Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

RESPOSTA A INTERPELAÇÃO DO SENADOR ARTUR DA TAVOLA.

Autor
CELSO LAFER
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • RESPOSTA A INTERPELAÇÃO DO SENADOR ARTUR DA TAVOLA.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2002 - Página 3828
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, ARIEL SHAROM, PRIMEIRO-MINISTRO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL, AUMENTO, VIOLENCIA, COMBATE, TERRORISMO, EXPECTATIVA, RETOMADA, PAZ, ORIENTE MEDIO.

O SR. CELSO LAFER - Eminente Senador Artur da Távola, agradeço as suas perguntas que são, ao mesmo tempo, um convite importante a uma análise mais profunda desse contexto e das suas dificuldades.

Creio que, do ponto de vista da dinâmica interna de Israel, tem havido uma alternância entre os mais duros e os favoráveis à razão, ao entendimento e à paz. É natural que, nesse processo, à medida que Israel e a sua população se vejam atingidos por surtos de violência vençam os duros, sendo colocados numa posição mais difícil aqueles com os quais simpatizamos e estamos em sintonia.

Se quisermos fazer um rápido retrospecto, verificaremos que, evidentemente, em razão da derrota do Barak, que representava um primeiro-ministro dotado de visão muito abrangente de paz, a recusa das propostas apresentadas e negociadas pelo Presidente Bill Clinton naquele momento é uma das causas que levaram a eleição de Ariel Sharom.

Há nesse jogo uma situação em que tanto palestinos quanto israelenses perderam a oportunidade de encontrar a sua janela de saída para uma grave crise, que envolve refugiados, território pela paz, legitimidade, reconhecimento do outro, aceitação do pluralismo e da diversidade.

Estava lendo hoje na Folha de S.Paulo um artigo de Amos Oz, romancista israelense, um dos maiores defensores de uma política de paz. Nesse artigo, obviamente sob o calor da emoção e da hora, ele fazia referência à existência de duas guerras. A primeira - legítima - seria pela criação do Estado palestino, pela sua manutenção, continuidade e viabilidade democrática. O campo da paz em Israel, dizia ele, é um defensor dessa guerra. Mas há uma outra guerra, que é uma guerra que Israel sente - ele diz -, com os ataques terroristas e com a rejeição da própria existência de Israel com outro tipo de guerra. Como distinguir uma guerra justa, legítima, como a criação do Estado palestino, com todos os seus direitos e com todo o seu futuro, daquilo que é um processo também complicado, de violência e de rejeição? Portanto, nesse campo, encontramos, na verdade, esse jogo de dialéticas contraditórias.

Há uma imagem de Bobbio, de que gosto muito, sobre o papel da razão na História. Diz Bobbio que há três grandes metáforas. A primeira é a metáfora da desesperança: somos como peixes colhidos na rede do pescador, a morte é inexorável e só nos cabe ou a resignação ou o ceticismo - é uma metáfora que recuso. A outra metáfora é a de que a História é um grande teatro com alguns observadores privilegiados que sabem qual é o enredo e que podem antecipar o seu resultado e o seu final - também não advogo essa idéia. A terceira metáfora de Bobbio é a do labirinto: o que a razão nos mostra é que a História é um labirinto dentro do qual a experiência nos mostra que existem certos caminhos que são bloqueados, que não oferecem alternativa, ou seja, “por aí não vai”. A experiência da razão, na qual acredito, e da sua imprevisibilidade é a de que, nesse mundo do Oriente Médio, o caminho bloqueado é o caminho da violência e é preciso encontrar e recuperar uma saída desse labirinto para a qual devem concorrer os homens de boa-fé.

Tenho a convicção de que existe em Israel um grupo disposto a encontrar esse tipo de saída para o qual o exercício puro do poder e da violência não encontrará solução. Estou convencido de que a ocupação, tal como está sendo feita, dos territórios palestinos, com a idéia de destruir os centros de terror, destruirá as cidades, mas não destruirá tais centros e não será o caminho para a paz e para o entendimento.

Dizia o Padre Vieira - e o cito porque sei que V. Exª tem o gosto pelas boas citações -, num sermão extremamente interessante, que é o Sermão de São Roque, que, "diante das incertezas da salvação, a esperança anima: o temor acautela". Tenho o temor dessas dificuldades, mas tenho a esperança que me anima.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2002 - Página 3828