Discurso durante a 131ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a formação de cartel por multinacionais na compra da produção de leite no país.

Autor
Osmar Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PECUARIA.:
  • Comentários sobre a formação de cartel por multinacionais na compra da produção de leite no país.
Aparteantes
Ademir Andrade, Ney Suassuna, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2001 - Página 24245
Assunto
Outros > PECUARIA.
Indexação
  • GRAVIDADE, CRISE, PECUARIA, GADO LEITEIRO, BRASIL, FALENCIA, PRODUTOR, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, EFEITO, DESEMPREGO, SETOR.
  • DENUNCIA, MANIPULAÇÃO, EMPRESA MULTINACIONAL, BENEFICIAMENTO, LEITE, REDUÇÃO, PREÇO, PERIODO, ENTRESSAFRA, DEFESA, APRESENTAÇÃO, RECLAMAÇÃO, CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONOMICA (CADE).
  • ANUNCIO, PROJETO DE LEI, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO PARANA (PR), ISENÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), PRODUÇÃO, LEITE, SEMELHANÇA, LEGISLAÇÃO ESTADUAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, CONCESSÃO, ISENÇÃO FISCAL, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), INDUSTRIA AUTOMOTIVA, OMISSÃO, PECUARIA, SUPERIORIDADE, OFERTA, EMPREGO.
  • DEFESA, RETIRADA, IMPOSTOS, PRODUTO, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS, COMPENSAÇÃO, REDUÇÃO, PODER AQUISITIVO, SALARIO, TRABALHADOR.
  • DEFESA, INCLUSÃO, LEITE, POLITICA, PREÇO MINIMO, PREVISÃO, AUMENTO, PRODUÇÃO, POSSIBILIDADE, EXPORTAÇÃO, IMPORTANCIA, FISCALIZAÇÃO, COMBATE, ECONOMIA INFORMAL.
  • DEFESA, INCLUSÃO, LEITE, EMBALAGEM, PAPEL, MERENDA ESCOLAR, PROGRAMA, POLITICA SOCIAL, COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, VANTAGENS, ALIMENTAÇÃO, POPULAÇÃO, AUMENTO, CONSUMIDOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece um discurso velho, mas é novo, porque novamente a crise afeta os produtores de leite do País e leva muitos produtores brasileiros a deixarem a atividade e venderem suas propriedades. Entendo que não é difícil resolver o problema dos produtores de leite; basta boa vontade e decisão do Governo.

            Não estamos falando de um setor sem importância. Estamos falando de um setor que reúne 1,8 milhão produtores espalhados pelo Brasil, gerando 3,6 milhões empregos em todo o País. Vejo governos apavorados, baixando portarias, decretos para isentar montadoras de automóveis de ICMS em seus Estados, como no meu Estado - ontem falei sobre este assunto aqui -, para garantir, talvez, três ou quatro mil empregos. No entanto, quando um setor de extraordinária importância, como a pecuária leiteira, se afunda na crise, os governos parecem ignorar a importância tanto social quanto econômica do setor. Falei em 3 milhões e 600 mil empregos! E quero dizer que a pecuária leiteira também contribui para a economia nacional com R$6,5 bilhões. Comparativamente, ela está abaixo da pecuária de corte, da soja e do milho. Apenas isso, Sr. Presidente.

            Portanto, sob os pontos de vista econômico e social, não há dúvida: trata-se de um setor que merece a atenção do Governo - ou pelo menos deveria merecer. No entanto, estamos diante da seguinte situação: é tempo de entressafra. A entressafra do leite começa em junho e vai até setembro, quando as pastagens perdem o seu poder nutricional, a sua capacidade de prover os animais e, evidentemente, eles diminuem a sua produção e não conseguem manter o nível da época da safra, que começa no mês de novembro em algumas regiões do País.

            Pois bem, no período de entressafra, o normal seria que o preço subisse, pela baixa oferta - o Senador Ademir Andrade, que é pecuarista no Pará, sabe que é assim. No entanto, o contrário aconteceu. Tivemos uma redução, na média dos preços nacionais, de 30% no preço do leite ao produtor. Não é o mesmo que ocorre com o preço do leite ao consumidor - e é este o primeiro problema para o qual quero alertar, por isso falei que era fácil resolver o problema. Ocorre que a indústria de leite e derivados está cartelizada. Temos a Nestlé, a Parmalat e mais uma meia dúzia de empresas que comandam praticamente o mercado de leite e derivados no País. Combinadas entre si - e isso está claro -, elas jogam o preço lá embaixo, impedindo que os produtores continuem mantendo o nível de produção e de produtividade, porque são obrigados a improvisar. Eles retiram determinados componentes do custo de produção; por exemplo, a ração concentrada, a proteína, que deveria estar sendo ofertada a um determinado nível de produção adiante. Isso tudo contribui para que a renda do produtor caia ainda mais, pela queda da produtividade, pela queda da produção, pela queda da renda, motivada pela menor oferta do produtor, e pelo menor preço.

            A indústria diz o seguinte: “O mercado está saturado, por isso o preço caiu”. Se o mercado está saturado, por que importar? Este ano o Brasil já importou um bilhão de litros de leite. Um bilhão de litros de leite!

            Apenas para dar uma referência, em 2001, produziremos cerca 21 a 22 bilhões de litros de leite no País. O nosso consumo está muito aquém do recomendado pela Organização Mundial de Saúde, que aconselha um consumo em torno de 360 litros per capita. O nosso consumo per capita está em 130 litros.

            Ao lado desse descaso do Governo, que permite a formação de cartel, prejudicando os produtores, há também um total desrespeito aos produtores nacionais quando se abre o mercado e se permite a importação, mesmo sob a alegação de que o preço está sendo reduzido em função de que está sobrando leite. É claro que o poder aquisitivo da população não aumentou. Dessa forma, por não ter aumentado - aliás, em relação à média dos trabalhadores, o poder aquisitivo decresceu, porque os trabalhadores, há vários anos, estão sem reajuste salarial -, eles não conseguem manter o poder de compra dos seus salários e o nível de vida que tinham há dois, três, quatro ou cinco anos. Com isso, reduzem também o consumo de leite.

            Pois bem, somando-se esse fator, do consumo que caiu, com o da importação, que deveria estar sendo inibida pelo Governo, e mais o problema que estamos aqui denunciando -- sobre a formação de cartéis pelas empresas, principalmente as multinacionais, que tomam conta do mercado --, temos a questão do mercado de leite, que é o problema do produtor de leite.

            O problema do cartel dá para ser resolvido? É lógico que sim. O próprio Ministro Pratini de Moraes disse que acionaria o Cade caso as empresas não revissem a sua política de compra, a sua política comercial. Isso não foi feito. A Confederação Nacional da Agricultura também ameaça ingressar no Cade. Já que todos ameaçam e não ingressam, eu o farei, porque creio que o Cade tem a obrigação de interferir nesse processo, para que os produtores de leite não sejam lesados nos seus interesses por ação das multinacionais, especialmente, que comandam o mercado de leite no país.

            Já entrei em contato com o Deputado Estadual da Assembléia Legislativa, o Agostinho Zucchi, que pertence ao Partido que integro hoje, o PDT, para que ele entre na Assembléia Legislativa com um projeto de lei, até para mostrar que isso é possível. O Rio Grande do Sul fez isso e hoje tem isenção total de impostos na produção de leite. Por quê? Porque o Governo do Rio Grande do Sul entendeu que os produtores não poderiam mais continuar produzindo se não houvesse esse incentivo nesse momento de crise, e o Governo do Rio Grande do Sul zerou o ICMs do leite. Aí dizem: “Mas isso é inconstitucional, é uma concorrência desleal”. Mas se é inconstitucional, se pode no Rio Grande do Sul, então também poderá no Paraná.

            Portanto, recomendei isso ao Deputado Agostinho Zucchi, e S. Exª hoje vai dar entrada num projeto de lei para que também seja isento de ICMs o leite produzido no Paraná, até para evitar que os produtores do meu Estado sejam prejudicados por mais uma ação danosa das empresas, das indústrias que controlam o mercado. Elas pegam o leite do Rio Grande do Sul, que não cobra imposto, e o despejam no Paraná, que cobra imposto, oferecendo, dessa forma, dificuldade na concorrência dos produtores do meu Estado com o leite proveniente do Rio Grande do Sul.

            Essas medidas são todas possíveis de serem adotadas.

            Ontem, falei aqui da isenção para as montadoras até 2009. O argumento em contrário foi o seguinte: “O mercado de automóveis está em crise”. O mercado de automóveis está em crise, e o de alimentos não? Os outros setores da atividade econômica não estão em crise?

            Se tudo isso fosse trocado por geração de emprego, eu até entenderia. Porém, a isenção de impostos para as montadoras não terá esse resultado. Ao contrário, a Renault vai demitir, como a Audi está demitindo no Paraná. As montadoras estão demitindo e ganhando isenção até 2009. Assim, ao mesmo tempo em que desempregam, elas ganham incentivo fiscal. A meu ver, isso não está correto, é contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, é injusto, mas se é possível para as montadoras, vamos também adotar essa mesma prática para os produtores de leite e até para os produtores de alimentos. 

            Como o salário não tem o poder de compra que tinha há 5 ou 6 anos, se retirarmos os impostos da cesta básica, conseguiremos permitir um maior acesso dos consumidores aos alimentos. Essa medida poderia pelo menos proporcionar uma alimentação decente.

            Atendo-me ao problema dos produtores de leite, quero dizer que há outras medidas que estão ao alcance do Governo e que poderiam ser adotadas. Por exemplo, incluir o leite na política de preços mínimos. Não é possível que o leite, hoje, seja comercializado pelo produtor a um valor menor do que o que se gasta para tomar um copo de água num boteco. Se o cidadão vai a um boteco e compra um copo de água, qualquer que seja a marca, ele vai pagar mais do que recebe o produtor por um litro de leite. Isso não é justo! É claro que é impossível continuar produzindo leite em um País onde praticamente não tem valor nenhum um produto tão nobre e essencial para a vida de todas as pessoas, não importando a classe social a que pertençam. É preciso que o Governo veja no leite um alimento nobre e permita que seja implantada no País uma política diferenciada para ele. Não podemos tratar esse produto como os demais, porque ele exige um sacrifício enorme de quem o produz: persistência diária, dedicação extraordinária dia e noite, e solução de problemas na propriedade que podem inviabilizar o produtor. Assim, não podemos permitir que, em função de uma política governamental equivocada, os produtores sejam sacrificados.

            Estou defendendo, sim, que o leite seja incluído na política de preços mínimos, até para garantir EGF, AGF e financiamento para estocagem, que poderiam partir dessa política de preços mínimos.

            Precisamos, também, criar um mercado futuro para o leite e abrir um mercado de exportação, porque se os produtores continuarem investindo na qualidade do seu rebanho, no manejo sanitário e alimentar, haverá um aumento na produção de leite nacional, como já aconteceu: do ano passado para cá, praticamente houve um acréscimo de um bilhão de litros. Pois bem, se cresce a produção e não cresce o consumo, haverá excedente, e não adianta as multinacionais dizerem que vão importar porque está faltando leite. Não está faltando, mas sobrando, como elas próprias disseram. Então, para que importar neste momento e enterrar o produtor na crise? A multinacional está se esquecendo de que vai precisar do produtor mais adiante, quando estiver difícil a importação.

            É claro que, hoje, o problema do dólar inibe a importação e por isso ela não está ocorrendo, mas, repito, no primeiro semestre, houve importação de um bilhão. Então, essa é uma política imediatista das empresas que fazem as importações, que jogam um setor inteiro na crise. Portanto, estou defendendo que o Governo crie um programa de exportação. Se outros podem, nós também podemos exportar, ao invés de importarmos leite quando é totalmente desnecessário.

            Uma outra proposta é a de se inibir o mercado clandestino. Não estou contra aqueles que vendem o leite clandestinamente, envasados em litros, em vasilhas, apenas porque acho que devam ser eliminados do mercado. Não. Creio que eles devam permanecer no mercado, mas incluídos no mercado regular, dando-se-lhes condições para que produzam leite de qualidade, financiem resfriadores e equipamentos, e instalem-nos em suas propriedades, de forma que, com uma linha de crédito criada especificamente para isso, possam participar do mercado formal de leite com qualidade, porque estamos falando de benefícios ao produtor e ao consumidor quando se garante a qualidade do leite por intermédio de uma fiscalização mais rigorosa.

            Também vamos permitir algo mais: se eliminarmos o mercado informal e clandestino de leite, haverá também - já que querem arrecadar imposto sobre o leite - maior arrecadação do próprio Governo. Assim, ganha o Governo, ganha o consumidor, ganha o produtor.

            Não entendo por que não se atua mais nessa área de forma a se colocar em prática uma fiscalização mais rigorosa para acabar com o mercado clandestino, que comercializa, muitas vezes, leite que leva doenças, bactérias principalmente, para o consumidor.

            Defendo, portanto, esse rigor na fiscalização.

            O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Ouço V. Exª, Senador Ney Suassuna, com prazer.

            O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Como sempre, Senador Osmar Dias, V. Exª traz uma colocação correta, um foco centrado na realidade. Eu queria não só me solidarizar, como acrescentar mais alguns itens. Na hora em que importamos, tendo condições de produzir, estamos piorando o nosso plantel; estamos tirando possibilidade de empregos numa área que os gera rapidamente, que é a pecuária; estamos criando dificuldades de câmbio, de um melhor equilíbrio na balança de pagamento, enfim, são tantos os prejuízos que não entendo por que o Governo ainda não incentivou não só a exportação que V. Exª está pregando, mas, mais do que isso, o estoque, porque o leite desidratado, transformado em pó, pode ser estocado para os anos em que haja problemas. Não é admissível - e V. Exª está coberto de razão - que, com o segundo rebanho do mundo, tenhamos que importar leite em pó da Suíça ou de países que, comparativamente ao Brasil, são de brinquedo. O seu posicionamento está extremamente correto e só teremos uma política válida, séria e correta nessa área quando fizerem exatamente o que V. Exª está pregando. Parabéns.

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Obrigado, Senador Ney Suassuna. V. Exª estava chegando quando fiz referência, no início do meu pronunciamento, ao significado social do setor leiteiro: um milhão e oitocentos mil produtores e três milhões e seiscentos mil empregos diretos, garantidos por uma atividade que produz um alimento nobre e essencial para a vida de todas as famílias, não importa de que classe social. Assim mesmo, vemos o desprezo que dedica o Governo a essa categoria de produtores de extrema importância para o País.

            Já que estamos falando em aspectos sociais, não entendo por que o Governo não inclui o leite longa vida nos programas sociais, principalmente naqueles que levam em conta a alimentação das famílias carentes e a merenda escolar, a fim de aumentar o consumo e melhorar a qualidade de vida das pessoas mais carentes do País. Estou defendendo o leite longa vida como defendo o leite envasado. Contudo, o primeiro permite o transporte, o armazenamento e o depósito por alguns dias, e poderia oferecer uma melhor condição nutricional aos estudantes carentes da rede de ensino pública, que, muitas vezes, vão à escola apenas para receber a merenda. Essa é uma realidade que o País vive e não podemos fugir dela. Então, por que não incluir o leite longa vida na merenda escolar?

            Ao lado disso, precisamos analisar o que fazer com o monopólio da embalagem do leite longa vida, que pertence à empresa sueca Tetra Pak. No mundo inteiro, nos cento e sessenta e cinco países em que praticamente domina o mercado, essa empresa fatura R$8,5 bilhões.

            Para que V. Exªs tenham uma idéia, no Brasil, a embalagem usada para envasar o leite longa vida custa de R$0,22 a R$0,24, enquanto o produto, que tem origem em uma propriedade rural, em muitas regiões do País, custa R$0,20 por litro. Vejam V. Exªs que custa mais a embalagem do que o leite que está dentro dela. Não conheço nenhum outro produto que tenha essa relação de preço com sua embalagem.

            O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Osmar Dias, faço apenas uma última referência: na Paraíba, que tem um grande rebanho caprino, o Governo do Estado passou a usar o leite de cabra na merenda escolar. Isso tem gerado empregos e tem sido uma fonte de proteínas incrível para a criançada. Assim, o leite caprino é mais uma variação que há no Nordeste, no semi-árido, e que, com toda certeza, é uma solução para nós.

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Essa é uma iniciativa que merece elogio, porque estamos defendendo que o leite de vaca seja distribuído na merenda escolar e nas cestas básicas dos programas de alimentação do Governo.

            Isso é fácil e existe oferta; é só ter boa vontade. Aliás, o leite é um alimento mais barato do que qualquer outro no País.

            O Sr. Ademir Andrade (PSB - PA) - Senador Osmar Dias, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Ademir Andrade (PSB - PA) - Senador Osmar Dias, eu gostaria de registrar que V. Exª e o Senador Jonas Pinheiro são, nesta Casa, os representantes autênticos do setor agropecuário brasileiro. São pessoas que falam com base e conhecimento, e merecem ter ressaltada a sua luta. V. Exª tem toda razão. Estava preocupado porque V. Exª ainda não havia falado do preço do leite do produtor, mas agora falou. Na verdade, o produtor vende o litro de leite a R$0,20. Realmente, isso é um absurdo. No Norte do Brasil, a produção de leite é praticamente familiar, feita pelo colono, pelo pequeno produtor, por aquele colono que tem uma terrinha pequena, que se dedica a criar gado leiteiro, que trabalha duro para tirar uma miséria, na verdade. Ele vive com poucos recursos e em uma situação de extrema dificuldade. Mas, além de não apoiar a produção e de não estimulá-la, de não retirar o imposto sobre a produção e de não criar o preço mínimo, como V. Exª coloca, o Governo brasileiro também não educa, não prepara, não estimula o produtor. Ao contrário, vemos hoje a Embrapa funcionar com toda dificuldade, sem recurso para nada. Em nosso Estado, praticamente se enterrou a Emater, uma entidade que preparava agrônomos e técnicos agrícolas para ensinar o colono a melhorar a qualidade da produção. Não se estimula a inseminação artificial, a melhoria do rebanho, não se faz nada para qualificar o trabalhador para que ele tenha um gado mais produtivo. Não se faz nada nesse aspecto também, e esse é outro ponto negativo do Governo. Na região de V. Exª, já há tecnologia mais avançada disponível e o grande proprietário tem condições de acessá-la. Na minha região, quem produz leite é o pequeno produtor, a quem não se dá nem a possibilidade de melhorar a qualidade do rebanho. Essa é outra falha muito grande do Governo, que deveria olhar a produção desse alimento tão importante para o povo brasileiro, que deveria até comprar, se fosse o caso, subsidiar. Gasta-se tanto dinheiro neste País sem necessidade, paga-se tanto ao especulador, incentiva-se a produção de carros, como bem coloca V. Exª, por que, então, não estimular, aumentar e até distribuir gratuitamente o leite para tanta gente que passa fome em nosso País? Se verificarmos os índices apresentados pelo IBGE, pelo Censo de 2000, constataremos a imensa pobreza e a imensa dificuldade por que passa o povo brasileiro. Portanto, se houvesse um Governo que olhasse um pouco para esse lado, de maneira econômica, ele poderia acabar com muita fome, com muita doença em nosso País. Parabenizo V. Exª por essa luta e pelo brilhante trabalho que sempre realiza nesta Casa. Lamento apenas que V. Exª não tenha vindo para o PSB, em vez de estar no PDT. Muito obrigado.

            O Sr. Roberto Saturnino (PSB - RJ) - Senador Osmar Dias, não é pela última referência do Senador Ademir Andrade, mas eu também gostaria de fazer um breve aparte ao discurso de V. Exª.

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Senador Roberto Saturnino, já concedo o aparte a V. Exª. Antes, quero agradecer ao Senador Ademir Andrade. Embora não tenha ido para o Partido de V. Exª, tenho uma gratidão enorme por V. Exª, porque, na qualidade de Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, identificou-se V. Exª com as necessidades que a comissão tinha de desenvolver um trabalho rápido - naquele período, principalmente - para corresponder aos anseios da população. Lembro-me de que foi na gestão de V. Exª como Presidente que apresentei um projeto que responde ao aparte de V. Exª. O meu projeto foi aprovado na Comissão de Assuntos Sociais, com o apoio de V. Exª, depois no Senado, e está dormindo numa gaveta na Câmara dos Deputados.

            O meu projeto diz que a cada trabalhador registrado que tenha mulher em gestação ou filho com até dois anos de idade - que é quando se forma realmente fisicamente e até intelectualmente um cidadão - todas as empresas serão obrigadas a fornecer um litro de leite.

            Não fiz essa proposta à toa. Levantei que o leite poderia proporcionar, por exemplo, para a vida escolar daquela criança - e o Senador Ney Suassuna sabe disso, porque é professor -, uma qualidade muito melhor de aprendizado, porque ela estaria pelo menos bem nutrida. Só que esse projeto, que foi aprovado por unanimidade, com o apoio de V. Exª, que era o Presidente da Comissão, depois no Plenário, está na Câmara dos Deputados.

            E aí teríamos mais esse efeito, Senador Ademir Andrade, que V. Exª citou: além de alimentar mais convenientemente os filhos de trabalhadores e as mulheres em gestação, haveria o aumento do consumo de leite nacional, que proporcionaria um novo ambiente para os produtores de leite do País, porque mercado não seria problema. Aumentaríamos o consumo, segundo os cálculos que fiz naquela época, em cerca de 4 bilhões de litros de leite, todos os anos, o que seria já suficiente para absorver o excedente.

            Concedo, com satisfação, o aparte ao Senador Roberto Saturnino.

            O Sr. Roberto Saturnino (PSB - RJ) - Serei breve, Senador Osmar Dias. Quero cumprimentar V. Exª pelo excelente e oportuno discurso. Aliás, os pronunciamentos de V. Exª são todos dessa qualidade. Peço licença para pegar uma carona no tema que V. Exª aborda e que é tão importante. Nos últimos 30 ou 60 dias, tenho recebido, com uma grande freqüência, postulações, reclamações, queixas dos produtores de leite do Estado do Rio de Janeiro, que não é nenhum produtor de excelência no Brasil. Lá, o produtor vive com muita dificuldade, numa topografia que não é favorável, mas ele vai exercendo a sua atividade com muito sacrifício. O que está acontecendo é que as empresas produtoras de laticínios e de leite em pó do meu Estado, com o racionamento, tiveram que reduzir a produção. E, em vez de contingenciar a produção e manter o preço ao produtor, reduziram o preço ao produtor. Com isso, vai haver um efeito social deletério sobre as populações rurais do Estado do Rio de Janeiro, porque muitos produtores, diante da inviabilidade da produção, estão abandonando-a. Essa é a verdade. Esse é um problema grave. Já escrevi ao Ministro Pratini de Morais. Infelizmente, até agora não recebi nenhuma manifestação de S. Exª. Mas tudo isso está de acordo com esse quadro preocupante que V. Exª mostra corretamente. Ou seja, trata-se de uma produção que tem muitas outras finalidades e benefícios e que tem de ser considerada e tratada como tal, e não largada ao sabor das regras de mercado, que vão alijar um percentual muito grande de produtores de leite, por exemplo, do meu Estado.

            O SR. OSMAR DIAS (Bloco/PDT - PR) - Obrigado, Senador Roberto Saturnino.

            Sr. Presidente, sei que já ultrapassei em mais de sete minutos o tempo destinado ao meu pronunciamento.

            Vou encerrar, lembrando, principalmente ao Senador Saturnino, que é do Rio de Janeiro, que esse Estado pode não ser um dos grandes produtores, mas é um dos maiores consumidores de leite do País. Com certeza, os consumidores também sentem quando não há uma política que mantenha a atividade leiteira no País.

            Lembro ainda que o ser humano é o único animal, Senador Ney Suassuna, que toma leite quando adulto. Por isso, deveria pelo menos respeitar o produtor de leite deste País.

 

            


            Modelo15/8/246:58



Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2001 - Página 24245