Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à reportagem da revista Superinteressante, que reforça a apreensão de S.Exa. em relação ao crescimento da biopirataria na floresta amazônica.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Comentários à reportagem da revista Superinteressante, que reforça a apreensão de S.Exa. em relação ao crescimento da biopirataria na floresta amazônica.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2001 - Página 28517
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, SUPERINTERESSANTE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, EXPLORAÇÃO, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.
  • CRITICA, SENADO, AUSENCIA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, CONTRABANDO, GENETICA, BIODIVERSIDADE.
  • REGISTRO, RIQUEZAS, ECOSSISTEMA, FLORESTA AMAZONICA, SUBSTANCIA, FABRICAÇÃO, MEDICAMENTOS, COSMETICOS, DADOS, PESQUISA CIENTIFICA, APREENSÃO, ORADOR, PERDA, DIREITOS, BRASIL, MOTIVO, PATENTE DE REGISTRO, PAIS ESTRANGEIRO, ESPECIFICAÇÃO, COMBATE, CANCER.
  • NECESSIDADE, PROTEÇÃO, RECURSOS NATURAIS, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO, PESQUISA CIENTIFICA, MEDICINA, SOLICITAÇÃO, APOIO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS).

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu havia preparado um pronunciamento, para fazer desta tribuna, justamente sobre biopirataria relativamente à Floresta Amazônica. Coincidentemente, a revista Superinteressante, em seu último número, publicou uma vasta e muito bem-elaborada matéria intitulada “Piratas da Floresta”. Essa publicação veio reforçar minha convicção, aliás da Nação inteira, de que somos vítimas, todo dia, de biopiratas, ou seja, dos piratas modernos que não vêm mais aqui só à cata do pau-brasil ou das aves exóticas, quando mandavam “papagaio real para Portugal”. Atualmente, eles vêm aqui em busca de matéria-prima para um sem-número de produtos, sejam farmacêuticos, cosméticos e até de outra ordem.

Sr. Presidente, passo, então, a ler o pronunciamento que já havia preparado, como também um trecho da reportagem da revista Superinteressante, a qual requeiro que faça parte integrante do meu pronunciamento. Lamento que uma CPI aqui requerida para investigar a biopirataria tenha sido simplesmente extinta, pela caducidade, em virtude da falta de indicação, pelos partidos, de seus membros. É lamentável que um assunto de tamanho interesse nacional tenha tido esse triste fim.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as extraordinárias riquezas da Floresta Amazônica sempre despertaram a cobiça de aventureiros de todas as espécies. Ao longo do tempo, e passando por diferentes ciclos, sua borracha, sua madeira, seus recursos minerais, seu abundante pescado, sua fauna exótica atraíram indivíduos em busca de fortuna fácil.

Há alguns anos, estamos observando o início de um novo ciclo. Agora, muitas expedições que se dirigem à Amazônia estão à procura não de grandes árvores, nem de ferozes predadores, mas sim de minúsculas partículas de material genético, partículas que podem ser obtidas da seiva das árvores, da química dos insetos, do veneno das plantas e a partir das quais se podem sintetizar substâncias capazes de salvar milhares de vidas humanas.

De fato, pesquisadores do mundo inteiro procuram nas matas brasileiras a cura para várias doenças. E este patrimônio genético, a nossa biodiversidade, é a riqueza maior que guarda as nossas florestas; maior que a enorme quantidade de madeiras nobres, maior até do que as reservas de ouro e outros metais preciosos, pois temos ali um enorme celeiro de remédios naturais. Afinal, 23% de todas as espécies conhecidas no mundo estão no Brasil, para não mencionar milhares e milhares de outras que não foram sequer catalogadas.

A Rede Globo de Televisão levou ao ar, meses atrás, uma edição do programa Globo Repórter tratando do potencial curativo dos produtos vegetais encontrados nos grandes ecossistemas brasileiros e da ameaça dos biopiratas, que estão, diuturnamente, a surrupiar esse material genético para transportá-lo aos exterior, submetê-lo a pesquisas e transformá-lo em medicamentos capazes de gerar milhões de dólares de lucros para os grandes grupos farmacêuticos internacionais.

Trata-se, com efeito, de uma riqueza incomensurável.

O programa relata, por exemplo, a existência de milhares de pacientes acometidos de câncer, nos Estados Unidos e na Europa, que estão combatendo a doença com a casca de uma árvore brasileira e se dizem curados; fala-se de óleos vegetais, com propriedade antiinflamatória, de um cogumelo cultivado aqui que se tornou mania no Japão, por suas reconhecidas propriedades terapêuticas, de plantas que combatem os sintomas da tensão pré-menstrual e da menopausa e até de uma madeira amazônica que funciona como um verdadeiro “Viagra” natural.

São poderosas ervas brasileiras que vêm surpreendendo o mundo. Uma nova forma de riqueza escondida na vastidão do cerrado, na Mata Atlântica e na Floresta Amazônica. Plantas eficazes no tratamento do câncer e, quem sabe, até da própria Aids.

Uma equipe de estudos brasileira, chefiada pelo conhecido médico oncologista Dr. Dráuzio Varela, vem há anos percorrendo periodicamente as margens do rio Negro, em busca de plantas medicinais. Essa equipe encontrou na floresta uma planta da mesma família do pepino bravo, o qual, há muitos anos, é comercializado por sua ação antitumoral, com eficácia no tratamento de linfomas e leucemia. Mas o resultado que mais entusiasma o Dr. Varela é a obtenção de três extratos vegetais que se mostraram ativos contra uma bactéria existente nos hospitais de São Paulo e de outros centros, a qual resiste a praticamente todos os tipos de antibióticos conhecidos.

Na verdade, o que fazem essas equipes de pesquisa é percorrer trilhas há muito tempo abertas pelos povos da Amazônia, que sempre fizeram uso de folhas e madeiras curativas.

Um caso notório é o do óleo da copaíba, um óleo tão difícil de se obter que, por vezes, é fraudulentamente misturado ao óleo diesel, para maior rendimento, e que já comprovou, em tubo de ensaio, poderes antiinflamatórios e cicatrizantes. No conhecimento popular, o óleo de copaíba é há muito tempo indicado contra gripe e inchaço.

A grande dificuldade na obtenção do óleo de copaíba faz com que a sua procura seja denominada “garimpagem”. Às vezes, uma árvore não fornece uma gota sequer do produto; em outras oportunidades, uma só árvore chega a produzir quinze litros desse óleo. O “garimpeiro” não recebe mais do que R$3,50 por um litro de óleo, duramente buscado no interior da mata. Já o exportador alega que, descontadas as despesas e vendendo cada litro por R$16,00 obtém o lucro de R$5,00 por litro. Chegando o óleo ao exterior, a situação muda drasticamente. Nos Estados Unidos o óleo de copaíba é vendido pela Internet como medicamento antiinflamatório e contra úlceras, ao preço de R$250,00 por litro, quinze vezes mais do que o preço cobrado pelo exportador.

Outro produto amazônico muito popular nos Estados Unidos é o tronco da muirapurama, transformado em pó, vendido como estimulante sexual e apresentado - repito - como o “Viagra da Amazônia”. Lá, um pequeno frasco do produto vale R$21,00; um quilo, R$700,00.

Mas, no conhecimento popular, as aplicações medicinais dos produtos da floresta são virtualmente infinitas. Da cobra jibóia se pode extrair uma substância alegadamente cicatrizante. O cipó escada de jabuti seria eficaz contra hemorróidas e males do útero. Um outro cipó mostrado naquele programa Globo Repórter é utilizado na gastrite crônica. Uma planta da família da samambaia é empregada contra picada de cobra. Da árvore conhecida como arrapazeiro se extrai um látex que os povos da floresta acreditam eficaz para todos os males do pulmão, inclusive a tuberculose.

O laboratório do Instituto de Pesquisas da Amazônia, em Manaus, dedica-se a testar as plantas, a fim de corroborar as indicações feitas pelo conhecimento popular. Um resultado já obtido por esse laboratório foi a extração da essência da uma resina vegetal conhecida como breu. As populações indígenas sempre fizeram uso do breu como um repelente natural, pois, queimado, ele exala um forte odor que espanta os insetos. A essência extraída pelo laboratório e aplicada sobre a pele mostrou grande eficácia como repelente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os conhecimentos dos povos da floresta - os nossos caboclos da Amazônia - vêm sendo resgatados por gente como a Drª Gessi Brelaiz de Castro*, índia mundurucu graduada em bioquímica que, no programa da Rede Globo, apresentou aos repórteres uma planta com propriedades antitérmicas e a infusão denominada “chá das virgens”, eficaz contra inflamações do útero e dos ovários. Ou o pajé da tribo satéré-maué Benedito Carvalho Vieira, que prepara um poderoso composto afrodisíaco misturando produtos de origem vegetal e animal.

Para explicar a riqueza das plantas em propriedades medicinais, o Dr. Dráuzio Varela lembra que, ao longo de milhões de anos de evolução natural, elas foram desenvolvendo defesas naturais contra bactérias, fungos e todos os tipos de parasitas que as atacam. Seriam, na sua opinião, essas defesas naturais as origens dos princípios ativos que servem também para combater doenças que atacam os seres humanos. O Dr. Varela lembra também a existência de 13 mil diferentes espécies de fungos no Brasil, e que esse tipo de vegetal costuma ter propriedades bactericidas e antivirais, tanto que todos os antibióticos são derivados de fungos.

Um exemplo consagrado de medicamento elaborado a partir de matéria-prima vegetal é o taxol, desenvolvido nos Estados Unidos a partir da casca de uma árvore canadense, o teixo do Pacífico, e receitado para tumores de mama e ovários pelo seu poder de impedir a reprodução das células cancerosas. A pesquisa que permitiu o desenvolvimento do taxol levou mais de dez anos.

No Brasil, contudo, esse tipo de pesquisa só recentemente foi iniciado. Até agora, alguns dos melhores resultados foram obtidos com certas plantas do cerrado, as quais, em pesquisa que vem sendo realizada pela Unicamp, não apenas impediram o desenvolvimento de células tumorais, como chegaram a matá-las.

Um dos pioneiros no Brasil da pesquisa sobre as propriedades medicinais das plantas é o Dr. Walter Accorsi, botânico da ESALQ da Universidade de São Paulo. Já nos anos 60 o Dr. Acorssi afirmava as propriedades anticancerígenas da casca do ipê. Infelizmente, as pesquisas no Brasil não avançaram e as duas patentes hoje existentes de princípios extraídos da árvore brasileira são norte-americanas. Isto é, o produto é nosso, a matéria é nossa, mas a patente é norte-americana. Atualmente, o Dr. Accorsi dedica-se ao estudo de um arbusto originário da África e trazido para o Brasil décadas atrás, o avelós. Esse arbusto produz um látex venenoso que, na dosagem correta, é muito eficaz contra câncer e leucemia.

E são muitas as pesquisas em andamento. Um laboratório localizado em São Paulo está testando um antineoplásico de origem vegetal que, em testes in vitro, mostrou-se mais eficaz que o taxol. A identidade da planta é mantida em segredo para proteção dos direitos desse laboratório. O óleo da prímula, uma flor, tem grande eficácia contra tensão pré-menstrual e também está em pesquisa. A terapia da reposição hormonal com hormônios sintéticos para combate dos sintomas da menopausa pode ser substituída, com vantagens, pela administração do hormônio natural derivado da soja. A mesma indicação tem a unha-de-gato, que, além disso, é eficaz contra sangramentos vaginais e até mioma. Uma paciente entrevistada pelo programa obteve redução, comprovada em exame de ultra-som, de um mioma, graças à utilização da unha-de-gato.

Sr. Presidente, neste ponto, faço um parêntese para prestar um esclarecimento. Na condição de médico, que tem reservas quanto à questão da eficácia e da veracidade científica de certos produtos, quero dizer que é realmente lamentável que o Brasil já esteja, há muito tempo, perdendo os seus produtos para outros países que os estão patenteando. Depois, vamos pagar royalties e preços absurdos por medicamentos que são originários da nossa fauna ou flora.

Um cogumelo cultivado no Brasil tem 95% de sua produção exportada para o Japão, onde já é objeto de estudos há mais de 30 anos. Em testes de laboratórios conduzidos no Brasil com cobaias, esse cogumelo mostrou ter atividade antitumoral direta, impedindo o crescimento celular. Em um caso clínico de uma jovem que sofria de febres repetitivas e mal-estar generalizado por conta de inchaço do baço, o uso do cogumelo proporcionou resultados excelentes, com plena melhora do estado geral. Realizado novo exame de ultra-som, comprovou-se que o baço havia voltado ao seu tamanho normal.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como se pode ver, o arsenal de remédios naturais contido nos ecossistemas brasileiros, principalmente na Amazônia, é vasto e poderoso. Por isso mesmo, desperta tanto interesse dos laboratórios e de pesquisadores estrangeiros -- os famosos biopiratas.

O caso do ipê, que foi inicialmente pesquisado aqui, mas acabou sendo patenteado no exterior, não é o único. Um outro exemplo de produto conhecido desde tempos imemoriais pelos nossos caboclos da floresta e que acabou patenteado lá fora é o do chá obtido pela decocção do cipó chamado mariri juntamente com a folha chamada chacrona. Esse chá, conhecido como ayahuasca ou vegetal, é utilizado desde os tempos do Império Inca e, em torno do seu consumo, foram criados cultos religiosos. Para os adeptos desses cultos, na composição desse chá, o cipó é o ingrediente que traz a força, enquanto a folha traz a luz, e o chá seria um remédio tanto para o corpo quanto para a mente e o espírito.

Relatos colhidos no Globo Repórter dão conta da eficácia da ayahuasca contra gripes, febres, problemas intestinais e uma infinidade de outros males. No entanto, um empresário norte-americano venceu uma disputa judicial com povos indígenas brasileiros e conseguiu obter a patente da ayahuasca. Caso ele consiga extrair o princípio ativo de algum medicamento a partir do chá, serão seus todos os lucros obtidos com a comercialização, não cabendo vantagem alguma aos povos da floresta que há séculos conhecem a bebida.

Nesse contexto dos prejuízos suportados pelo Brasil por conta da remessa para o exterior do nosso patrimônio genético, nunca é demais recordar o caso da seringueira, cujas sementes levadas para a Malásia foram responsáveis pelo fim do ciclo da borracha na economia da Amazônia.

Hoje em dia, os riscos são ainda maiores, pois, com a tecnologia moderna, um pesquisador não precisa de equipamento volumoso nem de grande quantidade de matéria-prima para obter o perfil farmacológico de uma planta. Umas poucas gramas dessa planta servem para essa finalidade. Basta consultar certas publicações científicas para obter comprovação de que os cientistas estrangeiros possuem estudos adiantados sobre as plantas amazônicas, muito mais do que nós, brasileiros, que sequer chegamos a estudar algumas delas. Há exemplo de artigo apresentado em congresso científico por pesquisadores japoneses avaliando as propriedades de 64 plantas medicinais da Amazônia -- japoneses apresentando estudos sobre 64 plantas medicinais da Amazônia! Aliás, vale lembrar que, na área de biotecnologia, 97% das plantas registradas no Brasil são de empresas ou inventores estrangeiros.

O pesquisador Charles Clement, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, reconhece a gravidade do problema da biopirataria. Mas, em sua opinião, ainda pior do que o contrabando de nosso material genético é a falta de pesquisa desse material no Brasil. E a situação ainda se agrava porque mesmo aqueles pesquisadores que têm seus estudos publicados geralmente não cuidam de protegê-los por patentes, até por falta de estímulo do Governo brasileiro.

A espinheira-santa, por exemplo, eficaz contra úlceras e como analgésico, foi estudada no Brasil na década de 80. No entanto, as duas primeiras patentes sobre os princípios da planta foram registrados de novo no Japão. Esse é um caso em que há indícios veementes de biopirataria, isto é, roubo do nosso material, da nossa biodiversidade. O Brasil, que não patenteou os resultados das pesquisas realizadas duas décadas atrás, agora corre atrás do prejuízo. Está novamente estudando a espinheira santa. Em testes efetuados com cobaias portadoras de úlceras, a planta provocou redução de 60% nas lesões.

Mas a planta brasileira que provoca maior entusiasmo hoje nos Estados Unidos, por suas propriedades anticancerígenas -- nos Estados Unidos, e não em qualquer Estado atrasado do Brasil --, é a graviola. Em suas folhas, há elementos denominados ascetogeninas, que seriam os responsáveis pelas suas propriedades terapêuticas. Pesquisas, in vitro, que estão sendo realizadas no Texas mostraram que a graviola mata as células do câncer 10 mil vezes mais rápido do que o melhor medicamento utilizado nos hospitais. No entanto, os pesquisadores não conseguiram ainda sintetizar o princípio ativo da graviola, motivo pelo qual ela vem sendo usada somente em sua forma natural, mostrando eficácia também contra vermes e parasitas.

Uma naturopata norte-americana criou uma fórmula denominada N-Tense, combinando graviola e outras sete plantas medicinais brasileiras. Segundo ela, entre 400 e 500 médicos daquele país -- dos Estados Unidos, portanto -- estão atualmente usando o composto. No entanto, fazem-no em segredo, pois a lei local determina que o tratamento do câncer seja feito apenas com remédios alopáticos -- isto é, remédios produzidos em laboratório. Portanto, se esses médicos admitissem que prescrevem o N-Tense, estariam sujeitos à cassação de seus registros profissionais.

Também na Alemanha, cerca de três mil pacientes estão utilizando uma combinação, desenvolvida por um médico daquele país, de graviola com uma planta carnívora também brasileira. Segundo esse profissional, a associação por ele criada tem a importante vantagem de não atacar células saudáveis e é 10 mil vezes mais poderosa que a quimioterapia no combate aos tumores cancerosos. Um paciente norte-americano relata que o tumor que tinha na bexiga desapareceu completamente após três semanas com o tratamento de graviola. Frente ao exame de ultra-som, que mostrou o desaparecimento do tumor, seu médico ficou atônito.

Como eu disse no início desta fala, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a maior de todas as riquezas contidas em nossas florestas é a sua espetacular biodiversidade. Temos lá, de fato, um espetacular celeiro de remédios naturais, substâncias que podem salvar centenas de milhares de vidas humanas. Trata-se de um tesouro, cujo valor, evidentemente, não é apenas econômico. Mas é também econômico.

Cumpre proteger esse patrimônio. De um lado, evitando que ele seja pirateado, roubado; de outro, realizando, nós mesmos, as pesquisas voltadas para a sua utilização.

Sr. Presidente, sei que já ultrapassei o meu tempo, mas, para encerrar, e fazendo menção de novo à publicação da revista Superinteressante que gostaria que fizesse parte integrante do meu pronunciamento, vou ler um trecho da revista sobre remédios já patenteados cuja origem do princípio ativo é brasileira. Por exemplo, o captopril, componente do veneno da serpente jararaca. No Brasil, o máximo que se faz com a jararaca é tirar-lhe o veneno para a produção do soro antiofídico. Para que o captopril é usado nos países onde está patenteado? É usado como medicamento contra o aumento da pressão arterial. E onde existe predominantemente a jararaca? No Brasil. Quem é o dono da patente? O laboratório Squibb, dos Estados Unidos.

Outra substância, a pilocarpina, extraída do pilocarpo, é um medicamento usado no tratamento do glaucoma - doença grave que pode levar à cegueira, pois aumenta a pressão ocular - e está patenteado por quem? Por vários laboratórios com sede nos Estados Unidos.

Outro exemplo é o rupununine, derivado da noz da Ocotea rodiei, árvore descoberta no meu Estado de Roraima, no extremo norte, que já está patenteado em Oxford, Inglaterra, em nome da Fundação para a Etnobiologia.

O cunaniol, usado pelos índios como veneno na pesca e pela indústria farmacêutica como relaxante, também está patenteado na Inglaterra.

O curare, utilizado pelos índios nas suas flechas, como veneno, é usado em anestesia, principalmente como relaxante muscular. É encontrado no Brasil e está patenteado nos Estados Unidos por três laboratórios.

O extrato da espinheira-santa, encontrada no Brasil, é usado contra a gastrite e já está patenteado no Japão.

Finalmente, uma substância da pele do sapo Epipedobates tricolor, encontrado no Brasil, tem função anestésica e foi patenteada nos Estados Unidos.

Recomendaria, sem fazer nenhum merchandise, que todos - Senadores, ouvintes e telespectadores da TV Senado - lessem essa matéria, porque o brasileiro, infelizmente, é muito litorâneo, preocupa-se muito com o que vem do exterior e não conhece as tantas riquezas que temos aqui.

Concluo, Sr. Presidente, pedindo novamente que o artigo publicado na revista Superinteressante faça parte integrante do pronunciamento que faço hoje, alertando contra a biopirataria e rogando ao Senado que instale a CPI da Biopirataria.

Apelo ao Ministro José Serra - que, segundo os jornais, é o campeão de aparição na televisão, fazendo algumas campanhas interessantes e outras desnecessárias - que se interesse por essa questão da biopirataria e, realmente, leve a sério esse problema.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO, INSERIDO NOS TERMOS DO ART. 210 DO REGIMENTO INTERNO.

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2001 - Página 28517