Discurso durante a 12ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem a memória do Governador, ex-Senador, ex-Deputado Federal e ex-Constituinte Mário Covas, falecido no dia 6 de março de 2001.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a memória do Governador, ex-Senador, ex-Deputado Federal e ex-Constituinte Mário Covas, falecido no dia 6 de março de 2001.
Publicação
Publicação no DSF de 06/03/2002 - Página 1416
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, MARIO COVAS, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EX SENADOR, EX-DEPUTADO, ELOGIO, ETICA, VIDA PUBLICA, ATUAÇÃO, BENEFICIO, DEMOCRACIA, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, ilustre Governador Geraldo Alckmin, Srs. Parlamentares, Senadores e Deputados, minhas senhoras e meus senhores, apenas um ano nos separa da morte de Mário Covas, ocorrida em março do ano passado, mas a verdade é que, hoje, já sabemos que o ex-Governador paulista tem assegurado o seu lugar entre os maiores políticos brasileiros de todos os tempos.

            É difícil julgar um homem público, especialmente quando é decorrido tão curto espaço de tempo de sua morte. Aliás, sempre é recomendável deixar passar vários anos ou décadas para que suas obras frutifiquem, para que seus erros ou acertos administrativos ganhem contornos definitivos, para que se aquietem as paixões que a sua atuação desencadeou, a fim de que seja julgado com serenidade e isenção.

            No entanto, já está bem claro para todos que Mário Covas era realmente um político fora de série e merece, passado um ano do seu falecimento, o elogio mais pleno e a homenagem mais irrestrita.

            Certa vez, Mário Covas disse: “Político não é tudo igual, não. Eu não sou melhor do que ninguém, mas muitos são piores do que eu.” Eu gostaria de fazer uma ressalva a essa frase. Eu diria: ninguém da nossa geração de políticos e administradores públicos foi melhor do que Mário Covas. Se eu tivesse que destacar um traço que o tornou único entre os políticos de sua geração - e tenho a honra de me incluir na geração de Mário Covas, porque nascemos no mesmo ano e porque enfrentamos as mesmas lutas cívicas -, ressaltaria a sua sinceridade. Sim, eu destacaria a sua total franqueza, a sua impressionante sinceridade.

            Foi dito e repetido, quando do falecimento de Mário Covas, que ele era um político que jamais escondia o que estava pensando, que ele era um político que não sabia mentir. Talvez o único, acrescentavam os maliciosos.

            A verdade é que Mário Covas não tergiversava. Ia sempre direto ao que pensava, mesmo correndo o risco de desagradar os amigos e de agradar os adversários. Se julgava justo e correta a meta a que se propunha a atingir, Mário Covas não media esforços, não economizava energia, não evitava riscos.

            Muitos atribuem essa sua franqueza à ascendência espanhola, ao seu quente sangue espanhol. Pode ser, mas a verdade é que esse traço de caráter se refletia de forma insofismável na sua atuação pública, porque determinava todas as suas ações e reações. Aliás, não havia diferença entre o Covas político e o Covas cidadão; ambos reagiam do mesmo modo: corajosa e abertamente.

            A tradição brasileira não é a do aberto confronto de idéias, como preferia Mário Covas. A nossa cultura política é a de conversa ao pé do ouvido, do acordo secreto, do acerto sigiloso, do entendimento na surdina, dos movimentos de bastidores.

            Mário Covas não era assim. Ele preferia a luta franca. Se tinha de discordar, discordava. Não contemporizava. Por isso era chamado de turrão, mal-humorado, ranzinza.

            Quem não lembra daquele episódio em que, cercado por professores em greve, recusou-se a sair pela porta dos fundos de um prédio estadual. O teimoso Mário Covas, contrariando os elementos de sua equipe de segurança, saiu pela porta da frente, enfrentou os radicais e disse a eles que aquele era um movimento puramente político, já que ele, Covas, havia elevado bastante o salário dos professores. Tentaram agredi-lo, mas ele saiu pela porta de frente, com a sua dignidade, passo a passo, entre os grevistas e cumprindo a sua missão. Pela porta dos fundos, nunca!

            Como o próprio Mário Covas lembrou depois, nas entrevistas que deu à imprensa, a solução mais simples teria sido chamar a força policial. Bastava chamar a força policial para que garantisse a saída do Governador. Mas ele nunca faria isso!

            Aquele é um episódio exemplar na vida de Mário Covas, porque mostra que ele era um homem que nunca procurava a solução mais fácil; muito ao contrário, procurava a saída mais digna, mais legítima, a mais democrática.

            Em uma outra ocasião, Covas chegou a subir no carro de som dos que se manifestavam contra o projeto que ele havia enviado à Assembléia, aumentando a contribuição para a Previdência estadual. Ali, ele disse: “A obrigação de quem governa é esta: vir aqui e dar uma satisfação, ainda que não seja para agradar. Porque se for para agradar, todo mundo sabe fazer.”

            Sim, o temperamento sangüíneo de Covas determinava todas as suas outras ações. Ele sempre reagiu de pronto, na hora. Como era um homem de sólida formação moral, não vacilava entre as opções. Tomava sempre, sem tardança, o caminho mais ético.

            Eis aqui outra peculiaridade de Mário Covas, que o fazia destoar da tradição política brasileira: ele não retardava as suas decisões, não prorrogava as medidas que tinha de tomar, mesmo quando antipáticas.

            Como é do conhecimento geral, grandes políticos brasileiros ficaram famosos por retardar ao máximo suas decisões, na esperança de que a passagem do tempo resolvesse os problemas ou dirimisse os confrontos.

            Por tudo isso, pode-se dizer, sem medo de errar, que Mário Covas era, de certo modo, o “antipolítico” brasileiro.

            Senhoras e Senhores, em um segundo momento deste meu pronunciamento, queria destacar o fato que mais me parece lamentável na morte de Mário Covas: na minha opinião, o Brasil perdeu um grande Presidente.

            Se não tivesse sido golpeado pela doença, estou certo de que Mário Covas seria o candidato à Presidência da República que uniria muitas forças, além do seu PSDB, na próxima eleição. E provavelmente seria imbatível.

            O que credenciava Mário Covas para exercer a Presidência da República? Em primeiro lugar, seu vasto e brilhante currículo político e administrativo. Mas o que me dá plena certeza de que Mário Covas seria um grande Presidente é a sua gestão à frente do Governo de São Paulo nos últimos seis anos.

            Todos lembram que quando Mário Covas assumiu o governo, o Estado de São Paulo estava em uma situação difícil. Adotando corajosas atitudes políticas, muitas delas impopulares, o Governador paulista conseguiu o que parecia ser impossível: colocar em ordem as finanças do mais rico Estado brasileiro.

            Lembro-me de um almoço no Palácio, em que lhe perguntei: Covas, como explicas essa intervenção no Banespa na antevéspera de assumires? Foi feito um acordo com o Presidente para que houvesse a intervenção e tu não sofrestes desgaste?” Ele respondeu: “Eu era contra a intervenção. Não fui consultado. Tomei conhecimento da intervenção pela imprensa, porque nem o Governador nem o Ministro da Fazenda me telefonaram dizendo que iria haver intervenção no Banco do Estado de São Paulo.”

            Falei com ele em outra ocasião: “Covas, o Presidente Fernando Henrique tem o grupo que o cerca, mas está faltando a presença, o conselho, a ação de pessoas como tu - pelo que tu és, pela tua biografia, pelo que representas no teu Partido e por seres o Governador de São Paulo”. E ele me respondeu: “Lamentavelmente, o Presidente nunca me consultou sobre esses assuntos”. Havia uma crise na política brasileira. “Sobre esses assuntos, comigo ele não fala.”

Há um pronunciamento de Covas sobre a administração pública que considero de uma clareza solar, irretocável:

Não compreendo porque começaram 14 hospitais para não terminar nenhum. Porque não construíram apenas um e terminaram, ao invés de deixarem 14 parados. Isso é um desrespeito ao dinheiro do contribuinte, que pagou pela obra inacabada e não pode utilizá-la.

            A recuperação das finanças de São Paulo foi um trabalho silencioso. Mário Covas não aumentou impostos, mas passou a cobrar mais resultados de seus secretários. Exigiu que os gastos públicos tivessem um retorno melhor para a sociedade. Pelo exemplo pessoal, imprimiu austeridade, empenho, seriedade e correção na condução dos negócios públicos.

            Hoje, com as finanças saneadas, o Estado de São Paulo está em condições de tocar as grandes obras que foram sonhadas pelo engenheiro Mário Covas.

            Nos dias que antecederam sua morte, Covas lamentou muito não ter mais condições de concretizar o que havia planejado, já que somente após seis anos de mandato teria algum recurso para investir.

            Aliás, neste ponto, cabe mencionar um outro traço pessoal de Mário Covas que chamava a atenção de todos os que o cercavam: a sua mentalidade de engenheiro. Mário Covas era cartesiano, pragmático, gostava de tudo às claras, bem explicado, bem planejado. Suas decisões administrativas visavam sempre os melhores resultados em benefício dos cidadãos, com o menor gasto.

            Na gestão dos negócios públicos, Mário Covas não se prendia a modismos ideológicos. Ele era um social-democrata convicto e, como tal, repudiava os dogmas tanto da direita quanto da esquerda.

            Mário Covas desprezava o populismo: “um fantasma que assombra tanto as agremiações de direita quanto as siglas de esquerda; vício político que vive da manipulação das massas menos esclarecidas”.

            Se, de um lado, pode-se dizer que Mário Covas seria um grande Presidente da República, pelas suas virtudes de administrador, de outro lado, deve-se ressaltar o seu total desapego ao poder, às formalidades que cercam o poder. Sabemos como muitas pessoas, desde o mais alto aos médios escalões, mudam e se transformam no exercício do poder.

            Mário Covas, mesmo tendo sido Prefeito da maior cidade da América do Sul e Governador do Estado mais rico do Brasil, não se deixou contagiar pela arrogância ou pela insensibilidade ou pela indiferença que acompanham muitas vezes o exercício do mando político.

            O desapego ao poder é outra das grandes qualidades de Mário Covas. O poder, para ele, era o instrumento para servir o povo, para governar em favor dos mais vulneráveis.

            Lembro-me de que, Governador do Rio Grande do Sul, quando estavam surgindo os movimentos para criar o PSDB, o Orestes Quércia, então Governador de São Paulo, chamou-me dizendo que sabia da minha amizade com Mário Covas e gostaria que eu dissesse a ele que se ficasse no PMDB teria sua candidatura a Governador absolutamente garantida. Fui ao gabinete do Covas. Estavam lá ele, o então Senador Fernando Henrique, o Richa e outras pessoas. Transmiti o recado: “Estou aqui, como emissário do Governador de São Paulo, para dizer que é um compromisso de honra: o candidato a Governador na legenda do PMDB és tu”. Os outros colegas riram, como se não devêssemos acreditar no Quércia. Diziam que era embromação para o Covas ficar e, depois, o Quércia faria o que quisesse. O Covas respondeu: “Tenho convicção de que se eu ficar no PMDB serei o candidato a Governador, porque é a minha vez. Na primeira eleição, o Quércia concorreu com o Montoro, mas perdeu, porque era a vez do Montoro. E o Quércia se contentou. Na segunda eleição, concorri com o Quércia, mas ele possuía a máquina do governo, o Montoro praticamente cedeu a ele todas as forças políticas, e ele possuía a maioria na convenção. Agora, é a minha vez. Se eu ficar no PMDB, serei o candidato. Mas não vou ficar, porque os meus companheiros - o Pimenta, o Richa, o Scalco, o Fernando Henrique e outros tantos - estão saindo e eu vou sair com eles.”

            Naquela ocasião, e alguns dias depois, no Rio Grande do Sul, ele insistiu muito para que eu também fosse para o PSDB. Respondi que a minha amizade com o Ulysses e o meu esforço na busca de uma solução para o País me levavam à tese de que o importante não era, a cada divergência, construir um novo partido. Se havia divergências no Partido, em São Paulo, se eles eram minoria no Partido, em São Paulo, tinham que lutar para conseguir a maioria, porque se cada vez que fôssemos minoria construíssemos novos partidos, nunca teríamos partidos consolidados. Mas o Covas, sabendo que era candidato a Governador pelo PMDB, entrou no PSDB. Imprevisível o que iria acontecer, mas ele não estava pensando nisso, seguiu a meta do seu sentimento.

            O temperamento de Mário Covas - sua franqueza rude e seu decantado mau humor - acabou sendo muito explorado pela imprensa. Mas a verdade é que Mário Covas tinha muitas virtudes escondidas sob o seu jeito turrão. Era um amigo afetuoso, dedicado e prestimoso. Sou um dos que podem dizer isso, pois nas horas mais dramáticas e mais difíceis da minha vida, Mário Covas foi de São Paulo a Porto Alegre para levar a solidariedade, o carinho e a amizade.

            Cassado pela violência, pelo arbítrio, o grande Líder do PMDB era um jovem, um guri, um engenheiro, e, boquiabertos, todos assistiam aos seus pronunciamentos espetaculares, que seguiam uma linha de bom senso, uma linha de equilíbrio, de dizer não à radicalização e sim ao avanço da democracia.

            Quando fomos visitá-lo era impressionante ver a serenidade de Mário Covas: sem ódio, sem mal querência. Aquele turrão, aquele revoltado estava em paz com sua consciência, aconselhando-nos a prosseguir: “Vocês tem que continuar”. Havia um movimento no sentido de renúncia coletiva, de voto em branco, e ele nos incentivou a prosseguir, pois que a caminhada ainda não tinha terminado. E lá foi ele cuidar da sua vida, o que fez durante dez anos, voltando depois para continuar a sua liderança.

            Era um amigo, repito, afetuoso, dedicado e prestimoso. Ao contrário do que alguns imaginam, Mário Covas sabia ouvir com atenção. Era uma personalidade agregadora, homem de partido, uma espécie de bússola do PSDB, uma bússola que evitou grandes extravios em certos momentos.

            Se o nosso amigo Serra hoje é candidato, se o Fernando Henrique hoje é Presidente da República, muito se deve ao Covas. Em determinado momento, o comando do PSDB já estava praticamente com o acordo selado e fechado com o Collor para fazer parte do Governo do Covas - Fernando Henrique, inclusive, seria o chanceler. Ele não conseguiu realizar o grande sonho da sua vida com Tancredo, com Serra e muito menos com o Collor; conseguiu fazê-lo com Itamar. Três Ministros e o Collor, justiça seja feita, que estava querendo dar um novo rumo ao seu governo para retomar a credibilidade perdida, achavam que, com o PSDB, o assunto estaria resolvido. Praticamente a imprensa toda já sabia que o acordo seria aprovado e que os Ministros seriam indicados. Só não esperavam por Mário Covas e seu discurso, um discurso tão claro, tão preciso, tão real, tão objetivo, que os mais apaixonados tiveram que reconhecer que estavam errados. O discurso de Covas retirou o PSDB do funeral do Collor, e, pouco depois, a CPI, que seria instalada de qualquer maneira, levou-o ao impeachment.

            Na CPI do impeachment, que atuação emocionante foi a de Mário Covas: seriedade, imparcialidade, austeridade. Ele buscou todas as fórmulas, mesmo as mais humildes, de ajudar nas investigações. Com dois grupos, foi a São Paulo consultar um e outro, buscar provas. Enfim, o seu trabalho, realmente, foi excepcional e o dignificou e também seu Partido.

            Discursando na sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, em outubro de 2000, Covas definiu com precisão a questão da ética na vida pública. Disse ele: “A ética na política exige exatamente um comportamento permanente a esse respeito. Exige uma crença dos valores que a ética cultiva, uma crença no povo, uma crença na democracia, uma crença na seriedade. E, quando falo em seriedade, não falo em honestidade. Vou mais longe do que isso. Falo em integridade, falo na capacidade que cada um tem de se conduzir de forma adequada em cada circunstância, em cada momento, fazendo com que a política seja colocada num plano superior a cada um dos políticos. Ao fazermos isso, nós certamente estamos contribuindo para a ética na política”.

            Senhoras e Senhores, como todos os homens de nossa geração, Mário Covas viu transcorrer sua vida política entre um breve interlúdio democrático, a longa ditadura e, por fim, o retorno à democracia plena, com a Constituição de 1988.

            No que se refere à economia, este País avançou, embora tenhamos passado por quadras muito ruins, com inflação persistente, endividamento irresponsável por parte de agentes públicos. Em função desses problemas, a década de 80 foi considerada a década perdida. Depois de muitos planos econômicos desastrosos, só conseguimos alcançar a estabilidade econômica em meados dos anos 90. Foi o Governo Itamar Franco, com o Plano Real, que iniciou o combate à inflação e a normalização do déficit público. Restou, porém, a grande, a absurda, a indigna e desumana dívida social. Avançamos na política, na economia, mas, no terreno social, continuamos a ser uma das mais injustas nações, se não a mais injusta, na distribuição da renda.

            Essa injustiça social era muito sentida por Mário Covas. Ele não conseguia entender como um País tão rico como o Brasil podia ter uma parcela tão grande de sua população passando necessidades.

            Mas ele fez a sua parte. Ao recuperar as finanças de São Paulo, preparou-se para desencadear um grande programa de investimentos, gerando milhares de empregos, o que beneficia diretamente os mais humildes.

            Mário Covas, um homem à frente de seu tempo, despertou antes dos demais para a importância da responsabilidade fiscal. Sabia que só um Estado saneado pode prestar os serviços reclamados pela sua população, principalmente a população mais pobre. Mas Covas ia além. A essa responsabilidade, somava o seu sonho de toda uma vida: a construção de um país socialmente mais justo.

            Senhoras e Senhores, nunca a classe política brasileira esteve tão desprestigiada quanto hoje. Quando se faz um levantamento para ver em quais instituições o cidadão brasileiro menos confia, uma posição de desonra sempre é reservada aos políticos.

            É verdade que os políticos são mal vistos em muitos outros países, porque os povos de todas as línguas costumam atribuir sempre a persistência de mazelas sociais ou administrativas à má-fé, à má-índole, aos maus propósitos e aos baixos instintos da classe política.

            Nesse meio ambiente hostil e adverso, Mário Covas era o modelo e o protótipo do autêntico, do legítimo, do verdadeiro representante do povo, distante das imperfeições que lhe atribuem o cidadão comum.

            Mário Covas era a honestidade, num meio saturado pelas denúncias de corrupção e de maus tratos ao dinheiro público.

            Mário Covas era a verdade, numa atividade marcada pela dissimulação, pela falsidade e pela mentira.

            Mário Covas era o interesse público, num meio marcado pela defesa desavergonhada dos interesses mais particulares e indefensáveis.

            Mário Covas era a coragem, numa classe marcada pelos exemplos de covardia, de traição, de duplo sentido.

            Mário Covas era a ética, num ambiente contaminado pela indecência, pelas tentações, pelas fraquezas do ser humano.

            Mário Covas era o político, num momento da história em que essa categoria se transforma quase numa ofensa, numa desqualificação.

            Mário Covas era tudo isso.

            Mário Covas foi um exemplo, um marco, um paradigma num País hoje flagelado pela carência de homens e de referências.

            Mário Covas se foi, mas ficou seu exemplo.

            O Brasil seria melhor, mais justo, mais feliz, se seguisse os exemplos e as lições de homens como Mário Covas.

            Sejamos, todos nós, um pouco de Mário Covas. E o Brasil, com certeza, ser-nos-á grato.

            Levo o meu abraço ao ilustre Governador de São Paulo, continuador de sua obra, e à família de Covas, na pessoa de Dª Lila Covas e de todos os seus familiares.

            Encerro, não podendo fugir de uma publicação da Folha de S.Paulo. Trata-se de uma mensagem que emocionou o Governador Mário Covas na primeira entrevista que concedeu após se submeter a uma cirurgia para retirar dois tumores malignos no intestino. O texto contém uma fábula, de autoria desconhecida, que foi adaptada para Covas pela Professora Mary Lourdes Machado Barbosa, do Rio de Janeiro.

      Amigos - meu amigo Covas,

      um dia, uma pequena abertura apareceu num casulo.

      Um homem sentou e observou a borboleta por várias horas, conforme ela se esforçava para fazer com que seu corpo passasse através daquele pequeno buraco.

      Então, pareceu que ela havia parado de fazer qualquer progresso.

      Parecia que ela tinha ido o mais longe que podia, e não conseguia ir mais.

      Então o homem decidiu ajudar a borboleta: ele pegou uma tesoura e cortou o restante do casulo. A borboleta, então, saiu facilmente.

      Mas seu corpo estava murcho e era pequeno e tinha as asas amassadas.

      O homem continuou a observá-la porque ele esperava que, a qualquer momento, as asas dela se abrissem e esticassem para serem capazes de suportar o corpo que iria se afirmar a tempo.

      Nada aconteceu! Na verdade, a borboleta passou o resto de sua vida rastejando com um corpo murcho e asas encolhidas. Ela nunca foi capaz de voar.

      O que o homem, em sua gentileza e vontade de ajudar, não compreendia era que o casulo apertado e o esforço necessário à borboleta para passar através da pequena abertura era o modo pelo qual Deus fazia com que o fluido do corpo da borboleta fosse para as suas asas, de forma que ela estaria pronta para voar uma vez que estivesse livre do casulo.

      Algumas vezes, o esforço é, justamente, o que precisamos em nossa vida. Se Deus nos permitisse passar através de nossas vidas sem quaisquer obstáculos, nos deixaria aleijados. Não iríamos ser tão fortes como poderíamos ter sido. Nós nunca poderíamos voar.

      Eu pedi forças... e Deus deu-me dificuldades para fazer-me forte. Eu pedi sabedoria... e Deus deu-me problemas para resolver.

      Eu pedi prosperidade... e Deus deu-me cérebro e músculos para trabalhar.

      Eu pedi coragem... e Deus deu-me pessoas com problemas para ajudar.

      Eu pedi favores... e Deus deu-me oportunidades.

      Eu não recebi nada do que pedi... mas eu recebi tudo de que precisava.

            Saudades, meu amigo Mário Covas! Em nome dos teus amigos, dos teus irmãos, levo a ti a minha mais sentida homenagem.

            Muito obrigado. (Palmas.)

 

            


            Modelo14/25/248:06



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/03/2002 - Página 1416