Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância do cumprimento da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, o Código do Consumidor.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.:
  • Importância do cumprimento da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, o Código do Consumidor.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2002 - Página 3835
Assunto
Outros > CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
Indexação
  • COMENTARIO, ABUSO, PODER ECONOMICO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, ANALISE, SITUAÇÃO, CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, INFERIORIDADE, APLICAÇÃO, COMPARAÇÃO, PRIMEIRO MUNDO.
  • DENUNCIA, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO, INFORMAÇÃO, CONSUMIDOR, CARACTERISTICA, PRODUTO, SERVIÇOS PROFISSIONAIS, ESPECIFICAÇÃO, MERCADORIA, SUPERMERCADO, OMISSÃO, FISCALIZAÇÃO, ESTADO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB - MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já é lugar-comum dizer-se que no Brasil, à maneira das vacinas e das modas, há leis que “pegam” e leis que “não pegam”. Trata-se de fenômeno político-social ainda a merecer a atenção mais detida dos sociólogos e dos cientistas políticos, mas é certo que os anos de experiência na vida pública nos autorizam a formular algumas hipóteses sobre por que isso ocorre.

Em princípio, todas as leis são bem-intencionadas. Leis visando a fins perversos, se existem em uma democracia, devem ser minoria. Leis bem-intencionadas podem, no entanto, ser mal formuladas, o que dificulta ou até inviabiliza sua execução. Não é raro, infelizmente, que isso ocorra. Leis podem, ainda, não encontrar ressonância na população, que não vê, não percebe ou não entende o benefício social resultante de sua obediência. Seria o descompasso entre a lei e a moral socialmente aceita.

Quase sempre, porém, sobretudo em um país como o Brasil, marcado por enormes desigualdades sociais e informacionais, o descumprimento das leis se dá pela preponderância pura e simples da força bruta econômica de alguns grupos sociais que conseguem, a um tempo, oprimir outros grupos sociais e se furtar à sanção do Estado.

Nesses casos, o que temos é o fracasso do aparato estatal em exercer sua função precípua de monopolista da violência e de árbitro dos conflitos sociais. Fracasso que, não tenhamos dúvidas, contribui há quinhentos anos para a perpetuação da injustiça e da desigualdade.

Esse é, por certo, o caso da Lei de nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, o Código de Defesa do Consumidor. Muito embora a situação do consumidor brasileiro tenha melhorado sensivelmente no que diz respeito a suas relações com fornecedores e produtores de todo tipo de artigo e de serviço, antes totalmente assimétrica e injusta, a verdade é que ainda há um caminho longo a ser percorrido até que nosso consumidor tenha a força que têm os cidadãos de nações mais adiantadas na regulação dessa matéria.

Exemplificarei, Sr. Presidente. Um dos direitos a meu ver mais fundamentais do consumidor, expresso na Lei, é o da informação sobre os produtos ou serviços que adquire. Informação que tem de ser veraz e completa. Ora, o artigo 31 de nosso diploma legal reza explicitamente:

A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

É suficiente percorrer, com um pouco de atenção, os corredores dos supermercados, observando os rótulos dos produtos disponíveis nas prateleiras ou gôndolas, para constatar como esse artigo é desrespeitado. Muitas vezes as informações, por exemplo, sobre prazos de validade, são pouco claras, com os algarismos formadores das datas todos juntos, com freqüência em ordem inversa - ano, mês, dia -, para confundir o consumidor.

Também, com freqüência, a lista dos ingredientes da fórmula de produtos alimentares industrializados está grafada em caracteres diminutos, o que dificulta a leitura até para a visão atilada de uma criança. Que dizer então dos adultos e, mais ainda, dos idosos? Com suas vistas cansadas, serão alijados do direito à informação? Serão obrigados, a todo momento, a ficar perguntando a algum freguês próximo que aparente boa vontade: “meu filho, você pode me dizer o que está escrito aqui”?

Pior: muitas vezes, essas informações estão impressas, por exemplo, em letras pretas sobre fundo vermelho vivo, produzindo pouco contraste e dificultando ainda mais a leitura. Isso para não mencionarmos a questão dos itens criptografados, como “conservante P-VI”, “acidulante INS 330”, “corante caramelo IV” e outras coisas semelhantes. Onde estão as tabelas com as substâncias a que correspondem esses códigos obscuros para o consumidor médio? Ao que me consta, são sempre escamoteadas.

Cabe dizer algo sobre um ponto que passa quase despercebido nessa história toda. Trata-se da exigência da língua portuguesa. Não raro, as informações contidas nos rótulos estão mal redigidas, em caçanje ininteligível. A instituição do Mercosul, por outro lado, trouxe a nossas prateleiras rótulos em risível “portunhol”, o que, dada a semelhança dos idiomas, é até compreensível. O que não é assim tão aceitável é a vista grossa das autoridades, que parecem, no caso, brandir o patético “entendeu, não sacrifica”.

E quanto à moda de abandonar o vocabulário de nossa língua em favor de termos estrangeiros? Por que dizer, por exemplo, “rosehips” quando podemos dizer “rosa-mosqueta”, ou “Aloe vera” - que, pelo menos, é designação científica - quando podemos dizer “babosa”?

Sim, Srs. Senadores, é pormenor talvez menos importante no quadro da desinformação do consumidor pelos fabricantes. Ainda assim, penso que se trata de descumprimento da lei e de sintoma da incapacidade de nosso Estado de fazer obedecidas suas determinações. Esse mesmo Estado desmoralizado de que reclamamos agora, tão agudamente, ações no sentido da segurança pessoal e patrimonial, tanto quanto ações no sentido da redução das desigualdades sociais.

O quadro cultural que nos permite julgar desnecessário cumprir algumas leis é o mesmo que mantém a visão da violência como coisa natural. É isso que todos, Nação e Estado, precisamos mudar.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2002 - Página 3835