Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo ao governo federal para uma solução do caso dos funcionários demitidos da extinta Petromisa, subsidiária da Petrobrás, na área de mineração. Satisfação com a reassunção da prefeita de Canindé do São Francisco/SE, Sra. Rosa Maria Feitosa, afastada por intervenção do governo estadual devido ao questionamento quanto à legalidade de sua posse. Comentários ao adiamento da apreciação, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, da PEC que trata da revitalização do Rio São Francisco.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESTADO DE SERGIPE (SE), GOVERNO MUNICIPAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Apelo ao governo federal para uma solução do caso dos funcionários demitidos da extinta Petromisa, subsidiária da Petrobrás, na área de mineração. Satisfação com a reassunção da prefeita de Canindé do São Francisco/SE, Sra. Rosa Maria Feitosa, afastada por intervenção do governo estadual devido ao questionamento quanto à legalidade de sua posse. Comentários ao adiamento da apreciação, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, da PEC que trata da revitalização do Rio São Francisco.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2001 - Página 26952
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. ESTADO DE SERGIPE (SE), GOVERNO MUNICIPAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, SITUAÇÃO, SERVIDOR, POSTERIORIDADE, EXTINÇÃO, PETROBRAS MINERAÇÃO S/A (PETROMISA), SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CUMPRIMENTO, RESPONSABILIDADE, REAPROVEITAMENTO, QUADRO DE SERVIÇOS, REINTEGRAÇÃO, TRABALHO.
  • REGISTRO, REASSUNÇÃO, ROSA MARIA FERNANDES FEITOSA, PREFEITO, MUNICIPIO, CANINDE DE SÃO FRANCISCO (SE), ESTADO DE SERGIPE (SE).
  • COMENTARIO, ADIAMENTO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, APRECIAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REVIGORAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, REPASSE, PERCENTAGEM, RECEITA LIQUIDA, UNIÃO FEDERAL.
  • ELOGIO, PESQUISA, PERIODICO, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), ANALISE, PROBLEMA, REVIGORAÇÃO, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, este nosso Brasil, a par de ser uma terra maravilhosa, guarda muitas injustiças. Injustiças grandes e injustiças pequenas. Injustiças visíveis e outras invisíveis. Injustiças que merecem destaque na mídia e outras escondidas das manchetes. Hoje, quero retomar uma questão aparentemente esquecida, mas que a persistência da injustiça não nos permite calar: trata-se da humilhante situação dos funcionários da extinta Petromisa. Demitidos com a extinção da empresa, em 1990, lograram ser anistiados em 1995. Mas essa anistia lhes foi solapada, negada, subtraída. Uma injustiça que, como tantas outras de maior vulto, precisa ser reparada.

Corria o já longínquo ano de 1990, ainda no século passado (vejam só!), quando os arroubos de um Presidente-espetáculo, um mandatário descomprometido com o País, levaram-no a extinguir uma série de empresas estatais. A desculpa (esfarrapada) era de que tais atos trariam o Brasil para o Primeiro Mundo, acabariam com a ineficiência estatal, etc. etc., num discurso que, até hoje, muita gente repete como se fosse verdade.

Entre as empresas extintas, estava a Petrobras Mineração S.A (Petromisa), subsidiária da Petrobras. Desse ato irresponsável, Sergipe sofreu um dos golpes mais duros - o meu querido Estado. Trezentos e vinte e oito trabalhadores viram-se, da noite para o dia, no olho da rua.

Mas esse foi um golpe do qual não apenas Sergipe foi vítima. No Brasil inteiro, tivemos esses funcionários de estatais na rua de um dia para o outro. Não foi fácil para centenas de famílias. Primeiro, a demissão violenta, sem motivação; depois, a peregrinação pelos gabinetes e pelos fóruns; a colocação em disponibilidade, para uns; o desemprego continuado, para outros.

Mas a luta, a persistência para retomarem seus postos de trabalho não os desanimou. Uma vez impedido o ex-Presidente Collor, novo ânimo tiveram os demitidos. Um governo democrático prometia restituir-lhe um pouco da dignidade roubada.

O resultado dessa luta pela dignidade viria alguns anos depois, já em 1994. Nesse ano, este Congresso Nacional votou um projeto de anistia, que ganhou lugar no nosso ordenamento jurídico sob a forma da Lei nº 8.878, de 1994. Com essa lei, reacenderam-se as esperanças de pais e mães de família. Não era a situação ideal; a lei não determinava a reintegração das pessoas retroativa à data da extinção da empresa, mas não deixava de ser uma reparação, pois mandava que esses funcionários retornassem aos cargos anteriormente ocupados ou, quando fosse o caso, nos que tivessem resultado de transformação.

A partir da lei, valendo-se dos recursos administrativos regulares ou da Justiça, os trabalhadores da Petromisa obtiveram o direito de retornar a seus empregos. A Petrobras, sendo detentora da quase integralidade do capital da Petromisa - e é bom que atentem para esse fato -, assumiu as minas, as instalações, o patrimônio e arrendou-os à Vale do Rio Doce, hoje privatizada. Mas qual não foi a surpresa daqueles trabalhadores anistiados que, ao chegarem nas instalações da Petrobras, foram tratados indignamente.

Inicialmente, o constrangimento era a não alocação em postos de trabalho; em seguida, veio a humilhação maior: uma fria circular a eles dirigida determinou-lhes que ficassem em casa. Mesmo recebendo salários, essa situação os deixou inconformados. Trabalhadores responsáveis e dignos que eram não podiam aturar uma situação vexatória como essa. Passaram, então, a ocupar os pátios da empresa em um ato de protesto e com esperança de que fossem realocados conforme as necessidades da empresa.

Sr. Presidente, a situação era insólita. Por um lado, a Petrobras contratava, por terceirização, funcionários para desempenharem tarefas que iam do serviço de vigilância à prestação de serviços médicos. Por outro lado, funcionários da empresa, anistiados, reconduzidos pela Justiça, eram impedidos de trabalhar. Ou seja, uma situação de falta de sensibilidade e de embrutecimento das relações trabalhistas.

Mas a humilhação não parou aí. Em seguida, a Petrobras deixou de pagar os salários, enquanto recorria a não sei quantas instâncias judiciárias com o propósito meramente protelatório. Tudo isso para impedir o reingresso dos servidores anistiados. Poderosa, a empresa desrespeitou as decisões da Justiça, fez pouco caso de liminares que lhe mandavam reintegrar o pessoal, dar-lhes um posto de trabalho e pagar-lhes os salários devidos.

Desde 1995, esses trabalhadores vêm lutando para retomarem os seus empregos, valendo-se de todos os meios que lhes são possíveis. Mas a grande maioria dos anistiados só recebeu nove meses de salário. Hoje, apenas 123 deles estão recebendo, pois tiveram esse direito assegurado pela Justiça, mas, mesmo assim, não tiveram os postos de trabalho de volta. Os outros dois terços estão literalmente na rua da amargura.

O que queremos hoje, o que reivindicamos, o que de pronto queremos ver realizada é a justiça. Se este Congresso, do alto de sua sabedoria, votou uma lei; se essa lei, constitucional, está em vigor; e se a Petrobras “herdou” o patrimônio da Petromisa, deve arcar também com a responsabilidade sobre os trabalhadores injustamente demitidos.

No entanto, a Petrobras está abrindo concursos, está necessitando de mão-de-obra. Por que não reaproveita os servidores da Petromisa? Não entendemos o porquê.

Por isso, Srªs e Srs. Senadores, empenho aqui minha solidariedade aos demitidos-anistiados da Petromisa - anistiados pelo Congresso Nacional e “desanistiados” pela Petrobras - e faço um apelo ao Ministro das Minas e Energia, ao Presidente Fernando Henrique Cardoso: façam cumprir a lei, mostrem, em um gesto de grandeza, que podem passar por cima dessa mesquinharia que tem sido feita contra os pobres servidores da Petromisa. Humilhar trabalhadores dignos não é um gesto de estadista, não é um gesto de coragem, não é um gesto nobre.

O próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso e muitos dos meus pares no Congresso foram injustamente afetados por atos da administração que lesaram seus direitos trabalhistas, civis e políticos. Mas foram alcançados por uma lei de anistia, de reparação, uma lei pela qual se mobilizou toda a sociedade civil brasileira. Lutava-se, então, contra a grande injustiça. Propugnava-se pelo fim do arbítrio. Daí veio a anistia.

Pois bem, Senhor Presidente da República, é só isso o que reclamam os trabalhadores anistiados da extinta Petromisa: que a anistia deles valha tanto quanto a sua. Sei que é muito difícil falar a um Presidente que, neste momento, se encontra no exterior, mas espero que seus auxiliares imediatos possam ouvir este pronunciamento, este reclamo mais do que justo, para que, no retorno do Presidente da República, possam transferir os termos deste apelo candente que faz um Senador de Sergipe: que a anistia aprovada pelo Congresso Nacional tenha validade; que a anistia que um dia serviu para beneficiar o Presidente da República, que havia sido punido por um ato discricionário, venha a ter prevalência na democracia, através de uma lei aprovada pelo Congresso Nacional; e, finalmente, que os trabalhadores da Petromisa possam voltar a seus postos de trabalho e viver dignamente suas vidas, criando seus filhos, construindo uma vida melhor para sua família.

Sr. Presidente, custa crer que, em nosso País, em plena democracia, um ato como esse esteja sendo tolerado, esteja sendo motivo de continuidade por parte do Governo, que não demonstra qualquer vontade de corrigir essa injustiça.

O Presidente da República Fernando Henrique Cardoso herdou esse problema do Presidente Fernando Collor. No entanto, foi durante o Governo do Presidente Itamar que a lei foi aprovada, justamente quando Sua Excelência era Ministro de Estado. Mesmo assim, não se deu ao trabalho de dar cumprimento a uma legislação aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República ao qual ele serviu. Isso demonstra que o Senhor Fernando Henrique Cardoso não tem consideração com aquelas pessoas que, com suor de seu rosto e o esforço de sua inteligência, conseguiram ingressar na Petromisa, foram demitidas por um ato arbitrário e tiveram as suas reintegrações decretadas pela Justiça. Ou seja, o Presidente da República faz vista grossa a uma decisão da Justiça, desafiando os ditames instituídos pela nossa Constituição de que a lei está acima de todas as vontades e que sem o respeito à lei não existe democracia permanente.

Antes de encerrar as minhas palavras, Sr. Presidente, gostaria de fazer um registro muito significativo. Trata-se de um evento no Estado de Sergipe: a posse definitiva no cargo de Prefeita Municipal de Canidé do São Francisco, ocorrida na última segunda-feira, da Drª Rosa Maria Fernandes Feitosa, do nosso Partido, PSB, que foi afastada do cargo para o qual foi eleita pela vontade do seu povo, por um ato de intervenção do Estado. A Prefeita retomou suas funções, readquiriu o direito de dirigir o Município de Canidé do São Francisco, um dos mais importantes do nosso Estado, notadamente porque é cortado pelo rio São Francisco. Ali existem projetos da mais alta magnitude, desde o de irrigação do Xingó até o de energia elétrica, inteiramente inaugurado pelo Governo Federal, e que representa um instrumento de segurança para o nosso desenvolvimento regional.

A Prefeita tem a grande incumbência de dirigir um Município que possui uma das maiores receitas do Estado, em virtude do pagamento do INSS e do ICMS provenientes da energia elétrica nos Estados de Sergipe, Alagoas e Bahia. Isso dá à Prefeita municipal o sustentáculo financeiro de que precisa para realizar as obras indispensáveis principalmente no campo social, que é a sua grande meta.

Portanto, aproveito esta oportunidade, Sr. Presidente, para transmitir à Srª Prefeita, Rosa Maria Fernandes Feitosa, os nossos agradecimentos pela gentil acolhida à caravana de parlamentares sergipanos, entre os quais estava eu, representando a Bancada Federal do meu Estado. Em meu pronunciamento, destaquei a importância daquele ato, principalmente porque a Justiça do Estado de Sergipe reconhecera a legitimidade e a legalidade da posse da Prefeita para governar o seu Município e levar à frente o plano de trabalho que se propõe a realizar em favor do seu povo.

Finalmente, Sr. Presidente, hoje, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania iria apreciar uma matéria que considero da mais alta importância. Trata-se da revitalização do rio São Francisco. No entanto, sua apreciação foi adiada a pedido da Liderança do Governo para a próxima reunião. Refiro-me à Proposta de Emenda Constitucional nº 27 de nossa autoria e de outros Senadores, cuja Relatora é a Senadora Maria do Carmo Alves, com parecer favorável, que prevê o direcionamento de 0,5% das receitas líquidas da União para a revitalização do rio São Francisco e a execução de projetos de desenvolvimento sustentável.

A esse propósito, Sr. Presidente, destaco o trabalho inestimável e extraordinário elaborado pela Universidade de Brasília, publicado na sua revista trimestral, por intermédio do seu editor-chefe, Armando Sobral Rollemberg. Trata-se de uma publicação da mais alta importância em que destaco dois assuntos que se referem ao rio São Francisco. O primeiro, sobre a revitalização e, o segundo, do adeus à transposição do rio São Francisco, em face da crise que se abateu sobre o nosso Velho Chico.

Em determinado trecho, a revista destaca um pronunciamento do pesquisador João Suassuna, a respeito da situação dramática em que estão vivendo as populações ribeirinhas do rio São Francisco, tendo em vista o processo de assoreamento que vem sofrendo. Segundo a revista, o assoreamento, que impede a navegação, é causado pelo desmatamento que ocorre principalmente em Minas Gerais, onde o rio recebe a metade de suas águas. A matéria ainda destaca que o pesquisador João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, estima já terem sido destruídos 75% da vegetação e 95% das matas ciliares do rio. De acordo com o que ele destaca, a maior parcela de culpa cabe às siderúrgicas mineiras, consumidoras de seis milhões de toneladas de carvão vegetal por ano, quase a metade retiradas das matas nativas.

Sr. Presidente, em outro trecho, a revista ainda ressalta o problema da navegabilidade do rio. A extensão de quase 1.500 quilômetros navegáveis do rio São Francisco, entre Pirapora e Juazeiro, está reduzida a apenas quase 100 quilômetros de navegação, o que demonstra que o Governo deve debruçar-se o mais rápido possível sobre o problema da revitalização do nosso rio. Que passe do discurso à prática e venha a atuar com celeridade a respeito da salvação do nosso Velho Chico.

A nossa proposta trata justamente desse assunto e possibilitará à União transferir ao Ministério responsável pela obra de revitalização e ao Ministério do Meio Ambiente recursos da ordem de R$250 milhões anuais, durante 20 anos, porque o prazo tem que ser bastante elástico, Sr. Presidente, uma vez que a situação do rio é bastante grave. Desde as suas nascentes até a sua foz, encontramos problemas de saneamento básico, de assoreamento, de reflorestamento. É preciso tomar atitudes apropriadas a fim de que o nosso rio volte a oferecer a todos aqueles que dele se serviam no passado e querem servir-se nos dias de hoje, mais de 15 milhões de brasileiros, ações ou atividades no campo da piscicultura, do turismo, de projetos de irrigação e de energia elétrica.

Na próxima reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, esse projeto estará novamente em pauta para ser votado. Concito o Governo Federal a não diligenciar para que seja tomada alguma medida protelatória. Tenho certeza de que, se depender do Presidente da CCJ, o grande Senador Bernardo Cabral, isso não acontecerá, porque S. Exª, apesar de morar em um Estado onde as águas existem e em grande quantidade e volume, o Estado do Amazonas, conhece de perto o sofrimento do nosso Nordeste e adotará, como o fez hoje, prioridade para a tramitação da emenda da PEC de revitalização do rio São Francisco.

Envio meus parabéns e minhas felicitações à Universidade de Brasília por essa revista, uma publicação de grande porte que serve, sem dúvida alguma, para melhorar e aprofundar o conhecimento dos estudantes de Brasília, em todas as matérias referentes aos problemas que mais interessam ao povo brasileiro.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2001 - Página 26952