Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Influência do déficit público e do descontrole na emissão de moeda para a crise argentina.

Autor
José Fogaça (PPS - CIDADANIA/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Influência do déficit público e do descontrole na emissão de moeda para a crise argentina.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2002 - Página 3805
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, DECADENCIA, ECONOMIA, EFEITO, INSUCESSO, POLITICA CAMBIAL, AUSENCIA, CONTROLE, DEFICIT, SETOR PUBLICO, EMISSÃO, MOEDA, PROVINCIA.
  • COMENTARIO, SUPERIORIDADE, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA.
  • COMENTARIO, INEXATIDÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, BRASIL, AVALIAÇÃO, CRISE, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JOSÉ FOGAÇA (Bloco/PPS - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta etapa política marcante e pré-sucessória da vida do País, em que se articulam as candidaturas à Presidência da República, se definem as coligações e se estabelecem as conversações democráticas para a construção do processo eleitoral, vivemos momentos de tensão e de preocupação interna.

Próximo de nós, o nosso país irmão, a Argentina, está vivendo horas realmente dramáticas. É profundamente entristecedor, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, testemunhar e presenciar, na fronteira do Brasil com a Argentina, o estado de ânimo absolutamente deprimente e a situação de decadência econômica e de paralisia das atividades produtivas, somados à total falta de perspectiva que vivem os nossos irmãos argentinos.

Esse fato nos traz inquietação, em particular, para os gaúchos, que crescemos e nos desenvolvemos aprendendo sempre a admirar a pujança e a grandeza econômica da Argentina, que chegou a ser, no princípio deste século, por volta de 1910, um dois países de mais alta renda per capita do mundo - bem maior, inclusive, do que a de muitos países europeus. Na Argentina, nos meados do século XX, já havia o melhor nível educacional de toda a América Latina e os mais baixos índices de analfabetismo.

É interessante notar que, assim como é difícil um povo sair do estado de pobreza e de ignorância, também é muito penoso, apesar de todas as crises econômicas, mudar o perfil educacional de uma nação. Nas últimas três ou quatro décadas, a Argentina viveu sucessivas crises e um inegável processo de decadência econômica, uma visível perda de espaço no cenário econômico mundial. Mesmo assim, continua tendo os melhores índices educacionais da América Latina, de causar inveja a muitos países do mundo. Ou seja, assim como é difícil arrancar um povo coletivamente da ignorância, também é muito difícil destruir essa força gerada pela educação, pela formação intelectual de um povo como o argentino.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste momento, em que estamos vivendo um processo sucessório, em que estamos fazendo escolhas para o futuro, em que estamos definindo as próximas etapas da vida brasileira, preocupam-me muito as avaliações erradas, extremamente equivocadas, que estão sendo feitas em torno da Argentina.

Alguns atribuem à crise argentina aspectos que são importantes, mas secundários no que está acontecendo. Alguns dizem que a Argentina está nessa situação porque realizou um grande programa de privatizações. Ora, inúmeros países realizaram programas de privatização em casos distintos, em situações diversas: alguns realizaram programas sólidos, consistentes, eficazes e eficientes; outros realizaram programas de privatização pífios, de mau resultado, de resultados precários. Portanto, atribuir o problema argentino a um processo específico e particular de um programa de desenvolvimento econômico ou de reforma do Estado é um equívoco, um erro. E, infelizmente, já ouvi candidatos à Presidência da República dizerem que o mal da Argentina está no programa de privatização empreendido pelo Governo anterior ao de Fernando de la Rúa, que foi o Governo do Presidente Carlos Menem.

            É possível que tenha havido muitos erros na condução do programa de privatização na Argentina, atropelos e até atos inconseqüentes e equivocados. Mas o programa de privatização é um aspecto específico, particular, e está confinado a uma questão localizada do problema.

            O drama argentino se deve a duas questões absolutamente essenciais, definitivas e definidoras da crise. A crise argentina se deve ao fato de que, tendo realizado, sim, um programa de privatização e algumas mudanças na órbita da sua economia, como a abertura econômica que, inegavelmente, realizou nos anos do Governo Menem e que não mudou nos anos de Fernando de la Rúa, o país cometeu o grave erro de manter dois vícios institucionais, que não foram sanados ou revertidos em momento algum. O primeiro deles é a paridade da moeda nos termos estabelecidos pela Lei Domingo Cavallo, a lei que gerou a paridade do peso com o dólar no Governo Carlos Menem, pelo Ministro Domingo Cavallo.

A fixação de um dólar por um peso, esse regime cambial engessado, fechado, tirou a possibilidade de uma política cambial flexível, criativa, para enfrentar diferentes situações ou tendências novas que o mercado internacional pudesse oferecer. Portanto, a Argentina entregou a sua balança comercial à rigidez dessa política cambial absolutamente fechada e restrita que pôs em prática a partir do Governo Menem, tendo Domingo Cavallo como Ministro. Mas, inclusive esse erro, essa decisão, esse regime tão fechado, tão rígido do ponto de vista da organização do câmbio, ainda assim poderia não ser tão malsucedido como foi, poderia não levar a uma derrocada econômica, como está levando, se a Argentina observasse rigorosamente uma questão essencial, que é o controle do seu déficit público.

O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti) - Senador José Fogaça, peço permissão a V. Exª a fim de lembrar que, conforme estabelecido, às 11h30min comparecerá a este plenário o Sr. Ministro Celso Lafer. Portanto, gostaria que V. Exª encerrasse seu pronunciamento a fim de que possamos suspender a sessão e dar entrada a S. Exª.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (Bloco/PPS - RS) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Agradeço a V. Exª e encerro em seguida.

            O registro que gostaria de fazer é exatamente o fato de que a grave e crucial questão que explica a derrocada da economia argentina é o descontrole absoluto do déficit público, a incapacidade de controlar o potencial de emissão de moeda de suas províncias. As quatorze províncias argentinas emitem moeda como se fossem um país, como se fossem uma nação. Não há uma consolidação no controle de capacidade de emissão de moeda. Há um absoluto descontrole do déficit público. Essa é a razão fundamental que levou a Argentina a perder o controle de sua economia.

Portanto, peço aos candidatos à Presidência da República que, ao fazerem um diagnóstico sobre a realidade argentina, ao fazerem uma avaliação sobre as razões que levaram a Argentina a esta débâcle, não cometam o erro de enfoques indevidos, de enfoques distorcidos, de uma visão caolha e restritiva do problema argentino. O desequilíbrio financeiro, a desarrumação das finanças e o endividamento cada vez maior em função de déficits sucessivos do Orçamento argentino levaram a essa derrocada. Não é outra senão fundamentalmente e essencialmente essa a razão pela qual o Brasil precisa aprender, precisa tirar lições eficazes do drama dos nossos irmãos argentinos.

Solidários com eles, evidentemente, participando da dor e do sofrimento do povo argentino, apoiando a Argentina nas suas reivindicações externas, para obter um financiamento que lhe permita sair da crise, não podemos deixar de tocar o dedo na ferida e de dizer que este erro sucessivo, por mais de uma década, ao longo de muitos anos, acabou acumulando déficits, dívidas, que tornaram a Argentina realmente este país em situação hoje de absoluto descontrole econômico e financeiro.

Sr. Presidente, esta é a avaliação que entendo deveria fazer. Este é o registro que eu gostaria de fazer perante os candidatos à Presidência da República, que têm feito afirmações absolutamente estapafúrdias e maldirecionadas, a partir de diagnósticos errados em relação ao problema e ao drama argentino.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2002 - Página 3805