Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ANALISE DA RENUNCIA DO MANDATO DO EX-SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES SOB A PERSPECTIVA DE FUGA DO PROCESSO DE CASSAÇÃO.

Autor
Roberto Freire (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Roberto João Pereira Freire
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • ANALISE DA RENUNCIA DO MANDATO DO EX-SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES SOB A PERSPECTIVA DE FUGA DO PROCESSO DE CASSAÇÃO.
Aparteantes
Hugo Napoleão.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2001 - Página 10774
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • CRITICA, DISCURSO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, EX SENADOR, TENTATIVA, ALEGAÇÕES, SUPERIORIDADE, MORAL, VIDA PUBLICA, RENUNCIA, MANDATO PARLAMENTAR, PREVENÇÃO, CASSAÇÃO, DIREITOS POLITICOS.
  • DEFESA, SENADO, CONSELHO, ETICA, ACUSAÇÃO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, EX SENADOR.

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, houve uma outra oportunidade aqui, quando o Senador Antonio Carlos Magalhães - S. Exª era Presidente da Casa à época - fez um discurso justificando o seu pedido de criação de uma CPI do Judiciário, que causou um impacto muito grande, e, tão logo terminou o discurso, subi a esta tribuna para contestar, nos termos em que era colocada. Felizmente, no desenrolar dos trabalhos, houve correção de rumos, porque aquela CPI não era para apurar nenhuma sentença, pois não cabia investigar nenhuma sentença; era, evidentemente, um atentado a princípios democráticos. A correção de rumos foi para discutir ações administrativas em relação àquilo que pode ser fiscalizado pelo Poder Legislativo.

Só que, naquela oportunidade, comecei a falar contestando, e o então Presidente desta Casa, Senador Antonio Carlos Magalhães, retirou-se e não consegui criar nenhum contraditório. E olhe que, naquela época, talvez fosse muito difícil, pois todos apoiavam. Até V. Exª criou uma outra CPI para contrabalançar um pouco o poder que, à época, o Sr. Antonio Carlos Magalhães tinha.

O que estamos vendo hoje? Ele assoma à tribuna, pronuncia um discurso de renúncia para fugir a um processo de cassação e, evidentemente, tenta justificar, com os vários tipos do que poderiam ser ações reconhecidas, sérias, meritórias, o fato de tentar se livrar de um processo por ação indecorosa: a violação do painel do Senado Federal, infringindo não apenas o decoro da Casa, mas o Código Penal, em crime de prevaricação. Assim age numa inversão de valores e passa para a sociedade a impressão de que o culpado foi o voto do Senador Ramez Tebet, da Senadora Heloísa Helena, de uma lista que ninguém viu, que ele violou, algo que é a materialidade do seu atentado ao decoro, do seu crime: uma lista que ninguém viu e que utiliza para chantagem, como se os que votaram fossem culpados de alguma coisa.

Pode-se ter o juízo de valor que se quiser. Que se desconfie do voto da Senadora Heloísa Helena, que se discuta o voto do Senador Ramez Tebet, o meu ou o de quem quer que seja. Ninguém cometeu nenhum crime. O Senador Antonio Carlos Magalhães cometeu. Há uma inversão de valores. E vem aqui como se fosse o campeão da moral, inclusive para um Governo a quem serviu. E eu poderia até dizer: se não denunciou ações que julga imorais, indecentes e até criminosas do Governo, mais uma vez comete crime de prevaricação, porque ele não era um militante qualquer deste Governo, ele era um dos principais Líderes que apoiaram a privatização, que aqui critica. Quem criticava isso era a Oposição, não era o Sr. Antonio Carlos Magalhães. E essa inversão de valores era o que me indignava.

Eu não quero falar mais de coisas do passado, para que o Senador Hugo Napoleão não precise, em nome do PFL, ficar defendendo. Eu estou apenas fazendo aqui um registro.

O Sr. Hugo Napoleão (PFL - PI) - Se V. Exª me conceder o aparte, eu aceito.

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - Claro que eu concederei, porque, diferentemente do Sr. Antonio Carlos Magalhães, eu não nego aparte a ninguém.

Eu quero dizer que aqui precisa ficar registrado para a Casa e não apenas para a imprensa no dia-a-dia, porque tudo o que estou dizendo agora eu disse lá fora. A renúncia não tem nenhum motivo nobre; é mera fuga, tal como os “anões do Orçamento” fizeram, para evitar o processo de cassação. A sociedade brasileira precisa entender isso. E nem esta Casa vai receber lição de moral do Sr. Antonio Carlos Magalhães. E o pior - aí vem a indignação - é que, naquele momento, tivemos que ouvir calados, porque ele não permitia apartes. Eu fiquei inquieto e não queria que passasse, mesmo sem a presença dele, o que para mim não é estranho. Hoje, felizmente, não mais Senador, mesmo que os efeitos só existam a partir da publicação, ele renunciou, é um ato unilateral, e já se foi. Mas eu nunca tive um bom debate com ele, porque isso não aconteceu na CPI do Judiciário e não aconteceu na acareação. É fácil dizer que eu fui contra o Fundo de Pobreza, que eu fui contra o salário mínimo. Eu não fui contra coisa alguma. Eu fui contra o Fundo de Pobreza dele, que era um atraso, que era assistencialismo e que em boa hora o Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso corrigiu rumos, também. Esse debate não se pode ter. Talvez eu possa ter com interposta pessoa, mas, evidentemente, são pessoas distintas, inclusive na sua formação democrática e ética.

            Ouço o Senador Hugo Napoleão.

O Sr. Hugo Napoleão (PFL - PI) - Muito obrigado, Senador Roberto Freire. Eu ia me retirar por alguns instantes do plenário, juntamente com o Senador Bello Parga, com quem eu ia tratar por alguns momentos de um assunto partidário, quando V. Exª dirigiu-se à tribuna e chamou-me à colação, pedindo minha presença, e, portanto, aqui estou. Devo dizer a V. Exª que nos conhecemos há 26 anos. Chegamos com o Presidente da Casa à Câmara dos Deputados e, de lá, sabe V. Exª que somos todos afeitos ao debate. Há controvérsia, há o debate tranqüilo ou o debate às vezes mais agitado. Quero dizer que o julgamento, a meu ver, do Senador Antonio Carlos Magalhães, no Conselho de Ética, é um julgamento político, e entendo que esta é uma Casa política e que a renúncia dele também foi um gesto político, como tem sido durante toda a sua vida. O que pessoalmente lamento é que V. Exª teve todo o tempo do mundo, até hoje, para dizer isso, e, justamente, é o mesmo reparo que venho fazer: quando ele vira as costas, então, há um verdadeiro ataque àquele que não tem mais o direito de se defender nesta Casa. É o reparo que faço.

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - Aceito o reparo de V. Exª apenas como um desencargo do cargo de Líder, porque é profundamente injusto em relação a mim falar que aguardo que o Sr. Antonio Carlos Magalhães saia para dizer o que estou dizendo. É profundamente injusto, Senador Hugo Napoleão.

O Sr. Hugo Napoleão (PFL - PI) - E não está sendo assim?

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - Não, desculpe-me. Tudo isso que estou dizendo eu disse na frente dele. E subi aqui lamentando não poder fazê-lo. Uma coisa que não me falta, e nunca me faltou aqui, porque, desta tribuna, desde o início, quando o Sr. Antonio Carlos Magalhães foi eleito Presidente desta Casa, com seu gesto de prepotência, de passar quase um carão no Presidente do Supremo Tribunal Federal, eu disse que isso talvez fosse algo que precisasse ser coibido. Eu não preciso estar dizendo daqui algo que não tenha dito na frente do Sr. Antonio Carlos Magalhães. Lamento não poder dizer sempre. Agora, não ia passar para a história coisa que ele pretende no seu discurso...

O Sr. Hugo Napoleão (PFL - PI) - Tanto melhor para V.Exª então.

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - ... nos Anais, parecer que ele pode dar uma lição de moral em todos. Chamar o Senador Roberto Saturnino de faccioso, indecoroso! Como? Ouvirmos calados? Que pelo menos dos Anais conste, já que ele aqui não pode responder, mas vai responder, porque a imprensa lhe dá tremendo espaço, não vai deixar de responder. O que eu queria é que não constasse dos Anais do Senado apenas o seu discurso para tentar justificar uma renúncia como um gesto nobre, quando se trata de uma fuga para evitar o processo de cassação. Não me estendi para fazer uma análise do Senador Antonio Carlos Magalhães. Eu o fiz apenas para que seu discurso tenha a contestação devida, até para que nos Anais desta Casa não conste que o Senado ouviu uma lição de moral de quem não tem, particularmente neste momento, de quem deu um parecer de vestal e quis parecer alguém que pode dar conselhos. Respeito sua derrota, mas não posso permitir que, por calarmos, esta possa ser transformada em vitória. O Sr. Antonio Carlos Magalhães renunciou para fugir ao voto consciente deste Plenário acerca do seu gesto objetivo, apurado em perícia e reconhecido por todos, de ter violado o sigilo do voto nesta Casa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2001 - Página 10774