Discurso durante a 99ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Solidariedade aos servidores públicos de Rondônia quanto ao direito de reposição salarial. Repúdio à Medida Provisória 2.166, que proíbe a utilização de 80% da área das propriedades rurais de Rondônia.

Autor
Amir Lando (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Amir Francisco Lando
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Solidariedade aos servidores públicos de Rondônia quanto ao direito de reposição salarial. Repúdio à Medida Provisória 2.166, que proíbe a utilização de 80% da área das propriedades rurais de Rondônia.
Publicação
Publicação no DSF de 24/08/2001 - Página 18333
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO), SOLIDARIEDADE, ORADOR, FALTA, REAJUSTAMENTO, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO, REPUDIO, DEMISSÃO, SERVIDOR PUBLICO ESTADUAL.
  • CRITICA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), PROIBIÇÃO, CORTE, FLORESTA, PROPRIEDADE PARTICULAR, DIFICULDADE, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, SUBSISTENCIA, FAMILIA, IMPOSIÇÃO, MULTA, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
  • NECESSIDADE, APROVAÇÃO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA), ZONEAMENTO ECOLOGICO-ECONOMICO, ESTADO DE RONDONIA (RO), RESULTADO, DEBATE, PROPOSTA, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, RESPEITO, PACTO, FEDERAÇÃO.

O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Goelbels afirmava que a mentira repetida cem vezes torna-se verdade. Tenho repetido centenas de vezes a verdade, mas ela não se torna realidade.

Mais uma vez, falarei sobre a situação dramática que vive o Estado de Rondônia. Inicialmente, gostaria de me solidarizar com os servidores públicos do Estado de Rondônia, sobretudo os servidores federais, que há sete anos não têm corrigidas suas remunerações. De acordo com a Constituição Federal, essa reposição deveria ser anual, mas, infelizmente, a política governamental impiedosa e implacável contra o servidor, nesse processo de desmonte do Estado brasileiro, ataca exatamente o elo mais frágil, o do prestador de serviços essenciais à população, que mereceria sobretudo a justa remuneração, nada mais do que isso, por um princípio de justiça. Solidarizo-me também com os servidores estaduais demitidos no meu Estado. Com certeza, a Justiça tarda, mas não falha. Ela irá prevalecer, mesmo depois de muitos malefícios e prejuízos irreparáveis. Se não acreditássemos na Justiça, não acreditaríamos no Estado de Direito, na democracia, enfim, naquilo que é essencial à República Nacional.

Sr. Presidente, neste momento, mais uma vez, tratarei da Medida Provisória nº 2.166 - antes, na linguagem que se tornou conhecida, sobretudo em Rondônia, Medida Provisória nº 2.080. Essa medida proíbe o corte raso sobre 80% das propriedades particulares do Estado de Rondônia e, por conseqüência, a exploração viável da floresta. É inconcebível que alguém possa sobreviver ou se desenvolver econômica e socialmente como quer o Estatuto da Terra - e falo isso sobremodo na colonização oficial - , que prevê que o módulo rural é a terra cuja renda proporciona a subsistência e o desenvolvimento econômico e social de uma família, a fim de que essa se integre na cadeia produtiva.

Ora, Sr. Presidente, o que se quer - já disse e repito - é reduzir o nosso produtor rural do Estado de Rondônia a um guarda florestal gratuito, sem qualquer remuneração. Se em contrapartida à proibição de explorar a terra lhe dessem um salário de sobrevivência, poderíamos exigir essa atitude heróica das sentinelas da Pátria que fizeram Brasil aqueles imensos páramos remotos. Mas, não se lhes dá nada em troca. Eles são proibidos de explorar a terra, o que quer dizer um despejo velado; pura e simplesmente, despeja-se o homem que foi fazer Brasil aquele solo nacional.

Hoje, mais do que nunca, estamos chegando aos limites da tolerância. Não se pode mais suportar essa pressão que vem do Ibama, que proíbe e impõe multas, muitas vezes superiores ao valor da terra, da propriedade; são impagáveis, é verdade, mas ameaçam a paz, a concórdia, a tranqüilidade e - por que não dizer - a produção dessa gente brasileira que mora em Rondônia, o meu Estado.

Lutamos em audiências públicas por uma solução razoável, de bom senso e mesmo receitada pelos organismos internacionais, que é o zoneamento econômico-ecológico do Estado de Rondônia. O Banco Mundial, a cujas propostas e soluções não tenho respeito ou devoção maior, é o representante dos credores, daqueles que financiaram os gastos inclusive por meio do Pólo Noroeste ou do Planaflora. Essa gente está de acordo, isto é, deu seu aval. Sabemos o poder imenso que têm os credores sobre os devedores. Entretanto, há uma resistência maior por parte do Ministério do Meio Ambiente, indecifrável. Não há razão que consiga estabelecer os motivos e as causas que levam simplesmente o Ministério do Meio Ambiente, sobretudo por intermédio do Conam, a opor um embargo brutal e definitivo contra a aprovação do zoneamento econômico-ecológico do Estado de Rondônia. Quanto a esse zoneamento, Sr. Presidente, é preciso que a Nação saiba a proposta feita à sociedade de Rondônia por meio da Assembléia Legislativa, que votou a lei e tem competência para fazê-lo, segundo a divisão de competências do pacto federativo pela qual cabe aos Estados também legislar sobre meio ambiente de maneira supletiva e concorrente. No Estado de Rondônia, que é uma unidade federada, a Assembléia Legislativa, ouvindo milhares de pessoas, as associações, as lideranças, todos os que foram consultados, depois de fazerem uma radiografia da realidade, depois de se mostrar o que já foi ocupado, explorado e, sobretudo, depois de reconhecer a realidade fática -- porque, quanto aos fatos, nós não podemos ter divergências; não podemos imaginar que 80% da exploração signifique apenas 20% e que se possa voltar e mudar essa realidade, como se pudéssemos desenhar no papel a realidade da exploração no Estado de Rondônia. Todos os Estados foram obrigados, inclusive, a explorar, no mínimo 50%, sob pena de não receber a titulação. Essa era a regra imposta pelo Incra. Quem não explorasse no prazo de cinco anos, necessariamente, não receberia a titulação e poderia ser removido da gleba. Ora, depois de cumprirem essa obrigação, incorporando ao solo, suor, sangue e trabalho, modificando a paisagem, humanizando-a, tornando a paisagem hostil em familiar ao convívio, à exploração, àquilo que se chama harmonia cósmica entre o homem e a terra; porque foi esse trabalho que modificou a paisagem, possibilitando a ocupação e uma vida digna, hoje é apenado por essa medida provisória, que agora quer voltar atrás, como se não houvesse um princípio elementar de Direito, de que a lei não retroage, a não ser no Direito Penal, para beneficiar o réu; ou, excepcionalmente, em matéria de outros processos, sempre para beneficiar aquele que foi prejudicado.

Ora, nessas circunstâncias não se pode falar em retroagir a lei, porque brada a Constituição, com todas as letras, no art. 5º, inciso XXXVI, que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Está escrito. Mas para Rondônia não vale; Sr. Presidente. Todos os agricultores, hoje, que quiserem obter um financiamento, via FDO, um fundo especial do Norte, destinado a promover o desenvolvimento rural, têm que averbar 80% de cobertura florestal.

Como averbar 80% de cobertura florestal se ela não existe, se no mínimo o agricultor seria obrigado a derrubar 50% da sua gleba para torná-la produtiva? Como voltar no tempo e apagar essa realidade que foi tão dura, tão difícil? Quantos foram sepultados ao pé da gleba, porque a malária foi implacável e devoradora? Quantos sucumbiram por falta de assistência médica, ou porque as estradas levavam a caminhos tortuosos, esburacados, sem acesso e cheios de atoleiros? E aqueles doentes, que morreram na rede que os conduziam, muitas vezes sem poder chegar ao hospital, sem assistência médica, em geral?

Então, o que se quer, Sr. Presidente, é despejar essa gente? É preciso ter a coragem de efetuar o despejo, mas há uma resistência, por parte do Ministério do Meio Ambiente, de entender essa realidade que chega a ser surrealista, caprichosa, irracional, escusa, porque ela não atende aos interesses do Brasil, do povo brasileiro, mas sim, talvez, das potências que querem preservar a Amazônia como uma reserva territorial para as suas gentes, para os seus povos, no futuro, ou as águas, que são abundantes e de ótima qualidade. Então, Sr. Presidente, temos que debelar, que dinamitar, com todas as forças dos nossos atos e das palavras, essa oposição do Ministério do Meio Ambiente.

Ainda ontem, aqui na Câmara dos Deputados, em reunião de algumas Comissões, especialmente da Comissão de Agricultura, esteve presente o Sr. Ministro que, simplesmente, quer que Rondônia modifique, agora, e se ajuste à vontade externa, e não à vontade nacional, não à vontade do povo de lá, que também é parte e tem que falar e ser ouvido. Ele quer que se façam novos ajustes para aprovar o Zoneamento Econômico Ecológico.

Não temos mais nada a fazer! Oferecemos à Nação, Sr. Presidente, 70% do território do Estado de Rondônia para a preservação. Vamos preservar a cobertura florística sobre 70% do Estado de Rondônia. Em algumas áreas onde a presença antrópica está mais visível, vamos realmente preservar apenas 20%. Em outras áreas, 100%. São 53 unidades de preservação. Além dessas unidades de preservação, há zonas em que é proibido o abate da floresta, em qualquer percentual, em qualquer porção, quer dizer, mantendo integralmente a floresta.

É por isso, Sr. Presidente, que temos de buscar uma solução racional, a partir da realidade, a partir daquilo que existe. Não podemos ignorar, como sempre ignoramos a Amazônia, e ignorar, inclusive, esse processo de ocupação havido que está gerando riqueza. Hoje, são mais de um milhão e meio de pessoas que estão vivendo ali. Em 1970, eram apenas 60 mil pessoas e, hoje, estão produzindo. Hoje, estamos produzindo, em matéria agropecuária, o que há de melhor para o País. Não apenas a produção de grão, como a produção de café, haja vista essa crise do café. Rondônia é um dos maiores produtores de café do Brasil, um dos maiores Estados em matéria de produção de café.

O nosso rebanho já avança para mais de 7 milhões de cabeças. A nossa produção de leite é expressiva e já representa algo significativo para o País. E o nosso agricultor vende esse leite a 22 centavos o litro. Sabemos que é realmente um valor que não remunera os gastos da produção. É a propriedade familiar que faz o milagre da produção, porque incorpora o trabalho próprio da família. E o importante é essa renda mensal que ocorre mesmo em circunstâncias adversas. Um dia há de melhorar, como também a produção do café. A política cafeeira precisa receber do Governo um choque de qualidade. Temos que buscar políticas que promovam a qualidade do café no Brasil, produto abandonado há muito tempo. Por isso, sobretudo em Minas Gerais e São Paulo, assiste-se à erradicação do café.

É por isso, Sr. Presidente, que viemos aqui para mostrar a revolta, a insatisfação, a contrariedade, o repúdio, a indignação do povo de Rondônia contra essa medida arbitrária, essa medida provisória que surge de um legislador solitário, que pensa sozinho e distribui para o Brasil uma receita inexeqüível.

Realmente, essa lei é inaplicável! E o que se encaminha, Sr. Presidente, é a resistência civil contra a aplicação dela, porque é essencialmente arbitrária, vinda de um legislador monocrático, cujo objetivo é impor uma conduta que afronta a realidade, que afronta qualquer idéia de crescimento e de desenvolvimento do Estado de Rondônia. E nós temos o direito à vida, em primeiro lugar. E a vida é o progresso, a vida é o desenvolvimento, a vida é continuar a produção.

É por isso que venho nesta hora repetir a mim mesmo. Não encontro mais outras palavras, como disse de outra feita, que pudessem alterar este discurso, para dizer, de maneira peremptória e definitiva: ou Rondônia ou a Medida Provisória nº 2.166! Ou o nosso desenvolvimento, a nossa sobrevivência, ou a imposição de uma norma arbitrária, imprópria, injusta, inadequada e, sobretudo, inaplicável!

Hoje se encaminha claramente a resistência civil contra a aplicação dessa lei, porque ela não tem nenhum compromisso com a realidade. Ela não é uma parturição social, mas uma parturição do arbítrio do legislador solitário.

Nosso repúdio e, sobretudo, nossa solidariedade com o povo de Rondônia. Continuem a plantar, porque isso é um direito sagrado, um direito à vida, um direito à sobrevivência.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/08/2001 - Página 18333