Discurso durante a 29ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ABORDAGEM SOBRE A NATUREZA DE SERVIÇOS PRATICADOS PELOS BANCOS COMERCIAIS, DIANTE DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE INGRESSADA PELA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO SISTEMA FINANCEIRO - CONSIF NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, QUE ACUSA A EXISTENCIA DE CONFLITOS ENTRE DISPOSITIVOS DO CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A LEI ESPECIFICA DO SISTEMA FINANCEIRO.

Autor
Eduardo Siqueira Campos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/TO)
Nome completo: José Eduardo Siqueira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • ABORDAGEM SOBRE A NATUREZA DE SERVIÇOS PRATICADOS PELOS BANCOS COMERCIAIS, DIANTE DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE INGRESSADA PELA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO SISTEMA FINANCEIRO - CONSIF NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, QUE ACUSA A EXISTENCIA DE CONFLITOS ENTRE DISPOSITIVOS DO CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A LEI ESPECIFICA DO SISTEMA FINANCEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/2002 - Página 3119
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, BANCOS, QUESTIONAMENTO, APLICAÇÃO, CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, FISCALIZAÇÃO, SERVIÇO BANCARIO, OPINIÃO, ORADOR, INADMISSIBILIDADE, AÇÃO DIRETA, INCONSTITUCIONALIDADE, EXPECTATIVA, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REPUDIO, IMPUNIDADE, ABUSO, PODER ECONOMICO.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (Bloco/PSDB - TO) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Código de Proteção e Defesa do Consumidor, instituído pela Lei nº 8.078, de 1990, tem seu âmbito de validade questionado presentemente pelas organizações bancárias.

É necessário realçar, de início, a grande importância que adquiriram as relações de aquisição de bens e serviços nos dias atuais. Não é sem razão que o Constituinte inseriu, no capítulo que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, um dispositivo específico (artigo 5º, inciso XXXII), que estabelece que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. Além disso, determinou, no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que o Congresso Nacional deveria elaborar, no prazo de cento e vinte dias após a promulgação da Carta Magna, o Código de Defesa do Consumidor.

Mas, quanto ao assunto a ser abordado nesta oportunidade, podemos dizer que a comprovação de que banco não é apenas um intermediador financeiro está nas tarifas que são cobradas pelos serviços bancários. Repito, serviços bancários.

Se se trata de prestação de serviços, não há o menor sentido para o atual questionamento que os bancos vêm tentando suscitar no que tange à natureza das atividades que realizam no relacionamento com os clientes, Sras e Srs. Senadores.

Porém os bancos, por meio de sua Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF), ingressaram com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no Supremo Tribunal Federal (STF), para impedir que os clientes se valham do Código de Proteção e Defesa do Consumidor quando se sentirem lesados ou prejudicados pelos bancos, alegando que o Sistema Financeiro Nacional necessita de uma lei complementar, e o Código de Defesa do Consumidor é uma lei ordinária. Por sua vez, os órgãos de defesa dos direitos dos clientes argumentam que o Código nunca teve o propósito de regular o sistema financeiro; apenas visa à proteção dos usuários, como em qualquer relação de aquisição de bens ou serviços. Esta posição foi acolhida pelo próprio Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, pelo Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, e pela Diretoria do Banco Central.

Realmente, a Constituição prevê, em seu artigo 192, que “O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre...” Segue-se uma enumeração de regras, que, em nenhum aspecto, mencionam a relação com os clientes ou usuários do sistema.

Acontece que a Constituição previu apenas que a estruturação e normas de funcionamento geral deviam constar de lei complementar. No relacionamento com os clientes, todas as características apontam para uma relação contratual cível, em que os bancos prestam os serviços e cobram por eles.

O julgamento da ADIN impetrada pela CONSIF só acontecerá no mês de abril, pois o atraso na publicação no Diário da Justiça impossibitou a realização do julgamento ainda no mês de março.

De acordo com manifestação do Procurador-Geral da República, em relação ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor, consignada em seu parecer, “não há invasão de competência alguma; mostra-se perfeitamente possível a coexistência entre a lei complementar reguladora do Sistema Financeiro Nacional e o código a que devem sujeitar-se as instituições bancárias, financeiras, de crédito e de seguros, como todos os demais fornecedores, em suas relações com os consumidores”.

Os bancos querem continuar com o abuso de poder econômico, sem sujeitar-se às sanções previstas e justas. O número de queixas contra essas instituições cresce assustadoramente. Em 2001, o Procon de São Paulo recebeu 12.126 consultas e 2.893 reclamações contra o setor. Em 2000, havia recebido 9.979 consultas e 1.654 reclamações. Constatamos um aumento de 21% no número de consultas e de surpreendentes 75% no número de reclamações.

            Na realidade, o que os bancos pretendem com a ADIN é livrar-se de alguns dispositivos incômodos presentes no Código de Defesa do Consumidor, entre os quais podemos mencionar:

¨     cobrança indevida: o consumidor tem direito à devolução em dobro, de acordo com os artigos 39 e 42 do CDC;

¨     falha em transações: o banco responde independente de culpa, conforme o artigo 14 do Código;

¨     dívida: é proibida a inclusão do nome do devedor nos cadastros da Centralização de Serviços dos Bancos S.A. - Serasa ou nos Serviços de Proteção ao Crédito - SPCs, enquanto estiver o caso dependente de ação judicial, respeitando os artigos 42 e 43 do CDC;

¨     artigo 51 do Código proíbe a utilização de cláusulas contratuais que deixem o fornecedor em vantagem excessiva, mas elas são freqüentes em contratos bancários;

¨     artigo 39 proíbe enviar qualquer produto sem solicitação do cliente ou consumidor;

¨     é obrigatório fornecer cópia do contrato ao cliente. Só recentemente os bancos passaram a obedecer essa norma.

Como podem ver as Sras e os Srs. Senadores, os bancos têm motivos de sobra para não quererem sujeitar-se ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Este é um verdadeiro freio aos abusos que costumavam praticar contra os clientes.

O parecer elaborado pelo Ministério da Justiça e pelo Banco Central, encaminhado pelo Presidente Fernando Henrique ao Supremo Tribunal Federal, esclarece de uma vez por todas as questões suscitadas pelos bancos. O texto ressalta que o Código de Defesa do Consumidor não regula o sistema financeiro. Além disso, o Código é uma norma de conduta, e não de organização, e a intenção do legislador, quando de sua elaboração, não foi a de disciplinar os aspectos relacionados ao custo de intermediação financeira e da aplicação de recursos próprios das instituições. Dessa forma, não pode haver conflito entre o Código e a lei específica do sistema financeiro.

            Creio que se pode esperar do Supremo Tribunal Federal uma decisão que demonstre toda a sabedoria daquela Corte, fazendo valer as normas que protegem os consumidores na qualidade de clientes bancários, impedindo que o poder econômico esmague os usuários dos bancos, como já foi praxe neste País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/2002 - Página 3119