado cumpre papel primordial; quadro, enfim, que faz esta sociedade tão desigual, que nos repugna aos que temos consciência social e um pingo de sentimento de solidariedade.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos exemplos mais flagrantes de transferência de recursos públicos, pertencentes a todos os brasileiros, para estratos privilegiados da sociedade é o das chamadas entidades filantrópicas. Não é de hoje que me tenho preocupado com esse tema, que é o que venho tratar no presente discurso.

Em setembro do ano passado, formulei requerimento ao Ministério da Previdência e Assistência Social, no qual solicitei informações sobre isenções fiscais concedidas a entidades filantrópicas. Gostaria de registrar que o Ministro Waldeck Ornelas, por ocasião de seu regresso ao Congresso Nacional, fez um belíssimo, claro e profundo discurso, analisando a situação da Previdência Social no Brasil e externando a mesma preocupação com essa situação de privilégio das entidades filantrópicas. Por razão de justiça, faço esse reconhecimento a S. Exª, que prontamente respondeu ao requerimento de informações que solicitei, quando ainda de sua gestão como Ministro de Estado.

Como se sabe, o § 7º do art. 195 da Constituição Federal concede isenção de contribuição para a seguridade social às entidades beneficentes de assistência social. Isso significa que essas entidades, chamadas geralmente de filantrópicas, não recolhem os 20% sobre a folha de salário, que seria a contribuição patronal devida ao INSS, nem as contribuições destinadas à seguridade social, que são administradas pela Receita Federal: a Cofins e a Contribuição Social sobre o Lucro.

Tendo perguntado quanto as entidades filantrópicas deixaram de recolher à Previdência nos últimos dez anos, fiquei sabendo que somente existem dados a partir de 1997. Para antes de 1997, fazem-se estimativas, pois ainda não havia registro de informação centralizado e sistematizado no Ministério. Vejam com que negligência é tratado o dinheiro público! Somente a partir de 1997 - há apenas quatro anos, portanto -, passamos a dispor de números confiáveis sobre a isenção da contribuição patronal ao INSS. Isso, sem contar que, antes de 1991, não havia necessidade sequer de que o Poder Público reconhecesse alguma entidade como filantrópica! Qualquer entidade podia intitular-se beneficente, deixar de recolher as contribuições, manter a documentação pertinente e esperar por uma fiscalização que muito dificilmente vinha.

            De qualquer forma, vamos aos números da isenção. Citarei apenas os referentes a 1997 para cá, por serem mais confiáveis. Em 1997, renúncia de R$1,27 bilhão; em 1998, R$1,38 bilhão; em 1999, R$1,5 bilhão. Para o ano 2000, o que existe é a projeção de R$1,7 bilhão. Notem que esses números - R$1,5 bilhão, em 1999, por exemplo - referem-se à renúncia da contribuição patronal ao INSS. Não incluem a Cofins, nem a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, contribuições, como lembrei, arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal.

Para se ter idéia da magnitude dos R$1,5 bilhão que deixaram de ser arrecadados pelo INSS em 1999, em função da isenção concedida às entidades filantrópicas, mantenhamo-nos no terreno da seguridade social, mais especificamente no terreno da assistência social, que é o que tais entidades reivindicam prestar à população.

Esse valor de R$1,5 bilhão foi justamente o orçamento do maior programa federal, hoje em curso, de assistência social, que é o chamado Programa de Benefício de Prestação Continuada. Tal programa beneficia idosos com 67 anos de idade ou mais, além de portadores de deficiência física cuja família tenha renda per capita inferior a um quarto de salário mínimo. Hoje, são um milhão de brasileiros que ganham mensalmente esse benefício de um salário mínimo. Ora, o dinheiro que fica com as entidades filantrópicas, só na parte que cabe ao INSS, daria para dobrar os recursos do programa federal de assistência social! Ou esse milhão de brasileiros - nem digo pobres, mas miseráveis - beneficiados pelo programa passariam a receber dois salários mínimos em vez de um, ou, então, outro milhão de brasileiros idosos e deficientes poderiam ser incluídos no programa, mantido o valor atual do benefício. Seguramente, não é pouca coisa!

Ora, estaria tudo bem se as supostas entidades filantrópicas prestassem, de fato, serviços relevantes de assistência social à população brasileira. Muitas delas, tenho certeza, efetivamente o fazem. Faço questão de destacar as entidades religiosas, oriundas da Igreja Católica e de outras igrejas, que prestam, historicamente, um serviço de solidariedade, verdadeiramente humanitário, aos mais excluídos da sociedade brasileira. Mas existem muitas, inúmeras que se escondem por detrás da fachada de beneficentes, mas que, na verdade, são empresas privadas como outras quaisquer, que buscam o lucro tão-somente, engordando-o à custa dos impostos e das contribuições que deixam de recolher aos cofres públicos. Todos estamos fartos de saber disso! O problema é que, dada a situação jurídica atual, não se pode separar o joio do trigo. Não se pode saber, de antemão, quem é quem.

Em discurso proferido por mim no dia 25 de agosto do ano passado, motivado por reportagem sobre esse tema, publicada no Jornal do Brasil, mencionei algumas empresas que ostentam o título de beneficentes, conferido pelo Poder Público, mas que, na verdade, estão longe de o serem. Nada mais fiz do que retirar alguns nomes da lista incluída na referida reportagem, na maior parte nomes de instituições de ensino e de hospitais. Citei, por exemplo, o Hospital Albert Einstein, sediado em São Paulo, que conheço bem e que se beneficiou, em 1999, da isenção de R$22 milhões: um hospital em que pobre não entra, um hospital para pessoas muito ricas, um hospital com todas as características de vanguarda, com atendimento sofisticado e de alta tecnologia, no Brasil. Comparei os R$22 milhões que o Albert Einstein deixou de recolher aos cofres públicos com os R$6 milhões que são o orçamento anual do Hospital de Base de Brasília, no Distrito Federal, que atende à população pobre pelo SUS, o Sistema Único de Saúde. A lista de entidades filantrópicas apresentada pela reportagem trazia muitas outras empresas de ensino e de saúde freqüentadas exclusivamente pela elite mais abastada do País.

E assim se dá aquele fenômeno de transferência perversa de renda a que aludi no começo deste discurso: o Estado tira dinheiro da população como um todo - isenção fiscal é apropriação privada de dinheiro público - e o transfere aos estratos privilegiados.

Sr. Presidente, com a intenção de coibir os flagrantes abusos que acabo de mencionar, abusos inaceitáveis, representados pela concessão de status de beneficentes a empresas que nenhum serviço de assistência social prestam à população e que acabam por prejudicar as verdadeiras entidades beneficentes que existem e são importantes, o Ministério da Previdência e Assistência Social propôs nova legislação, que foi aprovada pelo Congresso Nacional há dois anos. Trata-se da Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998.

Essa lei tornou mais rígidos os critérios para a concessão de isenção fiscal a entidades que se proclamam beneficentes. Passou a exigir, por exemplo, não apenas que a entidade promova a assistência social beneficente, mas que essa assistência se dê de forma gratuita e exclusiva. Definiu, também, o que vem a ser assistência social, embora, no meu entender, ainda de maneira demasiadamente ampla e leve, eu diria no melhor dos termos. E, muito importante, exigiu que as entidades filantrópicas que atuam na área de Saúde destinem pelo menos 60% dos leitos disponíveis ao atendimento pelo SUS. Estou tomando, é claro, o adjetivo “filantrópico” como sinônimo de “beneficente”, como é o uso na imprensa.

Em estudo solicitado por mim à Consultoria Legislativa desta Casa, as modificações na legislação resultantes da referida lei foram consideradas satisfatórias. A consultora que elaborou o estudo, especialista na área de Previdência, emitiu a opinião de que a lei atende o objetivo de conceder isenção fiscal somente às entidades que efetivamente prestam assistência social à população.

Ocorre, entretanto, que essa lei - a Lei nº 9.732, de 1998 - foi contestada no Superior Tribunal Federal pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços. Essa confederação moveu contra a lei a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.028-5. A ação ainda não foi julgada em seu mérito, mas foi concedida liminar a favor da confederação pelo Supremo Tribunal Federal, com base no relatório do Exmº Ministro Moreira Alves. Os efeitos da nova lei, portanto, encontram-se suspensos.

Pelo que pude apreender a respeito da liminar concedida, o Ministro considerou uma questão de mérito e uma de forma. A de mérito diz respeito à exclusividade que a nova lei impõe à prestação de serviços de assistência social às entidades filantrópicas. O Ministro entendeu que pode haver entidade filantrópica mesmo que não se caracterize essa exclusividade. A de forma refere-se a um vício de forma, pois, ao tratar de matéria que envolve limitação ao poder de tributar, a nova lei deveria ser complementar, como manda a Constituição, e não ordinária, como efetivamente o é. Embora o Ministro deixe bem claro que tais conclusões são preliminares, como é natural em se tratando de liminar, não resta dúvida de que são indicações sobre qual será o julgamento do mérito da ação de inconstitucionalidade.

De minha parte, uma vez conhecido o julgamento definitivo do Supremo Tribunal Federal, estou disposto a trabalhar para que a Lei nº 9.732, de 1998, seja restaurada em sua eficácia, sem excluir eventuais aperfeiçoamentos. Se existirem dispositivos inconstitucionais nela, que sejam modificados, desde que isso não implique abandono do seu objetivo maior, que é o de moralizar a concessão do estatuto da entidade beneficente. Caso contrário, que se emende a própria Constituição. Se, por sua vez, a forma requerida constitucionalmente for a de lei complementar, que a proposta tramite dessa forma no Congresso Nacional.

O que não pode continuar é essa pouca-vergonha que há hoje, esse desrespeito com o dinheiro público, esse pouco caso com os brasileiros realmente necessitados! Muitas das entidades filantrópicas que hoje fazem jus à isenção de contribuições fiscais só são beneficentes para seus próprios donos! É apropriação escandalosa da coisa pública! Isso não pode continuar! É inaceitável!

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Tião Viana?

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Ouço, com muita satisfação, o seu aparte, eminente Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - V. Exª aborda um tema de extrema curiosidade até para os brasileiros. Em verdade, não diria que há uma situação de descalabro em relação às entidades filantrópicas, mas seguramente de inúmeros desvios, que, de fato, precisam ser corrigidos. Perder a Previdência Social, por ano, algo em torno de R$1,7 bilhão, como aconteceu em 2000, é de fato uma evasão de divisas nacionais de grande envergadura, e a Previdência não está em condições de conceder tais favores, a não ser que esses recursos sejam verdadeiramente aplicados em benefício da sociedade brasileira. Mas V. Exª declara que não estão sendo rigorosamente aplicados nesse sentido. Conheço entidades, como as APAEs, que cumprem maravilhosamente bem o seu papel. Estou seguro de que outras entidades também o fazem, mas infelizmente nem todas. Quanto ao Hospital Albert Einstein, instituição de nível elevado, perdoe-me discordar de V. Exª por um aspecto único. Em verdade, é um hospital de grande envergadura, porém ele se transformou em um centro de ciência, de descobertas para a saúde no Brasil. Aquele hospital é um dos melhores do mundo hoje e o que se faz ali, em matéria de laboratórios, de pesquisas, serve para os demais hospitais brasileiros e contribui para que a medicina no Brasil vá cada vez avançando mais. Nos países mais desenvolvidos do mundo o poder público financia tais centros de pesquisa fortemente para que ele desenvolva esse tipo de papel. Aqui não é exatamente assim. O Hospital Albert Einstein se beneficia realmente desses pequenos recursos - e V. Exª já anunciou, são vinte e poucos milhões, o que não é muita coisa diante de um bilhão e setecentos milhões -, mas com resultados expressivos e visíveis em matéria de contribuição para a ciência médica no Brasil. A mesma coisa acontece com o Incor, que também faz esse papel na sociedade. Portanto, eu não poderia deixar de dar essa palavra ao discurso de V. Exª, com o qual, no geral, estou de acordo. Entretanto, em relação ao Hospital Einstein, ao Incor e a outros centros de pesquisa, V. Exª me permita discordar em razão dos argumentos que aqui expendi.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço ao Senador Edison Lobão pela manifestação, que só vem enriquecer o meu pronunciamento. Pela clareza com que expressa o seu raciocínio, não deixa dúvida de que estamos pensando da mesma maneira no conteúdo, com distinções em relação a alguns aspectos do meu discurso. Citei, como ilustração ao meu pronunciamento, apenas o Hospital Albert Einstein porque julgo ser um caso típico, já que todos conhecem, como seguramente V. Exª, a qualidade do atendimento prestado e a visão de tecnologia avançada que esse hospital reúne. Mas analiso com uma visão de prioridade, Senador Edison Lobão. Não podemos mais entender este País esquecendo as necessidades fundamentais da nossa sociedade. O Instituto do Coração, Incor, por sua vez, tem também o privilégio de algum beneficiamento fiscal, mas seguramente consegue cumprir um papel ético, porque 80% do seu atendimento é para a população carente. O Hospital Albert Einsten raramente faz isso e, quando o faz, é por amostragem. Então, em que pese o respeito por ser uma unidade de tecnologia avançada, um hospital de vanguarda na América Latina e um dos melhores do planeta, entendo que o Governo Federal tem outras prioridades na aplicação dos seus recursos quando tratar de isenção fiscal, porque temos de trabalhar de maneira sagrada com cada centavo desses recursos.

Se o Hospital Albert Einstein já recebe doações da comunidade israelita e de diversas outras origens, talvez esse dinheiro pudesse ser melhor aplicado em outra finalidade. Entendo perfeitamente a importância que ele tem no cenário da saúde do Brasil, mas não posso imaginar uma situação semelhante, como, por exemplo, o colégio com a maior mensalidade do Rio de Janeiro ser privilegiado também com isenções fiscais. Não consigo imaginar isso como típico de uma visão de horizontalização de interesses e de senso de prioridade em atendimento às necessidades da população.

Ocorreu agora esse escândalo da Legião de Boa Vontade no Brasil, que reflete o quanto esse sistema anda malconduzido, seguindo caminhos tortuosos em busca de resultados para com a sociedade. O sacrifício que tivemos para aprovar os R$4 bilhões para o Programa de Combate à Pobreza é um reflexo do que poderíamos fazer com quase R$2 bilhões se tivéssemos destinado esses recursos para o atendimento às necessidades da população. Assim, embora respeitando as divergências do aparte, entendo que o Brasil precisa ter outras prioridades.

Dessa forma, Sr. Presidente, encerro este discurso fazendo um apelo a S. Exª o Ministro Moreira Alves, do Supremo Tribunal Federal, para que julgue o mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2028-5 o mais rápido possível. Com base no seu julgamento, poder-se-ão tomar as iniciativas legislativas cabíveis para o aperfeiçoamento da legislação que regula a isenção fiscal a entidades filantrópicas. A concessão da liminar pelo STF foi publicada no Diário da Justiça do dia 16 de junho do ano passado. Enquanto não se realiza o julgamento do mérito da ação, quem se preocupa com esse assunto fica de mãos atadas, aguardando uma decisão. Enquanto isso, os donos desses estabelecimentos, que visam tão-somente o lucro, continuam se apropriando do dinheiro público!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para melhorar a distribuição de renda no Brasil, para deixarmos de nos envergonhar de ser esta Nação dividida entre abastados e miseráveis, é necessário desmontar os mecanismos existentes dentro do Estado brasileiro que transferem a renda dos pobres aos ricos. Sem dúvida alguma, a falta de critério e de rigor na concessão de isenção fiscal a supostas entidades filantrópicas é um desses mecanismos; uma forma de apropriação do dinheiro do povo por pessoas ricas e, algumas vezes, muito ricas. Não podemos transigir com um absurdo desses!

O Estado brasileiro deve ser transformado em agente distribuidor de renda, deixando de ser, como é hoje, agente concentrador de renda.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR TIÃO VIANA EM SEU PRONUNCIAMENTO:

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2001 - Página 3780