Discurso durante a 68ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A EXPLOSÃO E O CRESCIMENTO DA VIOLENCIA URBANA.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • PREOCUPAÇÃO COM A EXPLOSÃO E O CRESCIMENTO DA VIOLENCIA URBANA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2001 - Página 12616
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ROMERO JUCA, SENADOR, REGISTRO, AUSENCIA, MELHORIA, TELEFONIA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO.
  • GRAVIDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, BRASIL, SUPERIORIDADE, ESTATISTICA, HOMICIDIO, ORIGEM, MODELO ECONOMICO, LIBERALISMO.
  • ANALISE, INSUCESSO, CRESCIMENTO ECONOMICO, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA, DESEMPREGO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, REDUÇÃO, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL, AMPLIAÇÃO, EXCLUSÃO, CLASSE SOCIAL, PROVOCAÇÃO, VIOLENCIA.
  • NECESSIDADE, COMBATE, ORIGEM, VIOLENCIA, REDUÇÃO, PODER, CRIME ORGANIZADO.
  • CRITICA, GOVERNO, AUSENCIA, IMPLEMENTAÇÃO, PLANO NACIONAL, SEGURANÇA PUBLICA.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de dizer ao Senador Romero Jucá que o meu Estado não teve a mesma sorte que Roraima, porque, com a privatização da Telerj, no Estado do Rio de Janeiro, a situação piorou. Recebemos uma prestação de serviço pior do que antes. Houve um aumento nas tarifas e a situação continua cada vez mais caótica. Temos os apagões da Light e os “caladões” da Telemar.

Mas outro assunto me traz à tribuna e também está relacionado às comunicações e aos apagões: a violência urbana. Esta questão traz para toda a sociedade brasileira, os que habitam as grandes cidades do País e as regiões metropolitanas, uma preocupação. A violência aumenta cada dia mais.

Costumo dizer que o Brasil vive uma guerra civil não declarada, porque a quantidade de pessoas assassinadas, o número de homicídios que ocorrem nas grandes cidades e nas regiões metropolitanas é maior do que se estivéssemos numa guerra. Os números demonstram essa realidade. Em vários países em que houve guerras nos últimos tempos a quantidade de assassinatos foi menor que a de assassinatos que ocorrem no Brasil hoje.

O Brasil assistiu, nos anos 90, a uma explosão da violência urbana. É comum, nas pesquisas de opinião junto às comunidades, que o fenômeno da violência e da criminalidade ocupe papel de destaque nas preocupações das pessoas.

Efetivamente, nossos índices de violência são estarrecedores. No primeiro semestre de 1999, por exemplo, foi de 23 mil o número de homicídios no Brasil. Isso nos permite estimar em torno de 50 mil o número de homicídios, por ano, em nosso País.

Sr. Presidente, para comparar, a guerra civil na Colômbia, nos últimos 10 anos, matou cerca de 40 mil pessoas. No Brasil, são mortos, pela violência urbana, mais que isso a cada ano!

Quando se denuncia essa violência exacerbada, é muito comum mostrar que ela é o fruto trágico de um modelo econômico neoliberal que também, não por coincidência, vem sendo implantado ao longo dos anos 90. O modelo neoliberal que se implantou no País, como uma panacéia moderna, revelou-se não só injusto, mas também assassino. O programa neoliberal começou a ser aplicado por Collor e Itamar e foi desenvolvido de maneira radical por Fernando Henrique Cardoso. Sabemos agora, toda a sociedade, que esse caminho é um beco sem saída.

Na dimensão econômica, é evidente o fracasso do modelo neoliberal em propiciar um novo período de desenvolvimento sustentado do capitalismo brasileiro. O crescimento médio da economia brasileira foi, nos anos 90, de apenas 1,8% ao ano. Ora, de 1945 a 1980, nossa economia mostrou que podia crescer até 7% ao ano.

A reestruturação neoliberal da economia ampliou os desequilíbrios. O endividamento público aumentou estratosfericamente. As dívidas externa e interna transformaram-se numa doença da qual nossa economia não está conseguindo livrar-se. Os governos da década de noventa, principalmente o de Fernando Henrique Cardoso, desestruturaram o setor produtivo estatal, impedindo, assim, uma retomada sustentada do crescimento.

Na dimensão social, esse modelo neliberal levou a uma crise aguda. Primeiro, por seu próprio fracasso econômico, como fica evidente, por exemplo, na grave deterioração do mercado de trabalho. O desemprego aberto deu um terrível salto: o número de desempregados passou, na década de 90, de 4,5 milhões para 7,6 milhões, segundo o IBGE. A praga do trabalho informal, sem carteira assinada, é outro resultado dessa política econômica: passou de 51% da força de trabalho, em 1989, para 59%, dez anos depois. Registre-se que um país que possui uma das maiores concentrações de renda do mundo, um elevado nível de analfabetismo e uma taxa recorde de desemprego detém elementos que não podem ser secundarizados em qualquer discussão mais séria sobre tema tão grave.

É bom lembrar, a propósito, que o gasto governamental nos setores sociais recuou de 18,5% do PIB, em 1995, para apenas 14,5% em 2000.

Essas estatísticas, Sr. Presidente, ajudam-nos a compreender o crescimento exponencial da violência urbana. E não é só o fracasso econômico sua causa. O modelo neoliberal, por sua própria natureza, é promotor da exclusão social. E precisamente a exclusão social, e não meramente a pobreza, é a grande geradora da violência.

Os maiores índices de violência e criminalidade não se concentram nas regiões miseráveis, mas nas áreas metropolitanas ricas, em que a opulência contrasta com a sofrida sobrevivência dos excluídos. Não devemos esquecer que 50% dos brasileiros, a metade mais pobre, detêm uma riqueza que não consegue ser maior do que a de 1% da população mais rica.

Está claro que a economia de mercado, por si, não oferece as soluções demandadas pela sociedade. Mesmo quando consegue produzir riquezas, não consegue reparti-las. No Brasil, como de resto em toda a América Latina, a economia neoliberal conseguiu aprofundar a exclusão social. Cresceu a miséria e diminuíram as possibilidades de trabalhar para sobreviver com dignidade.

Os próprios maus valores éticos da economia neoliberal, ao estimular perniciosamente a cobiça, e não a solidariedade, ajudam a transformar a exclusão social em violência. A violência é agravada pelo modelo de organização econômica e social, equivocado e corrompido em sua própria essência.

O inchaço metropolitano desorganizado e desestruturante; a riqueza de poucos, de um lado, e a exclusão dos muitos, de outro; a falta de dignidade dos padrões de vida; as seqüelas sociais e psicológicas de uma vida degradante; os valores éticos perversos do neoliberalismo: eis outros ingredientes para explosão, entre nós, da violência urbana.

A violência e a criminalidade devem ser enfrentadas, é verdade. Mas o uso de poder de polícia é inútil se não entendermos que as raízes dos altos índices de violência estão no modelo econômico deformado e deformador que se consolidou na década de 90.

Além desse entendimento, é preciso que medidas de combate venham acompanhadas de uma orientação correta das práticas policiais e de políticas carcerárias adequadas, que realmente promovam a recuperação dos delinqüentes para o convívio social. Não basta só atacar os efeitos sem combater as causas; do contrário, nunca se vai resolver o problema crucial da violência no País.

Hoje, o jovem excluído que começa a se desencaminhar, em vez de ser recuperado, é jogado em verdadeiras escolas do crime. E os cidadãos dos bairros da exclusão social são muitas vezes acossados pelo arbítrio policial indiscriminado.

Acima de tudo, Sr. Presidente, é preciso não perder de vista as causas últimas da violência. Sua ascensão ao longo da década de 90, que tanto ameaça e impressiona a sociedade, não pode ser separada da política neoliberal, que se foi intensificando durante o mesmo período. Uma política que combina a perversão econômica com a perversão social. Uma política na qual persiste o atual Governo, para infelicidade dos brasileiros.

Por último, Sr. Presidente, queria lembrar o triste episódio do assassinato da Profª. Geisa no ano passado, por ocasião do seqüestro do ônibus 147, no Rio de Janeiro, quando o Governo Federal e toda a sociedade ficaram estarrecidos com a brutalidade do crime: o seqüestro do ônibus e o assassinato.

Na época, o Governo convocou os Secretários de Segurança para discutirem um plano de segurança para o Brasil inteiro, no qual seriam investidos alguns bilhões de reais. Na verdade, esse plano nunca saiu do papel. Ele foi elaborado e aprovado, mas os recursos não chegaram, o que significa que as cidades continuam com as mesmas dificuldades, haja vista a situação do Rio de Janeiro, de São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador.

Nas grandes regiões metropolitanas, a violência urbana continua cada vez maior. O crime organizado está avançando e dominando. No Rio de Janeiro, existem alguns bairros nos quais quem decide a vida da população é o crime organizado. Há o toque de recolher: a população sai de sua residência para seus afazeres, mas existe hora de voltar para casa. Os traficantes determinam o horário de entrada no bairro e, passando da hora estipulada, o morador precisa identificar-se como tal. Eles determinam a vida do cidadão, e a Polícia não faz absolutamente nada, reclamando que não tem como enfrentar o tráfico nem o crime organizado sem poder e sem armas.

Dessa forma, é preciso que o Governo Federal e os Governos Estaduais consigam o treinamento adequado e os armamentos para que a Polícia possa efetivamente livrar a sociedade desse tipo de prisão. Além de sofrer ameaças de morte, de seqüestro, de todo o tipo de violência, o cidadão fica privado da sua liberdade, direito esse que o Estado acaba sendo incapaz de lhe garantir.

Era isso o que eu queria dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2001 - Página 12616