Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos quinhentos anos do Rio São Francisco.

Autor
Ronaldo Cunha Lima (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Comemoração dos quinhentos anos do Rio São Francisco.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2001 - Página 23686
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, RIO SÃO FRANCISCO, DESENVOLVIMENTO, BRASIL.
  • ANALISE, NECESSIDADE, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RECUPERAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, IMPLEMENTAÇÃO, PROJETO, REVIGORAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RONALDO CUNHA LIMA (Bloco/PSDB - PB) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, desde que, no mais remoto tempo, as mãos de Deus retiraram do ventre das alterosas as águas do São Francisco, o mar, em sua imensidão, agradece as terras brasileiras pela fertilidade que se lhe creditam.

            Já se vão alguns séculos do conhecimento pelo colonizador do rio da integridade nacional. De lá até os dias de hoje o São Francisco conduz a cultura a esperança de um povo, símbolo moderno da tolerância e do sincretismo racial.

            Desde a Serra da Canastra, seu berço nas Minas Gerais, o São Francisco sai em busca de sua foz, prezando a fraternidade que justifica seu nome. Até parece que Deus, parturiente do rio, sabia dessa cena batismal, encenada por Américo Vespúcio, há 500 anos.

            Um sarau na foz reúne a beleza da cultura brasileira. O conto poético de Guimarães Rosa ouve versos de Castro Alves embalados ao som sertanejo do cancioneiro de Luiz Gonzaga. A poesia que o Oceano Atlântico inspira nas espumas de suas ondas são saudades que o Parnaso guarda do Brasil, desde Pindorama.

            Muito há que comemorar e agradecer. A Deus pela existência eterna do rio e a natureza, como instrumento divino, pela possibilidade ainda maior que o progresso humano possibilita à distribuição eqüitativa dessas águas.

            Permitimo-nos parodiar Demócrito Rocha afirmando que o São Francisco é uma artéria que sai do coração do Brasil para nutrir partes sedentas de seu corpo. É isso que cobramos, como solidariedade fraternal: uma transfusão de águas para garantir a sobrevivência do povo nordestino.

            É procedente a preocupação dos irmãos da Bahia, Alagoas e Sergipe, cobrando a revitalização desse conduto sangüíneo, quando não descartam, em paralelo, a transposição vital. Também nós, os paraibanos, cearenses e potiguares precisamos solver, para além da sobrevivência, as águas do São Francisco.

            É um ato que se prenuncia como de misericórdia, até para efetivar, na vontade divina do santo que emprestou nomenclatura ao rio, o amor ao próximo que, morando nos sertões áridos e secos, carece da água para matar a sede de viver, devolvendo vida a força à nação.

            Renovamos as expectativas e crenças que os “beradeiros” sertanejos cultivam desde que aportaram nessas terras, juntando-se aos nativos que aqui viviam, na certeza de que o nordeste é, como Egito do Nilo, um presente do São Francisco.

            Preocupações e esperanças integram, portanto, o Nordeste com o incentivo de Minas Gerais. A preocupação da resgatar a vida plena do rio, revitalizando seu curso e recuperando seu leito e suas margens; e as esperanças que suas águas cheguem aos demais estados do nordeste que tanto contribui ao progresso da pátria.

            É um instante de júbilo que reclama nossa gratidão aos céus por essa dádiva que é o São Francisco. Suas águas, até quando encontram a resistência das alturas, geram na queda a energia que precisamos na luz que nos ilumina. Das cataratas até o som é aproveitado nas noites de luar do sertão por onde passam as águas.

            Que oportunidade nos oferece esse momento para agradecimentos e congratulações. Graças daremos a Deus pelo São Francisco e aos irmãos pela certeza da fraternidade com a efetivação da tão reclamada transposição de suas águas. Por isso é que, nesta Casa, remetemos versos de apelo ao Presidente da República em favor desse projeto, que agora pedimos licença para repetir:

            CANTO DAS ÁGUAS

            Ao Presidente Fernando Henrique Cardoso

O homem camponês, em meu nordeste,

acredita em botija e em mal-assombro .

"Quando a enxada descansa, cansa o ombro",

filosofa esse herói , cabra da peste,

que no amanho da terra rude e agreste,

intuitivo e vidente continua

consultando , no céu , o sol , a lua,

do arco-íris nas cores o limite

entre o belo e o triste, se admite

que falta o verde à cor da terra nua.

Crê que leite de pião da cobra mata

o veneno e que a casca seca e pura

do angico, hemorróida sara e cura,

ou que um ramo de arruda espanta e trata

do mal do mau olhado que o maltrata.

E se o canto da acauã canta estiagem,

o d'asa branca é encanto em homenagem

à chuva que o redime desse inferno,

trazendo , com o carão, nuvens de inverno

para aguar o suor de sua coragem.

Se é manso no falar, ágil e valente,

é tão afirmativo nos revezes

que chega a usar o "não" por duas vezes

para negar a dor que n'alma sente

quando nas contas de Deus então pressente

que a chuva dessa vez não vai chegar.

E , mesmo assim , jamais vai renegar

da crença em São José, nele se guia

animando a esperança de que um dia

possa vir a colher o que plantar.

É em nome desse grande brasileiro

vivente em nosso solo nordestino

que refaço nos traços meu destino

e em discurso de curso mais ligeiro,

grito, proclamo e clamo o tempo inteiro

ao poder que em ceder se torna arisco,

nos conceda bem mais do que o chuvisco

das águas de um poço artesiano,

transpondo para o solo paraibano

as vazantes do rio São Francisco.

E tanto encanto, a tanto decantado,

corre livre, cursando o Velho Chico,

festeja suas nascentes, faz fuxico

de seu leito dormido no passado,

pinta em cores de espera o espaçado

da esperança de um povo em ser presente

ao presente das águas, à vertente

das sobras que esse rio fez juntar,

doando-as a quem mais necessitar,

secando n'água as lágrimas da gente.

Ao canto que esse pranto me oferece

eu junto as minhas mágoas afluentes

a outras mágoas de águas conseqüentes

que se aprestem confluentes à minha prece

quem sabe então assim não aparece

um rio de idéias com presteza

e a tempo de alegrar toda a tristeza

que ri no riso triste dessa gente

que morre à vida e é toda a vida crente

num milagre de Deus à Natureza.

Não importa que em vez da Asa Branca

seja um Tucano a dar a posição

das águas vindas da transposição

nos atos de um Governo que destranca

os cem anos de espera e os arranca

dos sonhos de querer, e crente fique

na força do nordeste e nele aplique

as dotações constantes do Orçamento

fazendo eterno o reconhecimento

dessa gente ao Doutor Fernando Henrique.

            Muito obrigado.

 

            


            Modelo13/28/247:35



Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2001 - Página 23686